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,, i! I' O Romance das Equações Algébricas Copyright© 1997, MAKRON Books do Brasil Ltda. Todos os direitos para a língua portuguesa reservados pela MAKRON Books do Brasil Editora Ltda. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, guardada pelo sistema "retrieval" ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio; seja este eletrônico, mecânico, de fotocópia, de gravação, ou outros, sem prévia autorização, por escrito, da Editora. EDITOR: MILTON MIRA DE ASSUMPÇÃO FILHO Produtor Gráfico: José Roberto Petroni Editoração e fotolitos em alta resolução: JAG Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Gilberto Geraldo Garbi, O Romance das Equações Algébricas / Gilberto Geraldo Garbi ; - São Paulo Makron Books, 1997. ISBN 85-346-0730-3 .l Este livro por traumas p Matemática pod 'i 1.i il ''/ !' 16 O Romance das Equações Algébricas Cap. V Ilustração 5.2: Pitágoras, de Samos e, depois, Crotona (David Smith Collection). Neste ponto de nosso relato é importante esclarecermos o leitor que este livro não tem condições de abordar de uma forma abrangente todo o desenvolvimento histórico da Matemática, embora o estudo de tal matéria seja altamente recomendado. O que está sendo contado restringe-se aos fatos e personagens ligados mais diretamente às Equações Algébricas e objetiva facilitar o entendimento de como se deu a evolução de nosso tema central ao longo do tempo. Por isso, matemáticos e episódios maravilhosos serão passados ao largo sempre que não tenham estado na rota principal das Equações Algébricas. Agora voltemos a Pitágoras. Quando ele demonstrou que em um triângulo retângulo vale a relação produziu-se, pela primeira vez na Europa, uma equação do 2° grau, com um atraso de pelo menos 1200 anos em relação ao que já havia acontecido na Babilônia. O que houve na Grécia Clássica, entre os séculos VI e II antes de Cristo, pode ser resumido numa palavra: milagre. Jamais existirá o risco de exagero ao dedicar-se elogios às realizações do espírito grego em tal período e é quase impossível expl agricultores, ma hoje, passados 1 Fídias, a arquite o ideal da Demc disposição de p€ levantar probler intelectuais sem tudo aquilo, enfi Após Tale e os teoremas f e a Grécia prodm conhecimento e Elementos, con: Não se sabe 01 grego. Talvez t revelou seu talei do Nilo (Egito) clássica. e ··8·.·· / �; Ilw Cap. XI François Viete Recorre à Trigonometria 57 p Este resultado é correto e pode-se demonstrar que é equivalente ao obtido por Tartaglia, embora pareçam diferentes. Permaneciam, entretanto, todas as dúvidas sobre quantidades de raízes e operações com números complexos quando A<O. Viête debateu-se com equações como a famosa x 3 - 1 Sx - 4 = O , ( cujas raízes, todas reais, não podiam ser achadas pela fórmula de Cardano ou pela que ele próprio deduzira, pois implicavam trabalhar com números "imaginários") até que, num lampejo de genialidade, encontrou uma solução trigonométrica para o problema. O caminho, como não poderia deixar de ser, tratando-se de Viête, foi uma substituição de incógnitas. Estamos lembrados de que a Fórmula de Cardano foi achada por Tartaglia fazendo-se a substituição x =A+ B. No método trigonométrico de Viête faz-se a substituição x = k cos0. Seja x 3 +px+q = O (kcos0)3 + p(kcos0) + q = O cos3 0+_p_ cos0+� = O k2 k3 Como grande conhecedor de trigonometria, Viête sabia que ( ) 3 cos30 cos30 = COS0 4cos 2 0- 3 OU COS 3 0 - 4 COS0 - - 4 - = Ü Assim, fez as seguintes equivalências: 70 O Romance das Equações Algébricas Cap. XII Matemática. Seu mais famoso livro, Discurso Sobre o Método de Bem Utilizar a Razão e de Encontrar a Verdade nas Ciências, publicado em 1.637 (um ano após a carta de Fermat a Roberval) trouxe como apêndice um trabalho denominado La Géométrie e que é considerado a pedra fundamental da Geometria Analítica. Ilustração 12.2: René Descartes - 1.596-1.650 (Mansell Collection). 72 O Romance das Equações Algébricas Cap. Xll figura 12.2 X pode-se demonstrar que os valores x e y estão relacionados pela equação Ax+By+C = O onde A, B e C são constantes características daquela reta em particular. Quando o ponto P(x,y) se encontra sobre uma circunferência, como na figura 12.3, a equação que relaciona x e y é (x - a)2 + (y - b ) 2 = r 2 , onde a e b são as coordenadas do centro e r o raio da circunferência. 6 y b .... a (x-a) 2 + (y-b)2 = r2 X figura 12.3 X E assim, elipses, parábolas, hipérboles, enfim, curvas das mais diversas naturezas, passaram a ser tratadas através de equações, o que abriu um horizonte inesgotável para as pesquisas matemáticas, inclusive para o próprio conhecimento 6 Este fato já era conhecido pelos Babilônios há quase 4.000 anos. 80 O Romance das Equações Algébricas Cap. XIII Assim, partindo de um contato com um livro de Astrologia em 1.663 e após um mergulho de pouco mais de um ano nos melhores livros de Matemática que pôde encontrar, Newton realizou em dois anos (1.665 e 1.666) as maiores descobertas até então feitas na Matemática e na Física desde que o homem começara a pensar. Tinha, então, menos de 24 anos e, em suas próprias palavras, encontrava-se no auge de sua idade inventiva e ocupava-se daquelas duas ciências mais do que o fez em qualquer outra época. Como poder-se-ia esperar, sua personalidade era bastante distinta daquilo que se encontra normalmente e não devemos fazer qualquer avaliação de caráter pessoal sobre um homem necessariamente excêntrico e cuja vida transcorreu em uma época em que os valores sociais eram totalmente diferentes dos de hoje. Isto precisa ser dito porque, inevitavelmente para quem atinge as proporções míticas por ele alcançadas, Newton acabou por receber alguns julgamentos que arranharam sua imagem sobrenatural. As razões principais foram: a obsessiva relutância em publicar o que descobria, confidenciando-o apenas a um pequeno círculo de amigos; uma triste polêmica que travou com Leibiniz quanto à primazia na invenção dos cálculos diferencial e integral; e os longos esforços que dedicou à alquimia e a questões de fundo místico-religioso. É fato que Newton produzia muito mas publicava pouco, procurando, de todas as formas, evitar as discussões e contestações que sempre surgem quando alguém descobre algo novo. Sua maior obra, Philosophiae Naturalis Principia Mathematica, considerado o mais importante livro científico de todos os tempos, somente foi publicada, em 1.687, por insistência de seu amigo Edmond Halley (o astrônomo que emprestou seu nome ao chamado Cometa de Halley), mais de 20 anos após as descobertas nela contidas terem sido feitas. Realmente, o desejo de ser deixado em paz em seus estudos e de guardar excessivo segredo de seus trabalhos era um traço eventualmente neurótico mas este é um detalhe ínfimo em alguém que foi tão grande e que tanto bem trouxe à Humanidade. A polêmica com Leibniz foi um episódio lamentável ocorrido entre duas pessoas maravilhosas. É indiscutível que Newton inventara o cálculo diferencial (que ele chamava de fluxões) em 1.665. Entretanto, nada divulgou a respeito, apenas circulando seus papéis entre um pequeno grupo de íntimos. Em 1.684, Leibniz publicou a mesma idéia, hoje acredita-se desenvolvida independentemente, e isto deu origem à disputa. Seguramente Newton não desejava qualquer polêmica mas o caso converteu-se em questão de honra ós Je es m LS, as lo er m !S te ra 10 la à le o a ,, o o e s [l s 1 ', ·, 1 ) l Cap. XIII Newton Entra em Cena 81 patriótica entre ingleses e alemães e Newton viu-se envolvido em um episódio em que as ofensas proferidas de parte a parte merecem seresquecidas. Ilustração /3.2: Edmond Halley, o astrônomo amigo de Newton, que o convenceu a escrever os Principia. É, também, verdade que Newton dedicou grandes esforços e consumiu muito tempo em estudos teológicos e experiências com alquimia. Ora, sendo estes dois campos um território muito mais místico do que científico, alguns entenderam que tal interesse pudesse, no mínimo, significar certo desequilíbrio da parte do incomparável sábio. Ninguém tem condições de emitir qualquer julgamento a este respeito e o melhor que as pessoas comuns devem fazer é acreditar que um homem excepcional como ele, capaz de ver e sentir o que outros não conseguiam, seguramente· possuía motivos válidos para conduzir tais estudos. Infelizmente, o objetivo deste livro não permite que se fale muito mais sobre a vida e a obra de Isaac Newton. Entretanto, é importante relatar algumas características básicas de sua genialidade porque elas nos trazem grandes ensinamentos. A rapidez com que ele fazia suas descobertas e os caminhos que seguia nos raciocínios permitem-nos concluir ter sido ele dotado de uma l l ) Cap. Xlll Newton Entra em Cena 89 A secante PP' forma com o eixo dos x o ângulo <I> de tal forma que tg<I> = Liy / Lll. A reta tangente à curva forma com aquele eixo o ângulo 0. Mas 0 é o ângulo ao qual tende o ângulo <I> quando P' se aproxima cada vez mais de P. Dizemos, então, que 0 é o limite ao qual tende o ângulo <I> quando P' tende a P ou, o que é o mesmo, quando LU. tende a zero. Em simbologia matemática escrevemos: tg0 = lim tg<I> = lim Liy / LU. 6"�0 6"�0 Em cada ponto da curva, em geral, existe uma tangente diferente, ou seja, para cada valor de x existe um valor de tg0 . Esta nova função de x, a saber, tg0 , é denominada a "função derivada" da função y = f(x) e é representada por y' ou f'(x). Os valores LU. e Liy são, respectivamente, as diferenças das abcissas e das ordenadas dos pontos P' e P e a relação Liy/LU. é chamada de coeficiente diferencial. Este conceito bastante simples de tendência a valores ou linhas limites teve conseqüências gigantescas pois, a partir dele, construíram-se o Cálculo Diferencial e o Cálculo Integral, com incontáveis aplicações na Matemática Pura, na Física, na Engenharia e em outros ramos do conhecimento. Quem por primeiro desenvolveu o Cálculo Diferencial, que é o estudo das funções derivadas, foi Newton mas ele declarou em um manuscrito que sua idéia baseara-se no método inventado por Fermat para o traçado de tangentes e que fôra a causa da di:;puta entre ele e Descartes, até que este reconheceu que o advogado achara uma solução melhor que a sua. É bastante fácil demonstrar que a derivada da soma de várias funções é a soma das derivadas de cada uma delas. É, também, simples provar que a derivada da função Y = ax n é y' = naxn-l Se não, vejamos: por definição 90 O Romance das Equações Algébricas Cap. XIII y' = lim L1y I .1x t.x�O [a(x + füc_füc)º - axº J y' = lim t.x�O y'= lim t.x�o ax" +( � )ax"-'âx +(; )ax"-'(8x)'+ ... +a(Áx)" -ax" L'.1X ( � )ax"_, 8x + (; )ax "-' (âx)' + ... +a(8x)" y'= lim t.x�o füc Quando fazemos füc tender a zero, todas estas parcelas, exceto a primeira, se anulam. Assim É, também, evidente que a derivada de qualquer valor constante é zero. Estes conhecimentos nos bastam para explicar o Método de Newton mas é difícil acreditar que um Primeiro Ministro possa ter sido ensinado sobre isto durante um jantar e, mais ainda, que tenha compreendido ... Agora, o Método. Encontrar as raízes da equação f(x) = O é achar os pontos onde o gráfico da função y = f (x) corta o eixo dos x (pois, ali, y =O) 92 O Romance das Equações Algébricas Cap. X/ll ou -y 0 = x 1 tg0-x 0 tg0 X 1 = X0 - y O / tg0 Mas tg0 = f'(x 0 ) e y 0 = f(x 0 ). Portanto Esta fórmula pertence à família das chamadas fórmulas de recorrência, pois, dada a função f, calculada sua derivada f' e tomado x0 como ponto de partida, calcula-se x1, para, em seguida, partindo-se de x1 e recorrendo-se à mesma fórmula, calcular-se x2: e assim por diante em uma seqüência que somente termina quando estivermos satisfeitos com a aproximação obtida. O Método de Newton é realmente brilhante porque, em princípio, aplica-se a qualquer função e não apenas às funções algébricas. Ele pode, por exemplo, ser empregado em equações tão estranhas quanto x + e-x + cos x = O Entretanto, uma de suas limitações é que somente as raízes reais são pesquisáveis por ele. Além disso, há circunstâncias em que a seqüência 94 O Romance das Equações Algébricas Cap. XIII primeiros termos da equação são positivos e crescentes para x>O. Se x = 1, sua soma vale 13, menor do que 20. Se x = 2, tal soma é 36, maior do que 20. Portanto, uma da raízes está entre 1 e 2 e podemos começar com xo = 1,5. Neste caso f(x) = x 3 +2x2 +lOx- 20 f'(x) = 3x2 + 4x + 10 X1 = 1,5 - 2,875/22,75 = 1,3736263736 X2= 1,3736263736 - 0,1017886829/21,155053737 = 1,36881481963 X3 = 1,36881481963 - 0,00014159349/21,09622130981 = 1,36880107 que é o resultado correto até à 8ª casa decimal. Em apenas 3 ciclos foi obtida esta impressionante aproximação e é por isto que o Método continua atual até os dias de hoje, depois de ter sido simplificado pelo matemático Raphson (1.690). Quanto aos critérios desenvolvidos por Newton para a pesquisa de raízes, dois deles merecem atenção especial. Suponhamos, por exemplo, que se deseje saber se o número 17 pode ser raiz da equação x7 + 12x6 - l0x 5 + 2lx 4 - 9x 3 + 6x 2 + 3x + 68 = O. Realizar a simples substituição de x por 17 e verificar se o resultado é zero é um procedimento correto mas extremamente trabalhoso e sujeito a erros ( 17 7 é o número 410.338.673 e leva-se bastante tempo para calculá-lo aritmeticamente). Entretanto, Newton descobriu uma forma prática de testar possibilidades valendo se do fato de ser muito fácil elevar os números 1 e -1 a qualquer potência inteira. Se um número R é raiz de uma equação polinomial P(x) =O , então P(x) = (x- R)Q(x) , onde Q(x) é um polinômio de grau imediatamente abaixo do de P(x). Fazendo-se x = 1 e x = -1 tem-se 96 O Romance das Equações Algébricas Cap. XIII P(l) = -Q(l) + P(m) m-1 m-1 e P(-1) = -Q(-1) + P( m) m+l m+l Basta que P(m) seja divisível por m - l e por m + 1 para que m passe pelo teste sem ser raiz. Para finalizar, falemos sobre as chamadas cotas inferiores e superiores. Seja, por exemplo, a equação x9 -8x 8 +3x7 +5x 6 +3x 5 +2x4 -l lx3 +2x2 +l lx+2 1 =0. Observando-a atentamente vemos que ela pode ser assim reescrita: x8 (x-8)+3x7 +5x6 +3x5 +2x 3 ( x-� 1)+2x2 +l lx+2 1 = O Para qualquer x> � 1 , 2x3 (x-� 1 )>0 .Para qualquer x>8, x2 (x-8))0. Como 8 > 1 1 / 2 , então para qualquer x > 8 não pode haver raízes daquela equação pois o valor do polinômio sempre será > O. Neste caso, dizemos que L = 8 é uma cota superior das raízes daquela equação, significando que para todo x>L, P(x)>O. A simples observação, como acabamos de fazer, nem sempre permite a determinação de uma cota superior pois, em geral, é difícil ou impossível visualizar diretamente, nos polinômios, relações que indiquem limitações para suas raízes. Neste caso deve-se proceder por tentativas. Seja o polinômio P(x) = a0x º + a,x º-1 + ... +a 0 _ 1 x + a 0 • Dividindo-o por um binômio x -L tem-se Se encontrarmos um valor de L que faça todos os bi e R(resto) positivos, então P(x) > O para qualquer x > L. O dispositivo de Briot-Ruffini permite o encontro de tal L partindo de um valor qualquer, por exemplo 1 , e aumentando-o sucessivamente, 2,3 ,4,etc., até que somente sejam obtidos valores positivos. Cap. XIII Newton Entra em Cena 97 Seja a equação x5 -2x4 + 3x 3 -7x2 -8x + 23 = O e procuremos uma cota superior de suas raízes 1 -2 3 -7 -8 23 1 1 -1 2 -5 -13 10 2 1 o 3 -1 -10 3 3 1 1 6 11 25 98 Como, a partir de 3, todos os números são positivos, L = 3 é uma cota superior. Para encontrarcotas inferiores, basta um pequeno artifício. Seja o polinômio P(x) e, nele, substituamos x por -x. Teremos, então, um polinômio P(-x) que, igualado a zero, produzirá uma nova equação, para a qual já sabemos como calcular uma cota superior de raízes, digamos L. Significa que, na nova equação, as raízes reais são sempre x < L , ou seja, -x , raiz da equação original, é sempre > -L. Este valor - L é, evidentemente, uma cota inferior da equação original, costumeiramente representada por l. Usando o mesmo exemplo, calculemos uma cota inferior de x5 - 2x 4 + 3x 3 - 7x 2 - 8x + 23 = O. Fazendo a substituição de x por -x temos a equação x5 - 2x4 + 3x 3 - 7x2 -8x + 23 =O, para a qual procuraremos uma cota superior L. 1 2 1 1 1 2 3 4 3 6 11 7 13 29 -8 5 50 -23 -18 82 Sendo L = 2 uma cota superior da nova equação, l = -2 é cota inferior da equação original. Portanto, as raízes reais de x5 -2x4 + 3x 3 -7x2 -8x + 23 = O estão situadas entre -2 e +3. Esta informação facilita bastante a determinação das raízes por métodos numéricos. E aqui termina nossa breve visita ao grande Isaac Newton, o homem que abriu as portas do mundo científico e tecnológico em que vivemos hoje. �. -----------------· -_;p CAPÍTULO XIV MAKRON Books • EULER DOMINA OS NÚMEROS COMPLEXOS O passeio que temos feito pelo país das Equações Algébricas pennitiu-nos, até aqui, conhecer alguns personagens fascinantes do romance da Matemática, cada um com suas características peculiares: Ahmes, o mais antigo dos autores cujo nome a História registrou; Tales, o rico comerciante que teve o coração conquistado pela Geometria; Pitágoras, o primeiro a perceber que o mundo fala a linguagem dos números; Euclides, o maior dos sintetizadores; Al-Khwarizmi, o pai da Álgebra; Leonardo Fibonacci, o primeiro cristão a escrever sobre o método hindu-árabe; Cardano, o brilhante mau-caráter; Tartaglia, o pobre menino autodidata que venceu as equações do 3° grau; Bombelli, o destemido manipulador dos números complexos; Fermat, o advogado dos números; Descartes, o unificador da Geometria à Álgebra; Newton, o descobridor das Leis do Cosmos. Agora, neste capítulo, seremos apresentados a alguém que, além de ter sido indiscutivelmente o matemático que mais produziu e publicou em todos os tempos, não encontra termo de comparação quanto a suas características de encantadora pessoa humana: o suíço Leonhard Euler (pronuncia-se Óiler), de quem foi dito que "calculava com a facilidade com que os outros respiram". Leonhard Euler nasceu em Basiléia, Suíça, no ano de 1. 707, quando o Cálculo, inventado por Newton e Leibniz, ainda expandia suas fronteiras e proporcionava aos estudiosos inúmeras e inesperadas aplicações. Foi discípulo de Jean Bernoulli, o mesmo que ajudou Leibniz a difundir as idéias do Cálculo em 98 100 O Romance das Equações Algébricas Cap. XIV Ilustração 14.2: Jean Bernoulli, que propôs a Newton o problema da Braquistócrona, professor de Euler (David Smith Collection). Euler era gentil, bem humorado, afável e generoso. Nada escondia de suas pesquisas e as publicava sem ciúmes ou receios. Somente não publicou, e foi muito, aquilo que as editoras não conseguiram dar vazão durante sua fecunda vida produtiva. Estima-se que sua obra ultrapasse 800 trabalhos versando sobre Cálculo, Teoria dos Números, Álgebra, Mecânica, Óptica, Teoria das Probabilidades, Topologia (interessantíssimo ramo da Matemática que estuda as propriedades das posições e onde as figuras não têm formas ógidas), cálculo das variações, música, números complexos, etc. Esta torrente matemática que jorrava de seu cérebro era concebida em um ambiente que nada tinha de frio, fechado ou mesmo silencioso: Euler era o Cap. XIV Euler Domina os Números Complexos /OI paciente pai de 13 filhos e escrevia ao mesmo tempo em que os atendia a todos. Um amigo que presenciara sua vida doméstica disse: "Uma criança no colo, um gato sobre o ombro, assim escrevia ele suas obras imortais". O grande Laplace, que ocupa destacada posição dentre os maiores de todos os tempos, dizia aos matemáticos mais novos: "Leiam Euler, leiam Euler, é o mestre de todos nós!" Ilustração 14.3: Pierre-Simon de Laplace, grande matemático francês, profundo admirador de Euler (Jean-Louis Charmet). É impossível sintetizar em alguns parágrafos a obra de um gigante de suas proporções. Por isso, ficaremos restritos a apenas 3 de seus trabalhos que mais diretamente estão relacionados às Equações Algébricas, tema deste livro: a Simbologia (Notação), o número "e" (Número de Euler) e os Números Complexos. Comecemos pela Simbologia (Notação). Quando vemos hoje uma equação - ----- - ----- 102 O Romance das Equações Algébricas Cap. XIV ser escrita, por exemplo, ax 2 + bx + c = O ou a raiz quadr�da de um núm�ro ser simbolizada por J , imaginamos que as coisas tenham sido sempre assim. Na realidade, esta simbologia é relativamente mo�ema pois até o século XVI a soma era representada por p (plus) e não por+ e a subtração por m (minus) e não por - , sem falar de outras operações mais complicadas como raízes, potências, etc. O sinal da multiplicação x foi introduzido em 1631 pelo inglês Oughtred (autor de um dos livros estudados por Newton em seu mergulho matemático); Descartes foi o primeiro a representar potências na forma ab; a raiz quadrada era indicada pelas letras Rq até ser expressa por F em 1526; os sinais > (maior) e < (menor) surgiram em 1631, e assim por diante. Para que se tenha uma idéia de como a simbologia moderna tomou mais clara a visualização e o tratamento dos problemas basta mostrar como a equação 3x2 + 5x = 21 seria representada no passado por alguns matemáticos famosos: Rudolff (1525) Bombelli (1572) François Viete (1590) René Descartes (1637) John Wallis (1693) sit3 Z + 5 � aequatus 21 2 1 u u 3 p 5 Eguale á 21 3Q + 5N aequatur 21 3ZZ+ 5Z a21 3XX+ 5X= 21 A equação do 3° grau 2x 3 + 5x = 17 seria assim expressa por Cardano: 2cub'p:5reb'ae q lis 17 Acrescente-se a isto que as obras científicas, até inícios do século XIX, vinham escritas em Latim e pode-se imaginar o sofrimento dos estudantes em sua tentativa de entender e enxergar os fatos matemáticos na obscuridade dos livros 104 O Romance das Equações Algébricas Cap. XIV este crescimento teria algum limite caso os créditos dos juros fossem sendo feitosem períodos cada vez mais curtos: anualmente, semestralmente, semanalmente,diariamente, a cada hora, minuto, segundo, etc. Sim, existe um limite e o estudodeste problema levou ao chamado número e, assim definido: e = lim(l + !)n n�oo n Ilustração 14.4: Jacques Bernoulli, irmão de Jean Bernoulli, cuja pergunta sobre juros deu origem ao número e (David Smith Collection). 106 O Romance das Equações Algébricas Cap. XJV de um ângulo 0, batizado de argumento. Chamando "'1a2 + b2 de p , batizado de módulo, o número Z pode ser expresso pela fórmula z = p( cose + i sen e) Imagine-se, agora, dois números complexos Z1 e Z2 Z 1 = p 1 (cos8 1 +isene i ) Z 2 = p 2 ( cos 0 2 + i sen 0 i) Multiplicando-os, obtém-se e como i2 = -1 Ora, lembrando que e tem-se Este é um resultado importantíssimo: quando se multiplicam dois números complexos, multiplicam-se os módulos e somam-se os argumentos (ângulos). 108 O Romance das Equações Algébn·cas Cap. XIV Elevando à potência n tem-se (n) ° = p'n (cosn<1>+.i sen n<1>) Para que este resultado seja igual a Z= p(cos0+isen�) é necessário e suficiente que, simultaneamente, p'n=p p'=w {cos nq> = cos 0 sen n<I> = sen 0 Nossa primeira tentação é concluir, apressadamente, através das duasúltimas igualdades, que nq> = 0 mas isto é apenas uma parte da verdade. O fato de serem cosnq> = cos0 e sen nq> = sen0 não significa que os ângulos sejam iguais. Se eles diferirem entre si por um número inteiro de 21t radianos as igualdades desenos e cossenos também estarão asseguradase este é ponto fundamental doraciocínio. Assim, conclui-se que: n<I> = 0 + 2k7t (onde k é um inteiro qualquer) ou Como se vê, fazendo variar k (inteiro) vão sendo obtidos diferentes valoresde <I>, ou seja, diferentes raízes enésimas do número Z. Mas, se k é qualquerinteiro, haverá então infinitas raízes? Não , e isto é fácil de ser compreendido.Façamos k tomar sucessivamente os valores 0,1,2,3, ........ ,n-1,n,n+l,n+2, etc. evejamos o que acontece. k <I> o <I>, 1 <1>2 2 <1>3 3 <1>4 e n =: +( 2:) =: +2( 2:) =: +3( 2:) Cap. XIV Euler Domina os Números Complexos /09 n-1 <I> n e (2n)= n +(n-1) � n <l>n+l =e+ n( 27t) =e+ 21tn n n n+l e ( 2n) e ( 2n) <l>n+z = n + (n + 1) � = n + � + 21t A partir de k = n os ângulos começam a diferir entre si por múltiplos inteiros de 2 7t, ou seja, as raízes enésimas p' (cos<I> + isen<I>) passam a se repetir, de modo que somente n delas são distintas e a belíssima descoberta de Euler estádemonstrada. Como seriam, na prática, as extrações de raízes cúbicas, por exemplo? Consider�mos os números 8 e -8 8 = a + ib = 8 + iO a=8 b=O o sen0=-;::::===Ü.Jg2 + 02 :. e= zero 110 O Romance das Equações Algébricas Cap. XIV 8 cos0=--;:::=== 1,J32 + 02 p = ,J32 + 02 = 8 Portanto, as 3 raízes cúbicas de 8 são: :. p' = 2 1/8 = 2(coH+( 2 3n)J+isen[�+( 2 ;)]) = 2(-½+: f (-1 +-Í3i) 2(coH+z(2;)J+isen[�+z(2;)])= 2(- � +: }(-hfü) -8 = a+ib = -8+i0 a=-8 b=O o sen e = -;=== = o,J32 + o2 -8 cose=--;:::=== -1 ,J32 + 02 p = ,J32 + 02 = 8 e as raízes cúbicas de -8 são: :. e= n :. p'= 2 Cap. XIV Euler Domina os Números Complexos 111 2(cos; +isen ;) = 2( ½+:} (1+v'Ji) � = i(c0{; +(2;)J+isen[; +(23�)]) = 2(-!+0i)= -2 i(co{; +i(2;)J+isen[; +2(2;)])= 2(½-:} (1-v'Ji) Finalmente, depois de quase 200 anos, aprendera-se a extrair raízes de números complexos, aquele mistério que intrigou Bombelli e tantos outros que haviam tentado aplicar a fórmula de Cardano nos casos em que �<0. O achado de Euler revolucionou a teoria das Equações Algébricas que, a partir de então, ganhou novo impulso, conforme será visto adiante. Embora seja este o fato que mais nos interesse no momento, porque estamos tratando da resolução de equações, é preciso ser dito que Euler fez outras descobertas ainda mais admiráveis no reino dos números complexos. Uma delas acabou por produzir a mais bela equação de toda a Matemática. A fórmula de de Moivre diz que (cose+ i sen0)" = cos(n0)+ i sen(n0) Se chamarmos cos 0 + isen 0 de f( 0 ), a fórmula citada pode ser reescrita [f(e)r = f(n0) Ora, sabemos bastante bem que esta é uma propriedade das funções exponenciais pois, por exemplo, [f(b )r = f(nb) e isto pode ter levado Euler a conjecturar que cos 0 + isen 0 , embora não o pareça à primeira vista, deveria ser algum tipo de função exponencial com variáveis complexas. Através de um método que será exposto no capítulo final deste livro, MAKRON Books • • CAPÍTULO XV GAUSS DEMONSTRA O TEOREMA FUNDAMENTAL DA ÁLGEBRA Quem foi o maior matemático de todos os tempos? Levantar esta interessante pergunta é tão inevitável quanto impossível é dar a ela uma resposta absoluta. Afinal, como comparar matemáticos que, por terem vivido em épocas distintas, herdaram de seus antecessores níveis totalmente diferentes de conhecimentos acumulados, a partir dos quais puderam realizar seus trabalhos? E ninguém menos do que o próprio Newton declarou, certa vez, com excessiva modéstia mas com grande propriedade: "Se enxerguei mais longe foi. porque me apoiei sobre ombros de gigantes". Portanto, qualquer avaliação relativa que se deseje fazer dos talentos dos grandes matemáticos jamais poderá ultrapassar os limites da subjetividade e, assim, estará exposta às mais diversas críticas e contestações. Apesar disto, é tentador conjecturar sobre o tema e vamos fazê-lo sob todos os riscos. É opinião predominante no mundo científico que Isaac Newton foi o maior intelecto já produzido pela Humanidade em razão daquilo que fez, conjuntamente, nos campos da Matemática e da Física. Entretanto, considerada isoladamente sua monumental obra matemática, ele pode ter sido igualado ou mesmo superado por dois outros gigantes: Arquimedes, que viveu no século m A.C., e o alemão Carl Friedrich Gauss (1.777-1.855), visto por muitos como o maior matemático de todos os tempos. Rivalizar com o sábio inglês no campo da Matemática é privilégio de pouquíssimos mas o que será relatado sobre Gauss demonstra que o alemão realmente dispunha de credenciais para tanto embora, em seu modesto julgamento 113 114 O Romance das Equações Algébricas Cap. XV pessoal, tenha sempre se considerado abaixo de Newton e Arquimedes. Carl Friedrich Gauss nasceu em Brunswick em 1. 777, filho de um rude trabalhador braçal que, mesmo sendo uma pessoa honesta e dedicada à farm1ia, não conseguia compreender os anseios intelectuais do filho . Felizmente, para este e para o mundo, sua mãe, Dorothea, malgrado a pequena escolaridade, era uma mulher de grande lucidez e não poupou esforços para que o menino tivesse o desejado acesso aos estudos. Quando falamos da genialidade de Newton, comparâmo-lo, com propriedade, a Mozart, em razão da inspiração divina de que ambos pareciam ser dotados. Entretanto, se a precocidade for levada em conta, o verdadeiro Mozart da Matemática foi Gauss, cujos feitos na mais tenra infância tornaram-se lendários. Aos 3 anos de idade já corrigia as desastradas contas feitas pelo pai. Aos 9, tendo o professor ordenado à classe que somasse os números de 1 a 50, observou que 1+50, 2+49, 3+48, etc., totalizavam sempre 51. Como o número de tais pares era 25 (com 50 números, formam-se 25 pares), a soma procurada era 51 x 25 = 1275 produto que, aliás, calculou de cabeça. Aos 12 anos discutia os axiomas dos Elementos, aos 13 percebeu que o postulado das paralelas poderia ser formulado diferentemente do que o fizera Euclides ( anos mais tarde pesquisou profundamente a matéria e incursionou bastante no território das geometrias não euclidianas), aos 15 elaborou a primeira demonstração rigorosa do teorema geral das potências binomiais, coisa que Newton descobrira mas não provara satisfatoriamente. Estas proezas não tardaram a chegar aos ouvidos do Duque de Brunswick, Ferdinand, que passou a custear os estudos de Gauss nas melhores escolas até seu doutoramento, gesto pelo qual o matemático demonstrou sempre a maior gratidão. Como se não bastassem seus excepcionais dons matemáticos, Gauss era também um prodígio lingüistico, analogamente a Euler, dominando com facilidade um grande número de idiomas. Aliás, até sua entrada na Universidade de Gõttingen, aos 18 anos, ainda não optara entre a Matemática e a Filologia somente vindo a fazê-lo por um acontecimento ocorrido em 29/05/1.795 e que hoje é considerado um marco histórico: naquele dia Gauss demonstrou como construir, com régua e compasso, um polígono regular de 17 lados, coisa insuspeitada desde a Grécia Clássica. E foi mais além: provou que aquelas construções são possíveis quando os números dos lados dos polígonos são primos da forma 2 2" + 1 , de modo que são também construtíveis com régua e compasso 116 O Romance das Equações Algébricas Cap. XV Ilustração /5./: Carl Friedrich Gauss - 1.777-1.855 (Mary Evans Picture Library). Quando se estuda a obra matemática da Gauss tem-se a sensação de que em todos os campos onde atuou ele não apenas fez o melhor possível mas, também, nada deixou para que outros, no futuro, viessem a superá-lo. Assim, por exemplo, aconteceu com seu doutoramento, aos 21 anos, em 1.799, quando apresentou o que ainda hoje é considerado a maior tese de doutorado em Matemática de todos os tempos. Ela nos interessa diretamente por ser o mais importante dos alicerces da teoria das equações algébricas e é conhecida como o Teorema Fundamental da Álgebra (denominação dada pelo próprio Gauss). Este teorema afirma que toda equação polinomialde coeficientes reais ou complexos tem, no campo complexo, pelo menos uma raiz. Desde os tempos de Cardano suspeitava-se que, por exemplo, as equações do 3° grau tinham 3 raízes, as do 4° grau 4 e assim por diante. Quando Euler demonstrou que qu se estava muito p1 raízes das equaçõc enunciar que elas t lo. O mais famo: le Rond d' Alembe uma prova do refei Teorema de d'Al inteligência e ale� sociedade francesa humilde. Filho ile d' Alembert foi aba Jean le Rond, pró:x orfanato para, algi conhecimento de q por eles abandonad seu país, vez ou ou valor, fraqueza que teve que vencer m característica, que temporariamente e divergência em tor de uma corda tet amadurecido pela , ao Imperador Fredi desde longa data, q matemático oficial , A obra de d') e inspirou uma lon� Laplace, Legendre perplexidade pelo demonstração inq1 adicionalmente, o d' Alembert anos ar certo em suas afirm 216 O Romance das Equações Algébricas Cap. XXlll relação ao tamanho da Terra, consegue-se ver o que acontece ( como o Sol estámuito distante, seus raios podem ser considerados paralelos). . . . .. . . �e ... • .l- ... . . . . . · .. .. figura 23.2 Lu�do Sol Luz do Sol É fácil ver que o ângulo que o raio do Sol faz com a vertical em Alexandriaé exatamente o ângulo, sobre um círculo máximo da Terra, entre Alexandria eSiena. Pela projeção da sombra, Eratóstenes não teve dificuldades em calcular que 0 era aproximadamente 7°, ou seja, cerca de 1/50 dos 360° abrangidos pelocírculo. Portanto, a circunferência da Terra deveria ser mais ou menos 50 vezes adistância entre Alexandria e Siena. Conta a tradição que Eratóstenes pagou a um escravo para que, a pé,medisse aquela distância que, multiplicada por 50, conduziu aos 40.000Km hojeconhecidos, com um erro de apenas 10%. O Novo Dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de HolandaFerreira, dá a seguinte definição para a palavra Elegância: É impossível ir nosso planeta ... O grande Eraté de números primos, 1 doença infecciosa ( e olhos, cegando-o. Pri 4. Arquim Arquimedes, indiscutivelmente o como o alemão Fefu 3 maiores matemáti, de um astrônomo, J até retomar a sua cic Como Newto empregando seus ci máquinas. Na Físic ponto de apoio e enunciado o princíI seu nome (Todo co1 para cima igual ao descobriu quando n saber se o ourives d ouro que confeccio correndo pelas ruas encontrava durante samara3968 samara3969 samara3970 samara3971
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