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O Mito de Prometeu e o Enigma da Condição Humana
O mito de Prometeu é o jeito que a cultura humana encontrou de projetar em uma narrativa aspectos muito profundos de si mesma, a fim de, olhando em suas entrelinhas, poder clarear questões enigmáticas do tipo: Quem somos nós? O que nos faz humanos? Por que somos tão diferentes de todos os animais? Por que somos tão contraditórios? Por que existimos? De onde viemos e para onde estamos indo? De onde vem essa potência que temos, que nos permite mapear o cosmos, explorar as profundezas oceânicas, inventar a Inteligência artificial, a clonagem, as cirurgias de transplantes de órgãos, inclusive do coração humano? Para onde caminhamos com todo esse poder? Por que somos assim e ao mesmo tempo tão cegos, tão egoístas, tão predadores, tão escravos de nós mesmos?
Este mito vem sendo contado de várias formas ao longo dos tempos, com diversos detalhes que variam conforme a fonte, mas as versões principais são as do poeta grego Hesíodo, que viveu há cerca de dois mil e oitocentos anos, e a do dramaturgo grego Ésquilo, que viveu há dois mil e quinhentos anos. Tais versões giram em torno de três fatos principais: Prometeu rouba o fogo dos deuses e dá aos homens; Zeus, o deus dos deuses, castiga Prometeu, acorrentando-o no alto do monte Cáucaso e todos os dias uma águia comia o seu fígado, que à noite se regenerava; Por fim, Prometeu é libertado pelo herói Hércules, que após ter concluído os seus doze trabalhos, desacorrenta-o, deixando em seu lugar o centauro Quíron.
Todos esses aspectos são profundamente simbólicos, e para entendê-los é preciso conhecer algumas chaves relacionadas ao Ser Humano, tanto no sentido do indivíduo como no sentido de toda a Humanidade. Vamos refletir um pouco sobre cada símbolo do mito.
Todos os elementos que aparecem nessa narrativa estão falando de aspectos do Ser Humano, os deuses, o fogo, a águia, o monte, o centauro, Hércules e Prometeu, todos são aspectos do próprio Homem, de suas etapas evolutivas, de sua condição, de seu passado, presente e futuro. Não há nada neste mito fora do Humano.
O fogo dos deuses representa a atividade mental, a capacidade de raciocinar que é o que nos torna humanos. Antes dessa capacidade, nós éramos alguma coisa entre uma fera e um homem. A mente é o que nos faz humanos. E quem seriam Prometeu e os deuses? São etapas evolutivas do próprio Homem. O mito nos diz que a evolução é tomada à força, ou seja, se cruzássemos os braços e ficássemos aguardando o crescimento, ele nunca chegaria. Assim, uma faceta mais evoluída de nós, representada por Prometeu, rouba o fogo dos deuses, ou seja, arranca à força para nós algo que nos seria dado mais à frente, que é essa capacidade de pensar, conjecturar, calcular e projetar.
Quem seria então Zeus? Ele representa a força misteriosa do destino, do plano de evolução para toda a humanidade. Esse grande destino cósmico submete Prometeu a consequências adversas, proveniente do encontro do “fogo” com a nossa natureza animal do homem.
A potência da atividade mental, se dominada pelos desejos animalescos que habitam em nós, acorrentam-nos no alto de uma montanha e nos submete a um sofrimento muito cruel. Essa cena da ave comendo o fígado de Prometeu durante o dia, e que à noite se regenera para no dia seguinte ser de novo devorado, representa a nossa condição de reféns das ilusões e das paixões. Esse aspecto nos remete a outro mito da cultura grega, que é o mito da caverna contado por Platão, no livro “A República”. Trata-se de uma sociedade de humanos acorrentados no fundo de uma caverna, para os quais toda a percepção da realidade se reduzia às sombras projetadas na parede, pela iluminação de uma fogueira acessa no interior da caverna. Esses dois mitos estão falando da mesma coisa.
Prometeu é como um dos cativos da caverna de Platão, que chegou a sair da caverna, viu a luz da evolução e retornou para libertar os outros. Mas ao chegar lá no fundo da caverna novamente, foi acorrentado. Esse movimento de evolução e involução é muito recorrente na história humana. Às vezes, erroneamente olhamos para a história como uma linha evolutiva contínua, em que os mais primitivos são involuídos, e os atuais mais evoluídos. No entanto, as descobertas arqueológicas apontam muitas vezes para o contrário disso. A simbologia egípcia, por exemplo, dá sinais de que em uma época remota houve uma civilização ali com valores infinitamente mais evoluídos que os nossos.
Todos temos dentro de nós esse Prometeu, que habita o mundo dos deuses, mas está acorrentado às paixões que lhe devoram o fígado diariamente. Estamos presos na ilusão das sombras, cheios de vícios, de egoísmos, enquanto uma enorme potência jaz adormecida dentro de nós.
A libertação dessa condição somente é possível a partir de outra faceta que também existe dentro de nós, que é representada no mito por Hércules. Esse aspecto em nós representa a nossa capacidade de lutar, capturar e subjugar a força animal que nos habita. Observe que todos os doze trabalhos de Hércules na mitologia representam exatamente isso, a luta para vencer monstros animalescos, como o Leão de Neméia, que ninguém conseguia matar, ou a Hidra de Lerna, que era uma serpente com corpo de dragão e com nove cabeças, a Corça de Cerineia, que era extremamente veloz e nunca se cansava, entre outros seres mágicos. Todos esses monstros são representativos dos impulsos que nós temos para os vícios, as ambições, os desvios de caráter, as paixões etc. Só uma natureza hercúlea pode nos libertar. É preciso vencer esses monstros, capturá-los, dominá-los, pois só isso nos permitirá partir as correntes das ilusões e sair da caverna, tornando-nos o Prometeu livre.
O mito de Prometeu abre um portal para uma percepção profunda da potência que somos. Como deuses acorrentados, somos corroídos dia-a-dia pelas paixões até despertarmos o Hércules em nós. Esse guerreiro que subjuga as forças primitivas dos vícios, e nos devolve a liberdade que só os deuses têm, nascerá em nós no momento em que decidirmos lutar contra essas ilusões de uma vida superficial.
Esse é o futuro da humanidade na teogonia grega. Evolução, nas entrelinhas da mitologia, significa libertação das paixões. É um erro confundir evolução com avanço tecnológico, pois as tradições nos dizem o contrário. Evolução, para todas as antigas tradições da humanidade, está relacionada a conquistas morais. Isso está em todos os livros sagrados e na maioria das narrativas míticas contadas ao longo de milhares de anos. Enquanto concentrarmos riquezas em pequenos grupos, em detrimento do resto da humanidade que padece de fome, enquanto alimentarmos padrões de existência predatórios das condições ambientais, enquanto nos digladiarmos pelo poder a qualquer custo, seremos Prometeus acorrentados no alto do monte Cáucaso, que mesmo em uma posição de altura, cercados das mais avançadas parafernálias tecnológicas, seremos corroídos todos os dias pelas paixões mais abjetas e primitivas. O futuro da humanidade está em sua condição de Hércules, caracterizada pela conquista sobre suas inclinações monstruosas. Então, já é tempo para cada um de nós iniciarmos essa jornada heróica, e começarmos a lutar contra os nossos monstros internos.
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