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FACULDADE LEGALE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO CIVIL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL MARIA EDUARDA CASTRO CORRÊA TEORIA DA CAUSA MADURA: À LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO SÃO PAULO 2023 Maria Eduarda Castro Corrêa TEORIA DA CAUSA MADURA: À LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do título de pós- graduado em direito civil e direito processual civil SÃO PAULO 2023 2 RESUMO O presente trabalho tem como objetivo analisar a relação entre a teoria da causa madura e os princípios constitucionais brasileiros. A teoria da causa madura estabelece que, em determinadas situações, é possível o julgamento de mérito de uma ação sem a necessidade de produção de provas ou realização de diligências. Por sua vez, os princípios constitucionais são preceitos fundamentais que orientam a interpretação e aplicação das normas jurídicas, garantindo a realização dos valores e objetivos do Estado Democrático de Direito. As relações entre esses dois temas estão presentes em diversas discussões no âmbito jurídico, especialmente no que se refere ao acesso à justiça e à garantia do devido processo legal. Isso porque, embora a teoria da causa madura possa garantir uma resposta mais rápida e efetiva aos litígios, é necessário que sejam respeitados os princípios constitucionais, como o da ampla defesa e do contraditório Assim, este trabalho destacará a importância da análise conjunta da teoria da causa madura e o princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório, buscando identificar as possibilidades e limites dessa relação e sua importância para a garantia do acesso à justiça e da efetividade do processo judicial. Palavras-chave: Teoria da causa madura, princípios constitucionais, ampla defesa, contraditório. 3 ABSTRACT This paper aims to analyze the relationship between the theory of mature cause and Brazilian constitutional principles. The theory of mature cause establishes that, in certain situations, it is possible to judge the merits of an action without the need to produce evidence or perform due diligence. In turn, constitutional principles are fundamental precepts that guide the interpretation and application of legal norms, ensuring the realization of the values and objectives of the Democratic State of Law. The relationship between these two themes is present in several discussions in the legal sphere, especially with regard to access to justice and the guarantee of due process. This is because, although the theory of mature cause can guarantee a faster and more effective response to litigation, it is necessary to respect constitutional principles, such as that of broad defense and adversarial. Thus, this work will highlight the importance of the joint analysis of the theory of mature cause and the constitutional principle of broad defense and contradictory, seeking to identify the possibilities and limits of this relationship and its importance for ensuring access to justice and the effectiveness of the judicial process. Keywords: Mature cause theory, constitutional principles, broad defense, contradictory. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 5 2. TEORIA DA CAUSA MADURA ..................................................................... 6 2.1 Breve Conceito e Critérios de aplicação ............................................................. 6 2.2 Evolução Histórica e sua Previsão no Atual Código de Processo Civil ........... 6 2.3 Aplicabilidade da Teoria da Causa Madura .................................................... 15 3. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO .......................................................................................... 20 3.1 Breve Conceito e Evolução Histórica ............................................................... 20 4. DA APLICAÇÃO DA TEORIA DA CAUSA MADURA E O PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA, CONTRADITÓRIO E DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO ...................................................................................................... 24 5. CONCLUSÃO ..................................................................................................... 28 5 1. INTRODUÇÃO A teoria da causa madura é uma abordagem utilizada no processo civil brasileiro para aprimorar a efetividade do julgamento. De acordo com esta teoria, a causa deve ser julgada na sua forma final, independentemente de haver necessidade de produção de mais provas ou de realização de atos processuais adicionais. No entanto, é importante ressaltar que a aplicação da teoria da causa madura não se dá em todos os casos, devendo ser criteriosamente avaliada pelo magistrado responsável pelo julgamento da causa. Afinal, a decisão final deve ser baseada em elementos que permitam a completa análise das provas e dos fatos que envolvem a questão. Em termos práticos, a teoria da causa madura tem como objetivo evitar atrasos no julgamento de processos, garantindo que as decisões sejam tomadas de forma mais ágil e eficiente. Além disso, a teoria também contribui para a redução de custos e para o aprimoramento do sistema de justiça, oferecendo mais agilidade e efetividade para os envolvidos. Por fim, é importante destacar que a aplicação da teoria da causa madura pode ser questionada por parte dos envolvidos na ação, pois pode ser vista como uma forma de cerceamento do direito de defesa. Por isso, a teoria deve ser aplicada de forma cautelosa e sempre em conformidade com os princípios constitucionais e legais que regem o processo civil brasileiro. 6 2. TEORIA DA CAUSA MADURA 2.1 Breve Conceito e Critérios de Aplicação A teoria da causa madura é um instrumento processual que permite ao órgão julgador decidir sobre o mérito da ação mesmo que ainda haja questões pendentes, desde que todas as provas tenham sido produzidas e as partes tenham tido oportunidade de se manifestar. Com a aplicação da causa madura, o processo é resolvido mais rapidamente, sem a necessidade de esperar por novas decisões interlocutórias. Isso traz benefícios tanto para as partes envolvidas, que têm acesso à justiça de forma mais célere, quanto para o sistema jurídico como um todo, que consegue reduzir o número de processos em tramitação. Nesse sentido, leciona o ilustre doutrinador Daniel Amorim “A teoria da causa madura deve ser compreendida como uma ferramenta para a adequação do processo às necessidades do jurisdicionado, permitindo a celeridade e a efetividade do processo.”1 Para que a teoria da causa madura seja aplicada, é necessário que o juiz entenda que há elementos suficientes para que a lide seja decidida. Isso significa que o magistrado deve ter certeza de que todas as informações necessárias para a decisão estão presentes nos autos do processo. Além disso, é preciso que as partes tenham sido ouvidas e que não existam questões pendentes que impeçam a resolução da causa. Entre as vantagens da aplicação da teoria da causa madura estão a rapidez na resolução de processos e a economia de recursos para o sistema judiciário. No entanto, é importante ressaltar que essa teoria só deve ser aplicada em casos excepcionais, quando todas as condições para a decisão do mérito estiverem satisfeitas. Caso contrário, pode haver risco de violação de direitos fundamentais e prejuízo às partes envolvidas. 2.2 Evolução Histórica e sua Previsão no Atual Código de Processo Civil No início, a teoria da causamadura era conhecida como teoria da causa petendi, que foi desenvolvida no século XIX pelos franceses Jean-Baptiste Colbert e Jean- 1 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo código de processo civil comentado. Salvador: Editora JusPodivm, 2016. 7 François Terré. Segundo essa teoria, a causa petendi era o fato ou conjunto de fatos que justificava o pedido formulado pelo autor em sua ação judicial. Com o passar do tempo, a teoria evoluiu para a causa de pedir, onde a causa do litígio passou a ser vista como o conjunto de fatos, cuja análise permitia que se concluísse pela existência de um direito subjetivo. No início do século XX, o jurista italiano Enrico Tullio Liebman, desenvolveu a teoria da causa madura, que se baseava na ideia de que a causa deve ser analisada pelo juiz antes de iniciar a instrução processual. Liebman defendia que o juiz deveria avaliar se a causa é madura o suficiente para ser julgada e se as partes dispunham de todos os elementos necessários para a formação de sua convicção. Com o tempo, a teoria da causa madura foi incorporada ao ordenamento jurídico de diversos países, incluindo o Brasil. No Brasil, a teoria foi incorporada ao ordenamento jurídico por meio da lei 10.352/2001 que acrescentou o §3º no artigo 515 do CPC/1973, estabelecendo que "nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito, o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento". No sistema processual anterior, o Tribunal tinha a responsabilidade de verificar as condições necessárias para a admissibilidade do recurso, bem como os critérios mencionados no artigo 515, parágrafo terceiro, do antigo Código de Processo Civil, o que inclui a existência de uma sentença que encerre o processo sem que o mérito tenha sido analisado, a presença de uma questão exclusivamente de direito e a possibilidade de julgamento imediato. Com relação à Teoria da Causa Madura, Eliézer Rosa apresenta o seguinte ensinamento: Causa madura é aquela que está completamente instruída e pronta para receber a sentença de mérito. Onde e quando se aplica o princípio da causa madura? Onde – no tribunal, em segunda instância. Quando – quando o juiz, por erro in judicando, em lugar de julgar o mérito, põe fim ao processo por uma sentença processual, sobre a ação, julgando, por exemplo, o autor carecedor de ação. Havendo recurso, a segunda instância tem dois caminhos a seguir: a) cassa a sentença, fazendo baixar os autos, para que o juiz profira sentença de mérito; b) pelo princípio da causa madura, reforma a sentença na sua conclusão e profere julgamento de mérito, pela procedência ou improcedência do pedido (Novo Dicionário de Processo Civil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1986, p. 63). 8 É relevante, portanto, examinar cada aspecto que é mencionado no terceiro parágrafo do artigo 515 do Código de Processo Civil de 1973, antes de adentrarmos na sua aplicação no atual código. O primeiro requisito legal se refere a uma sentença terminativa sem resolução do mérito, a qual é uma decisão judicial que encerra o processo e está prevista no artigo 267 do Código de Processo Civil anterior. Este dispositivo é diretamente referido pelo artigo 515, § 3°, do mesmo código, que estabelece circunstâncias em que, se identificadas nos autos, o juiz deve extinguir o caso sem analisar o mérito. É importante destacar, porém, que nem toda apelação apresentada contra uma sentença terminativa se enquadra no parágrafo terceiro do artigo 515 do Código de Processo Civil de 1973. É necessário que a sentença não apresente qualquer falha que possa comprometer a sua validade. Caso contrário, o tribunal precisa anular a sentença e devolvê-la ao órgão de origem para que uma nova decisão seja proferida. Um exemplo de falha seria a incompetência absoluta do juiz que emitiu a sentença. Alguns estudiosos argumentam contra a existência dos requisitos de que a questão seja exclusivamente de direito e que a causa esteja pronta para julgamento imediato, pois consideram que eles são praticamente idênticos. Isso ocorre porque, quando a questão é exclusivamente de direito, presume-se que não há necessidade de produção de prova, o que significa que a causa já está pronta para julgamento imediato. Na realidade, os requisitos são tão entrelaçados que não é possível separá-los, embora o legislador tenha feito isso. Além disso, para inflamar o debate, esses requisitos não são acumulativos. Quando se fala sobre o pressuposto da causa apta para julgamento imediato, isso quer dizer que a causa já deve ter sido devidamente instruída em primeira instância e que não há mais necessidade de coleta de provas. O processo deve ter seguido os princípios do devido processo legal, incluindo o contraditório e a ampla defesa. Dessa forma, não há margem para imoderação na realização desse pressuposto, visto que as partes têm o direito de participar ativamente do processo, sem surpresas decorrentes de decisões tomadas sem discussões e debates anteriores. Por fim, no que tange ao requisito da matéria exclusivamente de direito, está refere-se a circunstâncias nas quais o conflito é meramente jurídico, estando ausente controvérsias fáticas. Isto é, não cabe dilação de provas, ou a prova, se houver, foi constituída previamente na inicial. Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, o instituto da teoria da causa madura sofreu alterações no que tange seus requisitos e possibilidade de aplicação. 9 De acordo com o parágrafo primeiro do artigo 332 do Código de Processo Civil de 2015, em casos em que não seja necessário realizar a fase instrutória, o juiz, sem a necessidade de citar o réu, julgará o pedido como improcedente se perceber imediatamente a decadência ou a prescrição. Art. 332. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar: § 1º O juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição. Esse cenário é visto como uma novidade que se enquadra na aplicação da teoria da causa madura no âmbito da primeira instância. Conforme mostrado no texto do código anterior, era essencial para a utilização da teoria que a questão dissesse respeito exclusivamente ao direito, sem fatos em disputa. No entanto, após debates consideráveis sobre a aplicação desse dispositivo, o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu a jurisprudência uniforme sobre a teoria da causa madura no caso EREsp nº 874.507/SP em 2013, estabelecendo que: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. DIVERGÊNCIA NA INTERPRETAÇÃO DO ART. 515, 3º, DO CPC. TEORIA DA CAUSA MADURA. APLICAÇÃO DA REGRA AINDA QUE SEJA NECESSÁRIO O EXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO PELO TRIBUNAL. EMBARGOS REJEITADOS. 1 Divergência devidamente demonstrada. Segundo a Quarta Turma, conforme entendimento exposto no acórdão embargado, é possível a aplicação do art. 515, 3º do CPC, ainda que seja necessário o exame do conjunto probatório pelo Tribunal. No entanto, em sentido diametralmente contrário, para a Segunda Turma, a regra ali preconizada não se monstra cabível quando demandar essa providência. 2 A regra do art. 515, 3º, do CPC deve ser interpretada em consonância com a preconizada pelo art. 330, I, do CPC, razão pela qual, ainda que a questão seja de direito e de fato, não havendo necessidade de produzir prova (causa madura), poderá o Tribunal julgar desde logo a lide, no exame da apelação interposta contra a sentença que julgara extinto o processo sem resolução de mérito. 3 Embargos de divergência rejeitados. (grifo nosso) 2 2 STJ. EREsp nº 874.507/SP, Relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima, Corte Especial, julgado em 19/06/2013,DJe 1º/07/2013. 10 Na concordância do STJ, o §3º do artigo 1.013 do CPC/2015 elimina a parte que mencionava a "questão de direito" e permanece como exigência apenas a necessidade de uma decisão imediata, devendo o tribunal deliberar imediatamente sobre o mérito quando: I - reformar sentença fundada no art. 485; II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir; III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo; IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação. Infere-se que o inciso I do referido artigo trata da aplicação da teoria da causa madura em sentenças terminativas que já eram previstas no antigo Código de Processo Civil, não representando qualquer inovação legislativa. No entanto, os incisos II a IV e o parágrafo quarto do dispositivo introduzem novas situações em que a teoria pode ser aplicada, ampliando sua utilização no sistema processual brasileiro. Para uma compreensão mais clara das possibilidades apresentadas, é necessário explaná-las. A primeira hipótese (prevista nos incisos II e III do artigo 1.013 do novo Código) refere-se à anulação de sentenças por desrespeito aos limites do pedido, de acordo com o princípio da congruência. Nesse caso, a sentença proferida pelo juiz não está em conformidade com a demanda do autor, concedendo benefícios diferentes ou maiores do que o solicitado. É importante destacar que os limites da ação não se restringem apenas ao pedido, mas também à causa de pedir e às partes envolvidas. Portanto, pode-se aplicar a teoria da causa madura nos casos de sentenças extrapetita e citrapetita, que ocorrem quando o juiz decide algo diferente do que foi solicitado ou deixa de decidir alguma questão relevante na sentença, respectivamente. No caso da sentença extrapetita, há um erro de procedimento por parte do magistrado, que pode ser anulado por meio do recurso de apelação e, se a causa estiver pronta para ser julgada, o tribunal pode decidir diretamente sobre o mérito. Já no caso da sentença citrapetita, a falha na prestação jurisdicional é evidente, e pode ser impugnada por meio de apelação. Nesta seção, é importante destacar que os limites não se referem apenas ao pedido, mas também à causa de pedir e às partes envolvidas. Em outras palavras, a teoria da causa 11 madura pode ser usada em casos de sentenças que vão além (extra petita) ou aquém (citra petita) do que foi solicitado. No que diz respeito a sentenças extra petita, o juiz decide algo diferente do que o autor pediu, o que resulta em um erro de procedimento. Nesses casos, pode ser aplicado o parágrafo terceiro do artigo 1.013 do Novo Código de Processo Civil, que permite a anulação da sentença baseada em erro de procedimento por meio do recurso de apelação, permitindo que, após a anulação, o tribunal julgue diretamente o mérito da causa se esta já estiver apta a ser julgada. No caso da sentença citra petita, ocorre quando o juiz deixa de tomar uma decisão em sua sentença, indicando uma falha na provisão da justiça, uma vez que não atende ao desejado. É conhecido que quando há omissão, é possível estabelecer embargos de declaração, entretanto, neste caso, é possível fazer uma apelação para contestá-la. Ao considerar a situação, o vício (omissão) não está explicitamente manifestado na sentença proferida pelo juiz de primeira instância, mas sim no que falta a ela. Assim sendo, o tribunal pode se manifestar sobre as questões que o juiz da primeira instância deveria ter abordado, desde que o processo esteja pronto para ser julgado imediatamente. Dessa forma, é possível resumir os incisos II e III como a permissão do tribunal para aplicar a teoria em questão em decisões resolutivas de mérito, anulando-a e decidindo imediatamente sobre o pedido, desde que o recurso busque anular a decisão devido à não observância dos limites do pedido. Por outro lado, a anulação da sentença devido à omissão de confronto de causa de pedir ou fundamento de defesa só é legítima se tais alegações não foram suscitadas e discutidas no juízo de primeira instância. Sobre a matéria, interessante mencionar o entendimento de Daniel Assumpção Amorim Neves: A incongruência da sentença com os limites do pedido ou da causa de pedir é motive de anulação da sentença pelo recurso de apelação e julgamento imediato de mérito pelo tribunal. Dessa forma, reconhecendo o tribunal ser a sentença extra petita ou extra causa petendi, o processo não deve retornar ao primeiro grau, cabendo ao tribunal, após a anulaçao da sentença, julgar novamente o mérito da ação. A previsão legal contraria a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça formada na vigência do CPC/1973. Na hipótese de sentença ultra petita (não existe sentença ultra causa petendi) também haverá uma incongruência entre os limites do pedido e a sentença, mas nesse caso não há como se aplicar o dispositivo legal em razão da previsão de seu caput. Não haverá nesse caso decisão desde 12 logo de mérito, porque constatando o tribunal ser a sentença ultra petita anula-se apenas a parte excedente da decisão. A segunda hipótese de julgamento imediato do mérito da ação pelo tribunal no julgamento da apelação é a sentença citra petita, quando o juízo de primeiro grau deixa de decidir um ou mais dos pedidos formulados pelas partes. Nesse caso, a previsão do art. 1.013, §3º, III, do Novo CPC, permite ao tribunal a complementação do julgamento, passando a enfrentar de forma originária os pedidos que deixaram de ser decididos em primeiro grau em razão da omissão do juiz singular. Mais uma vez a novidade legislativa contraria a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema na vigência do CPC/1973 (NEVES, Daniel Assumpção Amorim. Manual de Direito Processual Civil. Volume único. 9. ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2017. p. 1.655). Em outro aspecto, a ideia expressa no inciso IV, que estabelece a possibilidade de anulação de uma sentença devido à falta de fundamentação, diz respeito ao dever do juiz de abordar todas as questões relevantes, tanto em relação à matéria de fato quanto de direito. Isso é fundamental para que a decisão tomada possa ser devidamente justificada, servindo como base para recursos como a apelação, pois avaliar se uma sentença é justa ou não só é possível com base nos motivos apresentados pelo magistrado. Assim, se o juiz não explica de forma racional ou não torna evidentes as razões na redação da fundamentação, a parte afetada pode apelar alegando que a sentença não tem fundamento suficiente ou contém erro no procedimento interno. Em consequência, será responsabilidade do tribunal superior anular a sentença e, se o processo já estiver em condições de ser decidido imediatamente, resolver o caso imediatamente. Uma outra inovação introduzida pelo novo CPC se refere ao parágrafo quarto do seu artigo 1.013, que aborda explicitamente a possibilidade de o tribunal julgar o mérito da causa diretamente, quando reformar uma sentença que reconheça prescrição ou decadência, sem necessidade de enviar os documentos de volta ao primeiro grau: §4º Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou prescrição, o tribunal, se possível julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau. Isso só é possível, no entanto, caso a causa esteja em condições de ser imediatamente julgada, ou seja, não haja necessidade de dilatação probatória com relação às questões que serão tratadas. 13 Cabe mencionar a recente e constante aplicação do referido parágrafo nas decisões jurisprudenciais: APELAÇÃO CÍVEL. ENSINO PRIVADO. AÇÃO DE COBRANÇA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NÃO CORROBORADA. APLICAÇÃO DO REGRAMENTO DO ARTIGO 1.013, §4° DO CPC/2015.CAUSA MADURA. - PARA QUE SEJA CARACTERIZADA A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE, NO ÂMBITO DO PROCESSO CIVIL, NECESSÁRIO O PREENCHIMENTO DE DOIS REQUISITOS: 1) QUE O CREDOR RESTE INERTE, DEIXANDO DE PRATICAR ATOS PROCESSUAIS, BEM COMO 2) QUE A AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO PERDURE PELO MESMO PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DA AÇÃO PRINCIPAL. - NO CASO CONCRETO, NÃO SE VERIFICOU DESÍDIA DA PARTE AUTORA, QUE IMPULSIONOU O PROCESSO A TODO MOMENTO DESDE O SEU AJUIZAMENTO, REALIZANDO INÚMERAS DILIGÊNCIAS NA TENTATIVA DE CITAÇÃO DO DEMANDADO. - DESCONSTITUIÇÃO DA SENTENÇA PORQUANTO NÃO CORROBORADA A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. - ANÁLISE COM BASE NO ART. 1013, §4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - ANTE A DESCONSTITUIÇÃO DA DECISÃO E AFASTAMENTO DA PRESCRIÇÃO, REMANESCE MATÉRIA IMPUGNADA NA ORIGEM, AINDA SEM APRECIAÇÃO JURISDICIONAL. APLICAÇÃO DO REGRAMENTO DO ARTIGO 1.013, §4° DO CPC/2015, VEZ QUE SE TRATA DE QUESTÃO EM CONDIÇÕES DE IMEDIATO JULGAMENTO. - NO CASO DOS AUTOS, EMBORA A RÉ TENHA ALEGADO QUE TENTOU REALIZAR O CANCELAMENTO DA MATRÍCULA JUNTO A INSTITUIÇÃO DE ENSINO, POR TELEFONE, NÃO HÁ QUALQUER ELEMENTO PROBATÓRIO APTO A EMBASAR AS SUAS ALEGAÇÕES, ÔNUS QUE LHE CABIA, A TEOR DO ART. 373, II, DO CPC. À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO APELO PARA DESCONSTITUIR A SENTENÇA EXTINTIVA E, COM BASE NO ARTIGO 1013, §4º, DO CPC, JULGARAM PROCEDENTE A AÇÃO. (Apelação Cível, Nº 50012244920128210019, Vigésima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Helena Marta Suarez Maciel, Julgado em: 28- 03-2023) Dos ensinamentos do ilustre Cássio Scarpinella Bueno, extraímos as seguintes considerações sobre o referido texto legal: O art. 1.013 amplia sensivelmente também as hipóteses até então regradas pelo art. 515, §3º, do CPC de 1973, e a possibilidade de julgamento de mérito pelo tribunal, independentemente de reenvio dos autos à primeira instância nos seus verdadeiramente didáticos §§ 3º e 4º. 14 Assim é que o Tribunal, de acordo com o §3º do art. 1.013, poderá enfrentar o mérito desde logo, sem necessidade de retorno do processo à primeira instância, nas hipóteses de o processo (na verdade, o mérito) estar em condições de imediato julgamento e quando se tratar de decisão terminativa, isto é, que não tenha apreciado o mérito (art. 485); quando se tratar de liminar a decisão ao pedido e/ou à causa de pedir, invalidando, destarte, o extrapolamento da decisão extra ou ultra petita, ou de complementar pedido não julgado (decisão infra ou citra petita) ou, por fim, quando se tratar de nulidade de sentença por falta de fundamentação, o que traz à tona o rico referencial dos §§ 1º e 2º do art. 489. Sobre a ausência de fundamentação, aliás, não é desnecessário lembrar do inciso II do parágrafo único do art. 1.022, que prevê a pertinência dos embargos de declaração para suprir aquele vício. Não há razão, contudo, para atrelar a aplicação do inciso IV do §3º do art. 1.013 à rejeição de prévios declaratórios para aquela finalidade. O §4º do art. 1.013, por sua vez, evidencia o que boa parte da doutrina já sustentava ser possível no CPC de 1973, de enfrentar o mérito no âmbito da apelação quando reformada sentença relativa à prescrição e/ou decadência (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 935-936). Seguindo essa perspectiva, o prestigiado professor Daniel Assumpção Neves também oferece uma explicação ampla do instituto: Para que seja aplicada a teoria da causa madura nos termos do art. 1.013, §3º, I, do Novo CPC, o processo deve estar em condições de imediato julgamento. Nesse caso, sendo anulada a sentença terminativa, poderá o tribunal passar ao julgamento originário do mérito da ação. Nesse caso, a sentença é anulada e não reformada como previsto no dispositivo legal ora comentado, cabendo ao tribunal, após julgar o mérito recursal, passar a julgar, de forma originária, o mérito da ação. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a regra não afronta o princípio da ampla defesa, nem mesmo impede a parte de obter o prequestionamento, o que poderá ser conseguido com a interposição de embargos de declaração. […] A aplicação da regra ora comentada se mostra dependente exclusivamente de uma circunstância: sendo anulada a sentença de primeiro grau em razão do equívoco do juiz em extinguir o processo sem a resolução do mérito, o tribunal passará ao julgamento imediato do mérito sempre que o único ato a ser praticado for a prolação de uma nova decisão a respeito do mérito da demanda. Havendo qualquer outro ato a ser praticado antes da prolação da nova decisão, o tribunal deverá devolver o processo ao primeiro grau de jurisdição. Em razão disso, é inaplicável o art. 1.013, §3º, I, do Novo CPC na hipótese de indeferimento da petição inicial (art. 330 do Novo CPC) (NEVES, Daniel Amorim Assumção. Manual de Direito Processual Civil. Volume único. 9. ed. Salvador: JusPodivm, 2017. p.1.652-1.653). 15 Conforme o entendimento de Humberto Theodoro Júnior "A teoria da causa madura teve grande influência na evolução do processo civil, permitindo a aceleração do processo e, assim, possibilitando a obtenção de uma justiça rápida e efetiva.”3 Assim, a teoria da causa madura no direito evoluiu ao longo do tempo, passando por diversas transformações e adaptações para se adequar às necessidades e às mudanças no campo jurídico, com base nas doutrinas e jurisprudenciais aqui explanadas. 2.3 Aplicabilidade da Teoria da Causa Madura Conforme mencionado no tópico anterior, o artigo 1.013, § 3º do CPC, determina que teoria da causa madura se aplica aos processos que estiverem em condições de imediato julgamento. Deste modo, o caput do artigo supracitado, se refere a possibilidade de aplicação da teoria ao recurso de apelação. Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. [...] § 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: I - reformar sentença fundada no art. 485; II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir; III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo; IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação (grifo nosso) Ainda, sobre aplicação da teoria no recurso de apelação, cabe mencionar a jurisprudência atual sobre o tema: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. USO EXCLUSIVO DE IMÓVEL. CONDOMÍNIO. TEORIA DA CAUSA MADURA. ART. 1.013, § 4º, DO CPC/2015. APLICAÇÃO. SUFICIÊNCIA DE PROVAS. 1.Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. A controvérsia resume-se a definir se, ao julgar a apelação para afastar a prescrição do fundo de direito, o Tribunal de origem poderia apreciar o mérito da demanda com base no art. 1.013, § 4º, do CPC/2015. 3. A teoria da causa madura pode ser aplicada quando o tribunal reforma a sentença 3 JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2018. 16 que reconhece a prescrição ou a decadência, desde que a demanda esteja em condições de imediato julgamento, sem a necessidade de dilação probatória. 4. Nas hipóteses, as provas colhidas nos autos da ação divisão – todas submetidas ao contraditório e à ampla defesa em cognição exauriente – são suficientes para a apreciação dos pedidos de ressarcimento material formulados na ação indenizatória. 5- Recurso especial não provido. (STJ - Resp: 1845754 es 2018/0145918-0, relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, data de julgamento: 24/08/2021, T3 - Terceira Turma,data de publicação: DJe 31/08/2021) (grifo nosso) Seguindo esse critério, tal teoria também se aplica ao recurso ordinário, tendo em vista a determinação do artigo 1.027, § 2º do Código de Processo Civil: “Aplica-se ao recurso ordinário o disposto nos arts. 1.013.” Sobre o assunto o ilustre Elpídio Donizetti disserta (2020): Ao recurso ordinário em sentido estrito aplica-se a teoria da causa madura, assim como ocorre na apelação. Deste modo, se a causa estiver em condições de imediato julgamento, deve o STJ decidir desde logo o mérito nas hipóteses mencionadas no § 3º do art. 1.013 4 Ainda, no que tange ao agravo de instrumento, por muito tempo pairou grande controvérsia sobre a aplicação de tal teoria ao recurso, porém, após a decisão do Recurso Especial nº 1.215.368/ES possibilitando sua aplicação, não foram proferidas decisões em sentido contrário: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFERIMENTO DE LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS. VÍCIO DE FUNDAMENTAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TEORIA DA CAUSA MADURA (ART. 515, § 3º, CPC). APLICABILIDADE. 1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública movida contra diversos sujeitos alegadamente envolvidos em licitações superfaturadas de medicamentos e material hospitalar em que está implicada a Prefeitura Municipal de Cachoeiro do Itapemirim. A indisponibilidade de bens requerida na Petição Inicial foi deferida pelo Juízo de 1º Grau e submetida a Agravo de Instrumento. 2. O Tribunal de origem reconheceu a apresentação de argumentos genéricos, mas aplicou a teoria da causa madura (CPC, art. 515, § 3º), supriu o vício de fundamentação e manteve a decisão recorrida. 3. A recorrente sustenta impossibilidade de o Tribunal a quo aplicar o art. 515, § 3º, do CPC em Agravo de Instrumento, amparando-se em precedentes do STJ que tratam da matéria de forma sucinta. [...] 5. A doutrina admite aplicação do art. 515, § 3º, do CPC aos Agravos de Instrumento (Dinamarco, Cândido Rangel. A reforma da reforma, 6ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, pp. 162-163; Wambier, Teresa Arruda 4 DONIZETTI, Elpídio. Curso de Direito Processual Civil. São Paulo: Editora Atlas, 2020. 17 Alvim. Os agravos no CPC brasileiro, 4ª ed., São Paulo: RT, 2006, pp. 349-350; Rogrigues, Marcelo Abelha. Manual de Direito Processual Civil, 5ª ed., São Paulo, RT, pp. 643-644; Alvim, J. E. Carreira. Código de Processo Civil reformado, 7ª ed., Curitiba, Juruá, 2008, p. 351). 6. Particularidades do caso concreto recomendam a aplicação da teoria, sem que haja prejuízo ao contraditório, à ampla defesa e ao dever de fundamentação [...]. (REsp 1215368/ES, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 01/06/2016, DJe 19/09/2016) Assim, cabe mencionar a aplicação recente dessa posição nas decisões dos tribunais de justiça: BANCÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA, CUMULADA COM DANO MORAL. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA. PEDIDO DE EXCLUSÃO DO NOME DO AUTOR DO CADASTRO DE INADIMPLENTES. DECISÃO QUE DEFERIU A TUTELA DE URGÊNCIA PARA DETERMINAR A ABSTENÇÃO DOS DESCONTOS REALIZADOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO AUTOR. DECISÃO EXTRA PETITA. JUIZ QUE DEVE DECIDIR A LIDE NOS LIMITES EM QUE PROPOSTA (CPC, ARTS. 141 E 492). DECISÃO CASSADA. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TEORIA DA CAUSA MADURA EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. APRECIAÇÃO IMEDIATA POR ESTE TRIBUNAL DO PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA PARA EXCLUSÃO DO NOME DO AUTOR DOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO (CPC, ART. 1.013, § 3º, INCISO II). PRECEDENTES DO STJ E DESTE TRIBUNAL. AUSENTE PROBABILIDADE DO DIREITO DO AUTOR E PERIGO DE DANO DE DIFÍCIL OU INCERTA REPARAÇÃO (CPC, ART. 300). EM JUÍZO DE COGNIÇÃO SUMÁRIA, AUSENTES INDÍCIOS DE QUE A ANOTAÇÃO NEGATIVA OCORREU DE FORMA INDEVIDA OU DE QUE TENHA OCORRIDO FRAUDE NA CONTRATAÇÃO DO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO OBJETO DA LIDE. MATÉRIAS QUE DEMANDAM UMA ANÁLISE COM MAIOR PROFUNDIDADE DE COGNIÇÃO PELO JUÍZO SINGULAR, APÓS CONTRADITÓRIO E EVENTUAL DILAÇÃO PROBATÓRIA. TUTELA INDEFERIDA. RECURSO PROVIDO.Com fundamento na teoria da causa madura, também aplicável ao recurso de agravo de instrumento, nos termos do artigo 1.013, § 3º, inciso II, do Código de Processo Civil, possível a análise imediata do pedido de concessão da tutela provisória de urgência apresentado pelo autor na petição inicial, máxime porque não depende de produção de outras provas nesta fase processual e em sede de cognição sumária. Por outras palavras significa dizer que pode desde logo ser decidida pelo tribunal, sem necessidade de retorno ao juízo de primeiro grau de jurisdição. (TJPR - 16ª Câmara Cível - 0072261-73.2022.8.16.0000 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR LAURO LAERTES DE OLIVEIRA - J. 26.03.2023) (grifo nosso) 18 AGRAVO DE INSTRUMENTO - INTEMPESTIVIDADE CONTRARRAZÕES- NÃO CONHECIMENTO - DESENTRANHAMENTO DA PEÇA - DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA - CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - NULIDADE - CAUSA MADURA - POSSIBILIDADE EXAME DO MÉRITO - URGÊNCIA NA APRECIAÇÃO DO PLEITO - CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL - SUPOSTOS DEFEITOS EXISTENTES NA COISA QUE INVIABILIZAVAM O SEU USO EM CONFORMIDADE COM A FINALIDADE PERSEGUIDA - LAUDO DE VISTORIA INICIALMENTE ASSINADO POR AMBAS AS PARTES - POSTURA QUE SINALIZA, EM PRINCÍPIO, CONCORDÂNCIA QUANTO À SITUAÇÃO DO IMÓVEL - QUESTIONAMENTOS POSTERIORES A RESPEITO DO ESTADO DA COISA LOCADA - INCOMPATIBILIDADE ENTRE A ANUÊNCIA INICIAL E O POSTERIOR DESAGRADO MANIFESTADO - NÃO COMPROVAÇÃO QUE OS SUPOSTOS DEFEITOS INVIABILIZARAM O USO NORMAL - CENÁRIO FÁTICO NEBULOSO - CONTAS DE ÁGUA EM NOME DA LOCATÁRIA MESMO APÓS A DEVOLUÇÃO DAS CHAVES - DESVINCULAÇÃO DO NOME DA EX-INQUILINA DA UNIDADE CONSUMIDORA - RECURSO AO QUAL SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. - Considerando que a juntada da peça de contrarrazões se deu após o prazo quinzenal previsto no art. 1.019, inciso II, do CPC, conforme, inclusive, certificado pelo diligente Cartório, inviável o conhecimento da referida peça. - Tendo em vista que o pronunciamento judicial ora impugnado não observou os imperativos de fundamentação, impactando o próprio contraditório que deve haver entre o juiz e as partes, tem-se que a referida decisão é irremediavelmente nula. - A Corte Especial do STJ, no bojo do REsp 1215368/ES, considerou ser possível a aplicação do princípio da causa madura também em sede de agravo de instrumento, apoiando-se, sobretudo, nos princípios da celeridade, economia processual e efetividade do processo. E considerando que no presente caso a parte agravante/autora juntou aos autos os documentos que entende suficientes para, nesta fase inicial do feito, evidenciar a probabilidade do direito alegado, além de reclamar, com urgência, o deferimento das medidas pleiteadas, tem-se por viável o exame do mérito à luz do princípio da causa madura. - Considerando que a parte agravante/locatária não logrou demonstrar, com a segurança exigível, que o rompimento antecipado da avença locatícia, por supostos defeitos existentes no imóvel, deu-se por culpa da locadora, inviável se mostra exonera-la do pagamento dos alugueis proporcionais pelo tempo que exerceu a posse, aí incluídos os acessórios da locação e multa rescisória. Destarte, a inscrição restritiva dos órgãos de proteção ao crédito não pode ser tida, em princípio, como irregular. - Tendo sido demonstrado nos autos que as chaves do imóvel foram entregues à ré na data de 18/07/2022, não tendo mais os autores a posse do bem desde então, inexistem motivos para que as faturas de consumo de água continuem apresentando como titular da unidade consumidora, os ex-locatários. - Recurso ao qual se dá parcial provimento 19 (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.22.255214-3/001, Relator(a): Des.(a) Lílian Maciel, 20ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 15/03/2023, publicação da súmulaem 16/03/2023) (grifo nosso) Sendo assim, consoante as conclusões acima explanadas, e ainda, seguindo o entendimento da obra de Daniel Amorim Assumpção Neves (2018, p. 1655), a regra é cabível a todo e qualquer recurso, especialmente ao agravo de instrumento. 20 3. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO 3.1 Breve conceito e evolução histórica A ampla defesa e o contraditório têm sua origem na Inglaterra, durante o período medieval. Naquele momento, o julgamento das questões era feito de forma arbitrária pelo rei ou por autoridades locais, e não havia espaço para a defesa. No Brasil, o direito à ampla defesa e ao contraditório data da época colonial, quando as Ordenações Filipinas estabeleceram o direito ao julgamento justo. Com a Independência, a Constituição de 1824 consolidou a garantia ao contraditório e à ampla defesa. Em 1934, a Constituição Federal previu a ampla defesa em seu artigo 113 e, em 1946, o direito foi ampliado com a inclusão do contraditório no artigo 141 da Constituição. Mas foi com a Constituição de 1988 que a ampla defesa e o contraditório passaram a ter uma importância ainda maior. A Carta Magna garante o direito do acusado de se defender em todas as fases do processo, com os meios e recursos que lhe são assegurados por lei. Além disso, a Constituição garante a publicidade dos processos e proíbe a utilização de provas obtidas de forma ilegal. Atualmente, a ampla defesa e o contraditório estão previstos no artigo 5, inciso LV da Constituição Federal e são considerados pilares do sistema jurídico brasileiro, presentes em diversos dispositivos legais, como o Código de Processo Penal e o Código de Defesa do Consumidor. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (grifo nosso) Em suma, o princípio da ampla defesa assegura ao indivíduo o direito de se defender de acusações ou demandas judiciais apresentando argumentos, provas e testemunhas. Já o princípio do contraditório estabelece a possibilidade de contradizer as 21 acusações e provas apresentadas pela parte adversa, garantindo assim um julgamento justo. De acordo com a Constituição Federal, ninguém poderá ser considerado culpado sem o devido processo legal, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. Tal garantia é considerada essencial para a proteção dos direitos individuais e para assegurar a isonomia entre as partes envolvidas no processo judicial. Nessa perspectiva, cabe mencionar os seguintes entendimentos doutrinários sobre o tema: O princípio do contraditório e da ampla defesa garantem o direito à participação e à argumentação, visando à busca da verdade processual. A contraditoriedade assegura o direito das partes de influenciarem na decisão final através de seu prévio conhecimento e de sua impugnação dos elementos de prova produzidos, ao passo que a ampla defesa resguarda a possibilidade de o acusado deduzir plenamente as suas razões defensivas, tendo-se em vista a presunção de inocência e a limitação do poder punitivo estatal.5 O contraditório e a ampla defesa se complementam e se reforçam reciprocamente. O primeiro assegura que as partes do processo tenham a oportunidade de falar, argumentar, produzir provas e contradizer os argumentos e provas da parte adversa. Já a segunda garante que a parte acusada tenha a possibilidade de se defender em todas as etapas processuais, apresentando suas razões, seus argumentos, suas provas e seus testemunhos.6 (grifo nosso) Em resumo, o princípio da ampla defesa e do contraditório são fundamentais para garantir que todo indivíduo tenha direito à defesa em qualquer processo judicial e administrativo do qual faça parte, possibilitando uma análise justa dos fatos apresentados. Outrossim, o princípio do duplo grau de jurisdição começou a se desenvolver de maneira mais significativa no sistema jurídico inglês. No final do século XII, os tribunais de apelação foram estabelecidos na Inglaterra para revisar as decisões dos tribunais inferiores. Esse sistema permitiu que as partes insatisfeitas com uma decisão de primeira instância recorressem a uma instância superior para obter uma nova análise do caso. Esse desenvolvimento foi crucial para o desenvolvimento do princípio do duplo grau de jurisdição. 5 Borges, Ana Paula Lisboa; Ferreira, Marco Aurélio. Manual de Prática Forense Penal. Editora JH Mizuno, 2018. Pág. 89 6 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 38. ed. São Paulo: Atlas, 2018. 22 Na maioria dos sistemas jurídicos contemporâneos, como o brasileiro, o princípio do duplo grau de jurisdição é amplamente reconhecido e protegido como um direito fundamental. A inclusão desse princípio em convenções internacionais e constituições nacionais reforçou sua importância e aplicação. O princípio do duplo grau de jurisdição garante às partes envolvidas em um processo judicial o direito de recorrer da decisão de primeira instância a uma instância superior. Esse princípio está intimamente relacionado ao direito fundamental de acesso à justiça, ao devido processo legal, bem como, aos princípios da ampla defesa e contraditório desenvolvidos acima. O duplo grau de jurisdição assegura que, após uma decisão ser proferida por um juiz de primeira instância, as partes insatisfeitas com essa decisão possam recorrer a um tribunal de segunda instância (ou instâncias superiores) para revisar a decisão e analisar novamente o caso. Isso permite que a parte que se sente prejudicada tenha uma nova oportunidade de ter sua demanda ou defesa reavaliada por uma instância judicial diferente. Esse princípio tem o objetivo de garantir maior imparcialidade, correção e segurança jurídica aos litigantes. Permite que erros ou injustiças cometidos na primeira instância possam ser corrigidos em uma instância superior, que conta com a participação de outros juízes, geralmente mais experientes e especializados. Nesse sentido, Fredie Didier Jr defende que O princípio do duplo grau de jurisdição constitui uma garantia fundamental do sistema processual, assegurando às partes a possibilidade de revisão de uma decisão proferida em primeiro grau por um órgão judicial hierarquicamente superior.7 Vale ressaltar que o princípio do duplo grau de jurisdição no direito brasileiro não é absoluto. Existem algumas situações em que as decisões podem ser finais e não sujeitas a recurso, como nas decisões proferidas em juizados especiais cíveis, em casos de determinadas matérias de competência originária do STF e do STJ, entre outras exceções previstas em lei. 7 Didier Jr., Fredie. Curso de Direito Processual Civil - Vol. 1. Editora JusPodivm, 2019. 23 Ainda, importante frisar que o princípio do duplo grau de jurisdição não está expressamente previsto na Constituição Federal do Brasil. O texto constitucional garante o direito à ampla defesa e ao contraditório (artigo 5º, inciso LV), mas não menciona especificamente o duplo grau de jurisdição. Contudo, embora não esteja mencionado explicitamente na Constituição Federal brasileira, ele é reconhecido como um princípio implícito e fundamental no sistema jurídico do país. Em resumo, no direito brasileiro, o princípio do duplo grau de jurisdição garante às partes o direito de recorrer das decisões judiciais proferidas em primeira instância a instâncias superiores, por meio do sistema de recursos, visando a revisão ea correção das decisões e a garantia da ampla defesa e do contraditório. 24 4 DA APLICAÇÃO DA TEORIA DA CAUSA MADURA E O PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA, CONTRADITÓRIO E DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO A teoria da causa madura e o princípio da ampla defesa e contraditório estão interligados no sistema jurídico. Enquanto a teoria da causa madura busca agilizar o processo, permitindo que o tribunal decida diretamente sobre o mérito da causa, o princípio da ampla defesa e contraditório garante às partes a oportunidade de se manifestar e apresentar seus argumentos antes de uma decisão ser tomada. Conforme mencionado, a teoria da causa madura admite a possibilidade de o processo ser apreciado diretamente pelo Tribunal, desde que sejam cumpridos os requisitos estabelecidos no artigo correspondente do Código de Processo Civil. Desta forma, tal teoria só será aplicada quando o processo já estiver “maduro”, isto é, em condições de julgamento pelo tribunal. Esclarecendo o assunto em exame, José Miguel Medina e Teresa Arruda expressa: Condições de imediato julgamento se deve entender o fato de a questão ter sido debatida pelas partes em primeiro grau de jurisdição – ou, pelo menos, de se ter verificado o contraditório -. A ponto de ser possível identificar com clareza qual é a questão de direito sobre a qual se funda o debate. (Recursos e Ações autônomas de impugnações, 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p.157 e 158). (grifo nosso) Ainda, conforme lesiona Cândido Dinamarco, essa exigência está diretamente ligada a observância dos princípios constitucionais que garantem o devido processo legal: A aplicação do artigo 515, § 3º (CPC de 73) depende de estritamente estar o processo já pronto para o julgamento do mérito. Tal exigência liga-se visivelmente às garantias integrantes da tutela constitucional do processo, especialmente às do contraditório e do devido processo legal. Posto isto, o entendimento doutrinário e jurisprudencial prevalecente é que a teoria da causa madura não tem condão de ofender ao princípio da ampla defesa e do contraditório. Nesse sentido, Daniel Amorim Assumpção Neves (2017): Para que seja aplicada a teoria da causa madura nos termos do art. 1.013, § 3º, I, do Novo CPC, o processo deve estar em condições de imediato julgamento. Nesse caso, sendo anulada a sentença terminativa, poderá o tribunal passar ao julgamento originário do mérito da ação. Nesse caso, a sentença é anulada e não reformada como previsto no 25 dispositivo legal ora comentado, cabendo ao tribunal, após julgar o mérito recursal, passar a julgar, de forma originária, o mérito da ação. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a regra não afronta o princípio da ampla defesa, nem mesmo impede a parte de obter o prequestionamento, o que poderá ser conseguido com a interposição de embargos de declaração. […] A aplicação da regra ora comentada se mostra dependente exclusivamente de uma circunstância: sendo anulada a sentença de primeiro grau em razão do equívoco do juiz em extinguir o processo sem a resolução do mérito, o tribunal passará ao julgamento imediato do mérito sempre que o único ato a ser praticado for a prolação de uma nova decisão a respeito do mérito da demanda. Havendo qualquer outro ato a ser praticado antes da prolação da nova decisão, o tribunal deverá devolver o processo ao primeiro grau de jurisdição. Em razão disso, é inaplicável o art. 1.013, §3º, I, do Novo CPC na hipótese de indeferimento da petição inicial Isto significa que tal teoria não viola o princípio do devido processo legal, já que há a possibilidade de apresentação de contrarrazões ao recurso, que garantem os princípios do contraditório e da ampla defesa, evitando que a parte seja surpreendida com uma decisão de mérito sem ter conhecimento prévio da ação. Dessa forma, é fundamental que a aplicação da teoria da causa madura seja feita com cautela, a fim de não violar o direito das partes à ampla defesa e ao contraditório. Isso significa que as partes devem ter a chance de se manifestar sobre os pontos relevantes da causa, oferecer provas, contrapor argumentos e participar ativamente do processo, antes que uma decisão final seja proferida pelo tribunal. Portanto, infere-se que a aplicação cuidadosa da teoria da causa madura é exigida pelo princípio da ampla defesa e do contraditório, visando assegurar que as partes tenham a oportunidade plena de participar do processo e expressar suas posições antes que uma decisão final seja proferida pelo tribunal. Assim, a teoria da causa madura deve ser aplicada de forma a conciliar a necessidade de celeridade processual com a garantia do devido processo legal e da participação efetiva das partes. Outrossim, há um debate em relação à possibilidade de essa teoria extinguir a instância inicial da jurisdição, uma vez que nela o processo é discutido pelos tribunais, o que caracterizaria um duplo grau de jurisdição. A corrente predominante argumenta que o duplo grau de jurisdição é um princípio constitucional, e não uma garantia, e não é obrigatoriamente incorporado no direito fundamental de ampla defesa previsto no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal de 1988, nem representa um direito processual fundamental por si só. É por esse motivo que 26 o duplo grau admite exceções e o legislador pode estabelecer restrições ao sistema de reexame de decisões judiciais, desde que haja uma ponderação adequada dos princípios envolvidos. Quanto a flexibilização do duplo grau de jurisdição cabe mencionar a lição de Antonio Carlos de Araújo Cintra: [...] cabendo ao tribunal de apelação verificar, em cada caso, se a causa está madura para o julgamento do mérito, desde logo, pelo próprio tribunal. Apenas no caso negativo voltariam os autos ao primeiro grau de jurisdição. Assim, se evitaria dano para a celeridade e economia processual, com uma concepção mais flexível do duplo grau de jurisdição. No mesmo sentido lesiona Cândido Dinamarco: Há de considerar ainda que o duplo grau possui índole ideológica, pois permite uma melhor reflexão sobre a decisão e também pedagógica, uma vez que condiciona o juízo a quo a atentar sobre a legalidade de sua decisão. Entretanto, em que pese a relevância dessas questões, é plenamente justificável a relativização de tal preceito, desde que feita com responsabilidade e observando-se os limites legais, visto que intenciona-se a celeridade processual e a entrega de uma prestação jurisdicional justa e eficiente.8 É importante destacar a posição do Supremo Tribunal Federal, que reconhece a possibilidade de flexibilização do princípio do duplo grau de jurisdição sem incorrer em nulidade do processo, como foi decidido no caso do AI n. 601.832 AgR, o qual interpretou tratados internacionais em relação à legislação brasileira. AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL PENAL. ALEGAÇÃO DE OFENDA AO ARTIGO 5º, PARÁGRAFOS 1º E 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO E CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. EMENDA CONSTITUCIONAL 45/04. GARANTIA QUE NÃO É ABSOLUTA E DEVE SE COMPATIBILIZAR COM AS EXCEÇÕES PREVISTAS NO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL. PRECEDENTE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IGUALDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. (...) 3. Contudo, não obstante o fato de que o princípio do duplo grau de jurisdição previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos tenha sido internalizado do direito doméstico brasileiro, isto não significa que esse princípio revista-se de natureza absoluta. 4. a própria 8 DINAMARCO, Cândido Rangel. Duplo Grau de Jurisdição no Direito Processual Civil. São Paulo: RT, 1995, p. 159. 1995, pág. 159. 27 Constituição Federal estabelece exceções ao princípio do duplo grau de jurisdição. 9 Assim,os métodos que permitem ao órgão ad quem julgar diretamente o mérito não são considerados supressão de instância ou violação ao duplo grau. Mesmo que as razões já apresentadas sejam insuficientes para justificar a constitucionalidade deste sistema, o artigo 1.013, parágrafo 3º, é presumido constitucional e, portanto, sua aplicação não pode ser negada e permanece vigente. Outra razão pela qual a alegação de supressão de instâncias não é válida é a relação entre a teoria da causa madura e a extensão do efeito devolutivo dos recursos. A amplitude da devolução ao tribunal ad quem é determinada pela escolha do recorrente e a profundidade é uma consequência natural da amplitude. O tribunal fica limitado apenas à parte contestada da decisão, mas o efeito devolutivo em profundidade permite que todas as questões relacionadas à parte contestada sejam transferidas para o tribunal ad quem. Ao concluir que a teoria da causa madura está intimamente relacionada ao efeito devolutivo, é evidente que a apresentação de um recurso é suficiente para que o tribunal julgue a questão imediatamente, dentro dos limites estabelecidos, mesmo que o assunto não tenha sido completamente analisado no julgamento anterior. Essa lógica nega qualquer objeção com relação à aplicação do artigo 1.013, parágrafo 3º, sob a justificativa de supressão de instância. 9 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AI nº 601.832 AgR; Relator (a) Min. Joaquim Barbosa; Segunda Turma; Julgado em 17/03/2009; DJ 02/04/2009. http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=584974 28 5 CONCLUSÃO Mediante as considerações expostas no decorrer do presente trabalho acadêmico, observa-se que a teoria da causa madura e o princípio da ampla defesa e contraditório desempenham papéis importantes no sistema jurídico, particularmente no processo civil. A teoria da causa madura busca promover a eficiência e a celeridade processual, permitindo que o tribunal decida diretamente sobre o mérito da causa, sem a necessidade de retorno à instância inferior. No entanto, é crucial garantir que a aplicação da teoria da causa madura seja realizada em conformidade com o princípio da ampla defesa e contraditório. Esse princípio garante às partes o direito fundamental de se manifestar, apresentar argumentos e provas, e participar ativamente do processo antes que uma decisão final seja proferida. Para conciliar esses dois aspectos, é fundamental que o tribunal assegure que as partes tenham a oportunidade efetiva de se manifestar sobre os pontos essenciais da causa antes de uma decisão final ser tomada. Isso implica em permitir o contraditório e a ampla defesa, garantindo que as partes tenham tempo suficiente e oportunidade de apresentar seus argumentos, contrapor os argumentos da outra parte e oferecer provas pertinentes. Assim, a teoria da causa madura e o princípio da ampla defesa e contraditório são princípios que se complementam, buscando um equilíbrio entre a eficiência processual e a garantia dos direitos fundamentais das partes envolvidas no processo. Portanto, cabe ao órgão julgador avaliar cuidadosamente se os elementos do processo são suficientes para a aplicação da teoria da causa madura e, ao mesmo tempo, garantir que as partes tenham a oportunidade de se manifestar sobre as questões relevantes para a solução do litígio. Em caso de dúvida, é recomendável que o órgão julgador solicite mais informações às partes ou determine a produção de provas complementares, a fim de garantir a adequada instrução do processo e a observância dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. 29 REFERÊNCIAS BRASIL. Código de Processo Civil. Lei no 5.869, de 11.01.1973. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5869.htm. Acessado em: 20 de maio 2023. BRASIL. Código de Processo Civil. Lei no 13.105, de 16.03.2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acessado em: 20 de maio 2023. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 23 maio 2023. BORGES, Ana Paula Lisboa; Ferreira, Marco Aurélio. Manual de Prática Forense Penal. Editora JH Mizuno, 2018. CASTRO, AMANDA SOUZA DE. Teoria da causa madura no novo Código de Processo Civil. 2018. Disponível em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52104/teoria-da-causa-madura-no novo-codigo-de-processo-civil. Acesso em: 01 abr 2023. COÊLHO, Marcus Vinicius Furtado. Arts. 332 e 1.013 do CPC - Teoria da Causa Madura. 2022. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/coluna/cpc- marcado/373480/arts-332-e-1-013-do-cpc--teoria-da-causa-madura. Acesso em: 30 de maio 2023. Didier Jr., Fredie. Curso de Direito Processual Civil - Vol. 1. Editora JusPodivm, 2019. DINAMARCO, Cândido Rangel. Duplo Grau de Jurisdição no Direito Processual Civil. São Paulo: RT, 1995 30 DONIZETTI, Elpídio. Curso de Direito Processual Civil. São Paulo: Editora Atlas, 2020. JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2018. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 38. ed. São Paulo: Atlas, 2018 NEVES. Daniel Amorim Assunção. Manual do Direito Processual Civil. Salvador: Editora JusPODIVM, 2018. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo código de processo civil comentado. Salvador: Editora JusPodivm, 2016.