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Professora Mestre Juliana Rui Fernandes dos Reis Gonçalves • Mestre em Direito pela Universidade Estadual de Maringá - UEM • Especialista em Metodologia para enfrentamento à violência contra criança/ adolescente (PUC-PR). Especialista em Bioética (UEL) Especialista em Direito Tributário (IBEJ) • Formada pela Escola da Magistratura do Paraná Formada pela Escola do Ministério Público do Paraná. Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Maringá - UEM Graduada em Teologia pela Faculdade Teológica Sul Americana - FTSA • Advogada e professora de graduação e pós-graduação Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/6783050288627824 APRESENTAÇÃO DO MATERIAL Prezado(a) aluno(a), que bom que você está interessado(a) em adquirir conhecimento. O fato de estar preocupado(a) em buscar novos estudos já mostra o quanto está à frente da maioria das pessoas e isso é excelente para você. Conhecer um pouco dos nossos direitos sempre nos ajuda a lidar com as situações práticas que surgem em nosso dia a dia e creio que o que vamos ver aqui te trará ainda mais curiosidade de conhecer o mundo das leis. Em nossos estudos veremos estas quatro unidades: Unidade I-Introdução ao Direito Unidade Il-Direito Constitucional Unidade III-LINDB e Direito Civil Unidade IV- Direito do Consumidor, Trabalhista, Ambiental e Tributário Na Unidade I, Introdução ao Direito, vamos estudar a Norma Jurídica, o direito objetivo, o subjetivo, as fontes do direito, sua origem e classificações, bem como a diferença entre o Direito Público e o Direito Privado, onde se dividem e se comunicam. Na Unidade II, Direito Constitucional, você irá saber mais sobre a Constituição Federal, suas bases na Teoria Geral do Estado, o que vem a ser a ideia de Federação, analisar os fundamentos da República Federativa do Brasil e sua organização político-administrativa, entre outros temas. Na Unidade III, LINDB e Direito Civil, falaremos a respeito da Lei de Introdução às normas do direito brasileiro e sua função no ordenamento, bem como teremos uma noção breve acerca de temas do direito civil ligados à pessoa humana e jurídica. Na Unidade IV, Direito do Consumidor, Trabalhista, Ambiental e Tributário, teremos um breve entendimento do que vem a ser importante em cada um dos direitos referidos. Muito obrigado por sua atenção e bons estudos! SUMÁRIO UNIDADE I Introdução ao Direito 3 UNIDADE II 24 Direito Constitucional UNIDADE III LINDB e Direito Civil 56 UNIDADE IV Direito do Consumidor, Trabalhista, Ambiental e Tributário 89 UNIDADE I Introdução ao Direito Professora Me. Juliana Rui Fernandes dos Reis Gonçalves Plano de Estudo: Norma Jurídica • Direito Objetivo e Subjetivo • Fontes do Direito: Lei, Costumes, Doutrina e Jurisprudência Direito Público e Direito Privado Objetivos de Aprendizagem: • Analisar a formação do conceito de sujeito de direito na sociedade. • Diferenciar as noções acerca do Direito Público e do Direito Privado, do Direito Natural e do Direito positivo, bem como do Direito Objetivo e do Direito Subjetivo. • Comparar o positivismo e o pós-positivismo, bem como a influência da jurisprudência na construção dos Direitos. INTRODUÇÃO Caro(a) aluno(a), Que bom que você está animado(a) em conhecer algo novo. O conhecimento nos abre portas que, antes, talvez, não imaginávamos buscar. Por isso estou muito feliz em estar com você neste estudo. Nesta disciplina vamos estudar a Norma Jurídica, suas implicações e classificações, bem como direito objetivo e subjetivo. Analisaremos, ainda, as Fontes do direito, sua origem e classificações, diferencian do-las e colocá-las frente ao direito e sua importância para ele. E, por fim, conheceremos a diferença entre o Direito Público e o Direito Privado, onde se dividem e se comunicam.. seu dia a dia, que aprenderá a identificar. Fique tranquilo(a), será muito fácil compreender, porque tudo isto já faz parte do Então, como se diz vulgarmente: "Bora estudar", porque agora vamos introduzi-lo(a). ao Direito e Legislação aplicada. Atenciosamente, sua professora. 1. NORMA JURÍDICA 1.1 Conceito Básico de Direito, a Moral e as Normas que Regulamentam as Relações Sociais Segundo Miguel Reale (2013, p. 60), um dos maiores pensadores do direito brasileiro, "Direito é lei e ordem, isto é, um conjunto de regras obrigatórias que garante a convivência social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada um de seus membros", sendo assim, pode-se dizer que "quem age de conformidade com essas regras comporta-se direito; quem não o faz, age torto". Um conceito simples e complexo ao mesmo tempo, tendo em vista que esboça realmente a face do direito, posto que seu papel é estabelecer aquilo que a própria sociedade determina que deve ser protegido, estando à margem do direito aqueles que não o obedecem. Mas viver em sociedade não é isso? Se adaptar a regras para que possamos con viver pacificamente uns com os outros. Por isso mesmo o autor referenciado diz que "o Direito corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência ordenada, pois nenhuma sociedade poderia subsistir sem um mínimo de ordem, de direção e solidariedade" (REALE, 2013, p. 62). Por esta razão é que no direito impera o brocardo que diz que "onde está a socie dade está o direito" (ubi societas, ibi jus), ou seja, em qualquer ajuntamento de pessoas haverá regras que regulam suas relações e, consequentemente, o direito, já que este é o principal regulador das relações sociais. UNIDADE I Introdução ao Direito Sendo assim, Reale (2013, p. 62) ensina que o direito, enquanto fato ou fenômeno social, não existe senão na sociedade e não pode ser concebido fora dela". Mesmo que o homem primitivo não tenha tido consciência disto por muito tempo (já que na evolução social tivemos um longo período com regras, que não eram pensadas a partir da lógica e significado do direito, mas apenas dos usos e costumes dos povos), ainda assim, tinha regras reguladoras do conviver em grupo, que se mostravam punitivas (ou cogentes, no linguajar jurídico). obrigando que os sujeitos daquela comunidade vivessem de acordo com elas. Conquanto aquelas regras (usos e costumes dos povos), que poderiam dizer serem morais, são o nascedouro do Direito, sua base em todos os grupos sociais. Importante ressaltar a diferença entre a Ética (princípio), a Moral (adaptação do princípio aos usos e costumes) e o Direito (regras impositivas de conduta). O conceito de Ética, segundo o dicionário Michaelis On-line: Ramo da filosofia que tem por objetivo refletir sobre a essência dos princípios valores e problemas fundamentais da moral, tais como a finalidade e o sentido da vida humana, a natureza do bem e do mal, os fundamentos da obrigação e do dever, tendo como base as normas consideradas universalmente válidas e que norteiam o comportamento humano (MICHAELIS, s.d., on-line). Já Moral, dentre algumas ideias que lhe são atribuídas e de acordo com o mesmo glossário, pode ser definido como o "conjunto de regras de conduta estabelecidas e admitidas por um grupo social numa época determinada" (MICHAELIS, s.d., on-line). Neste sentido, podemos dizer que a primeira (ética) traz os princípios que orientam a segunda (moral), os quais são adaptados a cada cultura, em cada período da história. Pensem no seguinte exemplo: Se o casamento e a formação da família que o envolve fosse um princípio, esta seria a ética. A forma como este se dá em cada cultura, seria o campo da moral. Em todos os lugares, pelo menos em tese, as pessoas se casam para formar uma família. Contudo, a forma como o casamento se faz em cada lugar ou cultura é diferente. Vamos comparar no quadro apresentado a seguir: UNIDADE I Introdução ao Direito 6 QUADRO 1 - DIFERENÇA CULTURAL DA REALIZAÇÃO DO CASAMENTO CASAMENTO NO BRASIL CASAMENTO EM PAÍSES ÁRABES - tem intenção de formar uma família, tem intenção de formar uma família, independentemente se com ou sem fi- normalmente com muitos filhos lhos monogâmico (duas pessoas apenas)-poligâmicopara o homem - pode ser heteroafetivo (homem mu--somente pode ser heteroafetivo (homem e mulher(es) lher) ou homoafetivo (pessoas do mes- mo sexo) - a união estável se equipara em direito- normalmente, somente aquele feito. tos ao mesmo se seguidos os requisi- dentro dos usos e costumes de cada tos legais país é assim aceito Fonte: a autora. Como pudemos ver, ainda que a ideia seja a mesma formar uma família - sua realização será totalmente diferente, de acordo com os usos e costumes (cultura) de cada localidade, sendo essa adaptação do princípio a cada sociedade, o campo da Moral. E desta (moral) é que nasce o direito que regula aquilo que a sociedade entende como mais importante a ser resguardado, criando regras de conduta que disciplinam o agir de cada pessoa (sujeito, na linguagem jurídica) no meio em que vive, determinando sua obrigatoriedade e punição para aquele que não as cumpre. 1.2 Características das Normas Jurídicas Maria Helena Diniz (2019, p. 257), ao citar Radbruch e sua obra Introducción a la Filosofía del Derecho, diz que o autor assevera que o "Direito é o conjunto das normas gerais e positivas, que regulam a vida social". Ou seja, a palavra regular é algo inerente ao Direito e, por isso mesmo, Reale (2013, p. 68) ensina que "a moral é incoercível e o Direito coercivel". Sendo assim, podemos dizer que a COERCIBILIDADE (ou Imperatividade) é uma característica marcante do discurso jurídico, "que serve para mostrar a plena compatibilidade que existe entre o Direito e a força" (REALE, 2013, p. 69). De acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2019, p. 22), "o fim do direito é precisa mente determinar regras que permitam aos homens a vida em sociedade". E quando os homens deixam de cumprir este acordo, acabam sendo punidos pela aplicação do direito, como, por exemplo, a aplicação de penas restritivas de liberdade para aqueles que cometem crimes ou a execução de multas para aqueles que deixam de respeitar um contrato. Todavia, mesmo com relação à característica da coação, existem análises diferentes sobre sua aplicação. Segundo Reale (2013, p. 70). "Para uns, a força está sempre presente no mundo jurídico, é imanente a ele, e, portanto, inseparável dele". Mas o autor ressalta que outros entendem que "a coação no Direito não é efetiva, mas potencial, representando como que uma segunda linha de garantia da execução da norma, quando se revelam insuficientes os motivos que, comumente, levam os interessados a cumpri-la" (REALE, 2013, p. 69). A BILATERALIDADE é outra característica da norma jurídica. Ela quer dizer que, normalmente, a norma é dirigida a duas partes, em que uma deverá respeitar o direito da outra, reafirmando o brocardo jurídico que determina que "o meu direito acaba onde começa o do outro". A ABSTRAÇÃO e a GENERALIDADE também são características das normas, sendo a primeira o fato de que a norma não se dirige a um determinado caso de forma concreta e real, mas apenas regula as condutas abstratamente, determinando um padrão a ser seguido; a segunda, que isto não se volta a ninguém em especial, mas a todas as pessoas, sujeitos de uma relação jurídica (ex.: qualquer um que matar alguém poderá responder pelo crime de homicídio, se assim se enquadrar a sua conduta; ou qualquer um que violar um contrato, poderá responder por multa se esta estiver configurada no contrato em caso de descumprimento). 1.3 Estrutura, Classificação e Divisão das Normas Jurídicas de Conduta 1.3.1 Estrutura Para Miguel Reale (2013, p. 70), a norma é elemento constitutivo do direito, em que se encontram todas as características já apontadas, sendo sempre reduzida "a um juízo ou proposição hipotética, na qual se prevê um fato (F) ao qual se liga a uma consequência (C)". Isso significa que a norma traz em si a previsão genérica (geral) e abstrata (indefinida) de fatos reais que, ocorrendo, poderão ser encaixados na norma, gerando a obrigatoriedade de sua aplicação ao caso concreto. UNIDADE I Introdução ao Direito Como se pode perceber, a norma expressa um determinado padrão de comportamento, genérico e abstrato, gerando uma garantia para a pessoa que busca o direito e uma responsabilidade para quem o viola, dando poder ao que teve o direito violado de cobrar o seu cumprimento pelo violador. Pense no seguinte exemplo: João vende um celular a Maria, pelo qual ela combinou de pagar R$1.000,00 (mil reais) em 30 dias, tudo estipulado em um contrato de compra e venda entre eles. Ele entrega o celular a Maria na assinatura do contrato. No prazo de 30 dias, Maria não paga o valor combinado, alegando que não tem dinheiro e precisa de mais tempo. O acordo entre eles foi violado, gerando direito a João de cobrar Maria judicialmente, com base em normas que garantem esse direito a ele. Ou seja, a norma garante o direito de João cobrar Maria e a responsabilidade desta de cumprir com o combinado com João, dando poder a este e estabelecendo o dever daquela. O VALOR expresso representa o fato de que apenas protegem por meio de leis aquilo que é mais importante às relações humanas. Ou seja, toda norma tem em si um valor resguardado. Mas o próprio autor citado ressalta que essa estrutura não serve a toda e qualquer tipo de norma, mas tão somente àquelas que são destinadas a regulamentar os comportamentos sociais, mas não se encaixam em normas de organização e estruturação do próprio Estado, já que estas são, como o próprio nome diz, de mera organização. 1.3.2 Classificação e divisão das normas jurídicas de conduta a) Quanto à imperatividade, classificam-se em: • Cogentes: são aquelas emanadas pelo Estado de modo absoluto, ou seja, não podem ser alteradas ou derrogadas pela vontade dos interessados, sendo denominadas de ordem pública, e podem ser mandamentais (determinam uma ação) ou proibitivas (impõem uma abstenção). Ex.: algumas normas de direito de família, sucessões, direitos reais. • Não cogentes: são também emanadas pelo Estado, mas sua imperatividade é relativa, não proibindo de modo absoluto determinada conduta, "mas permitem uma ação ou abstenção, ou suprema declaração de vontade não manifestada" (GONÇALVES, 2019, p. 53). Podem ser permissivas (interessados podem dispor como melhor lhes convier) ou supletivas (se aplica na falta de manifes UNIDADE I Introdução ao Direito o de vontade das partes). Ex.: escolher o regime do casamento ou silenciar, aplicando-se o que a lei determina nestes casos. b) Quanto à intensidade da sanção (autorizamento), classificam-se em (GON ÇALVES, 2019, p. 54/55): . Mais que perfeitas: são as que aplicam duas sanções. Ex.: Na Lei de alimentos, art. 19, § 1° aplica a pena de prisão para o devedor de alimentos e a obrigação de pagar as prestações vencidas e vincendas. • Perfeitas: impõem a nulidade do ato, sem pena ao violador. Ex.: art. 166, I do CC/02, que diz que é nulo o negócio jurídico quando celebrado por pessoa. absolutamente incapaz; • Menos que perfeitas: não acarretam nulidade ou anulação do ato ou negócio jurídico, se violadas, mas impõe uma sanção ao violador. Ex.: art. 1523, I do CC/02 que diz que não devem casar o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e de partilha aos herdeiros. • Imperfeitas: são as leis cuja violação não acarreta consequências, como as dívidas de jogo e as dívidas prescritas (que não foram cobradas nos prazos legais dos arts. 205 e 206 do CC/02), posto que a lei não autoriza a cobrar estas em juízo. c) Quanto à natureza, classificam-se em: • Materiais (substantivas): as normas que tratam do direito material definem direitos e deveres e estabelecem seus requisitos e forma de exercício, e se contrapõe ao direito processual ou normas adjetivas. • Processuais (adjetivas): são as normas que traçam os meios de realizar os direitos, efetivá-los, colocá-los em prática. Essa classificação, embora tradicional, é pouco utilizada na atualidade, posto que há normas que pertencem aos dois campos. d) Quanto à hierarquia, classificam-se em: Normas constitucionais• Leis complementares (matérias especiais, não tratadas em lei ordinária) • Leis ordinárias (emanam dos órgãos investidos na função legislativa na CF) UNIDADE I Introdução ao Direito 10 • Leis delegadas (elaboradas pelo Executivo, com autorização do Legislativo) • Medidas provisórias (editadas pelo Executivo, nos casos previstos na CF) *As três últimas estão no mesmo plano hierárquico e) Quanto à competência, classificam-se em: Leis Federais Leis Estaduais Leis Municipais f) Quanto ao alcance, classificam-se em: • Gerais: se aplicam a todo sistema de relações jurídicas, como o Código Civil (CC). • Especiais: se aplicam a determinado assunto, a situações jurídicas específicas, como o Código de Defesa do Consumidor (CDC), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o Estatuto do Idoso, entre outras leis que são chamado Microssistemas Jurídicos, posto que trazem em si um conjunto de regras regulamentadoras de determinado assunto, prescrevendo quais condutas são permitidas e quais são proibidas acerca de um determinado tema. Com relação a isso é importante destacar que diante de uma norma geral, como o Código Civil, que regulamenta as relações cíveis de uma forma geral e uma norma especial, como o Código de Defesa do Consumidor, diante de uma relação de consumo, será este a ser aplicado de forma direta, sendo o Código Civil apenas suplementar (complementando o CDC naquilo que este não tiver norma específica ou suficiente). 2. DIREITO OBJETIVO E SUBJETIVO 2.1 O Direito Objetivo e Subjetivo O Direito Objetivo é aquele positivado, ou seja, colocado dentro de um sistema de leis de forma escrita e que é impositivo, ou melhor dizendo, nas palavras de Reale (2013, p. 183), é o "conjunto de regras obrigatórias que garante a convivência social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada um de seus membros", regras estas que serão escritas no nosso sistema legal em códigos de leis e naquelas chamadas de esparsas (que estão fora dos códigos). Ele nasce do estudo filosófico conhecido como positivismo jurídico (que tem como expoente ou autor mais conhecido, o filósofo do direito, Hans Kelsen). Esta corrente de pensamento tem como objeto o estudo da norma jurídica positivada, aquela que é criada pelo homem, fruto, portanto, da conduta humana em sociedade, visando, dessa forma, orientar as condutas interindividuais.. Nesse sentido, a doutrina acentua não ser suficiente para se estabelecer a paz social, os homens estarem dispostos a aplicação da prática da justiça, sendo necessário, portanto, lhes indicar o caminho a ela (NADER, 2014). Dessa forma, pode-se conceituar direito positivo como "o conjunto de normas estabelecidas pelo poder político que se impõem e regulam a vida social de um dado povo em determinada época" (DINIZ, 2019, p. 257). UNIDADE I Introdução ao Direito O direito positivo, portanto, tem esse papel regulador das condutas dos indivíduos em sociedade, visando adequá-las às necessidades daqueles, impondo, dessa forma, a organização social. 12 Contudo, as regras de direito não se impõem apenas aos indivíduos em sociedade, mas também ao Estado, criador e fiscalizador do cumprimento dessas regras, que tem nelas o seu limitador e organizador. E o direito subjetivo, como podemos compreendê-lo? Antes de conceituar devemos analisar isto a partir do direito já analisado, ou seja, o positivo para sua melhor compreensão. Para Reale (2013, p. 157), a regra jurídica, em que encontramos o direito objetivo, "delimitar objetivamente o campo social dentro do qual é facultado ao sujeito da relação pretender ou fazer aquilo que a norma lhe atribui", ou seja, o direito subjetivo, ligado a essa intenção da pessoa, está na faculdade do sujeito de agir a partir daquilo que a norma determina. Para melhor compreensão, pense na seguinte situação: José é dono da Fazenda Terra Boa, direito esse assegurado pelo direito de propriedade que está inscrito no artigo 5 da Constituição Federal de 1988. Ou seja, como base em um direito objetivo, escrito na CF, ele pode usufruir de sua propriedade nos termos que a lei lhe permite, podendo, por exemplo, plantar por conta própria ou arrendá-la (alugar) para que outro exerça o plantio mediante o pagamento de uma renda (aluguel). A escolha dele de como usar a propriedade é uma faculdade, campo do direito subjetivo. exercida pela pessoa em cada situação do dia a dia. O Direito Subjetivo, portanto, está no campo da vontade juridicamente protegida, Ou seja, o direito subjetivo é aquele inerente à pessoa humana, seu íntimo (por isso uma faculdade, uma escolha), de agir em conformidade com a lei e nos limites desta, dentro das possibilidades que esta lhe dá para exercer seus direitos e cumprir seus deveres, posto que aqueles que escolhem agir em desconformidade com os preceitos legais, acabam punidos por esta. 3. FONTES DO DIREITO: LEI, COSTUMES, DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA 3.1 Fontes Diretas e Formais (Imediatas) A Lei é uma fonte direta e formal do direito, a qual se traduz em uma norma imposta pelo Estado que toma obrigatória a sua observância por todos, de acordo com o art. 5º, II da CF/88 (ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei). Para Carlos Roberto Gonçalves (2019, p. 53), se pode dizer que a lei "não serial propriamente fonte do direito", sendo na verdade, "produto da legislação, pois, assim como a fonte de um rio não é a água que brota do manancial, mas é o próprio manancial, a lei não representa a origem, porém o resultado da atividade legislativa". Contudo, segundo o autor, a legislação, que é o processo de criação da lei escrita, é a fonte jurídica por excelência e por isso a lei pode ser considerada fonte principal do direito. Ela se impõe (impositiva) a todos (genérica), de forma abstrata (ou seja, determina um padrão de conduta que serve a todos que nela se encaixarem), autorizando que a pessoa que teve seu direito lesado, busque, por meio dela, a reparação para a lesão sofrida. Ela ainda tem como características se manter no tempo (é permanente), somente deixará de existir se for revogada ou substituída por outra, devendo, por fim, emanar de autoridade competente. A lei é a principal fonte do direito, contudo não é a única. O Costume é uma fonte direta e formal do direito, e se mostra "na observância reiterada de certas regras, consolidadas pelo tempo e revestidas de autoridade" (GONÇAL UNIDADE I Introdução ao Direito VES, 2019, p. 74). Se traduz em um direito não escrito, que se mostra na realização de certa conduta de forma reiterada e uniforme. Seu principal uso é no Common Law, sistema inglês e estadunidense em que as decisões judiciais que criam a figura do precedente jurisprudencial são a base para julgamento de outros casos próximos àquele já analisado pelo juiz ou tribunal anteriormente. Pelo disposto no art. 4° do Decreto Lei n. 4.657/42 (Lei de Introdução às Normas do Direito brasileiro - LINDB), quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito, sendo, portanto, a analogia e os princípios gerais de direito também uma fonte formal do direito. A Analogia consiste em aplicar a hipótese não prevista especialmente em lei, dispositivo relativo a um caso semelhante. Ou seja, quando o juiz julga por analogia, ele analisa um caso parecido com o que está julgando agora e se baseia naquela decisão (com as devidas e necessárias adaptações e com respeito às leis em geral) para decidir naquele caso novo que está em julgamento. Já os Princípios gerais de direito orientam a compreensão do sistema jurídico. Para Reale (2013, p. 162), são "enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, quer para a sua aplicação e integração, quer para a elaboração de novas normas". E, por fim, temos a Equidade que, embora não esteja prevista no Decreto lei n. 4.657/42 (LINDB), auxilia na integração da norma jurídica. Trata-se do uso do bom senso, da adaptaçãorazoável da lei ao caso concreto e está prevista no Código de Processo Civil (CPC). 3.2 Fontes Indiretas e Não Formais (Mediatas) A Doutrina e a Jurisprudência são consideradas fontes não formais do direito, contudo, a esta (jurisprudência) tem sido cada vez mais recorrente o entendimento de que, no plano da realidade prática, tem-se se revelado fonte criadora do direito. A Doutrina, de forma simplista, é a análise aprofundada, a interpretação da lei feita por estudiosos do direito. É ela que analisamos nas faculdades de direito a fim de aprofundar os conhecimentos acerca dos diferentes temas da seara jurídica. Tem por fim auxiliar, desde o estudante até ao operador do direito em diferentes níveis, a conhecer e repensar o direito, suas bases e modificações ao longo da história. Já a Jurisprudência é o conjunto das decisões judiciais uniformes e constantes sobre casos semelhantes. UNIDADE I Introdução ao Direito Segundo Flávio Tartuce (2012, p. 23) "haveria uma tendência de se caminhar para um sistema próximo à Common Law, em que os precedentes jurisprudenciais constituem a principal fonte do direito". Mas o próprio autor destaca, citando Walber de Moura Agra, que "as súmulas vinculantes não são leis, não tendo a mesma força dessas''. A conclusão, portanto, é pela permanência, pelo menos por enquanto, de um sistema essencialmente legal". 3.3 Diferença entre Fato, Fato e Ato Jurídico e Negócio Jurídico Fato comum é uma ação humana ou fato ocorrido na natureza que não tem importância jurídica. Ex.: luz emitida por uma estrela. Fato jurídico é o acontecimento que tem importância jurídica, pois o Direito the atribui efeitos. As relações jurídicas são o fim dos fatos jurídicos e podem ser criados, modificados ou extintos por eles. Dessa forma, os fatos jurídicos, são acontecimentos, naturais ou não, que causam efeitos no mundo do direito, criando, modificando ou extinguindo as relações jurídicas. Para a doutrina os fatos jurídicos lato sensu (geral) seriam os fatos de uma forma geral que tenham relevância jurídica, enquanto os fatos jurídicos stricto sensu (específica) são os acontecimentos que geram efeitos jurídicos independentemente da vontade huma na, já que se esta estiver envolvida será ato jurídico (GONÇALVES, 2019). Dessa forma, fatos jurídicos stricto sensu são os fatos jurídicos naturais, que não dependem da intervenção humana. Pode ser dividido em ORDINÁRIO (fato comum que aparece ao longo da vida como o simples decurso do tempo- nascimento, maioridade etc.) ou EXTRAORDINÁRIO (fatos que fogem à normalidade e produzem efeitos, podendo ser classificados como caso fortuito ou força maior). Segundo Orlando Gomes (apud GONÇALVES, 2019, p. 100 e 101), considera-se Caso fortuito o evento totalmente imprevisível e Força maior o evento previsível, porém inevitável. Para Barros e Aguirre (2008, p. 61), o fato humano "é toda ação humana que visa à criação, extinção, modificação ou conservação de direitos e obrigações". Divide-se em ato ilícito (ato contrário ao ordenamento jurídico-art. 186 CC) e ato ilícito (ato que está de acordo com o ordenamento jurídico, produzindo efeitos na seara jurídica-lato sensu- e se divide em ato jurídico stricto sensu e negócio jurídico). O Ato Jurídico Stricto Sensu, para Barros e Aguirre (2008, p. 61), é relacionado à ação humana lícita que tem consequências jurídicas previstas em lei, e que depende da vontade humana de fazer o ato. Ou seja, o ato "tem como objetivo a mera realização da UNIDADE I Introdução ao Direito vontade do titular de um determinado direito. Ex.: pagamento, reconhecimento de filho, notificação para constituição em mora, fixação de domicílio etc. Para ficar claro, veja o quadro. QUADRO 2-DIFERENÇA ENTRE ATO, FATO, ATO E FATO JURÍDICO Ato Conduta humana. Fato Ação em si. Jurídico Produz efeitos no mundo do direito. ATO JURÍDICO é o gênero do qual o negócio jurídico é espécie; Todo NEGÓCIO JÚRI-ATO-FATO JURÍDICO: DICO É ATO JURÍDICO, mas nem todo ato jurídico é negócio jurídico, porque temos os atos jurídicos não negociais (ato jurídico stricto sensu) É a vontade inteiramente desprezada, como no caso da criança que comprar balas em estabelecimento comercial, o que produz efeitos independente do discernimento dela ou não; se fosse negócio jurídico seria in válido, porque a criança não tem discernimento e o negócio jurídico exige agente capaz. Fonte: a autora, Do Negócio Jurídico - é o ato celebrado entre as partes com o fim de compor seus interesses, autorregulamentação suas vontades, como no contrato. É uma declaração que expressa a vontade das partes envolvidas, que deve se ater a objeto lícito. Dessa forma, são as condutas pessoais deflagradoras de efeitos ilícitos que resultam mais da vontade do que da lei. 4. DIREITO PÚBLICO E DIREITO PRIVADO Desde o Direito Romano, o Direito tem sido dividido em Direito Público e Direito Pri vado, dizendo, de forma simplista, o primeiro a respeito das coisas do Estado e, o segundo, de utilidade dos particulares. A doutrina ensina que essa divisão clássica entre público e privado não é totalmente correta, já que os critérios estabelecidos para essa distinção (interesse/utilidade, interesse preponderante, poder de império, conteúdo patrimonial) não podem fazê-lo perfeitamente (GONÇALVES, 2019, p. 100 e 101). O primeiro citado, INTERESSE, diz respeito àquela divisão romana clássica, em que se via o interesse ou a utilidade visada pela norma que se referisse ao Estado, sendo essa parte do Direito Público; mas quando o interesse se referisse aos particulares, seria parte do Direito Privado. Esse critério foi dado como falho por não poder separar os diversos casos que muitas vezes não se sabe determinar se o interesse maior é do Estado ou do particular ou ainda porque há diversas regras de interesse geral que poderiam nesta divisão pertencer ao Direito Público, pertencem ao Direito Privado, como no caso do Direito de Família (NADER, 2014. p. 60 e 61). Em face disto, os canonistas (especialistas no direito, em especial ao canônico) tentaram acrescentar o adjetivo PREPONDERANTE a interesse, entendendo como sendo Público aquele interesse preponderante do Estado, ainda que vise também interesses dos UNIDADE I Introdução ao Direito 18 particulares e vice-versa no tocante ao Privado. Esse critério também foi criticado, porque, na verdade, não pode verdadeiramente dar perfeição a divisão (FERRAZ JUNIOR, 2019; NADER, 2014). Quanto ao PODER DE IMPÉRIO, proposto por Jellinek em sua Teoria Geral do Estado, colocou-se que "o Direito Público regula as relações em que está presente o poder de imperium" (MONTORO, 2016, p. 50). Enquanto o Direito Privado regula as situações de indivíduos iguais (ex.: contrato), onde não há uma relação de subordinação entre um e outro como no primeiro em relação aos indivíduos. No tocante ao CONTEÚDO PATRIMONIAL, como critério divisor proposto por Khan e outros autores (apud FERRAZ JÚNIOR, 2019, NADER, 2014), estes colocam que o Direito Privado contém um conteúdo material, enquanto o Direito Público não, o que não é verdade, pois ambos os Direitos têm normas de conteúdo patrimonial ou não. Ex.: Direito público - impostos, orçamentos etc. Direito privado-questões relativas ao nome, deveres de família, pátrio poder etc. Desta forma, pode-se dizer que nenhum dos critérios apresentados pode estabelecer com certeza uma divisão satisfatória entre Direito Público e Privado, mas em não havendo outra divisão, está ainda vigora, entendendo-se que o Direito Público é aquele que tem o condão de regular as questões relativas aos interesses do Estado e seus Poderes, Legislativo, Executivo e Judiciário. Enquanto o Direito Privado trata das relações jurídicas entre pessoas privadas, desde o nascimento até a morte, e ainda para as situações que podem se estender a esta. Estes ramos podem ser assim distribuídos (FERRAZ JUNIOR, 2019; NADER, 2014): DIREITO PÚBLICO INTERNO - Direito Constitucional, Administrativo, Financeiro, Tributário, Judiciário, Penal. DIREITOPÚBLICO EXTERNO- Direito Internacional Público. Direito Privado Comum- Direito Civil. DIREITO PRIVADO ESPECIAL - Direito Comercial, do Consumidor, do Trabalho. SAIBA MAIS A palavra Direito teve origem na palavra em latim directum ou rectum, que significa aquele que "é conforme a uma régua", tendo ainda a conotação de guiar, conduzir, traçar ou alinhar. Somente com sua evolução que o direito passou a ser "aquilo que está conforme a lei, a própria lei, conjunto de leis, a ciência que estuda as leis" (MONTORO, 2016, p. 53). Mas da conceituação de Direito expressa no vocábulo podemos perceber que ele não tem apenas um conceito unívoco, mas sim expressa cinco diferentes situações que se encontram interligadas, pois cabem a um mesmo fim, ou seja, demonstrar a função do Direito (MONTORO, 2016), SAIBA MAIS Elementos do negócio Jurídico; os atos essenciais ou de existência são aqueles que tratam dos elementos essenciais que dão existência aos negócios jurídicos. Estes estão dispostos no art. 104 do CC/02, que é um dos artigos mais essenciais ao estudo do direito, posto que estabelece os requisitos de validade dos negócios jurídicos, como, por exemplo, todos os contratos que fazemos. Art. 104. A validade do negócio jurídico requer 1-agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável III - forma prescrita ou não defesa em lei. REFLITA "Mas, assim como o homem civilizado é o melhor de todos os animais, aquele que não conhece nem justiça nem leis é o pior de todos (Aristóteles). UNIDADE I Introdução ao Direito CONSIDERAÇÕES FINAIS Como vimos anteriormente, a doutrina traz diversas conceituações acerca do termo direito, já que seria impossível encerrar em apenas uma única definição, assunto tão vasto. Sendo assim, podemos ter o Direito visto como: o duelo, Norma: expressa a lei ou a regra social obrigatória a todos. Ex.: o direito não permite Faculdade: expressa o poder, a faculdade ou a prerrogativa que o Estado tem de criar leis. O Estado tem o direito de legislar. Justo: significa aquilo que é devido pela Justiça. Ex.: a educação é direito da criança. Ciência: significa a própria ciência do direito que o estuda e estabelece seus con Aceitos. Ex.: cabe ao direito estudar sua criminalidade. Fato social: considerado como fenômeno da vida coletiva ao lado de outros fatos que também envolvem a vida de todo ser humano, como fatos econômicos, artísticos, cul culturais, esportivos etc. Ex.: o direito constitui um setor da vida social. O direito tem como sua maior fonte a Lei no modelo do Civil Law, que é aquele adotado em nosso país, derivado do cânone europeu, em especial o romano-germânico. Mas não deixa de ser influenciado também pela aplicação da Jurisprudência (cada dia com mais força) e pelos costumes, entre outras fontes, que auxiliam na formação do direito. E, por fim, vimos que o Direito Público é aquele que tem como objeto regular as relações jurídicas do Estado, relativo principalmente a sua organização e competência, enquanto o Direito Privado regula as relações jurídicas entre particulares que tem nos con tratos seu maior exemplo de liberdade, mas que adentra quase todas as áreas das ações humanas, porque se insere também nas relações familiares (ex.: casamento, herança) e de propriedade de bens (ex.: usufruto, usucapião).. UNIDADE I Introdução ao Direito LEITURA COMPLEMENTAR A leitura dos textos complementares é de suma importância para que se possa aprofundar no conhecimento do direito e, tendo em vista que o direito é extremamente teórico em suas bases e fundamentos, a leitura é a sua base de conhecimento. É imprescindível ler para conhecer. Então, vamos lá, porque seus estudos estão apenas no início. DINIZ, Maria Helena. Fontes do direito. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Teoria Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gon Zaga, André Luiz Freire (coord. de tomo). São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponivel em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/157/edicao-1/ fontes-do-direito FREIRE, André Luiz. Direito público e direito privado. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Teoria Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga, André Luiz Freire (coord, de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp. br/verbete/133/edição-1/direito-público-e-direito-privado SOUZA, Luiz Sérgio Fernandes. Lacunas no direito. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Teoria Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp. br/verbete/133/edição-1/direito-público-e-direito-privado SOUZA, Luiz Sérgio Fernandes. Lacunas no direito. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Teoria Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: UNIDADE II Direito Constitucional Professora Ma. Juliana Rui Fernandes dos Reis Gonçalves Plano de Estudo: A Constituição e a Teoria Geral do Estado O Direito Constitucional • A Federação no Direito Positivo Brasileiro • Os Poderes do Estado Objetivos de Aprendizagem: Analisar a formação do Estado brasileiro da perspectiva da • Teoria geral do Estado e do Direito Constitucional • Diferenciar as noções acerca da Federação no Estado brasileiro, da organização político administrativa, da repartição das competências, dos poderes entre outros aspectos da organização do Estado Nacional • Compreender os fundamentos da República Federativa do Brasil 24 INTRODUÇÃO Caro(a) aluno(a), Que bom que você está animado(a) em continuar seus estudos acerca do Direito. Como dissemos antes, o conhecimento abre portas para novos lugares e isso é de grande importância para quem quer crescer pessoal e profissionalmente. Nesta disciplina vamos estudar o Direito Constitucional, começando pela Teoria Geral do Estado e pelo estudo da ideia de Federação, os fundamentos da República Federativa do Brasil, caminhando para compreender a organização político-administrativa e a repartição das competências. Analisaremos ainda, as entidades federativas, os poderes de estado e sua divisão entre outros temas atinentes à formação e organização estatal. Então, vamos lá continuar nossos estudos, porque sempre é muito bom adquirir conhecimento. Atenciosamente, sua professora. 1. A CONSTITUIÇÃO E A TEORIA GERAL DO ESTADO 1.1 Conceito de Constituição Todas as coisas de existência física têm uma estrutura, uma constituição. Em senti do etimológico, ela tem relação com o "modo de ser das coisas, sua essência e qualidades distintivas (BONAVIDES, 2017, p. 93). Mas a palavra "constituição também pode ter outra conotação, a qual revele o modo de ser do Estado, e esta é sua concepção jurídica. ee No século XIX, Ferdinand Lassalle, autor da obra clássica Que es una constitución?, partindo de um sentido sociológico de constituição, afirmou que todos os Estados têm e sempre tiveram uma Constituição, tendo em vista que toda sociedade politicamente organizada, contém uma estrutura mínima, por mais rudimentar que seja (BONAVIDES, 2017), sendo a constituição de um país, apenas, "a soma dos fatores reais do poder que regem nesse país, sendo esta a constituição real e efetiva" (SILVA, 2017, p. 39). Posto isto, via como a única inovação em relação à matéria no final do século XVIII, o surgimento das Constituiçõesescritas. Estas Constituições escritas, do final do século XVIII e do século XIX eram consideradas liberais, já que advinham de um ideal burguês, que buscou proteger direitos primordiais a esta classe e, dessa forma, não permitir que esses direitos fossem destruídos ou contestados, tendo, assim, grande força (BONAVIDES, 2017). Com isto, a burguesia pretendia limitar o poder político dos governantes, tendo, estas constituições, o objetivo principal de organizar politicamente o Estado, para obtenção dessas limitações. Mas ainda, havia outros sentidos em que eram analisadas as Constituições. Segundo Carl Schmitt (apud BONAVIDES, 2017, p. 82), as constituições deveriam ser entendidas por meio de um sentido político, ao dizer que: Considerando-as como decisão política fundamental decisão concreta de conjunto sobre o modo e forma de existência da unidade política, fazendo distinção entre constituição e leis constitucionais; aquela só se refere à decisão política fundamental (estrutura e órgãos do Estado, direitos individuais, vida democrática etc.); as leis constitucionais são os demais dispositivos inscritos no texto do documento constitucional, que não contenham matéria de decisão política fundamental Kelsen (apud BONAVIDES, 2017, p. 33 e 35 ) as via apenas no sentido jurídico, o que quer dizer, que para o autor da Teoria Pura do Direito, a constituição é "considerada norma pura, puro dever-ser, sem qualquer pretensão a fundamentação sociológica, política ou filosófica", podendo ser analisada tanto partindo do sentido lógico-jurídico (norma fundamental hipotética, a qual dá fundamento lógico transcendental da validade da constituição jurídico-positiva) como deste sentido, ou seja, jurídico-positivo (o qual equivale à norma positiva suprema, conjunto de normas que regula a criação de outras normas, lei nacional no seu mais alto grau). Contudo, para o Prof. José Afonso da Silva (2017, p. 45-47) "essas concepções pecam pela unilateralidade"1, já que um conceito mais completo de constituição não deve ser fracionado, mas sim basear-se em uma realidade social, o que lhe dá o conteúdo fático e o sentido axiológico, os quais deverão ser retratados por meio do complexo de normas jurídicas que estejam, antes de tudo, em concordância com a vontade popular, regulando, assim, a forma como governantes e governados deverão agir, com o estabelecimento dos direitos e dos deveres de cada um. O constitucionalista português, José Joaquim Gomes Canotilho (2003, p. 50) afirma que "por constituição moderna entende-se a ordenação sistemática e racional da comunidade política através de um documento escrito no qual se declaram as liberdades e os direitos e se fixam os limites do poder politico". José Afonso da Silva (2017. p. 38) ensina que. 1 Expõe o autor que "a constituição é algo que tem, como forma, um complexo de normas (escritas ou costumeiras), como conteúdo, a conduta humana motivada pelas relações sociais (econômicas, políticas, religiosas etc.); como fim, a realização dos valores que apontam para o existir da comunidade; e, finalmente, como causa criadora e recriadora, o poder que emana do povo. Não pode ser compreendida e interpretada, se não se tiver em mente essa estrutura, considerada com conexão de sentido, como é tudo aquilo que integra um conjunto de valores (SILVA, 2017, p. ). A constituição do Estado, considerada sua lei fundamental seria, então, a organização dos seus elementos essenciais um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras que regula a forma do Estado, a forma de s e seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias, Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado, O Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2012) assevera que por Constituição, Em sentido jurídico, entende-se o conjunto de regras concernentes à forma do Estado, à forma do governo, ao modo de aquisição e exercício do poder, ao estabelecimento de seus órgãos, aos limites de sua ação. Dessa forma, pode-se perceber que alguns itens devem constar em uma Constituição para que essa seja assim entendida, ou seja, deve-se definir no seu texto, além de direitos e garantias, a forma de Estado e de governo, da aquisição e do exercício do poder, os órgãos que irão exercer esse governo, bem como a sua estruturação e o limite de ação desses órgãos. 1.2 Classificação Quanto à classificação das constituições, a doutrina adota alguns critérios para fazê-lo, dividindo-a quanto ao conteúdo, à forma, ao modo de elaboração, à origem, à estabilidade e, ainda, quanto à extensão e finalidade. a) Quanto ao conteúdo: elas se dividem em materiais (ou substanciais) e formais. MATERIAL OU SUBSTANCIAL - são as normas pertinentes à organização do poder, à distribuição da competência, ao exercício da autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana, tanto individuais como sociais" (BONAVIDES, 2017, p. 81). Para José Afonso da Silva (2017, p. 48/55), a constituição material pode ser concebida em um sentido amplo, que se identifica com a organização total do Estado, com seu regime político, bem como em um sentido estrito, em que se designa as normas constitucionais escritas ou costumeiras, inseridas ou não em um documento escrito, as quais regulam a estrutura do Estado, sua organização e os direitos fundamentais, sendo, este caso, em que a constituição refere-se essencialmente à matéria constitucional, excluindo-se todas as outras matérias que, apesar de descritas no corpo do texto, não são verdadeiramente constitucionais. Em resumo, isso representa que o aspecto material da constituição diz respeito ao seu conteúdo mais importante, que seriam as "únicas merecedoras" (BONAVIDES, 2017) de estarem rigorosamente descritas como matéria constitucional, posto que cuidam das decisões políticas fundamentais. FORMAL - há normas constitucionais que, apesar de estarem inseridas no corpo do texto, não se referem aos elementos básicos ou institucionais da organização política, cuidando, estas normas, apenas de outros aspectos, que, por estarem insertos na Carta Magna, passam "a gozar da garantia e do valor superior que lhe confere o texto constitucional" (BONAVIDES, 2017, p. 82). Embora não sejam materialmente constitucionais, somente poderão suprimir -se ou alterar-se mediante um processo diferente, mais solene e complicado (maioria qualificada, votação repetida em legislaturas sucessivas, ratificação pelos Estados-membros em algumas organizações federativas, conforme a prescrição constitucional etc.) (BONAVIDES, 2017, p. 82). Segundo José Afonso da Silva (2017, p. 41), "a constituição formal é o peculiar modo de existir do Estado" que se apresenta em um texto escrito estabelecido pelo poder constituinte e somente modificável por processos e formalidades especiais nela própria estabelecidos". Em resumo, o modo solene como ela é estabelecida e essa forma de modificar a Constituição de maneira diferenciada das leis infraconstitucionais (as quais se fazem de forma simplificada, como, por exemplo, a maioria simples) é que caracteriza a constituição em relação ao seu aspecto formal. b) Quanto à forma: elas se dividem em escritas e não-escritas (costumeiras ou consuetudinárias). ESCRITAS - são aquelas Constituições em que as regras apresentam-se codificadas em um único documento, sendo este a lei fundamental do Estado. As normas, dessa forma, integram um único texto, elaborado por um órgão constituinte, como é o caso da CF de 1988. Estas constituições tornaram-se possíveis, por um lado, em razão das lutas políticas ingleses que redundaram no triunfo parlamentar, juntamente com as ideias que, no século XVIII, influíram nas Revoluções Americana e Francesa. Por outro, em razão do contrato social sugerido de Rousseau, gerou-se o Instrument of Government da Inglaterra, promulgado em 16/12/1633, sendo a primeira constituição escrita criada, com bases maismodernas, sendo considerada o protótipo da Constituição dos Estados Unidos (BONAVIDES, 2017, p. 51/56). Em tempos modernos, tem sido sustentado entre os constitucionalistas uma certa primazia destas em relação às constituições não-escritas ou costumeiras, alegando que aquelas seriam superiores quando comparadas a estas, posto que educam politicamente governantes e governados e renovam a imagem do contrato social: oferecendo, ainda, maior soma de garantias e segurança em face de tratarem de forma concreta e objetiva dos assuntos necessários ao bom andamento da sociedade (BONAVIDES, 2017). Acerca do assunto, José Afonso da Silva (2017, p. 42) ensina que considera-se escrita a constituição, quando codificada e sistematizada num texto único, elaborado reflexivamente e de um jato por um órgão constituinte, encerrando todas as normas tidas como fundamentais sobre a estrutura do. Estado, a organização dos poderes constituídos, seu modo de exercício e limites de atuação, os direitos fundamentais (políticos, individuais, coletivos, económicos e sociais). Em resumo, a Constituição escrita é aquela posta em um documento solene, re duzida à forma escrita, elaborada pelo órgão constituinte, resultante de um processo de reflexão e materializada num só ato (BONAVIDES, 2017). NÃO-ESCRITA, COSTUMEIRA OU CONSUETUDINÁRIA - é baseada em leis esparsas, nos costumes e na jurisprudência. Elas foram as únicas que existiram antes do final do século XVIII, e se fundamentam em costumes, tratados internacionais e textos constitucionais esparsos, decorrendo estas normas da realidade concreta da sociedade, ou seja, dos seus hábitos que, de tanto se generalizarem, se converteram em costumes. Apresenta, José Afonso da Silva (2017, p. 42), como não escrita, "a constituição cujas normas não constam de um documento único e solene, mas se baseie principalmente nos costumes, na jurisprudência e em convenções e em textos constitucionais esparsos". Afirma Paulo Bonavides (2017, p. 85) que na época contemporânea inexistem Constituições totalmente costumeiras, semelhantes àquela que teve a França no antigo regime, antes da Revolução Francesa de 1789". Assevera que ainda existem constituições parcialmente costumeiras, como é o caso da Constituição Inglesa, que abrange o direito estatutário, casuístico ou jurisprudencial, o costume e as convenções constitucionais. Por outro lado, há também o caso da Constituição dos Estados Unidos que, apesar de escrita, pode ser complementada em sua aplicação, pelo costume, que é utilizado "como fator auxiliar e subsidiário importantíssimo para complementar e corrigir o texto constitucio nal lacunoso ou suprir, pela interpretação, partes obscuras e controversas da Constituição (BONAVIDES, 2017, p. 87). c) Quanto ao modo de Elaboração: divide-se em dogmática (sistemática) e histórica. DOGMÁTICA OU SISTEMÁTICA- é aquela "sempre escrita", que é "elaborada por um órgão constituinte, e sistematiza os dogmas ou ideias fundamentais da teoria política e do Direito dominantes no momento" (SILVA, 2017, p. 42). HISTÓRICA - se mostra como síntese da história e costumes de um povo, sendo que, seus conceitos são aqueles que se cristalizam como normas fundamentais da organização de determinado Estado (SILVA, 2017, p. 42). d) Quanto à origem: podem ser promulgadas (democráticas/populares) ou outorgadas. PROMULGADAS, DEMOCRÁTICAS OU POPULARES - derivam de uma Assem Bléia Nacional Constituinte eleita com essa finalidade (Ex.: Constituições de 1891, 1934, 1946 e 1988). Estas constituições, então, decorrem de um órgão constituinte legitimado pelo povo, eleito pelo povo, posto que este órgão é composto de representantes do povo eleitos para esse fim (SILVA, 2017). Segundo Paulo Bonavides (2017, p. 91), "as Constituições populares ou democráticas são aquelas que exprimem em toda extensão o princípio político e jurídico de que todo governo deve apoiar-se no consentimento dos governados e traduzir a vontade soberana do povo. OUTORGADAS são elaboradas sem a participação do povo, imposta a este por um Rei, Imperador, Presidente ou Ditador (Ex.: Constituições de 1824, 1937, 1967 e 1969). Ela é uma constituição elaborada por um órgão constituinte que não foi eleito pelo povo, mas sim Foi instituído por um governante e age de acordo com o que este determina (SILVA, 2020). Paulo Bonavides (2017, p. 91) ensina acerca das constituições outorgadas que "do ponto de vista jurídico, a Constituição outorgada é ato unilateral de uma vontade política soberana - a do outorgante, por outro lado, do ponto de vista político, se mostra como uma "inelutável concessão feita por aquela vontade ao poder popular ascendente, sendo pois o produto de duas forças antagônicas que se medem em termos políticos de conservação ou tomada de poder". e) Quanto a Estabilidade: divide-se em rígidas, flexíveis e semirrígidas. RÍGIDA - é a constituição "alterável mediante processos, solenidades e exigências formais e especiais, diferentes e mais difíceis que os de formação das leis ordinárias ou complementares" (SILVA, 2017, p. 43). São, então, aquelas que somente poderão ser modificadas com adoção de um procedimento especial previsto no próprio texto. Ex.: Constituição Federal de 1988, art. 60, o qual prevê as formas de modificação - com exceção da CF/1824, todas as nossas constituições foram rígidas. Posto isto, vê-se que uma constituição será rígida quando for alterável apenas com obediência de certas formalidades e dentro de determinados limites. FLEXÍVEL - são as constituições que não exigem nenhum requisito especial de reforma. Podem, por conseguinte, ser emendadas ou revistas pelo mesmo processo que se emprega para fazer ou revogar a lei ordinária" (BONAVIDES, 2017, p. 84). Dessa forma, este tipo de constituição pode ser modificado segundo o processo de elaboração das leis infraconstitucionais ordinárias. Se aplica mais às constituições cos tuneiras, sendo seu exemplo típico a da Constituição inglesa. Contudo, houve casos de constituições escritas flexíveis, como a Constituição italiana de 1848. Por isso, Paulo Bonavides (2017, p. 84) afirma que é errado pensar que "toda A Constituição costumeira é flexível e toda Constituição escrita é rígida". SEMI RÍGIDA- é a constituição que contém uma parte rígida e outra flexível, como fora a Constituição do Império do Brasil, à vista de seu art. 178. Posto isto, pode-se considerar como semirrígida ou semiflexível as constituições que admitem a alteração de uma parte por um processo legislativo mais solene e difícil, enquanto, em outra parte, permite um processo legislativo mais simples, como por simples lei ordinária (SILVA, 2017). Em regra, essa distinção tem relação com as normas materialmente constitucionais e com as normas formalmente constitucionais, respectivamente. Sendo assim, há normas que somente podem ser modificadas com a adoção de um procedimento especial e outras que podem ser modificadas segundo o procedimento de elaboração das leis ordinárias. f) Quanto à extensão e finalidade: elas são analíticas (dirigentes) e sintéticas. ANALÍTICAS OU DIRIGENTES neste modelo constitucional se regulamentam os assuntos relevantes à formação, destinação e funcionamento do Estado (Ex.: CF/88) (SILVA, 2017). Paulo Bonavides (2017, p. 83-85) chama-as de prolixas (longas, amplas, extensas, desenvolvidas ou largas), dizendo que são assim chamadas porque estas "trazem matéria por sua natureza alheia ao direito constitucional propriamente dito", tratando com minúcias a regulamentação, a qual melhor estaria posicionada se estivesse em leis complementares. São analiticas, então, aquelas que incluem, no texto constitucional, questões que poderiam ser tratadas pela legislação infraconstitucional, contemplando, ainda, normas voltadas para o futuro, como as normas programáticas e as ações afirmativas. SINTÉTICAS são mais reduzidas, trazendo somente os princípios e as normas gerais de regência do Estado como a Constituição Norte-americana. Paulo Bonavides (2017, p. 92) as chama de concisas(breves, sumárias, sucintas e básicas), e são assim "quando abrange apenas princípios gerais ou enuncia regras básicas de organização e fun cionamento do sistema jurídico estatal, deixando a parte de pormenorização à legislação complementar ou orgânica". Para o autor, elas resultam numa "maior estabilidade do arcabouço constitucional, bem como numa flexibilidade que permite adaptar a Constituição a situações novas e imprevistas do desenvolvimento institucional de um povo" (BONAVIDES, 2017, p. 92).. Posto isto, têm-se que as constituições sintéticas, reduzem-se ao núcleo essencial da divisão de poderes e do sistema de garantias individuais, sendo a Constituição dos Estados Unidos o maior exemplo de constituição concisa, tendo outros, ainda, nas Constituições da França de 1946, do Chile de 1833 e 1925 e a da República Dominicana de 1947. 1.3 Teoria Geral do Estado Ela corresponde a parte geral do Direito Constitucional, sendo, segundo Sahid Maluf (2009, p. 11), uma "ciência cultural, de cunho eminentemente sociológico, com a finalidade precípua de investigar a específica realidade da vida estatal, nas suas mais amplas conexões. A partir da Teoria Geral do Estado estudamos alguns conceitos inerentes à figura estatal, começando pela definição de NAÇÃO, que é uma realidade distinta de Estado, posto que este é uma realidade jurídica, objetiva enquanto aquela (nação) é uma realidade sociológica, subjetiva (MALUF, 2009). Para autor citado anteriormente, "Nação é uma entidade de direito natural e histórico que pode ser conceituada como "um conjunto homogêneo de pessoas ligadas entre si por vínculos permanentes de sangue, idioma, religião, cultura e ideais, sendo, por isso mesmo, "anterior ao Estado" já que se compõe como a "substância humana do Estado" (MALUF, 2009, p. 15). Nesse sentido, afirma-se doutrina que a nação pode perfeitamente existir sem o Estado ou reunidas em um só, como, por exemplo, a Escócia, a Irlanda do Norte, a Inglaterra e o País de Gales que, mesmo sendo nações diversas, se reuniram num só Estado que é a Grã-Bretanha (MALUF, 2009). Para Mancini (apud MALUF, 2009, p. 16), alguns fatores formam a ideia de nação: "a) naturais (territórios, unidade étnica e idioma comum); b) históricos (tradições, costumes, religião e leis); c) psicológicos (aspirações comuns, consciência nacional etc.)". Outro conceito importante de se analisar é o de POPULAÇÃO, sendo esta expressão aquela que determina o número de indivíduos que vivem dentro das fronteiras de um UNIDADE II Direito Constitucional determinado país, seguindo as mesmas leis, podendo estes serem nacionais, naturalizados ou estrangeiros residentes naquele país. Tem-se aqui um critério quantitativo e demográfico para dizer o número de habitantes de uma determinada localidade (DALLARI, 2015). Temos ainda o conceito de POVO, que em seu sentido genérico equivale a população, mais especificamente condiz com nação, sendo sinônimo desta, dizer povo brasileiro (DALLARI, 2015). 33 E, por fim, temos o conceito de RAÇA que é apresentada como uma unidade bioantropológica, como se pode perceber do fato de que em uma nação podemos ter várias raças, como no Brasil tem, em sua formação, três grupos étnicos predominantes, lusitano, africano e amerindio. Destaca-se ainda que este conceito pode ser analisado de outra perspectiva, já que de um só tronco racial pode surgir várias nações, como no Continente Americano (MALUF, 2009). Por outro lado, diferentemente da ideia de nação, temos o ESTADO, que, como foi passado no início, tem uma conotação mais objetiva e jurídica. Quanto a este a doutrina assevera que é difícil estabelecer um único conceito pois este tem muitas vertentes. No plano político, o Estado pode ser visto, principalmente, como um fato social, o que não retira de seu contexto o fato de ser tratado por alguns como "um organismo natural ou produto da evolução histórica e, por outros, como "entidade artificial, resultante da vontade coletiva manifestada em um dado momento (MALUF, 2009, p. 20). Há ainda, várias outras concepções para compreender o Estado, sendo uma das mais aceitas entre os doutrinadores brasileiros a de Clóvis Beviláqua, que diz que "o Estado é um agrupamento humano, estabelecido em determinado território e submetido a um poder soberano que lhe dá unidade orgânica" (apud MALUF, 2009, p. 21). Seus elementos constitutivos são: população, território e governo, Já vimos anteriormente o conceito de população, então passaremos direto ao de TERRITÓRIO. Esta é a base física, o âmbito geográfico da nação, onde ocorre a validade da sua norma jurídica, segundo Kelsen (apud MALUF. 2009, p. 21), e é elemento fundamental na formação do Estado, mas não da nação. Esta pode existir sem o território (ex.: nação judaica que por muitos anos existiu sem território desde a expulsão de Jerusalém, sendo recente a criação do Estado de Israel), mas o Estado não, principalmente na modernidade. Para alguns autores, o território de um estado deve ainda conter o espaço aéreo e marítimo, além de compreender que há territórios fora do espaço designado para o Estado, como as embaixadas, os navios mercantes em alto mar, os navios de guerra onde quer que se encontrem. No Brasil o mar territorial (espaço de mar que dá continuidade ao território ligado ao país) é de 200 milhas marítimas e o espaço aéreo, segundo dados do Departamento de Controle do Espaço Aéreo - DECEA (BRASIL. 2016), adentra parte do Oceano Atlântico de tal forma que compõe uma área de 22 milhões de km2, sendo protegidos por tratados internacionais. Por fim, ligado ao Estado, temos o conceito de GOVERNO, sendo este, segundo Maluf (2009, p. 27), "uma delegação de soberania nacional". Por isso, mesmo positivamente, é o conjunto das funções necessárias à manutenção da ordem jurídica e da administração pública. Sendo assim, não há Estado sem soberania, sendo esta a ideia de que não há qualquer autoridade que se sobreponha a ela, não sendo limitada por nenhum outro poder. Este poder é investido no Brasil, ao órgão federal (Estado Federal) que exerce este poder nos limites de seu território, e tem como seu maior representante o chefe do poder executivo ou presidente da república (MALUF, 2009). 2. O DIREITO CONSTITUCIONAL 2.1 O poder Constituinte e a Constituição Federal de 1988 De forma simplista, o poder constituinte se mostra por meio da manifestação soberana da vontade política de um povo juridicamente organizado que cria leis para a regência do Estado (SILVA, 2017), Desde muito tempo na história, foi percebido pelos estudiosos que para se organi Para criar um Estado, se fazia necessário estabelecer leis que lhe dessem direcionamento. Aristóteles já falava sobre isso em seus estudos; na Idade Média, os Reis dispu Tinham leis superiores, que eram feitas pelos legisladores reais a seu comando, com as quais o Rei se valia para governar. Contudo, a ideia de poder constituinte, enquanto teoria, somente passou a existir no final do século XVIII, à época da Revolução Francesa, sendo ligada à de constituição escrita (SILVA, 2017). Esse poder era um poder novo, contrário à ideia decadente do absolutismo monár quico, mas baseado na razão humana do que no poder divino do Rei. Cresce mais o conceito de poder soberano enquanto nação, o qual legitima uma nova titularidade desse poder e confere "expressão jurídica aos conceitos de soberania nacional e soberania popular" (BONAVIDES, 2017, p. 142). Dessa forma, os estudos pertinentes a essa matéria, poder constituinte, buscam Explicar como na Constituição, criada pelo poder constituinte, se produz uma nova fixação jurídica de uma ordem política e, simultaneamente, se compreende a ordem política como uma norma jurídica (BONAVIDES, 2017). E esta ideia não pode ser estudada sem que seja citada a grande contribuição dada pelo abade Emmanuel Sieyès, o qual, no panfleto "Que é o Terceiro Estado?", identificou a burguesia (entendida como nação) como um terceiro estado que trabalhava duro para a subsistência da nação, enquantoos outros dois, o clero e a nobreza, eram privilegiados, sem méritos e totalmente dispensáveis ao crescimento do Estado como um todo (BONAVI DE, 2017). Por isso esse terceiro estado deveria ter uma representatividade no governo do Estado que fosse igual ao do clero e da nobreza, com voto de igual peso, o que estabeleceria uma nova ordem, Ocorre que para que pudesse se estabelecer a organização desse novo Estado, fazia-se necessário criar um corpo de regras escritas que fossem superiores aos poderes que elas instituem, que demonstraria claramente a distinção entre poder constituinte, criador dessas regras, e poder constituído, o qual obedecerá às regras estabelecidas pelo primeiro, devendo estar em concordância com aquelas (BONAVIDES, 2017). Segundo Paulo Bonavides (2017), para o abade Sieyès, o poder constituinte era, Em primeiro lugar, um poder inicial, criador de uma nova ordem jurídica que não decorre de nenhuma outra, sendo o criador do ordenamento jurídico do Estado. Em segundo lugar, era autônomo (soberano), cabendo ao titular desse poder deter minar "se", "como" e "quando" se deve dar uma constituição ao Estado. E, em terceiro, era ilimitado, o que implica em dizer que não está sujeito a limitações formais ou substanciais, sendo tudo possível. Por isso mesmo, segundo o abade, o titular desse poder era a nação, já que a ideia de titularidade por ele expressada liga-se a de soberania do Estado. Ela vem, então, ligada à ideia de constituição rígida, para a qual faz-se necessário seguir um procedimento rigoroso previsto no próprio texto constitucional, ou seja, para haver a mudança ou a correção de normas, deverá ser seguido o mesmo procedimento pré-estabelecido (SILVA, 2017). O poder constituinte é um poder de direito ilimitado em relação ao direito positivo anterior, visto que é criador de nova norma, tendo seus limites estabelecidos apenas no direito natural, na norma pressuposta a todas as outras e existente antes mesmo de existir a nação (SILVA, 2017). E essa é a ideia que alicerça o Direito Constitucional moderno, sendo toda essa construção um dos fenômenos de maior relevância para o constitucionalismo (SILVA, 2017). Contudo, em relação à titularidade do poder constituinte, tem-se que esta não é da Nação, como dizia Sieyès, sendo predominante a ideia de que a titularidade desse poder pertence. ao povo, tendo em vista que o Estado decorre da soberania popular, sendo este conceito mais abrangente do que o conceito de Nação aplicado por aquele (BONAVIDES. 2017). Importa dizer que a Constituição Federal de 1988 foi criada a partir de uma Assembleia Nacional Constituinte, em que, teoricamente, se encontrava representado todo o povo brasileiro, sendo, em vista disto, assegurada necessária a confecção de uma Constituição democrática. Por isso mesmo, esta contém regras que asseguram direitos fundamentais, econômicos, sociais e culturais, de acordo com um constitucionalismo social. E ainda, apresenta regras acerca da organização política do Estado que garantem a forma federativa, e repartição das competências e a divisão dos poderes de acordo com os fundamentos de base descritos no seu texto. (2003, p. 69) ensina que um conceito ideal de Constituição Canotilho Identifica-se fundamentalmente com os postulados políticos-liberais, considerando-os como elementos materiais caracterizadores e distintivos os seguintes: (a) a constituição deve consagrar um sistema de garantias da liberdade (está essencialmente concebida no sentido do reconhecimento de direitos individuais e da participação dos cidadãos nos actos do poder legislativo através do parlamento): (b) a constituição contém o princípio da divisão de poderes, no sentido de garantia orgânica contra os abusos dos poderes estaduais: (c) a constituição deve ser escrita (documento escrito). E continua ao dizer que a vontade constituinte deve corresponder ao querer do povo, que se expressa por meio de seus representantes nesse poder constituinte de criar o Estado por meio da nova Constituição. E esse povo, segundo Canotilho (2003), è compreendido por uma pluralidade de forças culturais, sociais e políticas, tais como partidos, grupos, igrejas, associações, personalidades, que influenciam a formação das opiniões e das correntes políticas nos momentos da realização dos procedimentos constituintes. Isto posto, pode-se afirmar que a Constituição deverá expressar a vontade do povo em seu texto, pelo menos em tese, já que se trata da norma mais importante de um Estado Soberano, 2.2 Fundamentos da República Federativa do Brasil A Constituição é a consagração, no plano do direito positivo, de uma ideologia, aquela socialmente aceita, dando legitimidade ao próprio ordenamento. Em um Estado UNIDADE II Direito Constitucional 38 democrático de direito, é a sede normativa dos valores dominantes num dado contexto histórico-cultural, que nela recebem sua positivação (BONAVIDES, 2017). O Direito, enquanto mecanismo que se ordena para a realização de fins, é teleológico, sendo os valores também dotados desse significado, posto que apontam para um determinado fim (SILVA, 2017). E foi dessa forma que os valores adentraram o campo do Direito positivo, já no preámbulo da CF/88, que ressalta como valores supremos da sociedade brasileira o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça. Pode-se, dizer, portanto, que a Constituição é a sede normativa dos valores dominantes num dado contexto cultural, é uma norma portadora de determinados valores materiais que formam justamente a base do ordenamento; valores estes que se encontram no interior do Direito, incorporado aos princípios e, por isso mesmo, dão sentido a toda interpretação e aplicação que se faça das leis dentro desse ordenamento (SILVA, 2017). Valores estes que dão base e fundamento ao texto e são descritos por meios de princípios. Princípios, no sentido jurídico, são proposições normativas básicas, gerais ou setoriais, positivadas ou não, que, revelando os valores fundamentais do sistema jurídico, orientam e condicionam a aplicação do direito. Conforme ensina Celso Antônio Bandeira de Mello (apud SILVA, 2017, p. 107), em lição lapidar Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, ao ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustém e alui toda a estrutura nelas esforçada. Neste contexto, o Direito Constitucional contemporâneo acentua a força normativa dos princípios constitucionais, suplantando a doutrina positivista das normas programáticas. De acordo com a lição de Paulo Bonavides (2017), é na idade do pós-positivismo que tanto a doutrina do Direito Natural como a do velho positivismo ortodoxo vêm abaixo. em decorrência de reação intelectual comandada por Ronald Dworkin, jurista de Harvard, Os princípios, então, passam a ser tratados como direito, Destarte, é possível afirmar, juntamente com Paulo Bonavides (2017), que a teoria dos princípios, depois de acalmados os debates acerca da normatividade que lhes inerente, converteu-se no coração das Constituições, Sendo assim, são base e fundamento do texto, sendo as estradas por onde todo operador do direito terá que passar para compreender tudo que envolve nosso sistema legal. 3. A FEDERAÇÃO NO DIREITO POSITIVO BRASILEIRO 3.1 Origem e Importância do Princípio Federativo A ideia de Estado nasceu da necessidade humana de uma entidade com força supe para fazer as regras de conduta, de forma a permitir a vida em sociedade (SILVA, 2017). O Estado federal é um estado soberano constituído por uma variedade de estadosautônomos, os quais são coletividades públicas dotadas de autonomia político-constitucional ou federativa. Ou seja, o poder político fraciona-se no espaço territorial, gerando várias entidades governamentais autônomas, umas em relação às outras (SILVA, 2017). Na Antiguidade, viu-se que o Estado romano tinha diversos Estados-membros e mantinha a sua união pela força, tomando novos locais por meio de lutas, e anexando-os ao Estado romano. Com isso, havia despesas enormes e a perdas de muitos homens, então, por essa razão, o Estado romano começou a realizar alianças com outros Estados, os quais, com o receio de serem tomados por aquele, acabavam por se aliar ao primeiro, tornando-se um Estado-membro daquele. Contudo a origem da Federação como conhecemos deu-se bem depois, com o nascimento dos Estados Unidos da América (BONAVIDES, 2017). Vê-se, portanto, que a forma de Estado, que é denominada de federação ou Estado federal e que tem origem no federalismo como expressão do Direito Constitucional - nasceu com a Constituição norte-americana de 1787; após as treze colônias inglesas se libertarem da dominação da Inglaterra e constituírem vários Estados soberanos, com ordens UNIDADE II Direito Constitucional jurídicas independentes que, entre elas, firmaram um tratado internacional que deu origem a Confederação dos Estados Americanos (SILVA, 2017). Contudo, em face das dificuldades de se cumprir o tratado assinado, criou-se a Teoria dos Estados federados, exposta pelos políticos e juristas James Madison, Alexander Hamilton e John Jay, nos ensaios Federalist, de 1787 e 1788. Eles vieram em defesa do estabelecimento de um novo pacto entre aqueles Estados, constituindo, entre eles, uma união duradoura, por meio da criação de uma constituição (SILVA, 2017). Surge, assim, a Constituição norte-americana de 1787. Passa-se, portanto, a en tender como federal àqueles Estados onde havia repartição das competências entre os entor distintos ou seja a loiše o Estados membroS QUE inicia ressaltando o fato entes distintos, ou seja, a União, os Estados-membros ou as províncias, ressaltando o fato de que estas mantinham representantes no Senado, Vê-se, assim, que a origem do Estado federal é diretamente ligada ao seu cresci mento e a necessidade de organização desse Estado, que se deu por meio da descentralização do poder do Estado soberano para os Estados-membros, que se submetem aquele, com um fim único de satisfazer o interesse público, por meio da capacitação legislativa destes Estados-membros para legislar naquilo que lhe compete de acordo com o texto constitucional federal (SILVA, 2017). Por isso mesmo pode-se dizer que entre o primeiro, Estado soberano, e o segundo, Estados-membros, há um vínculo, sendo estes sempre ligados àqueles. Chama-se isso de princípio da indissolubilidade do vínculo federativo, o qual, na CF/88, vem descrito no art. 1 e tem duas finalidades básicas, ou seja, a unidade nacional e a necessidade descentralizadora (SILVA, 2017). Em face desse princípio, mesmo os Estados membros-que têm como características o fato de serem autônomos, possuidores da tríplice capacidade de auto-organização e normatização próprias, de autogoverno e autoadministração - são, ainda, ligados ao Estado soberano, sendo inadmissível qualquer pretensão de separação deste Estado-membro (SILVA, 2017). No caso do Brasil, além dos Estados-membros, também é impossível separar-se do Estado soberano, o Distrito Federal e os Municípios, inexistindo, no nosso ordenamento jurídico, o denominado direito de secessão (SILVA, 2017). Posto isto, percebe-se a importância do princípio federativo, no sentido de que este, mesmo em face da descentralização ou da retirada de competências do Estado soberano para os Estados-membros, os quais passam a ter capacidade legislativa para cuidar dos assuntos de seus interesses, não permite que estes deixem de integrar o Estado soberano, formando com ele uma Federação; em que este, apesar de ter competência sobre todo território nacional, tem apenas uma parcela mínima de poder, indispensável à garantia da unidade política e econômica, cabendo aos Estados-membros os demais poderes (SILVA, 2017). Não é admitido, portanto, que o princípio federativo seja violado, e isso é assim a fim de que se dê continuidade à Federação. 3.2 Organização Política Administrativa As características fundamentais do Estado federal são a descentralização política por previsão constitucional, a participação das unidades federadas nas decisões gerais e auto-organização das unidades federadas por meio de constituições próprias. a) Descentralização política por previsão constitucional: o Estado federal é um estado politicamente descentralizado. Todos os estados existentes ou que já existiram já tiveram uma descentralização maior ou menor. A descentralização é a passagem de certas competências do centro para a periferia e competências são modalidades de poder de que se vale um órgão ou entidade estatal para realizar ou cumprir suas funções (SILVA, 2017). Com a descentralização administrativa dentro do Estado soberano, houve a passa de certas competências de natureza administrativa para a periferia, ou seja, para os Estados membros. Contudo, cabe acrescentar que em todos os lados do território nacional existem entes que fazem a descentralização administrativa executando normas jurídicas (SILVA, 2017). O Estado federal também é politicamente descentralizado, isto é, quando os entes descentralizados dispõem do poder de editar normas jurídicas. As entidades federativas são a União, os Estados membros, o Distrito Federal e os Municípios (art. 18), sendo todos autônomos. Portanto, descentralização política consiste na capacidade de editar normas jurídicas. No Estado federal, as competências dos entes politicamente descentralizados encontram-se previstas na constituição. Para termos um Estado federal não basta ter a descentralização política. É preciso que o legislador não possa modificar o dispositivo que contém o princípio federativo (art. 60, par. 4. I, CF). Não poderá haver proposta alguma de reforma constitucional que atente contra o princípio federativo ou de descentralização política. As entidades periféricas são também politicamente descentralizadas e previstas na Constituição e as normas que preveem essa descentralização são intangíveis, imutáveis, uma cláusula pétrea, limitação material explícita (SILVA, 2017). b) Participação das unidades federadas nas decisões gerais: as decisões gerais acopladas aos Estados federais são necessárias, pois elas decorrem das unidades federadas (art. 44, 45 e 46 da CF/88). As decisões defluem da vontade dessas unidades federadas. Os senadores são seus representantes. Nos Estados federais, os Estados -membros dispõem de autonomia em grau máximo, se evidenciando nas decisões gerais, onde estas ocorrem com a participação necessária dos Estados-membros ou unidades federadas. Um exemplo é o Presidente da República que é eleito pelo povo brasileiro, componente de qualquer unidade federada (BONAVIDES, 2017). c) Auto-organização das unidades federadas por meio de constituições próprias: o art. 25 da CF/88 diz que cada unidade federativa dispõe da prerrogativa de se organizarem ou se auto-organizarem através de constituições próprias. A Constituição estadual é a fonte de validade do ordenamento jurídico do estado-membro. As unidades federadas dispõem de poder para organizar suas leis e sua própria constituição. É fundamental que as unidades federadas disponham do poder de auto-organização. Por exemplo, o Paraná dispõe de um ordenamento jurídico (Constituição) próprio; um conjunto de leis que foram editadas e admitidas. O mesmo ocorre com os Municípios e com o Distrito Federal, os quais também têm um ordenamento jurídico local (BONAVIDES, 2017). 3.3 Origem e Evolução do Federalismo Brasileiro Segundo Paulo Bonavides (2017), o Brasil é um Estado federal desde 1889 e isso ocorreu com a Proclamação da República. Em 1870 saiu o manifesto do Partido Republicano. O federalismo