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GÊNERO O gênero se refere às características socialmente construídas de mulheres e homens - como normas, papéis e relações existentes entre eles. As expectativas de gênero variam de uma cultura para outra e podem mudar ao longo do tempo. Também é importante reconhecer identidades que não se encaixam nas categorias binárias de sexo masculino ou feminino. As normas, relações e papéis de gênero também afetam os resultados de saúde de pessoas com identidades transexuais e intersexuais. QUAL É A DIFERENÇA ENTRE SEXO E GÊNERO? Enquanto a maioria das pessoas nasce biologicamente homem ou mulher, a elas são ensinados comportamentos apropriados para homens e mulheres (normas de gênero) - incluindo como eles devem interagir com outros do mesmo sexo e do sexo oposto dentro de famílias, comunidades e locais de trabalho (relações de gênero), bem como as funções ou responsabilidades que devem assumir na sociedade (papéis de gênero). Renda, escolaridade, idade, etnia, orientação sexual e local de residência são determinantes importantes para a saúde. Quando eles se cruzam com a desigualdade de gênero, podem agravar a experiência da discriminação, dos riscos à saúde e da falta de acesso aos recursos necessários para alcançar a saúde. IMPACTO NA SAÚDE As diferenças entre mulheres e homens definidas socialmente não constituem, em si mesmas, um problema, salvo quando limitam as oportunidades ou os recursos necessários para resultados de saúde e, por conseguinte, provocam discriminação e desigualdades que podem ter consequências negativas para a saúde. Quando os indivíduos não se encaixam nas normas, relações ou papéis de gênero estabelecidos, frequentemente enfrentam estigma, práticas discriminatórias ou exclusão social - todos com impactos negativos para a saúde. As normas de gênero influenciam o acesso e o controle sobre os recursos necessários para atingir a saúde ideal, incluindo: Econômicos (renda, crédito); Sociais (redes sociais); Políticos (liderança, participação); Informação e educação (alfabetização em saúde, acadêmica); Vinculados ao tempo (acesso aos serviços de saúde); e De caráter interno (autoconfiança/autoestima). As normas, papéis e relações de gênero resultam em diferenças entre homens e mulheres em: Exposição a fatores de risco ou vulnerabilidade; Investimento doméstico em nutrição, cuidados e educação; Acesso e utilização dos serviços de saúde; Experiências em contextos de cuidados de saúde; e Impactos sociais em problemas de saúde. IGUALDADE DE GÊNERO NA SAÚDE A igualdade de gênero na saúde significa que as mulheres e os homens, ao longo da vida e em toda a sua diversidade, têm as mesmas condições e oportunidades para realizar plenamente seus direitos e potencial para serem saudáveis, além de contribuírem para o desenvolvimento da saúde e se beneficiarem de seus resultados. A consecução da igualdade de gênero na saúde muitas vezes requer medidas específicas para mitigar os obstáculos. HISTÓRIA DAS RELAÇÕES DE GÊNERO A história do conceito de gênero, exemplifica, desde a segunda metade do século XX, essas idas e vindas, em campos como a Antropologia, as Ciências Sociais e a Filosofia. Esta história ganha, no início do século XXI, questionamentos aos quais nos interessa chegar a fim de fazer pensar até que ponto o conceito de gênero – a partir do qual se tem discutido a assimetria de gênero na sociedade –, pode ser repensado em nome do debate sobre a heteronormatividade. O conceito de gênero como importante operador para a crítica de situações sociais específicas nas quais as mulheres ainda são subjugadas, tomando como exemplos o mercado de trabalho, o ambiente da família e a sua necessária discussão no ambiente escolar. A noção de sexo, ou da natureza biológica de homens e mulheres, é uma construção social que foi construída ao longo de muitos séculos. Porém durante a Idade Média – Era Medieval – o fato mais emblemático quanto ao cerceamento das mulheres foi a caça as bruxas. PEDAGOGIA DO MEDO Podemos imaginar o efeito que teve nas mulheres o fato de ver suas vizinhas, suas amigas e suas parentes ardendo na fogueira, enquanto percebiam que qualquer iniciativa contraceptiva de sua parte poderia ser interpretada como produto de uma perversão demoníaca. Entender o que as mulheres caçadas como bruxas e as demais mulheres de suas comunidades deviam pensar, sentir e decidir a partir desse horrendo ataque contras elas também nos possibilita evitar as especulações sobre as intenções dos perseguidores e concentrar nossas atenções, por outro lado, nos efeitos que a caça às bruxas provocou sobre a posição social das mulheres. BRUXARIA = Contracepção, Paixão, Prática do sexo fora do contexto da reprodução, Prostituta, Trabalhadoras, Donas de posses, Questionadora, Rebelde, Pobreza, Velhice, Médica, Não europeia, Mulher independente, Solteirona, Viúva, Infértil, Mulher com amiga,Qualquer outra que ameace o poder ou a exploração do seu trabalho A CAÇA ÀS BRUXAS AMPLIFICOU AS TENDÊNCIAS SOCIAIS DA ÉPOCA. Existe uma continuidade inconfundível entre as práticas que foram alvo da caça às bruxas e aquelas que estavam proibidas pela nova legislação introduzida na mesma época com a finalidade de regular a vida familiar e as relações de gênero e de propriedade. À medida que a caça às bruxas avançava, aprovavam-se leis que castigavam as adúlteras com a morte A prostituição, os nascimentos fora do casamento, ilegalidade O infanticídio foi transformado em crime capital. As amizades femininas eram objeto de suspeita, denunciadas no púlpito como uma subversão da aliança entre marido e mulher, As relações entre mulheres foram demonizadas pelos acusadores das bruxas, que as forçavam a delatar umas às outras como cúmplices do crime. A palavra gossip [fofoca], que na Idade Média significava “amiga”, mudou de significado, adquirindo uma conotação depreciativa: mais um sinal do grau a que foram solapados o poder das mulheres e os laços comunais. RACISMO E MISOGINIA MESMA ORIGEM A sexualização exagerada das mulheres e dos homens negros — as bruxas e os demônios — também deve ter como origem a posição que ocupavam na divisão internacional do trabalho surgida com a colonização da América, com o tráfico de escravos e com a caça às bruxas. A definição da negritude e da feminilidade como marcas da bestialidade e da irracionalidade correspondia à exclusão das mulheres na Europa — assim como das mulheres e dos homens nas colônias — do contrato social implícito no salário, com a consequente naturalização de sua exploração. Racismo consiste no preconceito e na discriminação com base em percepções sociais baseadas em diferenças biológicas entre os povos. Misoginia é a repulsa, desprezo ou ódio contra as mulheres. ESTUDOS SOBRE GÊNERO Não é possível entender o que são Estudos de Gênero sem compreender o movimento feminista, que começa no cenário internacional no século XIX e reivindica direitos civis para as mulheres. É muito reconhecida a luta pelo direito ao voto, mas é importante lembrar que essa não era a única reivindicação – as mulheres tinham pouco direitos e muito pelo que lutar. A mulher casada, por exemplo, era considerada pela lei brasileira “incapaz” e sob tutela do marido – o que somente foi alterado na legislação em 1962, com a Lei 4.121. Estudar Gênero significa estabelecer um recorte sobre aspectos da realidade social existente – no presente e/ou no passado – que têm como peça fundamental a organização de papeis sociais baseada numa imagem socialmente construída acerca do que foi consolidado como sendo masculino ou feminino por exemplo. Portanto, procura compreender como a ideia de uma masculinidade hegemônica influencia nas relaçõese restringe as opções sociais de mulheres, de crianças e dos próprios homens, e propor estratégias de libertação. Aqui, nos Estudos de Gênero, estão as pesquisas sobre violência doméstica, violência sexual, feminicídio, desigualdade econômica e outras assimetrias relacionadas às desigualdades de gênero. POLÍTICAS PÚBLICAS As políticas públicas podem ser definidas como respostas do Estado a problemas que emergem na sociedade. São consolidadas em conjuntos de diretrizes, medidas e procedimentos que explicitam o posicionamento político do Estado frente a problemas que são considerados de interesse público (Teixeira, 1997; Lucchese, 2004; Sampaio & Araújo, 2006). No campo da ação social, as políticas públicas de saúde têm por função definir a resposta do Estado às necessidades de saúde da população, visando ações de promoção, proteção e recuperação da saúde em nível individual e coletivo (Lucchese, 2004). No Brasil, a política de saúde pública está consolidada, desde a Constituição Federal de 1988 no Sistema Único de Saúde (SUS). O SUS tem como princípios a universalidade e a equidade no acesso aos serviços e ações de saúde e a integralidade da atenção, operacionalizando- se pelas diretrizes de descentralização, regionalização e hierarquização do cuidado e de participação da comunidade. Produto da luta do movimento da reforma sanitária brasileiro, instituído no contexto de redemocratização do Brasil e na contramão das propostas hegemônicas de organização de sistemas de saúde focalizados vigentes nos anos oitenta, o SUS estabelece a saúde como um direito universal, sendo dever do Estado prover o acesso à saúde a todos os cidadãos e cidadãs. MARCO IMPORTANTE Um importante marco da introdução da dimensão de gênero na política de saúde do país foi o Programa Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM). Lançado em 1983, a partir da confluência de forças dos movimentos de mulheres e sanitarista, o PAISM ampliou a concepção até então hegemônica de “saúde da mulher”, restrita à atenção ao pré-natal e ao parto, construindo uma proposta de atenção à saúde que tomasse as mulheres na sua condição de cidadãs, portadoras de múltiplas necessidades de saúde, às quais o Estado deveria responder (Correa, 1993). POPULAÇÃO LGBTQIA+ Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais Ademais da incorporação das singularidades da população masculina, o debate sobre gênero e saúde tem se ampliado também no sentido de destacar a multiplicidade de construções de identidades de gênero e orientações sexuais que constituem a diversidade humana, para além da classificação dos sujeitos em homens e mulheres unicamente a partir de seu sexo biológico. Segundo Lionço (2009), em grande medida, os agravos à saúde dos segmentos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT) são determinados socialmente, em função das frequentes violações de direitos a que estão expostos estes cidadãos e cidadãs. Tais violações são expressões das representações e significações construídas socialmente acerca das orientações sexuais tidas como desviantes perante a norma, representada pela heterossexualidade. A vivencia da homossexualidade e da expressão de gênero em desacordo com o sexo biológico são marcadas pela injúria, desqualificando-se essas possibilidades de existência com vistas à asseguração dos padrões morais hegemônicos no campo da sexualidade. Os dados da pesquisa “Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil”, realizada pela Fundação Perseu Abramo, não deixam dúvida quanto à gravidade do preconceito da população brasileira em relação aos segmentos LGBT: 11 em cada 12 brasileiros concordam com a afirmação de que “Deus fez o homem e a mulher [com sexos diferentes] para que cumpram seu papel e tenham filhos”. O índice de homofobia, construído a partir dos dados da pesquisa, indica que um quarto – 25% - da população brasileira é homofóbica. Inserida no contexto da vigência do Programa Brasil sem Homofobia (Brasil, 2004), lançado em 2004 pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais foi lançada pelo Ministério da Saúde em 2008. Trata-se de um marco importante no reconhecimento das necessidades de saúde destes segmentos para além das questões referentes à epidemia de aids, no sentido do reconhecimento da complexidade e diversidade dos problemas de saúde que os afetam. A Política parte do reconhecimento da existência dos efeitos perversos dos processos de discriminação e de exclusão sobre a saúde da população LGBT e, visando a sua superação, orienta-se para a promoção da equidade em saúde. Destaca, ainda, que a orientação sexual e a identidade de gênero são reconhecidas pelo Ministério da Saúde como determinantes e condicionantes da situação, na medida em que a intolerância, o estigma e a exclusão social relacionadas à diversidade sexual são geradoras de sofrimento e limitadoras do acesso da população LGBT aos cuidados de saúde. PRINCIPAIS FATOS E MELHORAS As normas, os papéis e as relações de gênero podem influenciar os resultados de saúde e afetar a obtenção da saúde, do bem-estar mental, físico e social. A desigualdade de gênero limita o acesso aos serviços de saúde de qualidade e contribui para taxas de morbidade e mortalidade evitáveis em mulheres e homens ao longo da vida. O desenvolvimento de programas de saúde sensíveis às questões de gênero, apropriadamente implementados são benéficos para homens, mulheres, meninos e meninas. É necessário desagregar dados e conduzir análises de gênero para identificar diferenças sexuais e de gênero nos riscos e oportunidades de saúde, além de projetar intervenções apropriadas. Abordar a desigualdade de gênero melhora o acesso e os benefícios dos serviços de saúde.