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Fundamentos de Direito EDNA RAQUEL HOGEMANN 1ª Edição Autores Edna Raquel Hogemann Revisor Técnico Solange Moura Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário Organização do Livro Didático........................................................................................................................................6 Introdução ..............................................................................................................................................................................8 Capítulo 1 Elementos Iniciais Fundamentais ao Estudo do Direito ............................................................................... 11 1. A sociedade e o direito ......................................................................................................................................... 12 1.2. O direito e a moral ............................................................................................................................................. 13 1.3. Fontes do direito ................................................................................................................................................. 15 1.4. Teoria geral da norma jurídica e do ordenamento jurídico ................................................................. 19 1.5. Direito e justiça: a estrutura do Poder Judiciário ................................................................................... 21 Capítulo 2 Fundamentos do Direito Constitucional ............................................................................................................. 24 2.1. Conceito de poder constituinte e formas de constituição ................................................................... 25 2.2. A instituição do Estado Democrático de Direito e os princípios constitucionais......................... 30 2.3. Dos direitos e garantias fundamentais ....................................................................................................... 32 2.4. Da organização do Estado ............................................................................................................................... 37 2.5. Da organização dos poderes........................................................................................................................... 37 Capítulo 3 Noções de Direito Administrativo ......................................................................................................................... 40 3.1. Administração Pública ...................................................................................................................................... 40 3.2. Ato Administrativo .............................................................................................................................................. 45 3.3. Extinção do Ato Administrativo ..................................................................................................................... 48 3.4. Administração Indireta ..................................................................................................................................... 50 3.5. Noções de licitação pública ............................................................................................................................ 52 3.6. Sobre o contrato administrativo .................................................................................................................... 53 3.7. Intervenção no domínio econômico ............................................................................................................. 55 3.8. Responsabilidade Civil da Administração Pública .................................................................................. 56 3.9. Processo administrativo .................................................................................................................................. 56 4 Capítulo 4 Introdução ao Direito do Trabalho e ao Direito da Seguridade Social .................................................... 57 4.1. Conceito, fontes e princípios em Direito do Trabalho ............................................................................ 58 4.2. Empregado e Empregador. Contrato de Trabalho .................................................................................... 59 4.3. Contrato de Trabalho – extinção. Férias. Aviso Prévio. FGTS. Estabilidade ..................................... 60 4.4. Segurança e Medicina do Trabalho. Direito do Menor e Direito da Mulher ................................... 61 4.5. Reforma trabalhista: flexibilização e precarização das relações trabalhistas .............................. 62 4.6. A seguridade social: conceito origem e histórico .................................................................................... 64 4.7. Assistência social ................................................................................................................................................ 65 4.8. Regime Geral de Previdência Social ............................................................................................................ 65 4.9. Regime Próprio de Previdência Social ........................................................................................................ 67 4.10. Regime Complementar de Previdência .................................................................................................... 67 4.11. Reformas da Assistência e da Previdência Sociais ............................................................................... 69 Capítulo 5 Introdução ao Direito Ambiental e ao Direito do Consumidor ................................................................... 71 5.1. Introdução ao Direito Ambiental e ao Direito do Consumidor ........................................................... 72 5.2. Fundamentos Constitucionais da Proteção Ambiental .......................................................................... 74 5.3. Objeto da Tutela Ambiental. Meios de Proteção Ambiental ................................................................ 75 5.4. Dano Ambiental e Responsabilidade Civil, Penal e Administrativa .................................................. 76 5.5. Agenda 21 e Biodiversidade ........................................................................................................................... 77 5.6. A base constitucional da proteção do consumidor ................................................................................. 78 5.7. Sobre o Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC) .............................................................. 79 Capítulo 6 Elementos de Direito Civil e Direito Empresarial ........................................................................................... 85 6.1. Direito Civil e a Constituição Federal de 1988: o fenômeno da constitucionalização do Direito Civil ................................................................................................................................................................... 86 6.2. A pessoa natural: personalidade jurídica, nome, capacidade, personalidade e domicílio ......... 87 6.3. A pessoa jurídica: conceito; natureza jurídica; classificação e constituição, regime jurídico e extinção.......................................................................................................................................................................... 90 6.4. Noções distintivas sobre fatos, atos e negócios jurídicos .................................................................... 93 6.5. Prescrição e Decadência: conceito, elementos, fundamento e espécies ......................................... 95 5 6.6. Os bens: conceito, bens intrinsecamente considerados e reciprocamente considerados ......... 97 6.7. Atos Ilícitos e Responsabilidade Civil: noções gerais .............................................................................97 6.8. Noções gerais sobre o direito das obrigações .......................................................................................... 99 6.9. A teoria geral dos contratos ..........................................................................................................................102 6.10. Direito empresarial na Constituição e no Código Civil .....................................................................105 6.11. O empresário: Características e pressupostos legais ........................................................................105 6.12. O estabelecimento empresarial: noção, natureza jurídica e regime jurídico de estabelecimento ........................................................................................................................................................106 6.13. Sociedades empresárias. Elementos gerais e específicos ................................................................108 6.14. Sociedade anônima: noções gerais e características. Constituição. Classificação. Formação. Extinção. Administração .........................................................................................................................................111 6.15. A crise estrutural e a crise conjuntural da empresa e os seus respectivos remédios: falência e recuperação .............................................................................................................................................................111 Referências ........................................................................................................................................................................114 6 Organização do Livro Didático Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização do Livro Didático. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. Cuidado Importante para diferenciar ideias e/ou conceitos, assim como ressaltar para o aluno noções que usualmente são objeto de dúvida ou entendimento equivocado. Importante Indicado para ressaltar trechos importantes do texto. Observe a Lei Conjunto de normas que dispõem sobre determinada matéria, ou seja, ela é origem, a fonte primária sobre um determinado assunto. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. 7 ORGANIzAçãO DO LIvRO DIDáTICO Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Posicionamento do autor Importante para diferenciar ideias e/ou conceitos, assim como ressaltar para o aluno noções que usualmente são objeto de dúvida ou entendimento equivocado. 8 Introdução Olá a todos(as)! Sejam bem-vindos(as) à disciplina Fundamentos de Direito. Os alunos que ingressam nos diversos cursos superiores, muitas vezes, ainda não tiveram contato com noções que dizem respeito, especificamente, ao mundo do Direito. Não conhecem expressões básicas como “normas jurídicas”, “ordenamento jurídico” e talvez não tenham ouvido falar dos “princípios fundamentais do Direito” ou em “como dotar de segurança e equilíbrio os negócios jurídicos”. Em geral, o mundo do Direito é como uma nova região a ser explorada e conhecida em todas as suas particularidades. Assim, a presente disciplina se propõe a fornecer as chaves que os auxiliará a abrir as portas para diversas regiões do mundo do Direito, ao trazer noções fundamentais para a compreensão do universo jurídico, referindo-se a vários conceitos científicos utilizados nos diversos ramos do Direito, com objetivos pedagógicos. Ao longo das aulas, vamos tratar de assuntos relativos aos fundamentos básicos do Direito e, logo a seguir, conheceremos o Direito Constitucional, ramo do Direito público que estuda os princípios e as normas que formam a estrutura do Estado e que são garantidores dos direitos e das liberdades individuais de todos os indivíduos de um mesmo Estado. Seguiremos pelas trilhas do Direito Administrativo até chegar a um tema constante da nossa sociedade capitalista, fundada no trabalho e nas relações dele decorrentes: vamos falar sobre Direito do Trabalho, também conhecido como direito laboral, e seguiremos até o Direito da Seguridade Social, cada dia mais relevante numa sociedade cujo signo maior deve ser o da solidariedade. Mas, a relevância da sustentabilidade também será objeto de nossos estudos, porque aportaremos na estação do Direito Ambiental e vamos aproveitar esse momento especial para fazer uma conexão com o Direito do Consumidor, disciplina jurídica dos tempos atuais, que decorre de múltiplos fatores, entre os quais a massifficação do consumo. Por fim, seremos apresentados a duas áreas muito especiais do Direito, a saber, o Direito Civil e o Empresarial. Claro que não ficaremos especialistas em todas essas matérias, mas teremos a oportunidade de conhecer os fundamentos básicos das disciplinas e alguns aspectos muito relevantes para a gestão. 9 O aluno terá a oportunidade de deparar com novas perspectivas a partir das nossas discussões. Comece, desde já, a explorar o material especialmente disponibilizado, incluindo os textos e o material audiovisual. Mas, não se afobe: nossa sugestão é que você organize seu tempo para ler o material com calma, realizar as atividades e assistir às videoaulas dentro de prazo estabelecido. Caso tenha alguma dúvida, você pode (e deve!) consultar o professor tutor da disciplina. Objetivos » Abordar a relevância da disciplina Fundamentos de Direito, constante na grade curricular dos cursos de licenciatura. » Orientar os estudantes na compreesão dos diversos ramos do Direito selecionados para apreciação, em seus aspectos basilares e práticos. » Refletir sobre os aspectos principiológicos fundamentais dos diversos ramos do Direito estudados no sentido de conferir lastro a futuras ponderações sobre as matérias. 10 11 Introdução Tendo em conta o compromisso de nosso curso em preparar o aluno para uma performance profissional correspondente às novas demandas e exigências cada vez mais sofisticadas do mercado de trabalho na área de gestão de recursos humanos, apresentamos essa disciplina que lhes possibilitará uma visão ampla e variada dos mais diversos aspectos do Direito que possuem relação com o fazer do gestor de recursos humanos. Iniciaremos fornecendo aos alunos os elementos que possibilitarão que ele compreenda o que é Direito e qual a sua importância em nossa sociedade, bem como a função social desempenhada pelo direito na prevenção e solução dos conflitos. A partir dessa compreensão, avançaremos para estabelecer a necessária distinção entre Moral e Direito, conhecer as diversas fontes de produção e de conhecimento do direito e obter noções fundamentais a respeito da teoriageral da norma jurídica e do ordenamento jurídico. Terminaremos esse capítulo conhecendo a estrutura do Poder Judiciário. Objetivos » Conhecer a relação entre o direito e a sociedade. » Distinguir os conceitos jurídicos fundamentais. » Diferenciar os dois grandes sistemas jurídicos da Common Law e da Civil Law. » Identificar as diversas fontes de produção e conhecimento do direito. » Reconhecer a estrutura do Poder Judiciário brasileiro. 1 CAPÍTULO ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO 12 CAPÍTULO 1 • ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO 1. A sociedade e o direito O direito se revela como fato ou fenômeno que só existe na sociedade e não pode ser concebido fora dela, por isso é um fato social. O propósito do direito é o de estabelecer padrões de conduta que colocam limites na ação de cada um dos membros da sociedade. Portanto, podemos considerar que o direito é um conjunto de regras obrigatórias, com força coativa (impositiva) que tem por propósito garantir a convivência social. Então, podemos afirmar que o direito é a regra de conduta estabelecida pelo grupo social para ser aplicada a seus membros, que permite a coação em certas circunstâncias, e é exercido pelo poder competente. 1.1. A função social do direito Consideramos o Direito como um conjunto de normas que têm por finalidade disciplinar e organizar a vida em sociedade, solucionando os conflitos de interesses e promovendo a justiça. Como observa o jurista Miguel Reale (2013): Aos olhos do homem comum o Direito é lei e ordem, isto é, um conjunto de regras obrigatórias que garantem a convivência social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada um de seus membros. Assim sendo, quem age de conformidade com essas regras comporta-se direito; quem não o faz, age torto. Em relação à função social do direito, na verdade são funções: prevenir, solucionar conflitos, regulamentar e orientar a vida em sociedade, e legitimar o poder político e jurídico. A existência das normas de direito oferece o que se costuma denominar “segurança jurídica”, a fim de evitar que o conflito se instaure. Mas, caso o conflito seja inevitável, o Direito atua para solucionar conflitos de interesses ou restaurar o estado anterior. Inicialmente seria, então, um instrumento de coerência e de estabilização, oferecendo ou impondo regras de conduta para a decisão que o caso requer. Mas, atenção! A simples existência das normas de direito não consegue fazer com que os conflitos desapareçam, porque são inerentes à sociedade. O conjunto das normas de direito orienta o comportamento social, procurando evitar que surjam conflitos. A maneira persuasiva das normas jurídicas está estruturada na forma de modelos normativos do sistema jurídico. O direito visto assim se apresenta como organizador da vida em sociedade e instrumento de prevenção de conflitos. 13 ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO • CAPÍTULO 1 Além disso, o direito tem por obrigação organizar o poder da autoridade que decide os conflitos (aplicando as normas), legitimando os órgãos e os instrumentos humanos de realização do próprio direito e estabelecendo normas de competência e de procedimento. 1.2. O direito e a moral Vamos agora conversar um pouco sobre um assunto muito importante para quem quer conhecer os fundamentos do direito: a relação entre direito e moral. Imagine duas situações distintas: » Situação 1 – você tem um grande amigo, desde a infância. De repente, descobre que esse amigo fala muito mal de você pelas suas costas. Ele é seu melhor amigo, não deveria agir assim em relação a você. Mas, isso é uma questão moral. Você pode se aborrecer com seu amigo, ficar triste com ele, dizer a ele que não proceda mais assim. E só. » Situação 2 – você trabalha com carteira assinada e ganha mais de R$28.500 por ano. Então, deve fazer declaração de imposto de renda e pagar imposto, caso seja devido. Mas, você acha injusto ter que pagar imposto, porque, na sua opinião salário, não é renda. Isso é uma questão de direito, prevista em lei. Ainda que você não quisesse, terá que pagar o imposto, senão sofrerá as sanções previstas na norma. Analisando os exemplos, podemos concluir que o dever moral (não trair o amigo) não é exigível por ninguém, reduzindo-se a dever de consciência, ao tu deves. Por outro lado, o dever jurídico (pagar o imposto de renda) deve ser observado sob pena de sofrer o devedor os efeitos da sanção organizada, aplicável pelos órgãos especializados da sociedade (no caso, a Receita Federal). Assim, no direito, o dever é exigível, enquanto na moral, não. 1.2.1 Norma moral x norma jurídica O direito, apesar de se basear em alguns parâmetros morais importantes, cobertos com sanções ativas, que são aplicadas por órgãos estatais, tem campo mais amplo que a moral, pois regula também matéria técnica e econômica que não tem aspectos morais envolvidos, por exemplo, o horário de funcionamento bancário. Mas, é importante ressaltar, o jurídico não está a salvo de julgamentos éticos. Direito e moral se encontram no direito privado e no direito penal. No direito penal, regras morais (de caráter religioso), como é o caso de não matar, não roubar, respeitar os mortos, os túmulos, o culto e os símbolos sagrados, são impostas em normas previstas pelo direito penal. De igual modo, as normas de direito privado (direito civil) também refletem essa influência, como no direito de família. 14 CAPÍTULO 1 • ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO Os campos da moral e do direito entrelaçam-se e interpenetram-se de diversas maneiras. As normas morais tendem a converter-se em normas jurídicas, como sucedeu, por exemplo, com o dever do pai de velar pelo filho, e com a indenização por acidente de trabalho. 1.2.2 Direito natural x direito positivo O direito natural é o ordenamento ideal, correspondente a uma justiça superior e suprema. Para a corrente jusnaturalismo (jus = direito), além do direito escrito (positivo), há uma ordem superior que é a do direito justo. A teoria do direito natural é muito antiga, estando presente na literatura jurídica ocidental desde a aurora da Civilização Europeia. O Direito Natural não é escrito, não é criado pela sociedade, nem é formulado pelo Estado. [...] É um Direito espontâneo, que se origina da própria natureza social do homem e que é revelado pela conjugação de experiência e razão. É constituído por um conjunto de princípios, e não de regras, de caráter universal, eterno e imutável. (NADER, 2014, p. 147). Surge assim a diferença entre direito positivo e direito natural. O primeiro é o ordenamento jurídico em vigor num determinado país e numa determinada época; o segundo, o ordenamento ideal, correspondente a uma justiça superior e suprema. O jusnaturalismo atual vê o direito natural como um conjunto de princípios amplos, a partir dos quais o legislador deverá compor a ordem jurídica. Esses princípios têm a ver com o direito à vida, à liberdade, à participação na vida social, à igualdade de oportunidades, entre outros. O direito positivo, assim denominado porque é o que emana diretamente do Estado (do latim jus positum: imposto que se impõe), são as normas produzidas pelo aparelho estatal. É o direito escrito e posto para todos nós pelo Estado. Figura 1. Comparação entre direito natural e positivo. DIREITO NATURAL • O direito natural, pressuposto, é anterior ao Estado, está na razão, no elemento racional das pessoas. • O direito natural tem validade universal e imutável (é válido em todos os tempos). • O direito natural está ligado a princípios fundamentais, de ordem abstrata; relaciona-se à noção de Justiça. DIREITO POSITIVO • O direito positivo é imposto pelo Estado • O direito positivo tem validade por determinado tempo (vigência temporal) e sobre um território. • O direito positivo é um conjunto de normas jurídicas, cujo fundamento é a estabilidade e a ordem social. Fonte:Elaborado pela autora. 15 ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO • CAPÍTULO 1 Para os positivistas: “Não existe outro direito além do Direito Positivo”. Desse modo, são intransigentes diante do direito natural. Assim, para o positivista a lei é em si o único valor. Mas, o direito não é composto somente de normas, como deseja essa corrente filosófica. Além disso, as normas jurídicas apresentam sempre um significado, um valor social e ético a ser realizado. A lei, sem condicionantes valorativos, é uma arma para o bem ou para o mal. 1.2.3 Direito objetivo e direito subjetivo Direito Objetivo – é formado por todas as normas jurídicas, as leis, que devem ser obedecidas rigorosamente por todos os indivíduos que vivem naquela sociedade que as adota. O seu descumprimento, dá origem a sanções. Direito Subjetivo – também chamado facultas agendi (faculdade de agir) é o poder de exigir determinada conduta de outrem, conferido pelo direito objetivo, pela norma jurídica. Então, podemos afirmar que é a situação jurídica, amparada por uma norma, segundo a qual alguém, a quem chamamos de ‘titular” tem direito a determinado ato face a outro alguém, que terá um dever jurídico. Elementos do direito subjetivo » Sujeito = pessoa física ou pessoa jurídica; » Objeto = o bem jurídico sobre o qual o sujeito exerce o poder conferido pela ordem jurídica. 1.3. Fontes do direito A expressão fonte vem do latim fons, fontis, nascente, denotando tudo aquilo que origina, que produz algo. Portanto, a expressão fontes do direito expressa, dessa maneira, as configurações pelas quais o direito se apresenta na sociedade. 1.3.1 Common law x Civil law Os sistemas jurídicos dos países ao redor do mundo geralmente se enquadram em uma das duas categorias principais: Common law e Civil law (sistemas de direito comum e sistemas de direito civil). Existem aproximadamente 150 países que têm o que pode ser descrito como Civil law, enquanto há cerca de 80 países que adotam a Common law. A principal diferença entre os dois sistemas é que, nos países da Common law, a jurisprudência – na forma de pareceres publicados – é de primordial importância, 16 CAPÍTULO 1 • ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO enquanto nos sistemas da Civil law predomina o direito codificado (os Códigos). Mas essas divisões não são tão claras quanto parece. De fato, muitos países usam uma combinação de recursos dos sistemas Common law e Civil law. Compreender as diferenças entre esses sistemas primeiro requer uma compreensão de seus fundamentos históricos. As origens históricas dos sistemas Common law e Civil law A fonte original do sistema da Common law (anglo-saxão) está na monarquia inglesa, que costumava emitir ordens formais chamadas writs quando a justiça precisava ser feita. Como os writs não eram suficientes para cobrir todas as situações, os tribunais de equidade foram finalmente estabelecidos para ouvir reclamações e elaborar remédios apropriados com base em princípios equitativos retirados de muitas fontes de autoridade (como o direito romano e o direito “natural”). Como essas decisões foram coletadas e publicadas, tornou-se possível para os tribunais buscar opiniões precedentes e aplicá-las aos casos atuais. E assim o Common law (direito comum) se desenvolveu. O sistema da Common law tem nas decisões judiciais uma importante fonte do direito. O Common law se apresenta como um direito jurisprudencial, ou seja, baseado em precedentes judiciários (judge-made-law), tendo a lei desempenhado papel irrelevante na sua evolução. Os costumes do reino exerceram influência decisiva como importante fonte da Common Law. Os costumes são a principal fonte do direito. A Civil law remonta ao código de leis (Corpus Juris Civilis) compilado pelo imperador romano Justiniano, por volta de 600 DC, com códigos legais, com raízes nessas leis (ou em outras), que se desenvolveram ao longo de muitos séculos em vários países, levando a sistemas legais semelhantes, cada um com seus próprios conjuntos de leis. Como Portugal fazia parte do Império Romano, sofreu a influência desse sistema que legou para nós, através da colonização. O sistema da Civil Law tem como principal fonte do direito a lei. 1.3.2 Fontes formais e fontes materiais Quadro 1. Fontes do direito. FONTES DO DIREITO DE PRODUÇÃO(MATERIAIS) Estado Sociedade DE CONHECIMENTO (FORMAIS) IMEDIATA Lei Princípios gerais de direito MEDIATA Costumes Jurisprudência DDoutrina Fonte: Elaborado pela autora. 17 ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO • CAPÍTULO 1 As fontes materiais – são os fatos sociais, as próprias forças sociais criadoras do direito. Constituem a matéria-prima da elaboração deste, pois são os valores sociais que informam o conteúdo das normas jurídicas. As fontes materiais não são ainda o direito pronto, perfeito, mas para a formação desse concorrem sob a forma de fatos sociais econômicos, políticos, religiosos, morais. São elas que criam o direito. As fontes formais – são aquelas pelas quais se toma conhecimento do direito. As fontes formais imediatas são aqueles fatos que, por si sós, são geradores do direito, como por exemplo, as normas jurídicas (regras e princípios, ou seja, “lei” em sentido amplo e princípios gerais de direito). As fontes formais mediatas são os costumes, os princípios gerais do direito, a jurisprudência e a doutrina. Conceitos Lei – em sentido amplo, é a norma jurídica que inclui a lei propriamente dita (ordinária ou complementar), a medida provisória e o decreto. Ou seja, é a lei comum e obrigatória, elaborada pelo Poder Legislativo, no âmbito de sua competência (municipal, estadual ou federal). Princípios gerais de direito – princípios são normas jurídicas, não necessariamente escritas, que se apresentam, como diria o jurista Miguel Reale, como as “verdades fundantes” de todo o conjunto das normas em vigor, que recebe o nome de ordenamento jurídico. Princípios informam, orientam e inspiram todas as normas jurídicas em geral. Em determinado sistema jurídico, não se encontram apenas regras, mas também princípios, que podem estar ou não positivados, isto é, previstos na legislação. Alguns exemplos: quando dizemos que ninguém deve ser punido por seus pensamentos ou ninguém está obrigado a fazer o impossível, estamos diante de clássicos princípios gerais de direito. Costume – é a prática social frequente de determinada conduta e considerada obrigatória. É uma regra não escrita que se introduziu pelo uso, com o consentimento tácito da sociedade que admite a sua força como norma. Um exemplo clássico é o do cheque pré-datado, não previsto em lei, mas aceito por todos. Saiba mais VOCÊ SABIA? O costume é a mais antiga e autêntica fonte de direito. 18 CAPÍTULO 1 • ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO Jurisprudência – é a coletânea de decisões uniformes proferidas pelos tribunais sobre determinado assunto jurídico. O termo jurisprudência é usado para as decisões dos tribunais e a expressão “precedente” para as decisões de juízes de primeiro grau ou primeira instância. Doutrina – é o direito resultante dos estudos realizados pelos pensadores destinados a sistematizar, esclarecer, adequar e trazer inovações ao direito, concebendo e formulando novos institutos jurídicos. 1.3.3 Elementos de integração do direito O intérprete do direito, ou seja, o(a) julgador(a), não pode deixar sem resposta as questões que chegam para sua apreciação e, pode acontecer que, justamente para aquele caso concreto não haja uma norma jurídica que se encaixe de forma específica. O que fazer? O(a) juiz(a) não pode se negar a julgar um caso sob a alegação de inexistência de norma para a solução do litígio. Deve procurar meios para basear sua decisão dentro do próprio ordenamento, através dos instrumentos de integração Dentre os métodos sugeridos pelo próprio legislador, encontra-se a analogia, podendo ser utilizada para a constatação e suprimentodas lacunas. O que é analogia? A doutrinadora Maria Helena Diniz nos ensina que a analogia consiste em aplicar a um caso não previsto de modo direto ou específico por uma norma jurídica, uma norma prevista para uma hipótese diferente, mas parecida com o caso não contemplado, com base na identidade do motivo da norma e não da identidade do fato. É necessário: 1o) o caso ser totalmente não previsto em lei; 2o) devem existir elementos semelhantes entre o caso previsto e aquele não previsto; 3o) esse elemento deve ser essencial e não um elemento qualquer, acidental. Atenção A Jurisprudência Vincula? Nos Estados de direito codificado (Civil Law), a jurisprudência apenas orienta e informa, tendo autoridade científica sem, no entanto, vincular os tribunais ou juízes de instância inferior. A exceção da Súmula Vinculante – decorre da EC-45, que adicionou o art. 103-A da Constituição de 1988. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após repetidas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e Administração Pública. 19 ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO • CAPÍTULO 1 1.4. Teoria geral da norma jurídica e do ordenamento jurídico 1.4.1 Conceito, estrutura lógica e características da norma jurídica De acordo com o Direito Positivo, a norma jurídica é o padrão de conduta social que é imposto pelo Estado, visando a possibilidade da convivência harmônica entre os indivíduos em sociedade. O doutrinador Paulo Nader a estabelece como a “conduta exigida ou o modelo imposto de organização social”. Para o professor Orlando Secco , seria o conjunto de regras imperativas por meio das quais o Direito se revela para nós, e que instituem os padrões de comportamento ou de organização, que são impostos de forma coercitiva aos indivíduos, destinando-se ao estabelecimento da ordem e da segurança da sociedade, de maneira harmoniosa. 1.4.2 Ordenamento jurídico e seus elementos constitutivos As normas jurídicas não existem de forma isolada, não atuam de maneira solitária, elas se correlacionam e se implicam umas às outras o tempo todo, compondo um todo constante e organizado harmonicamente que recebe o nome de ordenamento jurídico. Para o professor Miguel Reale (2013, p. 123), esse ordenamento jurídico pode ser conceituado como o sistema de normas jurídicas in acto, compreendendo as fontes de direito e todos os seus conteúdos e projeções: é, pois, os sistemas das normas em sua concreta realização, abrangendo tanto as regras explícitas como as elaboradas para suprir as lacunas do sistema, bem como as que cobrem os claros deixados ao poder discricionário dos indivíduos (normas negociais). Uma questão importante do ordenamento jurídico é a sua plenitude. O ordenamento jurídico não pode deixar sem apontar solução, qualquer conflito ou litígio que venha a abalar a segurança, a ordem e o equilíbrio sociais. Por isso, contém possibilidade de suprir possíveis lacunas das fontes do direito. Trata-se do princípio da plenitude do ordenamento jurídico que sempre busca em si mesmo as respostas para possíveis lacunas. 1.4.3 Norma Fundamental e Poder Constituinte O jurista austríaco Hans Kelsen concebeu uma teoria a respeito do ordenamento jurídico, para quem formava um todo unitário. Para ele, as normas jurídicas estariam organizadas de maneira escalonada, pelo fato de as normas de um ordenamento jurídico não estarem no mesmo plano, existindo, assim, normas superiores e inferiores. Assim, se subirmos a escala das normas, chegaremos a uma norma maior de todas, sobre a qual repousa a unidade do ordenamento. Essa norma que chamou de “norma 20 CAPÍTULO 1 • ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO fundamental” faz das diversas normas inferiores e de diversas procedências um conjunto unitário chamado ordenamento. Sem a existência dessa norma fundamental (hipotética), as outras seriam somente um amontoado. Por isso, por mais numerosas que sejam as fontes do direito de um ordenamento complexo, todas as normas se referem a uma única norma. Existe, assim, uma estrutura hierárquica de normas. Essa hierarquia pode ser representada na forma de uma pirâmide, a “pirâmide de Kelsen”. Figura 2. Pirâmide de Kelsen. Norma hipotética Fundamental Constituição Normas gerais: leis, costumes, decretos, jurisprudências Normas individualizadoras decisões judiciais, negócios jur. Fonte: https://gabialcarpe.wordpress.com/2014/09/15/filosofia-juridica-3o-bimestre-2o-ano/. Quanto ao poder constituinte, temos que, como o professor português Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1985) nos ensina: “o povo pode ser reconhecido como titular do Poder Constituinte, mas jamais quem o exerce. É ele um titular passivo, ao qual se imputa uma vontade constituinte sempre manifestada pela elite”. O poder constituinte pode ser originário, quando se revela como poder criador, ao institucionalizar uma primeira constituição, ou derivado, quando previsto no próprio texto constitucional. 1.4.4 Direito como ciência O jurista austríaco Hans Kelsen também teve o mérito de elevar o direito à categoria de ciência, a ciência do direito. O objeto de estudo da ciência jurídica são as normas jurídicas (e a conduta humana, mas somente na medida em que se revela conteúdo de normas jurídicas). Para esse autor, o direito é uma ciência normativa, limitando-se ao conhecimento e à descrição das normas e às relações entre episódios constituídos por essas próprias normas. 21 ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO • CAPÍTULO 1 1.5. Direito e justiça: a estrutura do Poder Judiciário A função do Poder Judiciário é garantir os nossos direitos individuais, coletivos e sociais e resolver os problemas (conflitos) que surjam entre os cidadãos, as entidades e o Estado. Para tal, possui autonomia administrativa e financeira que estão garantidas pela Constituição Federal e o faz exercendo a jurisdição. O que é jurisdição? É o poder que o Estado detém para aplicar o direito a um determinado caso que lhe é submetido, para solucionar conflitos de interesses e, assim, proteger a ordem jurídica e a autoridade da lei. A jurisdição opera por meio dos juízes de direito e tribunais regularmente investidos. É atividade do juiz, quando aplica o direito, em um processo regular, mediante a provocação de alguém que exerce o seu direito de ação. Figura 3. Organograma da estrutura do Poder Judiciário brasileiro. Supremo Tribunal Federal STF Superior Tribunal de Justiça STJ Tribunal Superior Eleitoral TSE Tribunal Superior do Trabalho TST Superior Tribunal Militar STM Tribunais de Justiça TJ Tribunais Regionais Federais TRF Tribunais Regionais Eleitorais TRE Tribunal Regionais do Trabalho TRT Tribunal de Justiça Militar TJM Juízes de Direito Juízes Federais Juízes Eleitorais Juízes do Trabalho Juízes Militares Fonte: http://queromeformaragora.blogspot.com/2013/08/dia-11-endireitando.html. Saiba mais VOCÊ SABIA? Jurisdição vem do latim “juris” e “dicere”, que significa “dizer direito”. 22 CAPÍTULO 1 • ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO Supremo Tribunal Federal (STF) Órgão máximo do Poder Judiciário do país. Sua principal função é zelar pelo cumprimento da Constituição e dar a palavra final nas questões que abranjam normas constitucionais. Tem onze ministros indicados pelo Presidente da República e nomeados por ele, após aprovação pelo Senado Federal. Superior Tribunal de Justiça (STJ) Abaixo do STF temos o STJ, responsável por fazer uma interpretação uniforme da legislação federal. Tem 33 ministros, nomeados pelo Presidente da República, escolhidos numa lista tríplice elaborada pela própria Corte. Esses ministros do STJ também têm de ser aprovados pelo Senado, antesda nomeação pelo Presidente. Justiça Federal A Justiça Federal comum processa e julga aquelas causas em que a União, suas autarquias ou empresas públicas federais sejam autoras, rés, assistentes ou oponentes – exceto aquelas relativas a falência, acidentes de trabalho e aquelas no âmbito da Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho. Tem juízes federais que atuam na primeira instância, nos Tribunais Regionais Federais (segunda instância) e nos Juizados Especiais Federais, para as causas de menor potencial ofensivo e de pequeno valor econômico. Justiça do Trabalho Julga as causas individuais e coletivas entre trabalhadores e patrões. Tem Juízes Trabalhistas que atuam na primeira instância e nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRT), e ministros que atuam no Tribunal Superior do Trabalho (TST). Justiça Eleitoral Existe para garantir o direito ao voto direto e sigiloso, bem como regulamentar os procedimentos eleitorais. Responsável por organizar, monitorar e apurar as eleições, também por diplomar os candidatos eleitos. Pode decretar a perda de mandato eletivo federal e estadual e julgar irregularidades praticadas nas eleições. Os juízes eleitorais atuam na primeira instância e nos tribunais regionais eleitorais (TRE) e os ministros atuam no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mas não são de carreira, são os juízes estaduais que acumulam as funções. Justiça Militar É uma justiça especial, composta por juízes militares que atuam em primeira e segunda instância e por ministros que julgam no Superior Tribunal Militar (STM). Sua função é processar e julgar especificamente os crimes militares. 23 ELEMENTOS INICIAIS FUNDAMENTAIS AO ESTUDO DO DIREITO • CAPÍTULO 1 Justiças Estaduais Justiça estadual está organizada em cada estado da federação e do Distrito Federal. Nela atuam juízes de direito (primeira instância) e desembargadores, (nos Tribunais de Justiça, segunda instância). Sua função é processar e julgar qualquer causa que não seja da Justiça Federal comum, do Trabalho, Eleitoral ou Militar. A Justiça estadual se divide pela organização judiciária fixando as competências das varas cíveis, criminais, empresariais, de família, juizados especiais cíveis e criminais etc. Saiba mais VOCÊ SABIA? O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) integra a estrutura do Poder Judiciário. Foi criado pela Emenda Constitucional 45/2004, da Reforma do Judiciário, e constitui um mecanismo do controle externo da administração da justiça no país. Promove a fiscalização e a supervisão de atividades administrativas internas do Judiciário. Sintetizando Vimos até agora: » Que o direito é um fenômeno que só existe em sociedade e, portanto, junto com outras instituições, como a família, a escola e o Estado, cumpre uma função social. » Que o objeto de estudo da ciência do direito é a norma jurídica. » Que existem normas que não são escritas, os costumes, e que existem normas escritas, aquelas postas pelo Estado, as normas positivadas. » Que o direito se manifesta na sociedade através de diversas fontes e que dentre todas, na nossa sociedade, a lei é a mais importante. » Que o Poder Judiciário é o responsável pela aplicação da lei nos casos concretos que lhe são submetidos. 24 Introdução O Direito Constitucional é, tradicionalmente, um ramo do Direito Público responsável pelo estudo da organização do Poder Político, do Estado, da estrutura do Estado e dos Direitos Fundamentais que controlam o exercício e o abuso deste poder que se encontra consagrado numa lei maior chamada Constituição. Ao longo desse capítulo, conheceremos como se iniciou esse processo e como se elabora uma Constituição que pode se apresentar de diversas formas, bem como os princípios e direitos fundamentais nela consagrados. Desde 1822, com o “7 de setembro”, símbolo da Independência, até os dias de hoje, já tivemos sete constituições em nosso país, a saber: 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988. Dessas sete Constituições, quatro foram promulgadas por assembleias nacionais constituintes, ou seja, foram discutidas e votadas democraticamente; duas foram outorgadas, quer dizer, foram impostas — a de 1824, por D. Pedro I e a de 1937 (apelidada de “Polaca”), pelo ditador civil, Getúlio Vargas — e uma, a de 1967, foi “aprovada” pelo Congresso, mas por exigência do regime militar, responsável pelo golpe militar de 1964. Assim, na história dessas Leis Maiores de nosso país, há uma alternância entre regimes autoritários e democráticos, com a concernente correspondência no conteúdo (ora incluindo direitos e garantias, ora sonegando-os) e aprovação, ora impostas, ora aprovadas democraticamente. Objetivos » Identificar os fundamentos básicos do direito constitucional. » Reconhecer as diversas formas e concepções de constituições. Compreender a relevância do constitucionalismo nos marcos do Estado Democrático de Direito. 2 CAPÍTULO FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL 25 FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL • CAPÍTULO 2 2.1. Conceito de poder constituinte e formas de constituição A constituição é um conjunto de normas jurídicas que determinam a ordem geral do Estado. Contra ela não se pode alegar direito adquirido. Então, afirma-se que é o código de leis máximas e fundamentais do país. A constituição é o estatuto da nação que trata dos direitos da pessoa humana, tanto os individuais como os sociais, da organização do poder, da distribuição das competências, do exercício da autoridade e da forma de Estado e governo. Saiba mais VOCÊ SABIA? O constitucionalismo, objetivamente, foi um movimento jurídico e filosófico surgido no século XVIII com as revoluções liberais burguesas, baseado na crença de que o poder político deve estar submetido à supremacia da lei, de uma Lei Maior, a Constituição escrita. Saiba mais Segundo o grande jurista do século XIX, Hans Kelsen, o ordenamento jurídico formaria uma verdadeira unidade que teria sua validade assegurada na constituição. Abaixo da Constituição Federal estariam os demais preceitos legais, cada qual com campos diversos: leis complementares, leis ordinárias, decretos-leis, medidas provisórias, leis delegadas, decretos legislativos e resoluções, além das normas internas da Administração Pública, como as portarias, circulares, ordem de serviço, que são hierarquicamente inferiores aos decretos. Figura 4. Ordenamento jurídico. Constituição Federal Leis Complementares Leis Ordinárias Medidas Provisórias e leis delegadas Resoluções Fonte: https://resumosparaconcursoro.blogspot.com/2013/09/direito-constitucional-1-nocoes.html. Por conseguinte, toda legislação deve estar conforme o disposto na Constituição, a Lei Maior, a Carta Magna que constitui cada nação. 26 CAPÍTULO 2 • FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL O poder constituinte Na primeira aula, tivemos algumas noções a respeito do que vem a ser esse poder, quando aprendemos a respeito da norma fundamental, aquela norma hipotética que confere unidade e coerência a todo o ordenamento jurídico. A ideia de poder constituinte surgiu no século XVIII com o teórico Emmanuel Sieyés, contemporânea à ideia de constituição escrita. O poder constituinte, originalmente, emana do povo que é seu titular, pois ele tem o poder soberano, mas não o exerce diretamente, conferindo-o, pelo voto, a seus representantes para que elaborem o texto constitucional. Nesse caso, ele é denominado poder constituinte originário. Além disso, encontramos também o poder constituinte derivado que pode ser reformador, revisor ou decorrente. O Poder Constituinte Derivado é o poder já previsto pelo legislador constituinte na própria Constituição pelo poder Originário, objetivando ou prevendo, cautelarmente, legitimar a sua alteração caso seja necessário. Figura 5. Hans Kelsen. Fonte: https://www.britannica.com/biography/Hans-Kelsen. O jurista judeu Hans Kelsen nasceu em 11 de outubro de 1881, na cidade de Praga, região da Checoslováquia, atual República Tcheca, que naquela época erapertencente ao então Império Austro-Húngaro (BOTELHO, 2005, p. 98) O maior objetivo de sua obra foi analisar e propor os fundamentos e métodos da teoria jurídica. O pensamento de Kelsen seria identificado com o intuito de atribuir à ciência jurídica objeto e métodos próprios, satisfatórios para vencer questões metodológicas e garantir ao jurista uma autonomia científica. Em 1941, Hans Kelsen fugiu do nazismo e, a convite, ingressou na Universidade de Harvard (EUA). Em 1943, tornou-se professor de Ciência Política da Universidade de Berkeley, onde permaneceu até falecer em abril de 1973, aos 91 anos (BOTELHO, 2005 p. 98.) 27 FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL • CAPÍTULO 2 Processo histórico de construção das constituições no mundo ocidental Estado liberal – as primeiras constituições foram consequência da influência do Iluminismo (independência dos EUA, de 1776 e Revolução Francesa de 1789). São dirigidas, inicialmente, ao Estado e não ao cidadão. São individualistas e de pouca ação político-social. Controlavam só o Estado e não davam direitos e garantias aos cidadãos. Estado Democrático-Social – depois da Segunda Guerra Mundial, as Constituições passaram a ser um complexo de normas, motivadas pelas relações sociais (econômicas, políticas e religiosas) com a finalidade de organizar e estruturar o Estado voltado para o bem-estar geral (Welfare State), caso contrário não têm razão de ser. Um bom exemplo é a nossa Constituição Federal de 1988. Pós-Moderna – atualmente, a ideia de constituição se manifesta como um estatuto reflexivo que, através de certos procedimentos, do apelo a autorregulações, de sugestões no sentido da evolução político-social, permite a existência de uma pluralidade de opções políticas, a compatibilização dos dissensos, através da construção de rupturas, respeitando o conflito de interesses (Constituição da África do Sul). Formas e concepções de constituição: As constituições podem ser classificadas quanto ao seu conteúdo, forma, origem, elaboração e extensão etc. Atenção ANOTE AÍ! Quem é legitimado para fazer a constituição? Mas o que é legitimidade? Legitimidade refere-se a todo comando que se reconhece como não arbitrário. Vivemos em uma democracia em que o titular do poder soberano é o povo e o agente desse poder constituinte será a Assembleia Nacional Constituinte eleita para fazer a Constituição em nome do povo. 28 CAPÍTULO 2 • FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL Figura 6. Classificação das constituições. CONTEÚDO FORMA ORIGEM ELABORAÇÃO EXTENSÃO • Formal - procedimentos fixos para alteração • Material - brota naturalmente •Escrita •Não escrita - textos esparsos •Promulgada - legitimidade popular • outorgada - imposta • Cesarista - povo não participa, mas pode modificar • dogmática - regras sistemáticas • histórica - elaborada aos poucos • Analítica inúmeros tópicos • Sintética - apenas princípios gerais Fonte: Elaborado pela autora. Por essas categorias, classifica-se a Constituição Brasileira de 1988 como formal, escrita, promulgada, dogmática e analítica. Mas...aqui no Brasil, como tudo começou? Aqui em nosso país, no contexto pós-independência de Portugal, foi elaborada uma constituição que, inicialmente, contemplou os interesses dos grandes fazendeiros, limitando os poderes do imperador. Mas, diante disso, D. Pedro I, reagiu, dissolvendo a Assembleia Nacional Constituinte, mandando prender os deputados e senadores e fez um texto constitucional que lhe agradou. Assim, nossa primeira Constituição, de 1824, foi outorgada (imposta) e teve as seguintes caraterísticas: governo monárquico, autoritário, centralizado, quatro poderes (legislativo, judiciário, executivo e moderador – esses dois últimos a cargo do imperador) e uma religião oficial (católica). O poder moderador tornava o imperador um monarca quase absolutista. Ele era o chefe do Estado e da Igreja. O Estado era confessional. As constituições pós-proclamação da República Com a proclamação da República, os grandes latifundiários conseguiram finalmente ter uma influência no texto constitucional. A Constituição de 1891, promulgada, foi feita com base no modelo liberal norte-americano, instituiu a república federativa, o presidencialismo, o casamento civil e criou o Estado laico. Não há mais religião oficial. Mas, retirou o dever do Estado de dar educação e saúde ao povo. Afinal, foram os grandes latifundiários seus mentores. Em 1934, já na Era Vargas, a Assembleia Nacional Constituinte, convocada pelo Governo Provisório da Revolução de 1930, redigiu e promulgou a segunda constituição republicana do Brasil. A nova Constituição substituindo a Constituição de 1891, já obsoleta devido ao dinamismo e evolução da política brasileira, foi promulgada, 29 FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL • CAPÍTULO 2 para reformar profundamente a organização da República Velha e realizar mudanças progressistas, mas durou pouco, só três anos. Em 1937, depois de um golpe, uma constituição já pronta foi outorgada por Getúlio Vargas (conhecida como a “polaca”), transformando o presidente em ditador e o estado “revolucionário” em autoritário. Era o fim das liberdades democráticas. Representou um momento de forte mudança para o Brasil, pois se opunha ao liberalismo e alinhava o Brasil ao fascismo. Sua principal característica era a enorme concentração de poderes nas mãos do chefe, o presidente. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, também Vargas terminou como político. No primeiro ano de governo do presidente Dutra, foi eleita a Assembleia Constituinte para elaborar a quarta Constituição da República, que foi promulgada em 18 de setembro de 1946. Era uma carta francamente liberal-democrática. O direito a liberdade de associação de classe, de pensamento e de expressão; bem com o direito de greve eram assegurados aos trabalhadores. Em 1964, o Brasil sofreu um golpe militar e inúmeros atos institucionais (AI) e atos complementares foram baixados. Eles não tinham previsão constitucional, portanto eram inconstitucionais. Então, era necessário fazer uma nova constituição que desse legitimidade aos atos praticados pela ditadura. Tempos difíceis... A Constituição brasileira de 1967 foi outorgada em 24 de janeiro e posta em vigor em 15 de março do mesmo ano. A forma federalista do Estado foi mantida, todavia com maior expansão da União. Na separação dos poderes foi dada maior ênfase ao Executivo que passou a ser eleito indiretamente por um colégio eleitoral. Alterou-se a estrutura do processo legislativo, surgindo o regime da legislação delegada e dos decretos-leis. Os direitos humanos existentes na Constituição de 1946, foram sonegados. Ela serviu para justificar legalmente o autoritarismo e o arbítrio político, incorporando os “atos institucionais” (o AI-5, de 1968, foi o mais conhecido). A retomada do processo democrático Finalmente, depois de muita luta dos setores progressistas da sociedade brasileira, a população retomou as rédeas de seus destinos e de sua pátria e em 15 de maio de 1985, a Emenda Constitucional no 25 alterou dispositivos da Constituição Federal e 30 CAPÍTULO 2 • FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL estabeleceu outras normas constitucionais de caráter transitório, restabelecendo eleições diretas para presidente e vice-presidente da República. Era a consolidação do fim do arbítrio. Em 1986 foram realizadas eleições para os governos dos Estados e para o Congresso que se constituiria como Assembleia Nacional Constituinte. A nova Constituição Federal promulgada em 1988, conhecida como “Constituição Cidadã”, refletiu os avanços ocorridos no Brasil, especialmente na extensão dos direitos sociais e políticos a todos os cidadãos e às “minorias”, consagrou direitos e garantias individuais, sociais e coletivos, inaugurando um verdadeiro Estado Democrático de Direito em nosso país. Alguns dizem que esta Carta seguiu uma longa tradição histórica brasileira já presente na Constituição de 1934 e na Constituiçãode 1946. Assim, no contexto da nossa constituição de 1988, a Federação, a República, o Presidencialismo e a Democracia são: a forma de estado, forma de governo, sistema de governo e regime de governo, respectivamente. 2.2. A instituição do Estado Democrático de Direito e os princípios constitucionais Vamos entender o advento do Estado Democrático de Direito. Ao longo do desenvolvimento da concepção de Estado, distintas formas foram imaginadas com a finalidade de estabelecer a divisão territorial de poderes, desde o tradicional Estado Unitário, característico do Estado Absolutista, até a forma federativa de Estado que foi criada por ocasião da independência dos Estados Unidos da América, em 1776. Saiba mais Vamos conhecer o Dr. Ulisses Guimarães, o “Senhor Diretas” ou “o Grande Timoneiro”: Dois processos foram de fundamental importância para recolocar nosso país no rumo da democracia: o movimento pelas Diretas Já, um movimento civil que reivindicava eleições diretas para presidente da república no Brasil ocorrido entre 1983 e 1984, pela proposta da Emenda Constitucional Dante de Oliveira, infelizmente derrotada pelo Congresso. O segundo foi o da Assembleia Nacional Constituinte de 1987. Em ambos, se destacou a figura do deputado Ulysses Guimarães (PMDB/SP). Foi a principal liderança das “Diretas Já” e presidiu a Assembleia Nacional Constituinte que deu origem à nossa atual Constituição, por ele denominada “Constituição Cidadã”, quando de sua promulgação, ocasião em que disse: “Declaro promulgado o documento da liberdade, da democracia e da justiça social do Brasil”. 31 FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL • CAPÍTULO 2 Baseada nas ideias de Montesquieu, autor da obra De l’Esprit des Lois (O Espírito das Leis), a criação do Estado norte-americano idealizou um novo sistema de governo, cujo nexo de construção era a separação de poderes como organismo de limitação do poder do Estado. Nesse sentido, a separação e independência entre os poderes se transformam em elemento nuclear do presidencialismo. Finalmente, no que diz respeito aos regimes de governo ou regimes políticos, aqui definidos como os diferentes modelos que garantem ou não a participação do povo na condução da vida política do Estado, temos a classificação em democracia ou autocracia. A classificação em regimes políticos democráticos ou autocráticos está ligada à participação ou não do povo na formulação das políticas públicas, na decisão das questões essenciais do Estado, na legitimação do sistema jurídico e na produção legislativa constitucional e infraconstitucional. Assim, no contexto da nossa Constituição de 1988, a Federação, a República, o Presidencialismo e a Democracia são: a forma de estado, forma de governo, sistema de governo e regime de governo, respectivamente. A separação de poderes é o instrumento necessário para limitar um possível poder abusivo por parte do Estado, sendo, por essa razão, em conjunto com a proteção dos direitos fundamentais, um dos apoios sobre o qual se sustenta o Estado Democrático de Direito. Podemos, então, conceber que o Estado Democrático de Direito se refere a qualquer Estado que se dedica a garantir o respeito das liberdades civis de seus cidadãos, considerados enquanto tais, ou seja, o respeito por seus direitos humanos e por suas garantias fundamentais, pelo estabelecimento de uma proteção jurídica. Nesse estado de direito, as próprias autoridades políticas estão sujeitas ao respeito e ao cumprimento das regras de direito. Saiba mais No site da Brasil Escola, está disponível um texto que discorre sobre o Estado Democrático de Direito. Vale conferir! Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/estado-democratico-direito.htm. Atenção O Estado Democrático de Direito, aqui no Brasil, foi uma conquista dos brasileiros com o fim da ditadura militar de 1964 e a transição democrática, com o resgate da cidadania que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988. 32 CAPÍTULO 2 • FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL Princípios Fundamentais Constitucionais Assim como a ciência é gerada por princípios ou cânones, também a Constituição oferece princípios fundamentais, sem os quais não se pode, de maneira alguma, interpretá-la. 2.3. Dos direitos e garantias fundamentais Conhecer os direitos e garantias assegurados pela Constituição é essencial para o efetivo exercício da cidadania e para a organização da sociedade civil. Nosso livro didático apresenta a Constituição como instrumento basilar para a vida em sociedade, que deve ser lida por todos, com atenção, posto que todo o ordenamento jurídico deve estar em conformidade com os dispositivos constitucionais, caso contrário serão inconstitucionais. Observe a lei Constituição Federal de 1988 Título I Dos Princípios Fundamentais Art. 1o. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. Atenção A importância da dignidade da pessoa humana A dignidade humana é um valor/atributo essencial, próprio de cada pessoa, que se revela em cada um de maneira específica e em relação ao respeito da própria existência e das outras pessoas com as quais se relaciona. Conforme afirma o professor Rizzato Nunes (2009, p. 25): “A dignidade humana é um valor já preenchido a priori, isto é, todo ser humano tem dignidade só pelo fato já de ser pessoa”. Assim, somos humanos porque temos dignidade e temos dignidade porque somos humanos. A dignidade é elemento essencial de nossa humanidade. Reconhecer e respeitar a dignidade humana é obrigação constitucional. 33 FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL • CAPÍTULO 2 2.3.1 Os direitos individuais constitucionais O modelo de Estado que surgiu como consequência da queda da monarquia em decorrência da Revolução Francesa de 1789, de perfil burguês, foi um Estado Liberal. Esse modelo de Estado liberal está associado ao Estado Mínimo e às liberdades individuais, pois não se preocupa com a busca da igualdade material (de verdade) nem com a proteção dos hipossuficientes (mais fracos). Na verdade, ele não reconhece os direitos sociais como verdadeiros direitos fundamentais. Por isso, o denominado núcleo essencial do Estado Liberal é esse rol de direitos civis e políticos, tidos como elementos da primeira dimensão (para alguns, gerações) dos direitos fundamentais. Em resumo, o paradigma liberal só reconhece como direitos públicos subjetivos (dos sujeitos) as liberdades individuais e os direitos políticos. Liberdades individuais Dizem respeito às liberdades individuais, como a de contratação, de consciência, de culto, à inviolabilidade de domicílio, à liberdade de reunião. Direitos políticos Direito de votar, ser votado e de participar da vida política do Estado. Observe a lei Constituição Federal de 1988 Título II Dos Direitos e Garantias Fundamentais Capítulo I Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; II- ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; III- ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; IV- é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; 34 CAPÍTULO 2 • FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL 2.3.2 As garantias constitucionaisGarantias constitucionais ou remédios constitucionais visam instrumentalizar a proteção de direitos pela via judicial. A Constituição de 1967 citava os seguintes remédios constitucionais processuais, denominados garantias constitucionais: » mandado de segurança; » habeas corpus; » ação popular. A atual Constituição Federal, inovando, criou o mandado de segurança coletivo, o mandado de injunção, o habeas data e estabeleceu que a ação popular protegeria também a moralidade administrativa. Mandado de Segurança O objeto do mandado de segurança é a correção de ato comissivo ou omissivo de autoridade, marcado pela ilegalidade ou abuso de poder. (CF/1988, art. 5o, LXIX). São pressupostos do mandado de segurança: » a existência de direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data; V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; VI- é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; VII – é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva; VIII- ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; IX- é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (...) Obs. Leia todos os incisos do art. 5o da Constituição, para melhor conhecer seus Direitos. 35 FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL • CAPÍTULO 2 » ato praticado por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições públicas. Há um prazo de 120 dias para impetrar mandado de segurança em juízo após o referido ato de desrespeito ao direito líquido e certo do interessado. Se a parte titular do direito deixar passar o prazo ou se seu direito não for líquido e certo, poderá usar ação judicial normal, pois o mandado de segurança é uma proteção rápida do referido direito. É a medida mais eficaz contra qualquer ilegalidade que possa atingir os direitos fundamentais do ser humano. Mandado de Segurança Coletivo Pode ser impetrado por partido político com representante no Congresso Nacional, por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados (CF/1988, art. 5o, LXX). Mandado de Injunção É utilizado diante da falta de alguma norma regulamentadora que inviabilize direitos e liberdades, nacionalidade, soberania e cidadania. São seus pressupostos: » que se trate de um direito previsto na Constituição, ou seja, os acima citados; » que tais direitos se tornem ineficazes em razão de uma norma que os regulamente. Habeas Corpus É um remédio para a proteção da liberdade de locomoção. Cabe sempre que alguém esteja privado ou ameaçado de ser privado de sua liberdade de locomoção, por violência ou coação, consequência de ilegalidade ou abuso de poder. Configura-se abuso de poder quando a autoridade utiliza indevidamente o poder que possui ou quando alguém usurpa poder que não possui. Qualquer brasileiro poderá impetrá-lo, mesmo sem advogado, em favor de qualquer compatriota ou estrangeiro, antes ou depois da ocorrência da coação ou da violência e é uma ordem dirigida contra o Poder Público. Habeas Data Será concedido para: » assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constante de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; 36 CAPÍTULO 2 • FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL » retificação de dados, quando não se prefira fazê-la por processo sigiloso, judicial ou administrativo (CF/1988, art. 5o LXXII). Ação Popular É o remédio constitucional que permite a qualquer cidadão eleitor obter a invalidade de atos ou contratos administrativos ilegais do Estado, ou de entidade em que o Estado participe, lesivos ao patrimônio público. É um instrumento de defesa dos interesses da coletividade visando tornar nulos os atos do poder público que venham a lesar o patrimônio público, das entidades autárquicas ou das sociedades de economia mista. Visa ainda, por expressa recomendação constitucional, à defesa da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural. 2.3.3 Dos direitos sociais Esses direitos surgiram, originalmente, como consequência de enfrentamentos brutais entre trabalhadores e patrões, na Europa, na Rússia e nos EUA no início do século XX. Os direitos econômicos e sociais dos indivíduos foram introduzidos no constitucionalismo brasileiro, e se fizeram presentes, inicialmente, na Constituição de 1934 e depois na Constituição de 1946 (apresentados na introdução deste capítulo). Contudo, foi com o processo de redemocratização do Brasil, após vinte anos de regime militar ditatorial, que culminou com a promulgação da Constituição de 1988, que os direitos sociais fundamentais como um todo receberam maior destaque. Além de apresentar um extenso rol de direitos e garantias individuais (direitos civis e políticos), a Constituição de 1988 elenca uma série de direitos econômicos, sociais e culturais. Desse modo, a atual Constituição possui um Capítulo dedicado aos direitos sociais, definidos em seu art. 6o: “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados na forma desta Constituição”. Saiba mais VOCÊ SABIA? Além dos direitos sociais, a Constituição de 1988 possui, ineditamente, um capítulo próprio destinado à seguridade social, à ciência e tecnologia, à comunicação social, ao meio ambiente e aos índios, todos disciplinados no Título VIII – Da Ordem Social. 37 FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL • CAPÍTULO 2 2.4. Da organização do Estado A Constituição estabelece, como base de seu funcionamento, o sistema democrático, a forma federativa de Estado e a forma republicana de governo. A forma republicana de governo é aquela que investe o chefe do governo de uma autoridade que não sofre controle parlamentar. Na República presidencialista, como é no Brasil, a chefia de Estado pertence ao Presidente da República, eleito pelo povo, por voto direito, por prazo determinado pela Constituição. Seus poderes como chefe de Estado incluem o comando das Forças Armadas e o controle sobre a política externa. A forma de Estado é federativa, por adotar a doutrina do federalismo, que defende a autonomia dos estados-membros dentro do Estado Federal. Mas essa autonomia não é total, podendo o estado-membro ter autonomia econômica, administrativa e política, desde que observados os princípios da Constituição Federal. Cada Estado-membro tem a sua própria Constituição, leis, bem como poderes executivos, legislativos e judiciários próprios. Uma reunião de municípios forma um estado-membro e cada município é politicamente organizado, possuindo dois poderes: Executivo, exercido pelo Prefeito e Legislativo exercido pela Câmara dos Vereadores. A federação é composta pela união indissolúvel dos estados-membros, municípios e do Distrito Federal. Os estados, municípios e o Distrito Federal fazem parte de um todo, que é o Brasil. O Regime Representativo é o democrático, pois prevalece sempre a opinião da maioria. É quando o poder emana do próprio povo, que o exerce indiretamente, através do Presidente da República, senadores e deputados. 2.5. Da organização dos poderes O conceito deEstado moderno está estreitamente ligado à noção de poder institucionalizado, isto é, o Estado se forma quando o poder se funda em uma instituição e não em um indivíduo. Assim, no Estado moderno, não há poder absoluto, pois mesmo os governantes devem se submeter ao que está previsto na Lei. 38 CAPÍTULO 2 • FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL De acordo com nossa atual Constituição, os poderes estão divididos em Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas, na realidade, o poder é um só, ocorrendo somente uma divisão de atribuições e funções do Estado. O que acontece é que esse poder precisa realizar atos necessários para ordenar a vida dos governados. Para tal, são necessárias normas que regulem as suas vidas e de entes que as façam cumprir. Como modo de evitar o abuso de poder e a tirania do próprio Estado, a sociedade concebeu a divisão do “poder-função” como uma forma eficiente de equilíbrio institucional. Por outro lado, o fato de os poderes serem independentes é entendido como um fator que impede a ingerência arbitrária de um poder sobre o outro, tornando o Estado funcional, o que deve garantir o seu equilíbrio. O Poder Executivo A Constituição Federal de 1988 estabeleceu o sistema presidencialista de governo para o Brasil. Nele, o Poder executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado. Suas principais funções são: chefiar o Estado, representando a nação; praticar atos de chefia de governo e de administração. O Poder Legislativo Cabe ao Poder Legislativo a elaboração de leis e fiscalização dos atos dos Poderes Executivo e Judiciário. No parlamento há uma grande diversidade de representantes da sociedade, o que deveria torná-lo uma real representação desta. Hoje em dia, nosso Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, composto por Câmara de Deputados e Senado Federal. A Câmara é composta por 513 deputados eleitos por quatro anos, de acordo com a população de cada Estado, enquanto o Senado é composto por 81 senadores, eleitos por oito anos, a partir de sistema majoritário (três para cada Estado). A organização do Legislativo em duas casas é chamada bicameralismo e existe assim para que uma casa complete o trabalho da outra. O Poder Judiciário Cabe ao Poder Judiciário julgar conflitos (litígios) que surgem tendo como base o ordenamento jurídico nacional. São órgãos do Poder Judiciário: o Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça, os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais, 39 FUNDAMENTOS DO DIREITO CONSTITUCIONAL • CAPÍTULO 2 os Tribunais e Juízes do Trabalho, os Tribunais e Juízes Eleitorais, os Tribunais e Juízes Militares e os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal, e, ainda, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Sintetizando Vimos até agora: » Que todas as sociedades, independente do espaço ou do tempo, tiveram alguma espécie de constituição, ainda que não escrita. » Que a constituição é um conjunto de normas jurídicas que determinam a ordem geral do Estado.Que existem diversas modalidades de constituições refletindo as correlações das forças que atuam na sociedade em que foram produzidas. » Que a nossa atual constituição de 1988 consagra um Estado Democrático de Direito que garante direitos individuais, direitos sociais e coletivos para toda a sociedade, tendo a dignidade da pessoa humana como base. 40 Introdução Comecemos este capítulo sublinhando a importância para o gestor em qualquer área em obter noções a respeito do Direito Administrativo. Vamos iniciar por esclarecer em que consiste a função administrativa no exercício de poderes pelo Estado e seus agentes, com as seguintes finalidades: » A satisfação dos interesses essenciais do conjunto da sociedade, também conhecido como interesse público primário, o que, em essência, justifica que essa mesma sociedade conceda poderes às autoridades públicas e igualmente elas tenham que se submeter a diversas limitações legais. » A promoção da organização e do funcionamento dos órgãos e entidades estatais que estabelecem tarefas que restringem a vida particular. Visando atingir tais objetivos é que surge o Direito Administrativo enquanto ramo jurídico que estabelece os princípios gerais que orientarão os atos de gestão e as ações das autoridades administrativas. O Direito Administrativo trata das competências de cada ente federativo, das afinidades entre órgãos e entidades, das conformações de centralização ou descentralização de funções, da delegação, avocação do exercício de tarefas administrativas etc. Vamos conhecê-los! 3.1. Administração Pública A administração pública é o conjunto das normas e funções desempenhadas para organizar a administração do Estado em todas as suas instâncias e tem como principal objetivo o interesse público, seguindo os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37 da Constituição Federal). 3 CAPÍTULO NOçÕES DE DIREITO ADMINISTRATIvO 41 NOçÕES DE DIREITO ADMINISTRATIvO • CAPÍTULO 3 O Direito Administrativo rege a máquina administrativa, seu funcionamento, a execução concreta de políticas públicas, a gestão da estrutura física, enfim, o lado prático do Estado. Hely Lopes Meirelles define assim a administração pública: “Administração pública é todo o aparelhamento do Estado, preordenado à realização de seus serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas” (2009, p. 127). 3.3.1 Princípios da Administração Pública Os princípios de direito administrativo são mandamentos gerais aplicáveis a toda e qualquer situação, em maior ou menor medida. Eles guiam a produção dos atos administrativos, a condução dos processos e a realização dos contratos, como também a edição dos atos normativos. Os princípios gerais mais importantes estão dispostos no art. 37, caput da Constituição Federal de 1988. São eles: a. Princípio da legalidade (art. 37, caput) O Estado é resultado da vontade da coletividade. Por isso, as entidades públicas e a ação do administrador público estão condicionadas aos mandamentos legais e às exigências do bem comum. Os atos que desrespeitam a lei são viciados (irregulares) e alguns vícios não podem ser corrigidos, o que exige a anulação do ato e, eventualmente, se houver má-fé ou falha, haverá a responsabilização do Estado e do agente público. Por isso, na Administração Pública não há real liberdade nem vontade pessoal, mas sim ações vinculadas às finalidades públicas de cada instituição. Em alguns casos, porém, a legislação cria espaços de discricionariedade, ou seja, dá margens de escolha para o administrador, mas mesmo nessas situações há que se observar os princípios gerais e as finalidades públicas. b. Princípio da moralidade (art. 37, caput Constitui pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública, que deve obedecer não somente à norma jurídica, mas também a padrões éticos que podem ser estabelecidos em cada instituição. A violação dessas regras éticas e morais próprias (regulamentos internos) pode eventualmente configurar infração disciplinar e, em casos mais graves, improbidade administrativa. Além do mais, todo e qualquer cidadão pode ajuizar ação popular contra atos públicos que afrontem a moralidade administrativa. Aponte-se, ainda, que a moralidade está vinculada ao princípio da razoabilidade, segundo o qual os atos 42 CAPÍTULO 3 • NOçÕES DE DIREITO ADMINISTRATIvO do administrador público devem se adequar para atingir a finalidade pública. As restrições e os inconvenientes que os atos administrativos causem aos particulares devem ser compensados por benefícios à coletividade. c. Princípio da impessoalidade e finalidade Exige que o ato seja feito sempre com finalidade pública. O administrador não pode procurar outro objetivo ou praticá-lo com interesse próprio ou de terceiros. O interesse público pode coincidir com o de particulares, como ocorre nos atos administrativos negociais e nos contratos