Prévia do material em texto
QUÍMICA GERAL AULA 1 Prof. Marcos Baroncini Proença 2 CONVERSA INICIAL Nos anos em que venho ensinando Química, cada vez mais fica evidenciada sua importância, pois, sem ela, não existiriam novos materiais, como o grafeno, responsável por um salto evolutivo na transmissão e processamento de dados, os motores elétricos e a combustão com materiais cada vez mais leves e eficientes, novos combustíveis para geração de energia, alimentos, medicamentos, produtos de higiene e limpeza, processos industriais, sustentabilidade... Enfim, tudo o que nos cerca no mundo moderno depende de uma boa dose de entendimento da química. Para compreendermos as propriedades dos materiais de engenharia e de substâncias com as quais entramos em contato no nosso dia a dia, é fundamental que conheçamos como são as estruturas atômicas dos elementos que se ligam para os constituírem. Assim, é necessário compreender a estrutura atômica e saber representá-la para que, em função disso, seja possível prever algumas propriedades periódicas que certamente serão incorporadas aos materiais ou às substâncias geradas por suas ligações. TEMA 1 – O ÁTOMO 1.1 Primeira teoria sobre o átomo Podemos atribuir a primeira teoria sobre o átomo ao filósofo Leucipo de Mileto, na Grécia do século V a.C., ou seja, mais de 2.400 anos atrás. Mas quem desenvolveu esta teoria dentro de observações materialistas e do raciocínio lógico foi seu discípulo Demócrito de Abdera, em suas obras literárias. Figura 1 – Dracma grego com a imagem de Demócrito Fonte: Andrey Lobachev/Shutterstock. 3 Como membro da filosofia materialista de Mileto, Demócrito acreditava que tudo é resultado das leis naturais e, portanto, pode ser explicado por interações entre elementos físicos, regidos por estas leis. Como efeito de sua posição materialista, e seguindo a teoria de Leucipo, Demócrito defendia, acerca da natureza das coisas, que na origem de todas as coisas estão os átomos e o vazio (tudo o mais não passa de suposição). Os mundos são ilimitados, engendrados e perecíveis. Nada nasce do nada e nada volta ao nada. Os átomos são ilimitados em grandeza e número, e são arrastados com o todo em um turbilhão. Assim nascem todos os compostos: o fogo, o ar, a água, a terra. Pois são conjuntos de átomos, incorruptíveis e fixos devido à sua firmeza. (Conforme texto doxográfico da obra de Diógenes Laércio do século II d.C., denominado Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres) Assim, tudo consistia em um número infinito de partículas extremamente pequenas, completamente cheias e sem espaço vazio; indivisíveis, indestrutíveis e eternas, que ele e seu mestre chamaram de “átomos” (do grego, a = negação/tomos = divisível, ou seja, não divisíveis). Esta posição foi revolucionária em sua época, entrando em confronto com o que pregava Parêmides de Eleia, da escola de Eleia, que era mais antiga, e cujos postulados eram defendidos por ilustres filósofos, como Aristóteles e Platão, com quem em diversas oportunidades Demócrito confrontou suas teorias. O ponto principal da discussão era a continuidade ou descontinuidade da matéria, ou seja, a presença ou não de vazios na natureza das coisas. Demócrito utilizou os sentidos humanos para oferecer analogias que nos possibilitassem ter uma imagem dos átomos. Ele empregou como exemplo a maçã, que pode ser cortada em minúsculos pedaços, o pote cerâmico, que se quebra em pequenos pedaços que podem ser transformados em pó por trituração, e a decomposição de frutas e animais. Seguindo também a escola pitagórica, distinguiu os átomos de acordo com formas, tamanhos e a maneira como se agrupam. Esta variedade de átomos seria importante para explicar a diferença de solidez dos objetos no mundo. Estes mesmos sentidos humanos eram usados por Platão e Aristóteles para postular que o vazio não existia, sendo todas as coisas totalmente preenchidas. Como nenhum dos lados possuía ferramentas para comprovar tacitamente suas teorias, a discussão permaneceu ao longo dos anos. Mais de um século se passou e Epicuro, ainda defendendo a teoria da existência do átomo e do vazio, acrescentou o conceito de que átomos de materiais diferentes teriam pesos diferentes, constituindo a primeira Teoria da Massa Atômica. Will Santos Will Santos Will Santos 4 Assim, entre os séculos V a.C. e II a.C., tivemos a primeira definição do que seria o átomo e a massa atômica. 1.2 Leis fundamentais da composição da matéria e a teoria atômica de Dalton Contribuições significativas para a compreensão de questões como a da estrutura da matéria só começaram a surgir a partir de 1620, quando Francis Bacon propôs uma metodologia de investigação dos problemas científicos baseada na observação e na coleta de dados. No final do século XVIII, pesquisadores conseguiram identificar algumas substâncias como elementos e outras como compostos. Começavam a ser estabelecidas, experimentalmente, várias leis relativas à composição da matéria e às reações químicas. A lei mais fundamental relacionada à composição da matéria é a Lei da Conservação das Massas, publicada pela primeira vez em 1760, em um ensaio do químico russo Mikhail Lomonosov. No entanto, foi o químico francês Antoine Laurent Lavoisier que tornou esta lei mundialmente conhecida (hoje, fala-se também “Lei de Lavoisier”). Por volta de 1774, usando balanças precisas como instrumentos de análise quantitativa, ele postulou que “A soma das massas das substâncias reagentes é igual à soma das massas dos produtos da reação”, como resultado da análise de diversos ensaios de combustão e calcinação de substâncias em recipientes fechados. Em 1797, o também químico e francês Joseph Louis Proust elaborou a Lei das Proporções Constantes, ou Lei das Proporções Definidas, conhecida também como Lei de Proust. Ele realizou experimentos com substâncias puras e concluiu que, independentemente do processo usado para obtê-las, a composição em massa dessas substâncias era constante. Assim, postulou que “as massas dos reagentes e produtos participantes de uma reação mantêm uma proporção constante”. Em 1803, o químico inglês John Dalton, tomando como base a Lei das Proporções Definidas de Proust, postulou a Lei das Proporções Múltiplas, uma das leis fundamentais da estequiometria. Esta lei estabelece que, sempre que elementos químicos se combinam para formar um ou mais de um composto, o fazem numa razão de pequenos números inteiros. Uma vez postuladas, houve a necessidade de explicar o porquê de as substâncias e materiais da natureza obedecerem estas leis. https://pt.wikipedia.org/wiki/1797 Will Santos 5 Novamente, o químico e cientista John Dalton, que desde 1793 lecionava matemática, física e química no New College, em Manchester, explicou o porquê de as substâncias e materiais da natureza obedecerem estas leis, elaborando e postulando a primeira teoria atômica moderna. Figura 2 – Sir John Dalton Fonte: Georgios Kollidas/Shutterstock. Dalton desenvolveu sua teoria atômica numa série de conferências que proferiu em Londres, nos anos de 1804 e 1805, quando expôs suas conclusões de ensaios com gases. Temos abaixo alguns postulados desta teoria: • Os elementos são constituídos por partículas extremamente pequenas e indivisíveis, chamadas de átomos. • Os átomos são maciços e apresentam forma esférica semelhante a uma bola de bilhar. • Os átomos são indivisíveis. • Os átomos são indestrutíveis. • Os átomos de um elemento têm sempre a mesma massa média e as mesmas propriedades. Os átomos de elementos diferentes teriam, por consequência, massas diferentes e diferentes propriedades. • Os compostos são formados pelas combinações de átomos e elementos diferentes. • Os átomos de dois ou mais elementos podem se combinar em mais de uma proporção, formando mais de um composto.A Teoria Atômica de Dalton explicava as leis fundamentais da composição da matéria da seguinte forma: a Lei da Conservação da Massa foi explicada, pois, se as mudanças químicas efetuam só um rearranjo dos átomos em várias Will Santos Will Santos Will Santos 6 combinações, é claro que a massa total do material envolvido na transformação química deve permanecer inalterada. A Lei da Composição Constante foi entendida nos seguintes termos: se os compostos são formados pela combinação de números definidos de átomos de elementos diferentes, a massa relativa de cada componente no composto deve ser a mesma. Assim, os elementos devem sempre guardar as mesmas proporções de massa em todas as substâncias puras do mesmo composto. A Lei da Proporções Múltiplas também foi esclarecida, pois, em vista dos átomos manterem sua massa característica, a combinação de um ou mais átomos de um elemento com outro leva a uma variação de peso numa relação múltipla simples. Como resultado da Teoria Atômica de Dalton, os cientistas ficaram estimulados para obter explicações de outros fatos observados. Logo descobriram que o peso de um átomo era uma de suas propriedades fundamentais. E, porque este peso fornecia o melhor meio quantitativo de distinguir os átomos dos diferentes elementos, concentraram-se na descoberta de valores exatos para os pesos relativos de vários átomos. Esses pesos vieram a ser conhecidos como “pesos equivalentes”. Trabalhando com esses pesos equivalentes dos elementos e, mais tarde, com o conhecimento do número de átomos envolvidos em cada combinação, os cientistas puderam deduzir pesos relativos para átomos de vários elementos. Esses pesos relativos são chamados de “pesos atômicos”, e são a base da construção da Tabela Periódica. TEMA 2 – ESTRUTURA ATÔMICA A Teoria Atômica de Dalton preconizava que os átomos dos elementos eram indivisíveis, e que não existiam partículas menores que os átomos. Novos fatos, com o aperfeiçoamento da tecnologia aplicada para este tipo de estudo, levaram a modificações e extensões desta teoria, orientando o estudo da estrutura atômica. 2.1 Descoberta dos componentes do átomo 2.1.1 Elétrons Will Santos Will Santos Will Santos 7 A descoberta e a comprovação da existência do elétron remetem à última metade do século XIX, quando Michael Faraday iniciou uma pesquisa sobre as descargas elétricas em gases submetidos a baixas pressões. A pesquisa alcançou maior desenvolvimento quando o alemão Heinrich Geissler conseguiu construir tubos de vidro selados que continham eletrodos de metal. Com esses tubos, o físico alemão Julius Plücker observou que, próximo ao catodo, formava- se uma luminescência de cor verde; o físico alemão Eugen Goldstein demonstrou que esta luminescência era provocada por raios que partiam do catodo e atravessavam o tubo em linha reta, chamando estes raios de “raios catódicos”. O grande passo para o uso destes conhecimentos na descoberta e comprovação da existência do elétron foi dado por volta de 1886, quando Sir William Crookes projetou um tubo em que esses raios poderiam ser melhor estudados. Construiu um tubo curvo, produziu vácuo em seu interior e aplicou altas voltagens em suas extremidades, onde se localizavam as placas metálicas. De seus experimentos, concluiu que os raios catódicos são formados de feixes de partículas com carga negativa, emitidas do catodo com velocidade muito alta. Figura 3 – Sir William Crookes Fonte: Domínio público. Figura 4 – Experimento de Crookes Will Santos 8 Fonte: Sekula, 2010. Em 1897, Sir Joseph John Thomson, professor de física de Cambridge, realizou novas experiências que o levaram a concluir que os raios catódicos eram formados por partículas que possuem carga negativa. Tempos mais tarde, Thomson provou que esses raios eram desviados mediante a aplicação de campo elétrico, chamando a isso de “elétrons”. Thomson procurou determinar algumas propriedades dos elétrons, como, por exemplo, o valor da carga e a massa destas partículas. Com os recursos da época, não foi possível obter experimentalmente o valor dessas grandezas. O que ele conseguiu foi medir a razão entre a carga e a massa do elétron. Figura 5 – Sir Joseph John Thomson Fonte: Domínio público. 2.1.2 Prótons O primeiro passo para a descoberta e a comprovação da existência dos prótons foi dado em 1886 quando Eugen Goldstein introduziu uma nova variante na experiência de Crookes e perfurou o cátodo da ampola. Ele percebeu um Will Santos Will Santos 9 feixe de raios de luz na direção oposta ao feixe dos raios catódicos. Se os raios catódicos eram negativos, este novo raio deveria ter um caráter positivo. Figura 6 – Eugen Goldstein Fonte: Domínio público. Em 1898, Wilhelm Wien refez os experimentos de Goldstein, mas com um diferencial: submeter o raio a um campo eletrostático muito mais intenso que o do experimento antecessor. Com seus experimentos, Wien concluiu que os raios eram compostos por Hidrogênio ionizado. Pouco antes, em 1896, a presença de partículas carregadas positivamente no átomo foi verificada por Antoine Henri Becquerel, cientista francês, nos primeiros estudos sobre radioatividade. Ele notou que certos elementos, notadamente o urânio, emitiam, espontaneamente, partículas carregadas positivamente, o que ele chamou de “partículas alfa”, e partículas carregadas negativamente, o que ele chamou de “partículas beta”. Figura 7 – Antoine Henri Becquerel Fonte: Domínio público. No entanto, somente 20 anos depois, em 1919, Ernest Rutherford publica seus estudos acerca da desintegração artificial e, consequentemente, a conclusão inequívoca acerca da descoberta do próton. O experimento de Rutherford será abordado com mais detalhes no Tema 3, quando falaremos da estrutura atômica. https://www.infoescola.com/elementos-quimicos/hidrogenio/ Will Santos Will Santos 10 Figura 8 – Ernest Rutherford Fonte: rook76/Shutterstock. 2.1.3 Nêutrons Quando Ernerst Rutherford publicou os resultados de seus experimentos e lançou sua teoria sobre a estrutura atômica, muitas controvérsias surgiram, sendo a principal referente ao postulado de que o átomo teria um núcleo composto de partículas positivas chamadas “prótons”. Como já era amplamente conhecido o conceito de atração e repulsão de cargas, concluiu-se que este fenômeno comprometeria a estabilidade do núcleo, porque os prótons, sendo partículas positivas, sofreriam uma força de repulsão entre si e o núcleo se desfaria. Diante disso, Rutherford admitiu que deveriam existir no núcleo outras partículas semelhantes aos prótons, porém, sem carga elétrica. Isto explicaria a estabilidade do núcleo, pois tais partículas neutras evitariam que houvesse proximidade suficiente entre os prótons para que a repulsão pudesse ameaçar a estabilidade do núcleo. Só em 1932 o físico inglês Sir James Chadwik conseguiu comprovar este conceito. Em seu experimento, Sir Chadwik bombardeou o elemento berílio com o feixe de partículas alfa, provocando a colisão destas partículas com o elemento. Utilizando o conceito da Conservação da Quantidade de Movimento, verificou em seus cálculos que o núcleo do berílio estava emitindo partículas sem carga elétrica e de massa praticamente igual à dos prótons, as quais chamou de nêutrons. Will Santos Will Santos 11 Figura 9 – Sir James Chadwick Fonte: Domínio público. 2.1.4 Léptons e Quarks Em 1964, o professor emérito de física teórica do Instituto de Tecnologia da Califórnia e um dos fundadores do Instituto Santa Fé, Murray Gell-Mann, propôs, independentemente e concomitantemente com o físico russo-americano George Zweig, que na época era pesquisador no Laboratório Nacional Los Alamos e no Massachusetts Institute of Technology – MIT, a existência dos quarks, que seriam asmenores partículas componentes na matéria. Na época, a proposição era ousada e pouca gente a levou a sério. A evidência experimental dos quarks foi considerada convincente apenas na década de 1970, a chamada década de ouro da física de partículas, através de reações de altas energias em aceleradores/colisores de partículas, como o acelerador Linear de Stanford. Hoje é aceito pela comunidade científica que os quarks, assim como os léptons, são as partículas verdadeiramente elementares da matéria, sendo o elétron um tipo de lépton e o próton, e o nêutron constituídos de quarks. Figura 10 – Murray Gell-Mann Fonte: CC BY 2.5. https://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%ADsica https://pt.wikipedia.org/wiki/Instituto_de_Tecnologia_da_Calif%C3%B3rnia https://pt.wikipedia.org/wiki/Instituto_de_Tecnologia_da_Calif%C3%B3rnia https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Instituto_Santa_F%C3%A9&action=edit&redlink=1 https://pt.wikipedia.org/wiki/George_Zweig https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Laborat%C3%B3rio_Nacional_Los_Alamos&action=edit&redlink=1 https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Laborat%C3%B3rio_Nacional_Los_Alamos&action=edit&redlink=1 http://web.mit.edu/ https://pt.wikipedia.org/wiki/MIT Will Santos 12 Figura 11 – George Zweig Fonte: CC BY-SA 4.0. 2.2 Estrutura atômica Desde que o homem conjecturou a existência do átomo, ele busca desvendar como é essa estrutura. Considerando o mesmo raciocínio materialista de Mileto e da escola pitagórica que Leucipo e Demócrito usaram para definir o átomo, a primeira proposta estrutural da era moderna deve ser atribuída a Sir John Dalton, o qual propôs que o átomo possuía uma forma esférica, tal qual uma bola de bilhar. Porém, ponderando que o átomo seja constituído de partículas menores, Sir Joseph John Thomson foi o primeiro a fazer uma proposta de estrutura atômica. Após seus experimentos, que resultaram na comprovação da existência do elétron, Sir Thomson propôs que o átomo era formado por elétrons imersos em uma base estrutural de carga positiva, tal qual ameixas em um pudim, motivo pelo qual este modelo também ficou conhecido como “Modelo do pudim de ameixas”. É interessante observar que Sir Thomson afirmou que a carga do átomo seria nula, pois a carga dos elétrons anularia a carga positiva. Este modelo, embora suscitasse diversas controvérsias, permaneceu vigente até o ano de 1911, quando Ernest Rutherford apresentou sua proposta de modelo de estrutura atômica, resultante da análise dos resultados de seu experimento de laboratório sobre a desintegração dos elementos e a química das substâncias radioativas. Rutherford executou o seguinte experimento: • Uma fonte de partículas α foi colocada na boca de um detector circular. • As partículas α foram lançadas através de um pedaço de chapa de ouro. • A maioria das partículas α passaram diretamente através da chapa, sem desviar. https://pt.wikipedia.org/wiki/George_Zweig 13 • Algumas partículas α foram desviadas com ângulos grandes. Figura 12 – Experimento de Rutherford Fonte: Brown; LeMay Jr.; Bursten; Burdge, 2005. Se o modelo do átomo de Thomson estivesse correto, o resultado de Rutherford seria impossível. Rutherford concluiu que as partículas carregadas positivamente ficavam concentradas num pequeno volume do átomo, que conteria a maior parte de sua massa. A esse volume chamou de “núcleo”, o qual, pela concentração de prótons, apresentaria carga positiva. Os elétrons estariam, então, espalhados por todo o espaço de volume relativamente grande que envolveria o núcleo, chamado de “nuvem eletrônica”. Vamos lembrar que, em 1919, Rutherford provou a existência do próton, dando mais força à sua teoria. Rutherford modificou o modelo de Thomson da seguinte maneira: • Supondo que o átomo seja esférico, a carga positiva deveria estar localizada no centro, com uma carga negativa difusa em torno dele. • O átomo, portanto, seria constituído de partículas neutras, positivas e negativas. • As partículas positivas e neutras estariam localizadas no núcleo do átomo, que é pequeno. A maior parte da massa do átomo se deveria ao núcleo. • Os elétrons estariam localizados fora do núcleo, espalhados na forma de nuvem. Assim, com estes estudos, até a descoberta do nêutron, algumas partículas da estrutura atômica se tornaram claras. Então, o número de prótons Will Santos Will Santos 14 no núcleo de um átomo ficou conhecido como “número atômico”. Também ficou estabelecido que o número de elétrons na nuvem eletrônica de um átomo é igual ao número de prótons no núcleo. Posteriormente, o número de massa foi definido como a soma do número de prótons e nêutrons presentes no núcleo. Contudo havia uma grande controvérsia referente a esta proposta de estrutura atômica. Tomando como base os conhecimentos da física clássica, estes elétrons componentes da nuvem eletrônica descreveriam uma curva espiralada até se chocarem com o núcleo. Em 1913, o físico dinamarquês especialista em física atômica Niels Henry David Bohr resolveu a controvérsia existente através do modelo da estrutura atômica que propôs e que até hoje é usado. Vale como curiosidade apresentar a trajetória que levou este brilhante cientista até seu modelo. No ano de 1911, Niels Bohr viajou da Dinamarca para a Inglaterra e foi trabalhar com Sir Thomson na Universidade de Cambridge, com o objetivo de desenvolver uma tese sobre a teoria eletrônica dos metais. Trabalhou por um ano e, como lá não encontrou respostas para suas indagações, em 1912 se mudou para Manchester, para trabalhar como assistente de Rutherford, focando seu trabalho na resolução da controvérsia a respeito do modelo proposto por este renomado cientista. Voltou para a Dinamarca em 1916, tornando-se diretor do Instituto de Física Teórica na Universidade de Copenhague, na qual havia se formado. Iniciou a elaboração de seu modelo trocando inúmeras correspondências com Rutherford. Em uma destas correspondências, enviou um memorando, no qual, ao final, formulou a hipótese de que a estabilidade dos anéis eletrônicos do modelo atômico de Rutherford decorreria da proporcionalidade entre a energia cinética e a frequência de rotação dos elétrons dispostos em “anéis” ao redor do núcleo. Começou seu trabalho usando a bagagem que obteve trabalhando com Thomson e Rutherford, partindo do princípio de que um gás emitia luz quando uma corrente elétrica passava por ele, porque os elétrons, em seus átomos, absorveriam esta energia elétrica e depois a liberariam na forma de fóton. Sendo assim, deduziu que deveria haver uma energia disponível para seus elétrons, a qual poderia ser quantizada. Montou seus preceitos usando o princípio da quantização da energia proposto por Planck, mas ainda sem sucesso, pois lançava mão da mecânica estática como premissa de resolução. Só após uma conversa com seu amigo, o espectroscopista Hans Hansen, que lhe questionou como sua teoria explicaria as séries espectrais decorrentes da fórmula de Will Santos Will Santos 15 Balmer-Rydberg (utilizada em física atômica para determinar todo o espectro da luz emitida pelo hidrogênio), foi que, ao estudar a dedução desta equação, chegou à forma definitiva. Figura 13 – Espectro de hidrogênio Fonte: Brown; LeMay Jr.; Bursten; Burdge, 2005. Para isso, estabeleceu que: • O equilíbrio dinâmico dos sistemas nos estados estacionários pode ser discutido por meio da mecânica ordinária, enquanto a passagem dos sistemas entre diferentes estados não pode ser tratada nessa base. • Esta passagem é seguida pela emissão de uma radiação homogênea, para a qual a relação entre a frequência e a quantidade de energia emitida segue o princípio da quantização da energia proposto por Planck. A partir desses pressupostos, Bohr chegou às relações para as energias estacionárias e para as energias da radiação emitidas em consequênciada transição entre dois estados estacionários, fundamental para seu modelo, cuja expressão é: 𝐸𝐸 = (−2,18 . 10−18𝐽𝐽) . � 1 𝑛𝑛2 �. A variável de número inteiro n desta expressão foi chamada de “número quântico”, podendo assumir valores de 1 a infinito. Para cada raio atômico haverá um número quântico proporcional. O menor estado de energia se encontra no n=1, aumentando com o valor de n. Aplicando esta expressão ao átomo de hidrogênio, Bohr observou que havia um bom acordo entre seu modelo e alguns resultados experimentais conhecidos. Postulou, desse modo, seu modelo de estrutura atômica, no qual: https://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%ADsica_at%C3%B4mica https://pt.wikipedia.org/wiki/Espectro_eletromagn%C3%A9tico https://pt.wikipedia.org/wiki/Hidrog%C3%AAnio Will Santos Will Santos 16 • Apenas órbitas circulares de certos raios a partir do núcleo, correspondentes a níveis de energias bem definidos, são permitidos para os elétrons em um átomo. • Os elétrons nestas órbitas permitidas não irradiarão energia e, portanto, não se moverão em uma espiral na direção do núcleo, sendo estas órbitas de energia estacionária. • A energia só é irradiada ou absorvida pelos elétrons quando mudarem de um estado de energia permitido para outro, sendo a energia irradiada na forma de fóton. Assim nasceu o modelo que até hoje é o mais usado, no qual o átomo é constituído por um núcleo contendo prótons e nêutrons e, ao redor dele, circulam elétrons em órbitas circulares definidas. Figura 14 – Representação do modelo de Bohr Fonte: Byjus, 2016. Até o momento, foram observados sete níveis de energia referentes à circulação dos elétrons ao redor do núcleo. Assim, teríamos n variando de 1 até 7. No modelo de Bohr, estes níveis também são representados com letras maiúsculas, variando de K até Q. Especula-se que a representação por letras comece com a letra K em homenagem a Copenhague, cidade Natal de Bohr (na grafia nórdica, København). Este modelo atendia ao hidrogênio e a elementos que seguiam seu comportamento, não atendendo a átomos mais complexos. Coube ao seu assistente, o físico alemão Arnold Johannes Wilhelm Sommerfeld, em 1915, estudando os espectros de emissão de átomos mais complexos que o hidrogênio através da Teoria da Relatividade de Einstein e da Teoria Quântica, complementar o modelo proposto, admitindo que em cada camada eletrônica (n) havia uma órbita circular e n menos uma (n-1) órbitas elípticas com diferentes excentricidades. Essas órbitas elípticas foram chamadas Will Santos 17 de subníveis ou subcamadas, e caracterizadas por l, em que l varia de 0 até 3. Assim, o modelo passou a ficar conhecido como “Modelo da Estrutura Atômica de Bohr-Sommerfeld”. Figura 15 – Da esquerda para a direita, Sommerfeld, Bohr e o modelo proposto Fonte: American Institute of Physics, S.d. A Teoria de Bohr e Sommerfeld teve de ser abandonada quando pesquisas mostraram que não seria correto admitir que os elétrons fossem, num átomo, partículas discretas com posições e velocidades definidas. Em 1924, Louis-Victor de Broglie, físico francês, estabeleceu o Princípio da Dualidade Onda-Partícula, sugerindo que todas as partículas materiais poderiam, eventualmente, manifestar propriedades ondulatórias. Em particular, pequenas partículas como os elétrons, movendo-se com uma velocidade v, teriam, por hipótese, um caráter ondulatório a eles associado, com comprimento de onda ʎ, relacionado à sua massa m e à velocidade v, em função da constante de Planck h, cuja expressão seria: ʎ = h / (m.v) Will Santos 18 Figura 16 – Louis de Broglie Fonte: Domínio público. Mais tarde, em 1926, o físico alemão Erwin Schrödinger propôs que todas as partículas em movimento podiam ser descritas por uma equação de onda. Este brilhante cientista havia desenvolvido uma equação que permitia encontrar a função de onda de uma partícula a partir do conhecimento da energia potencial à qual está submetida. Aplicada aos átomos, leva ao mesmo resultado de Bohr para os níveis de energia do elétron no átomo de hidrogênio, além de explicar corretamente as propriedades dos átomos mais complexos. Figura 17 – Exemplo da aplicação da equação de Schrödinger para um elemento mais complexo que o hidrogênio. Fonte: Brown; LeMay Jr.; Bursten; Burdge, 2005. Figura 18 – Erwin Schrödinger 19 Fonte: Domínio público. A equação de Schrödinger – 𝐻𝐻.�𝜓𝜓 = 𝐸𝐸.𝜓𝜓 –, quando resolvida, gera uma série de funções de onda 𝜓𝜓 , cada uma delas associada a uma energia de ligação E do elétron. Esta função de onda parte da premissa de que a posição do elétron, como partícula discreta, não pode ser precisamente conhecida. Em lugar disso, tem-se uma função de onda 𝜓𝜓, perfeitamente definida em cada campo do espaço. A função 𝜓𝜓 pode ser interpretada das seguintes maneiras: • Sendo o elétron uma partícula discreta; o quadrado da função de onda, 𝜓𝜓, dá a probabilidade relativa de ele estar num dado ponto. • Como o elétron se espalha como uma distribuição de carga negativa, a densidade de carga varia de ponto a ponto, com a grandeza 𝜓𝜓2. Em 1927, o físico alemão Werner Heisenberg, que trabalhava no Instituto de Niels Bohr, em Copenhague, acrescentou a este conceito o princípio da incerteza. Heisenberg estava trabalhando com as implicações da Teoria Quântica e descobriu um problema no modo como as propriedades físicas básicas de uma partícula em um sistema quântico podiam ser medidas, o que equacionou da seguinte forma: ∆𝑥𝑥 .∆𝑝𝑝 ≥ ℎ 2 Esta equação representa o Princípio da Incerteza, pelo qual não podemos medir a posição (x) e o momento (p) de uma partícula com precisão absoluta. Quanto mais precisamente conhecemos um desses valores, menos sabemos exatamente sobre o outro. A multiplicação dos erros nas medidas destes valores (∆x .∆p) dará um número maior ou igual à metade da constante de Planck �ℎ 2 �. Assim, segundo Werner Heisenberg, para encontrar a posição correta de um elétron, a radiação deve ter um comprimento de onda na ordem da incerteza com que se quer determinar esta posição. Quanto menor for o comprimento de onda, menor será o erro da posição do elétron. Entretanto, conseguindo estabelecer a posição provável, este elétron já não estará mais nesta posição. http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/1922/bohr-bio.html Will Santos Will Santos 20 Figura 19 – Werner Heinsenberg Fonte: CC BY-SA 3.0 de. Mas, afinal de contas, como fica então a estrutura atômica? Reparem que avançamos em conceitos e tecnologia, e estamos praticamente voltando a questões filosóficas da Grécia de Demócrito. Se o comportamento de partículas aceleradas é de onda, ou seja, pura energia, como explicar os aceleradores/colisores de partículas, como o acelerador Linear de Stanford, cujo princípio é provocar um aumento de velocidade em uma partícula carregada por meio de campos eletromagnéticos e então causar o choque desta partícula contra um ponto específico, no qual existem detectores que registram as bandas de energia geradas no choque? Para ocorrer o choque tem de existir partícula. Por outro lado, como explicar que o calor que vem do Sol e é transmitido por elétrons esquenta os cômodos de uma casa ou ambiente de trabalho atravessando paredes, telhado e janelas? Para isso, é preciso que seja energia na forma de onda. Como explicar nossa própria existência se as estruturas atômicas não forem constituídas por partículas? Como explicar o calor que trocamos com o ambiente se não isso não for constituído por energia na forma de onda? Talvez a melhor resposta esteja no Princípio de Dualidade de Luis-Victor de Broglie, o qual propôs que os elétrons apresentavam características tanto ondulatórias como corpusculares, comportando-se de um ou outro modo, dependendo do experimentoespecífico. Portanto, podemos afirmar que a estrutura atômica é composta de um núcleo com prótons e nêutrons, circundado por elétrons que se comportam ora como partícula, ora como onda. 21 TEMA 3 – ORBITAIS Como é sabido sobre a estrutura atômica, as funções de onda nos fornecem a probabilidade relativa de um elétron estar numa dada posição ao redor do núcleo. Considerando agora o conjunto de funções de onda do elétron num átomo, temos os chamados orbitais. Assim, podemos definir os orbitais como as regiões no espaço nas quais as funções de onda indicam a maior probabilidade de haver elétrons para os diversos níveis e subníveis de energia. Os subníveis são designados por letras minúsculas: s, p, d, f, g, h, i, sendo esses 3 últimos ausentes no diagrama convencional, pois, apesar de existirem na teoria, não há átomo que possua tantos elétrons e que precise utilizar esses subníveis. Assim, os orbitais conhecidos até hoje são os orbitais s, p, d, f. Vamos conhecê-los. 3.1 Orbital s O orbital s é denominado sharp (nítido), tendo sido o primeiro tipo de orbital detectado, gerando as raias espectrais de elementos simples como o hidrogênio. Está presente nos sete níveis principais de energia ao redor do núcleo, havendo, então, os orbitais 1s, 2s, 3s, 4s, 5s, 6s, 7s. O orbital 1s é sempre positivo e, a partir do 2s, existem regiões positivas e negativas. Para este orbital, há a probabilidade de estarem presentes no máximo dois elétrons. O orbital s possui simetria esférica ao redor do núcleo. Assim, este orbital é considerado como de representação espacial uniforme em função dos três eixos de coordenadas. Na figura abaixo são mostradas duas alternativas para representar a nuvem eletrônica de um orbital s, sendo que, da esquerda para a direita: • Na primeira, a representação indica que a probabilidade de encontrar o elétron (representada pela densidade de pontos) diminui à medida que se afasta do núcleo. • Na segunda, se apresenta o volume esférico no qual o elétron passa a maior parte do tempo. Devido à sua simplicidade, a segunda forma é mais empregada. Will Santos Realce Will Santos Realce Will Santos Realce Will Santos Realce Will Santos Realce 22 Figura 20 – Representações do orbital sharp(s) Fonte: Brown; LeMay Jr.; Bursten; Burdge, 2005. 3.2 Orbital p O orbital p é denominado “principal”. Está presente do segundo nível de energia principal até o sexto nível, existindo, então, os orbitais 2p, 3p, 4p, 5p e 6p. Tomando como referência os três eixos que compõem o espaço, existem três tipos de orbitais p: um ao longo do eixo x (px), um ao longo do eixo y (py) e um ao longo do eixo z (pz). Cada orbital p é constituído por uma região positiva (ao longo da parte positiva do eixo cartesiano) e uma região negativa (ao longo da parte negativa deste eixo). Em cada região há a probabilidade de existir no máximo um elétron. Portanto, haverá a probabilidade de existir um máximo de seis elétrons presentes neste orbital. A forma geométrica dos orbitais p é a de duas esferas achatadas (par de alteres) no sentido do núcleo atômico (ou centro do eixo) e orientada segundo os eixos de coordenadas. De maneira análoga ao caso anterior, os orbitais p apresentam n-2 nós radiais na densidade eletrônica, de modo que, à medida que aumenta o valor do número quântico principal, a probabilidade de encontrar o elétron diminui. Assim, este orbital é considerado de representação linear ao longo de cada eixo de coordenadas. Figura 21 – Representações do orbital principal (p) Fonte: DLT, S.d. Will Santos Realce Will Santos Realce Will Santos Realce 23 3.3 Orbital d O orbital d recebe o nome de diffuse (difuso). Está presente do terceiro nível de energia principal até o sexto nível, existindo, então, os orbitais 3d, 4d, 5d e 6d. Tomando como referência os três eixos que compõem o espaço, existem cinco tipos de orbitais d: dxy, dyz e dxz, dx2-y2 e dz2. São importantes as seguintes características: os orbitais dxy, dyz e dxz são iguais, exceto por terem amplitudes máximas nos planos xy, yz e xz, respectivamente; o orbital dx2-y2 tem a mesma forma que o orbital dxy, mas está deslocado de 45o, de modo que seus lobos estão ao longo dos eixos x e y; o orbital dz2 é simétrico em torno do eixo z. Cada orbital d é constituído por uma região positiva (ao longo da parte positiva do eixo cartesiano) e uma região negativa (ao longo da parte negativa deste eixo). Em cada região há a probabilidade de existir no máximo um elétron. São de representação planar. Portanto, haverá a probabilidade de existir um máximo de dez elétrons presentes neste orbital. Os orbitais d têm uma forma mais diversificada: quatro deles têm forma de 4 lóbulos de sinais alternados (dois planos nodais, em diferentes orientações espaciais), e o último é um duplo lóbulo rodeado por um anel (um duplo cone nodal). Figura 22 – Representações do orbital diffuse (d) Fonte: Brown; LeMay Jr.; Bursten; Burdge, 2005. 3.4. Orbital f O orbital f recebe o nome de fundamental. Está presente apenas no quarto e no quinto níveis de energia, existindo, então, somente os orbitais 4f e 5f. Estes orbitais têm pequeno papel nas ligações químicas. Possuem distribuição espacial não uniforme. Haverá a probabilidade de existir um máximo de quatorze Will Santos Realce Will Santos Realce Will Santos Realce Will Santos Realce 24 elétrons presentes neste orbital. Os orbitais f apresentam formas ainda mais exóticas que os orbitais d, que podem ser derivadas da adição de um plano nodal às formas destes orbitais. Figura 23 – Representação do orbital fundamental (f) Fonte: Pierson Chemistry, S.d. TEMA 4 – DISTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA Paralelo ao desenvolvimento do conhecimento sobre a estrutura atômica e do próprio conceito de orbitais, começaram a surgir proposições de como estes elétrons se distribuiriam ao redor no núcleo para cada elemento químico. Vamos tratar deste conceito neste tema. 4.1 Linus Pauling O modelo aceito pela comunidade científica para predizer como os elétrons se distribuem ao redor do núcleo é o proposto por Linus Carl Pauling. Mas, antes de apresentar este modelo, é importante falar deste importante cientista, e sobre como ele chegou a este modelo. A contribuição de Linus Pauling para o desenvolvimento científico no século XX é de tamanha importância, que a conceituada revista britânica New Scientist o colocou, com Albert Einstein, na lista dos 20 maiores cientistas de todos os tempos. Foi a única pessoa a ser agraciada duas vezes com o Prêmio Nobel. É interessante ressaltar que, embora seja reconhecido como um dos maiores químicos do século XX, ele desenvolveu trabalhos em diversas áreas, como mineralogia, química, biologia, medicina e até na área automotiva, participando de estudos de desenvolvimento de carros elétricos na década de 1950. Também foi um dos pioneiros da química quântica e, por último, suas Will Santos Realce 25 crenças no consumo regular de vitamina C levaram ao início da medicina ortomolecular. Figura 24 – Linus Carl Pauling Fonte: Domínio público. A caminhada para o desenvolvimento de seu diagrama de distribuição eletrônica começou quando ele ingressou na Universidade Agrícola do Oregon, em 1917. No seu segundo ano de curso, tendo manifestado a necessidade de conseguir um emprego para ajudar financeiramente sua mãe, recebeu a proposta de assumir a cátedra da disciplina de química analítica quantitativa que acabara de concluir com méritos. Assim, começou a ter maior contato com os conhecimentos de química, em especial com o trabalho de Lewis e Langmuir sobre a configuração eletrônica dos átomos, assim como a forma como estes se ligavam para formar moléculas. Neste momento, decidiu aprofundar seus estudos e investigações científicas focado na compreensão da relaçãoda estrutura atômica da matéria com as suas propriedades físicas e químicas. Desenvolveu seus estudos até concluir seu doutorado no Instituto de Tecnologia da Califórnia com a menção máxima, summa cum laude, em 1925. Em função disso, ganhou uma bolsa da Fundação Guggenheim, que o permitiu se deslocar para a Europa e desenvolver estudos sob orientação de Sommerfield, Bohr e Schrödinger. Voltou aos Estados Unidos em 1927, ingressando como professor assistente de química teórica no Instituto de Tecnologia da Califórnia, seguindo sua carreira até o cargo de professor titular. Nesta instituição, investigou profundamente a natureza das ligações químicas, o que o levou à edição de seu famoso livro The Nature of the Chemical Bond, publicado em 1939. Este livro é considerado um dos mais importantes trabalhos de química publicados, sendo https://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%81tomo https://pt.wikipedia.org/wiki/Mol%C3%A9cula 26 nele inseridos, como resultado de seus estudos, os conceitos de eletronegatividade, de hibridação e seu modelo de distribuição eletrônica. 4.2 Diagrama de Linus Pauling O Diagrama de Linus Pauling é elaborado para auxiliar na distribuição dos elétrons pelos subníveis da eletrosfera. A eletrosfera é a região externa do átomo onde se localizam os elétrons. Segundo Pauling, teoricamente, cada camada da eletrosfera é dividida em subníveis. A camada K é composta pelo subnível s. A camada L é composta pelos subníveis s e p. A camada M é composta pelos subníveis s, p e d. A camada N é composta pelos subníveis s, p, d e f. A camada O é composta pelos subníveis s, p, d, f e g. A camada P é composta pelos subníveis s, p, d, f, g, e h. A camada Q é composta pelos subníveis s, p, d, f, g, h e i. Os subníveis suportam no máximo: s – 2 elétrons; p – 6 elétrons; d – 10 elétrons; f – 14 elétrons; g – 18 elétrons; h – 22 elétrons; i – 26 elétrons. Assim, a camada K, que só possui o subnível s, apresenta no máximo 2 elétrons. Já a camada L, que possui os subníveis s e p, apresenta no máximo 8 elétrons (2 provenientes do subnível s e 6 provenientes do subnível p), e assim sucessivamente. Linus Pauling elaborou, portanto, um dispositivo prático que permite colocar todos os subníveis de energia conhecidos em ordem crescente de energia. É o processo das diagonais, denominado Diagrama de Pauling. A ordem crescente de energia dos subníveis é a ordem na sequência das diagonais, em que cada número corresponde a uma camada eletrônica: 1=K, 2=L, 3=M, 4=N, 5=O, 6=P, 7=Q A representação deste diagrama segue abaixo: Figura 25 – Diagrama de Linus Pauling Fonte: CC BY-SA 3.0. Will Santos Realce Will Santos Realce Will Santos Realce 27 TEMA 5 – FAZENDO A REPRESENTAÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA Chegamos à parte final desta aula. Mostraremos, neste tema, como usar os conhecimentos anteriores para fazer a representação da distribuição dos elétrons ao redor do núcleo e, com isso, prever algumas características dos elementos químicos. 5.1 Ferramentas úteis e representação Vamos nos valer inicialmente de alguns conceitos já vistos: • O primeiro conceito é o do número atômico e da equivalência do número de prótons e de elétrons. Vimos que o número atômico é o número de prótons no núcleo e que os átomos possuem o mesmo número de prótons e de elétrons em sua estrutura. Acrescento a isso, como complementação, o conceito de massa atômica, que é a soma do número de prótons e nêutrons do núcleo. Antecipando o que veremos na aula 3, quando abordaremos a Tabela Periódica, a representação do número atômico (Z) e da massa atômica (A) nos elementos ocorre como abaixo: AEZ Digamos que um elemento tenha a seguinte representação: 9E4. Neste caso, os valores do número atômico e da massa atômica seriam Z=4 e A=9. O fato de ter Z=4 indica 4 prótons no núcleo. Como o número de elétrons é igual ao número de prótons, ele terá 4 elétrons distribuídos em níveis de energia ao redor do núcleo. Também podemos determinar a quantidade de nêutrons que possui, pois a massa atômica é a soma do número de prótons com o de nêutrons no núcleo. Como A=9 e Z=4, o número de nêutrons será dado por 9-4=5, ou seja, 5 nêutrons no núcleo. A propósito, o elemento que possui esta configuração é o berílio (Be). • O segundo é o Diagrama de Linus Pauling. Usando como base a representação do diagrama da figura 25, poderemos fazer a distribuição dos elétrons do berílio por níveis de energia. Como vimos, ele tem 4 elétrons. Assim, usando o diagrama, sua distribuição será: 1s2, 2s2 Will Santos Realce Will Santos Realce 28 Repare que foram alocados 2 elétrons na camada K e dois elétrons na camada L. • O terceiro é o Modelo de Bohr, segundo o qual o átomo é formado pelo núcleo contendo prótons e nêutrons, circulando ao redor dele elétrons em órbitas circulares bem definidas. Como já obtivemos o número de prótons, o número de nêutrons e a distribuição dos elétrons, agora é só transcrever para o modelo de Bohr: colocamos um núcleo contendo 4 prótons e 5 nêutrons e distribuímos os elétrons nas camadas ao redor do núcleo: Repare que, no núcleo, foi indicada numericamente a quantidade de prótons e de nêutrons presentes, e que estes foram alocados conforme a distribuição eletrônica segundo o Diagrama de Linus Pauling – dois elétrons na camada K (os dois alocados no seu orbital s) e dois elétrons na camada L (os dois alocados no seu orbital s). Estes elétrons podem ser alocados em qualquer posição dessas camadas, em função do Princípio da Incerteza.de Heisenberg. Como ficaria, então, a representação da distribuição eletrônica para o flúor? 35Cl17 No caso do Cl, teremos Z=17 e A=35. Assim, serão 17 prótons, 17 elétrons e 18 nêutrons (35-17=18). Sua distribuição eletrônica será: 1s2, 2s2, 2p6, 3s2, 3p5 Repare que, no nível de energia mais alto, embora possam existir até 6 elétrons no orbital p, foram alocados 5, pois os outros 12 já haviam sido alocados nos níveis de energia anteriores. Assim, ficará com 2 elétrons na camada K (os dois do orbital s) e 8 elétrons na camada L (os dois do orbital s mais os seis do orbital p) e 7 elétrons na camada M. Portanto, sua representação será: 29 5.2 Predizendo algumas propriedades Através da análise comparativa entre os elementos Be e Cl representados anteriormente, podemos predizer algumas propriedades, até de forma intuitiva. Levando em conta que o raio atômico é a distância entre o centro do núcleo e a última camada de energia, comparativamente o Cl terá raio atômico maior que o Be. Se levarmos em conta que os elétrons são atraídos pelas cargas positivas do núcleo, podemos dizer que a camada mais externa – a “camada de valência” – do Cl sofre maior atração para o núcleo que a camada mais externa do Be. Esta atração se refletirá na eletronegatividade proposta por Linus Pauling, e que veremos já na aula 2, quando abordaremos as ligações químicas. Mais propriedades serão tratadas nas próximas aulas. FINALIZANDO Com os conhecimentos apresentados nesta aula, mostramos a importância de compreender a estrutura atômica e de sabermos representá-la. Agora, você está habilitado a usar estes conceitos como base para entender as propriedades e, mais adiante, com os conhecimentos das aulas seguintes, predizer os comportamentos dos elementos químicos e das substâncias e materiais formados por eles. 30 REFERÊNCIAS COTARDIERE, P. História das ciências: da antiguidade aos nossos dias. São Paulo: Texto & Grafia, 2011. v. 1. FARNDON, J. A história da ciência por seus grandes nomes. 6. ed. São Paulo: Coquetel, 2015. GOMPERZ, T. Pensadores da Grécia. História da filosofia antiga. São Paulo: Ícone, 2011. Tomo I. MAHAN, H.; BRUCE, M. & MYERS, R. J. Química: um curso universitário. 4. ed. São Paulo: Edegard Blücher, 1995. PAZ, M. L. de A. L. Grande enciclopédia do saber– física e química. São Paulo: Editorial Amereida, 2010. RUSSEL, J. B. Química geral. 2. ed. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1994. v. 1 e 2. THEODORE, l. B.; LEMAY, E. H. Jr. & BURSTEN, E. B. Química, a ciência central. 9. ed. São Paulo: Pearson, 2005. Conversa inicial Nos anos em que venho ensinando Química, cada vez mais fica evidenciada sua importância, pois, sem ela, não existiriam novos materiais, como o grafeno, responsável por um salto evolutivo na transmissão e processamento de dados, os motores elétricos e ... TEMA 1 – O ÁTOMO TEMA 2 – ESTRUTURA ATÔMICA TEMA 3 – ORBITAIS TEMA 4 – DISTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA TEMA 5 – FAZENDO A REPRESENTAÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA FINALIZANDO REFERÊNCIAS