Buscar

Trabalho Liberdade de Expressão, censura e Licença Fundamentação legal

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 20 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 20 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 20 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Historicamente muito se discutiu sobre as formas de governo [1] e bem assim qual delas teria superioridade sobre as outras, sendo certo que neste contexto, na classificação antiga, encontraríamos três modelos, como afirmam Hamon e Troper
“Neste ponto de vista, descrever a forma de governo é indicar quem é o detentor do poder e distinguimos, assim, a monarquia, a oligarquia e a democracia. A distinção mais frequente é fundada sobre o número dos que governam, um só, todos ou alguns”.
Para os autores, em um critério qualitativo, enquanto a monarquia representa o governo de um só homem designado pela hereditariedade, a oligarquia o governo de alguns, a democracia consiste no governo de todos ou do povo [2].
No exame da classificação contemporânea, Hamon e Troper, faz observar que um homem é livre se ele faz o que quer, se ele se submete à sua própria vontade, e sobretudo, consoante ressalva, se ele é submisso às leis que contribuiu fazer. A democracia é, portanto, um sistema de liberdade porque as leis são feitas para todos que estão sujeitas a elas [3].
Ultrapassado o exame mais aprofundado a respeito dos sistemas de governo, especialmente sobre os aspectos filosóficos da democracia, que aqui não cabe fazê-lo, não se pode deixar de reconhecer a existência de direitos fundamentais às liberdades, aos direitos sociais e aos direitos difusos.
Os direitos fundamentais, como assevera Ferreira Filho, constituem direitos subjetivos de agir de acordo com a própria vontade, sem que haja qualquer impedimento por parte de quem quer que seja, daí porque nada reclamam do sujeito passivo, salvo a não oposição, enquanto que os direitos sociais dizem respeito aos chamados direitos prestacionais, ao passo que direitos difusos correspondem a interesses metaindividuais, isto é, relativo a todo um grupo de determinadas pessoas [4].
Dentre os direitos fundamentais de maior envergadura, encontramos o direito à liberdade de expressão, sendo considerado uma das maiores postulações dos homens em todos os tempos, tendo ele sido consagrado em nossa Carta Magna de 1988.
Marcelo Novelino [5] nos lembra que historicamente a liberdade de manifestação do pensamento teria surgido como uma forma de defesa contra a censura e o autoritarismo do Estado, sendo originalmente prevista no art. 8º do Bill of Rights inglês de 1689, porém foi com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 que a liberdade de expressão passou a ser consagrada de modo bem mais amplo, na forma em que tem sido contemplada nos textos constitucionais modernos.
Na medida em que o indivíduo vive em sociedade, possui naturalmente a necessidade de exprimir suas convicções, ideias, opiniões, buscando, a par disso, propagá-las sob as mais variadas formas, de modo que a liberdade de pensamento, enquanto liberdade intelectual, envolve o direito dele exprimir tudo aquilo que pensa acerca da ciência, religião, futebol, arte, política, e outros vários temas, mediante os mais diversos meios de comunicação, não se sujeitando à censura ou mesmo licença prévia, o que é próprio do Estado democrático de Direito (art. 5º, IX da CF) [6], observando-se, porém, os respectivos limites.
A liberdade de expressão atinge a qualidade da comunicação, seja ela de ideias, pensamentos, informações e mesmo expressões gestuais, havendo quem defenda com fervor a tese estapafúrdia de que o regime democrático permite que os indivíduos tenham o direito de agir ilimitadamente, e por isso mesmo possam veicular, escrever, dizer ou publicar suas opiniões, qualquer que seja seu conteúdo, já que a censura não é admitida, ou ainda fazer qualquer coisa também sem quaisquer limites, o que não encontra amparo, já que completamente desarrazoado.
O Estado democrático de Direito pressupõe não apenas a organização político-constitucional e estrutura administrativa, o respeito à liberdade de pensamento e, portanto, ao convívio pacífico das mais diversas ideias antagônicas e ao pluralismo de opiniões, mas sobretudo o inarredável respeito à Constituição enquanto Lei Fundamental, assim como a todas as demais leis infraconstitucionais existentes no ordenamento jurídico.
Daí, se é correta a afirmativa de que todos têm o direito de expressar livremente seu pensamento, não menos certo é que seu efetivo exercício deve guardar respeito aos limites constitucionais e legais que lhes são igualmente impostos, sob pena de responsabilização decorrente dos excessos e abusos cometidos, que em nada se confunde com a censura prévia, como uns e outros procuram propagar erroneamente.
No atual cenário, frequentemente inúmeros indivíduos utilizam os mais diversos meios de comunicação para expressar suas opiniões repletas de conteúdos ofensivos, disseminar discursos de ódio, propagar palavras de incitação à violência, buscando, amparo, a seu juízo, no direito constitucional à liberdade de expressão, que se traduz como a exteriorização de pensamento, como se este direito fundamental fosse revestido de natureza absoluta, o que não passa de equívoco profundo defendido por muitos, haja vista as limitações impostas igualmente pela Constituição.
Por essa razão, as transgressões ao que estabelecido na Constituição enseja a respectiva reprimenda, já que, não à toa, Paulo Branco [7], com feliz acerto, fez anotar que
“[...] a proibição de censura não obsta, porém, a que o indivíduo assuma as consequências, não só cíveis, como igualmente penais, do que expressou”.
Não divulgado o pensamento, frise-se, disso não se ocupa o direito visto que não haverá repercussões na órbita jurídica. Todavia, a partir do momento em que o indivíduo materializa sua opinião, expondo-a, deve respeitar a zona fronteiriça que separa o lícito do ilícito para não ofender o direito fundamental de outrem e por consequência responder civil, mediante direito de resposta e indenização), e penalmente, conforme o caso.
Assim é que, por exemplo, o companheiro que ofende física, psíquica e moralmente sua companheira, não poderá invocar, obviamente, o direito à liberdade de expressão para eximir-se de eventual responsabilidade civil e penal, já que essa garantia não constitui excludente de ilicitude. Antes, porém, sujeitar-se-á às disposições concernentes aos crimes eventualmente praticados, bem como aos mecanismos destinados à proteção da vítima previstos na Lei nº 11.340/2006, denominada de Lei Maria da Penha, tais como medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor [8], e medidas protetivas de urgência à ofendida [9], dentre outras providências.
O mesmo se diga do indivíduo que com pretenso amparo no direito à liberdade de expressão procura disseminar ideias destinadas à defesa de crimes [10], assim como aquelas tendentes à incitação à prática de atos de violência [11], incluindo-se autoridades, muitas vezes com ostentação de armas, inclusive de uso restrito, mediante induvidoso gesto intimidador, ou ainda aquelas outras tantas ideias de exaltação contrária ao funcionamento das Instituições da República, conclamando pela intervenção militar, o retorno do AI5, o fechamento do Congresso Nacional, da Suprema Corte e a deposição de seus Ministros, à margem da lei, conquanto sua conduta pode vir caracterizar qualquer dos crimes contra a honra [12] ou mesmo crimes contra as Instituições Democráticas [13] previstos na Le 14.197 97/2021 [14].
Não se pode conceber que o indivíduo pelo simples fato de viver numa democracia possa dizer ou fazer qualquer coisa que queira, sem limites, inclusive atentar contra as Instituições Republicanas, repita-se. Longe disso, a democracia não permite tamanha desfaçatez.
Aliás, o jornalista Reinaldo Azevedo [15], com bastante propriedade, assinalou que “o único regime que tudo pode é a tirania para o tirano e seus amigos, desde que estes não contrariem o tirano”, regime esse que acarreta a total subserviência dos indivíduos ao jugo do tirano a ponto de se acostumarem com a ausência de liberdade, como pontuou La Boétie [16]
“Os homens nascidos sob o jugo, depois alimentados e educados na servidão, sem olhar mais à frente, contentam-se em vivercomo nasceram e não pensam que têm outros bens e outros direitos a não ser os que encontraram. Chegam finalmente a persuadir-se de que a condição de seu nascimento é natural”.
A crença de que o direito à liberdade de expressão exercido de forma abusiva seria natural, que “não é nada de mais”, ou que representa um indiferente penal, é inconcebível, cujo ato de tolerância reiterada atenta contra a democracia e tende a desestabilizá-la, tal o mal e a desordem provocadas.
A liberdade de pensamento, é certo, constitui indubitavelmente um dos maiores pilares do regime democrático, não há nenhuma dúvida a esse respeito, e qualquer que seja sua expressão, intelectual, artística, científica ou de comunicação, deve ser exercida nos exatos limites tracejados na Constituição Cidadã 1988 [17], não constituindo a censura qualquer salvo-conduto para a prática dos mais diversos atos ilícitos por quem quer que seja, limitação essa também encontrada tanto na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 [18], quanto nas anteriores Constituições de 1824 [19], 1891 [20], 1934 [21], 1937 [22], 1946 [23], 1967 [24].
Dizemos isso porque se de um lado há o direito fundamental à liberdade de expressão, há outros direitos igualmente fundamentais como o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem que gozam do mesmo status constitucional, o que pode ensejar a chamada colisão de direitos individuais que comporta enorme discussão, muito bem lembrada por Gilmar Mendes [25], que após tecer considerações sobre o conflito, reconhece com propriedade que a liberdade de expressão não constitui direito absoluto ao asseverar
“Nas situações de conflito entre a liberdade de opinião e de comunicação ou a liberdade de expressão artística ( CF, artigo 5º, IX) e o direito à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem ( CF, artigo 5º, X), o texto constitucional parece deixar claro que a liberdade de expressão não foi concebida como direito absoluto, insuscetível de restrição, seja pelo Judiciário, seja pelo Legislativo. Não se excluiu a possibilidade de serem impostas limitações à liberdade de expressão e de comunicação, estabelecendo, expressamente, que o exercício dessas liberdades haveria de se fazer com observância do texto constitucional. Não poderia ser outra a orientação do constituinte, pois, do contrário, outros valores, igualmente relevantes, quedariam esvaziados diante de um direito absoluto e insuscetível de restrição”.
Juridicamente organizado, o Estado exige que todos comportem-se dentro das regras do jogo, respeitando a Constituição e demais prescrições legais, não lhes sendo permitido agir indistintamente a seu bel prazer, conforme sua conveniência e convicções pessoais em profundo desrespeito aos direitos dos semelhantes.
Por isso mesmo os comportamentos que ultrapassarem a fronteira do permissivo legal exigem pronta e imediata resposta de quem de direito, e mais ainda das Autoridades constituídas notadamente quando a violação atenta contra a própria democracia, não se afigurando legítimas as omissões em casos tais, já que os contínuos atos de tolerância acabam pondo em risco a própria existência do Estado, considerando os efeitos decorrentes da desordem e do caos que podem se instalar.
Em muitos casos temos observado que após os excessos absurdos cometidos, diante da repercussão causada, há quem se intitulando ser “um cara do bem”, se precipite em lançar desculpas “aos que se sentiram ofendidos”, e ainda em afirmar que “o que dissera fora tirado do contexto”, como se isso justificasse a conduta ilícita praticada, tornando-a legítima, e não merecesse a devida reprimenda.
Conquanto a Constituição não admita a censura e tampouco exija anterior licença, ressalte-se, veda o anonimato justamente com o escopo a que haja possível a identificação do autor que emitiu juízo de valor sobre determinada pessoa, a fim de que posteriormente seja permitida a respectiva responsabilização decorrente dos eventuais excessos e ou abusos cometidos, e por isso mesmo tal vedação constitucional acaba por impedir que denúncias anônimas possam servir de base para instauração de inquérito policial ou mesmo como prova reputada ilícita [26].
Quando muito, a denúncia anônima poderá servir para que as autoridades competentes, no uso legal de suas atribuições, tomem conhecimento dos fatos noticiados, cabendo-lhes a verificação sumária da veracidade ou não da informação prestada, o que deverá ser levado a efeito com as providências e cautelas pertinentes para, conforme o caso, posteriormente ensejar instauração de procedimento criminal próprio para apuração da materialidade e autoria acerca dos ilícitos relacionados, consoante Precedente do Pretório Excelso firmado no Inq 1.957, Rel. Min. Carlos Velloso, voto do Min. Celso de Mello, j. 11-5-2005, P, DJ de 11-11-2005 [27].
O direito à crítica jornalística encontra-se inserido dentro do âmbito da liberdade de pensamento, devendo igualmente ser exercida nos limites constitucionais estabelecidos, não se afigurando legítimo, nessas hipóteses, sofrer restrições por parte dos Poderes Públicos, incluindo-se o Judiciário que, conforme bem anotado por Bulos [28], não pode impor, de acordo com convicções próprias do Magistrado, cerceamentos a comentários jornalísticos de natureza política, sociológica, ideológica ou confessional, nem estabelecer padrões de conduta cuja observância implique restrição aos meios de divulgação de pensamento.
A liberdade de manifestação de pensamento em espaços públicos acerca da defesa da descriminalização de certos tipos penais, como nos casos do aborto ou do uso de drogas (maconha), não se confunde em nada com os delitos de incitação ao crime (art. 286 do CP) e apologia de crime, mas representa, em sentido diametralmente oposto, legítimo e efetivo exercício do direito de reunião, como, a propósito, entendeu o STF no Precedente concernente à denominada Marcha da Maconha decidido no julgamento da ADPF 187/DF [29].
A liberdade de expressão, contudo, não autoriza a realização de atos de violência, nem constitui reduto para a prática de quaisquer ofensas morais, como também bem decidiu o STF no ARE 891647, Rel. Min. Celso de Mello [30], tampouco tolera discurso de ódio quando se pretende incitar a discriminação racial por meio de ideias antissemitas que procuraram restaurar a concepção racial que fora estabelecida pelo então regime nazista, buscando, inclusive, negar fatos históricos devidamente comprovados, tal qual o holocausto, posto que na espécie essa conduta constitui crime não abrangido por aquela garantia [31].
O discurso do ódio ou hate speech se situa na zona fronteiriça do limite da liberdade de expressão, constituindo-se como forma de incitamento ao ódio através da prática de atos ou comunicações destinadas a inferiorizar certo indivíduo ou mesmo determinado grupo, nas palavras de João Filho [32], ou por outra, representa a manifestação de convicções destinadas a estimular a segregação e a discriminação concernente ao gênero, religião, raça, assim como aqueles grupos considerados como das minorias [33].
O Eminente Prof. Lênio Streck [34] com o brilhantismo de sempre, fez observar:
“Indagamos: No andar da carruagem, se não se fizer a diferença entre liberdade de expressão e discurso de ódio, entre liberdade de expressão e disseminar mentiras, entre liberdade de expressão e racismo, mas também entre liberdade acadêmica e negacionismo, etc, daqui a pouco será possível dizer que injúria, calúnia, difamação, além de incitação ao crime ou falsidade ideológica, etc, não seriam mais crimes, mas mera liberdade de expressão? Como se alguém tivesse o direito de mentir, de agredir, de injuriar, de infligir dor e sofrimento às/aos outros/as, ainda que com palavras [...] Em suma, vê-se que a liberdade de expressão não é incondicionada, haja vista que se a Constituição de 1988 veda, enfaticamente, toda forma de censura, não dá guarita para aqueles que levantam pretensões não validáveis discursivamente, pois não há um direito constitucional que garantao fomento de ofensas [...]”.
Destacamos ainda a enfática lição de Bobbio [35] para ilustrar o tema abordado:
“Na maioria das situações em que está em causa um direito do homem, ao contrário, ocorre que dois direitos igualmente fundamentais se enfrentem, e não se pode proteger incondicionalmente um deles sem tornar o outro inoperante. Basta pensar, para ficarmos num exemplo, no direito à liberdade de expressão, por um lado, e no direito de não ser enganado, excitado, escandalizado, injuriado, difamado, vilipendiado, por outro. Nesses casos, que são a maioria, deve-se falar de direitos fundamentais não absolutos, mas relativos, no sentido de que a tutela deles encontra, em certo ponto, um limite insuperável na tutela de um direito igualmente fundamental, mas concorrente. E, dado que é sempre uma questão de opinião estabelecer qual o ponto em que um termina e o outro começa, a delimitação do âmbito de um direito fundamental do homem é extremamente variável e não pode ser estabelecida de uma vez por todas”.
A propagação das chamadas fake news, difundida pelas milícias digitais, inclusive em período eleitoral, com nítido propósito espúrio de causar no seio do eleitorado a desinformação ou incutir psicologicamente ideias errôneas sobre determinados candidatos, seja na esfera de sua vida privada ou pública, objetivando causar-lhes rejeição e obter vantagem política na cooptação de votos, é medida odiosa e deve ser repudiada, já que extrapola os limites constitucionais da liberdade de expressão, porque se desvia de sua proteção legal inscrita na Carta Republicana e presente no espírito do Constituinte quando de sua promulgação, haja vista seu nítido caráter fraudulento a desviar da finalidade a que se destina a propaganda em ano de eleição.
Nesse sentido é que o Tribunal Superior Eleitoral poderá cassar, respeitado o devido processo legal, o registro de candidato que incidir nessa prática, consoante notícias divulgadas em diversos sites [36], como, a propósito, ocorreu no caso do Deputado Fernando D. Franceschini, que teve o mandato cassado, além de ser declarado inelegível [37], sendo certo ressalvar que o Min. Nunes Marques do Pretório Excelso, em recentíssima decisão monocrática, decidiu por suspender referido julgado da Corte Superior Eleitoral. Porém, a 2ª Turma por maioria de votos, negou referendo à liminar em tela, restabelecendo, assim, a eficácia da decisão da Corte Eleitoral [38].
Portanto, a liberdade de expressão não constitui direito absoluto, cujo entendimento pode ser encontrado em Bulos, [39], José Afonso da Silva [40], Sarmento [41], dentre tantos outros, posto que não há direito fundamental absoluto como lembra Fernandes [42].
Lembremo-nos que desde que a Constituição Federal de 1988 consolidou o restabelecimento do Estado democrático de Direito, foram assegurados diversos direitos e garantias fundamentais (art. 5º) que se concretizam para assegurar uma convivência digna, livre e igualitária entre todos os indivíduos, tornando concreta a realização da edificação de uma sociedade livre, justa e solidária, como um dos objetivos fundamentais da República (art. 3º, I).
Esta realidade propicia a sustentação da própria democracia, especialmente sob o amparo da diversidade, da pluralidade e do respeito ao próximo. Neste sentido, importante destacar a efetivação do direito à liberdade de expressão como um de seus pilares, sendo, por tal razão, consagrado na Magna Carta (art. 5º, IV, IX e 220), e igualmente previsto nas Constituições anteriores e mesmo na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, consoante ressaltado, constituindo-se, inclusive, um dos direitos fundamentais próprio ao livre desenvolvimento da personalidade e à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III).
Remate de uma das grandes conquistas do movimento Iluminista, a liberdade de expressão é, a bem da verdade, o direito de qualquer um manifestar, livremente, opiniões, ideias, pensamentos ou expressar atividades intelectuais, artísticas, científicas e de comunicação sem receios de revide ou censura do Governo ou demais indivíduos.
Dessa maneira, é possível observar que a liberdade de expressão relaciona-se com o direito à manifestação de pensamento, posto que ser direito considerado como uma base de sustentação da democracia. Sem a liberdade de expressão não há campo propício para debates, para convivência harmônica de ideias antagônicas, não há possibilidade de controlar os governantes e tampouco se afigura possível fiscalizar e supervisionar os Poderes Públicos.
Entretanto, como já esclarecido, os direitos fundamentais não são absolutos, e embora não possam ser negados, seu efetivo exercício pode e deve, justamente para que iguais direitos de outrem não sejam ofendidos, nos termos da lapidar lição de Gonçalves Filho [43].
“Os direitos fundamentais não são absolutos. Consentem na limitação que é imprescindível, a fim de que o direito de uma não esmague direitos de outros. Tal limitação há de ser mínima, visando essencialmente à preservação, para todos, de seus respectivos direitos. A ideia já está no art. 4º da Declaração de 1789, segunda parte: “O exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limite senão os que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo destes mesmos direitos”. Deflui desse texto que, se os direitos fundamentais não podem ser negados a quem quer que seja, o seu exercício pode, e deve, ser refreado na estrita medida necessária para que os direitos de outros indivíduos não sejam violentados. Compartam, portanto, um comedimento, embora este deve ser o menor possível. Tal limitação tem, portanto, um caráter coordenativo antes que restritivo”
Fato é, nesse particular, que a Constituição acertadamente proíbe a censura e não exige licença anterior (art. 5º, IX). No entanto, é válido ressaltar que a vedação à censura não implica em ausência de limites legais ou constitua uma liberdade absoluta para tudo, visto que o efetivo exercício do direito à liberdade de expressão há de igualmente respeitar as restrições existentes no Estado democrático de Direito e que são estabelecidas pela Constituição, restrições essas aptas a gerar a responsabilização cível e criminal (art. 5º, V) nos casos dos excessos e abusos cometidos consoante entendimento doutrinário dominante e jurisprudencial, nelas incluindo-se os discursos de ódio, não obstante, é certo, o subjacente amplo debate suscitado sobre quais os limites impostos à liberdade de expressão.
1 Tradução livre nossa de: De ce point de vue, décrire la forma de gouvernement, c’est indiquer qui est le détenteur du pouvoir et l’on distingue ainsi, la monarchie, l’oligarchie et la démocratie. La distinction la plus frequente est fondée sur le nombre de ceux qui gouvernent, un seul, tous ou quelqus’uns. HAMON, Francis. TROPER, Michel. Droit Constitutionnel. 32 édition. Paris: Lextenso Éditions, 2011, p. 94.
2 op. cit. p. 94.
3 op. cit. p. 97.
4 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Princípios Fundamentais do Direito Constitucional. 3º ed. Saraiva, São Paulo, 2012, p.100.
5 NOVELINO, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 9ª ed. São Paulo: Método, 2014, p. 503-504.
6 Art. 5º [...] IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença [...].
7 BRANCO, Paulo Custavo Gonet. MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 10ª ed. Saraiva, 2015, p. 265.
8 Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I – suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II – afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III – proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes eo agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V – prestação de alimentos provisionais ou provisórios. § 1º. as medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público. § 2º. Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6º da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso. § 3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial. § 4º. aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5º. e 6º. do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 ( Código de Processo Civil).
9 Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: I – encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento; II – determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor; III – determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos; IV – determinar a separação de corpos. Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras: I – restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida; II – proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial; III – suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor; IV – prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida. Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo.
10 Código Penal: Art. 287. Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.
11 Código Penal: Art. 286. Incitar, publicamente, a prática de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.
12 Código Penal: Art. 138. Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa; Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa; Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
13 Lei nº 14.197/2021: Art. 359-L. Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.
14 A Lei nº 14.197/2021 define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, revogando expressamente a Lei nº 7.170/1983 ( Lei de Segurança Nacional) e o art. 39 do Decreto-Lei nº 3.688/1941 ( Lei das Contravencoes Penais).
15 Programa “O É da coisa” veiculado pela Band News FM em 8 de setembro de 2021.
16 LA BOÉTIE, Étienne de. O discurso da servidão voluntária. São Paulo: Martin Claret, 2010, p. 43.
17 Constituição de 1988: Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] IV - e livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; [...] X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação [...].
18 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789: Art. 11. A livre comunicação do pensamento e da opinião é um dos direitos mais precisos do homem: todo cidadão pode, pois falar, escrever, imprimir livremente, salvo quando tiver que responder por abuso desta liberdade, nos casos previstos em lei.
19 Constituição de 1824: Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte. [...] IV. Todos podem communicar os seus pensamentos, por palavras, escriptos, e publical-os pela Imprensa, sem dependencia de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que commetterem no exercicio deste Direito, nos casos, e pela fórma, que a Lei determinar [...].
20 Constituição de 1891: Art. 72. A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes: (Redação dada pela Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926) [...] § 12. Em qualquer assumpto é livre a manifestação do pensamento pela imprensa ou pela tribuna, sem dependencia de censura, respondendo cada um pelos abusos que commetter, nos casos e pela fórma que a lei determinar. Não é permittido o anonymato. (Redação dada pela Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926) [...].
21 Constituição de 1934: Art. 113. A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: [...] 9) Em qualquer assunto é livre a manifestação do pensamento, sem dependência de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um pelos abusos que cometer, nos casos e pela forma que a lei determinar. Não é permitido anonimato. É segurado o direito de resposta. A publicação de livros e periódicos independe de licença do Poder Público. Não será, porém, tolerada propaganda, de guerra ou de processos violentos, para subverter a ordem política ou social [...].
22 Constituição de 1937: Art. 122. A Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no País o direito à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: [...] 15) todo cidadão tem o direito de manifestar o seu pensamento, oralmente, ou por escrito, impresso ou por imagens, mediante as condições e nos limites prescritos em lei [...].
23 Constituição de 1946: Art. 141. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: [...] § 5º. É livre a manifestação do pensamento, sem que dependa de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um, nos casos e na forma que a lei preceituar pelos abusos que cometer. Não é permitido o anonimato. É assegurado o direito de resposta. A publicação de livros e periódicos não dependerá de licença do Poder Público. Não será, porém, tolerada propaganda de guerra, de processos violentos para subverter a ordem política e social, ou de preconceitosde raça ou de classe [...].
24 Constituição de 1967: Art. 150. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] § 8º. É livre a manifestação de pensamento, de convicção política ou filosófica e a prestação de informação sem sujeição à censura, salvo quanto a espetáculos de diversões públicas, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer. É assegurado o direito de resposta. A publicação de livros, jornais e periódicos independe de licença da autoridade. Não será, porém, tolerada a propaganda de guerra, de subversão da ordem ou de preconceitos de raça ou de classe. [...]
25 MENDES, Gilmar Ferreira. Liberdade de expressão e direito de personalidade. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-set-16/direito-civil-atual-liberdade-expressao-direitos-personalidade. Acesso em: 25 de setembro de 2021.
26 Art. 5º [...] LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos [...].
27 EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. MINISTÉRIO PÚBLICO: INVESTIGAÇÃO: INQÚERITO POLICIAL. CRIME DE DISPENSA IRREGULAR DE LICITAÇÃO. LEI 8.666/93, art. 24, XIII, art. 89, art. 116. I. - A instauração de inquérito policial não é imprescindível à propositura da ação penal pública, podendo o Ministério Público valer-se de outros elementos de prova para formar sua convicção. II. - Não há impedimento para que o agente do Ministério Público efetue a colheita de determinados depoimentos, quando, tendo conhecimento fático do indício de autoria e da materialidade do crime, tiver notícia, diretamente, de algum fato que merecesse ser elucidado. III. - Convênios firmados: licitação dispensável: Lei 8.666/93, art. 24, XIII. Conduta atípica. IV. - Ação penal julgada improcedente relativamente ao crime do art. 89 da Lei 8.666/93.
28 BULOS, Uadi Lammêgo. 10ª ed. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 591.
29 [...] MÉRITO: “MARCHA DA MACONHA” – MANIFESTAÇÃO LEGÍTIMA, POR CIDADÃOS DA REPÚBLICA, DE DUAS LIBERDADES INDIVIDUAIS REVESTIDAS DE CARÁTER FUNDAMENTAL: O DIREITO DE REUNIÃO (LIBERDADE-MEIO) E O DIREITO À LIVRE EXPRESSÃO DO PENSAMENTO (LIBERDADE-FIM) – A LIBERDADE DE REUNIÃO COMO PRÉ-CONDIÇÃO NECESSÁRIA À ATIVA PARTICIPAÇÃO DOS CIDADÃOS NO PROCESSO POLÍTICO E NO DE TOMADA DE DECISÕES NO ÂMBITO DO APARELHO DE ESTADO – CONSEQUENTE LEGITIMIDADE, SOB PERSPECTIVA ESTRITAMENTE CONSTITUCIONAL, DE ASSEMBLEIAS, REUNIÕES, MARCHAS, PASSEATAS OU ENCONTROS COLETIVOS REALIZADOS EM ESPAÇOS PÚBLICOS (OU PRIVADOS) COM O OBJETIVO DE OBTER APOIO PARA OFERECIMENTO DE PROJETOS DE LEI, DE INICIATIVA POPULAR, DE CRITICAR MODELOS NORMATIVOS EM VIGOR, DE EXERCER O DIREITO DE PETIÇÃO E DE PROMOVER ATOS DE PROSELITISMO EM FAVOR DAS POSIÇÕES SUSTENTADAS PELOS MANIFESTANTES E PARTICIPANTES DA REUNIÃO – ESTRUTURA CONSTITUCIONAL DO DIREITO FUNDAMENTAL DE REUNIÃO PACÍFICA E OPONIBILIDADE DE SEU EXERCÍCIO AO PODER PÚBLICO E AOS SEUS AGENTES – VINCULAÇÃO DE CARÁTER INSTRUMENTAL ENTRE A LIBERDADE DE REUNIÃO E A LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO – DOIS IMPORTANTES PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE A ÍNTIMA CORRELAÇÃO ENTRE REFERIDAS LIBERDADES FUNDAMENTAIS : HC 4.781/BA, REL. MIN. EDMUNDO LINS, E ADI 1.969/DF, REL. MIN. RICARDO LEWANDOWSKI – A LIBERDADE DE EXPRESSÃO COMO UM DOS MAIS PRECIOSOS PRIVILÉGIOS DOS CIDADÃOS EM UMA REPÚBLICA FUNDADA EM BASES DEMOCRÁTICAS – O DIREITO À LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO: NÚCLEO DE QUE SE IRRADIAM OS DIREITOS DE CRÍTICA, DE PROTESTO, DE DISCORDÂNCIA E DE LIVRE CIRCULAÇÃO DE IDEIAS – ABOLIÇÃO PENAL (“ABOLITIO CRIMINIS”) DE DETERMINADAS CONDUTAS PUNÍVEIS - DEBATE QUE NÃO SE CONFUNDE COM INCITAÇÃO À PRÁTICA DE DELITO NEM SE IDENTIFICA COM APOLOGIA DE FATO CRIMINOSO – DISCUSSÃO QUE DEVE SER REALIZADA DE FORMA RACIONAL, COM RESPEITO ENTRE INTERLOCUTORES E SEM POSSIBILIDADE LEGÍTIMA DE REPRESSÃO ESTATAL, AINDA QUE AS IDEIAS PROPOSTAS POSSAM SER CONSIDERADAS, PELA MAIORIA, ESTRANHAS, INSUPORTÁVEIS, EXTRAVAGANTES, AUDACIOSAS OU INACEITÁVEIS – O SENTIDO DE ALTERIDADE DO DIREITO À LIVRE EXPRESSÃO E O RESPEITO ÀS IDEIAS QUE CONFLITEM COM O PENSAMENTO E OS VALORES DOMINANTES NO MEIO SOCIAL – CARÁTER NÃO ABSOLUTO DE REFERIDA LIBERDADE FUNDAMENTAL ( CF, art. 5º, incisos IV, V e X; CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, Art. 13, § 5º) – A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À LIBERDADE DE PENSAMENTO COMO SALVAGUARDA NÃO APENAS DAS IDEIAS E PROPOSTAS PREVALECENTES NO ÂMBITO SOCIAL, MAS, SOBRETUDO, COMO AMPARO EFICIENTE ÀS POSIÇÕES QUE DIVERGEM, AINDA QUE RADICALMENTE, DAS CONCEPÇÕES PREDOMINANTES EM DADO MOMENTO HISTÓRICO-CULTURAL, NO ÂMBITO DAS FORMAÇÕES SOCIAIS – O PRINCÍPIO MAJORITÁRIO, QUE DESEMPENHA IMPORTANTE PAPEL NO PROCESSO DECISÓRIO, NÃO PODE LEGITIMAR A SUPRESSÃO, A FRUSTRAÇÃO OU A ANIQUILAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS, COMO O LIVRE EXERCÍCIO DO DIREITO DE REUNIÃO E A PRÁTICA LEGÍTIMA DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO, SOB PENA DE COMPROMETIMENTO DA CONCEPÇÃO MATERIAL DE DEMOCRACIA CONSTITUCIONAL – A FUNÇÃO CONTRAMAJORITÁRIA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO – INADMISSIBILIDADE DA “PROIBIÇÃO ESTATAL DO DISSENSO” – NECESSÁRIO RESPEITO AO DISCURSO ANTAGÔNICO NO CONTEXTO DA SOCIEDADE CIVIL COMPREENDIDA COMO ESPAÇO PRIVILEGIADO QUE DEVE VALORIZAR O CONCEITO DE “LIVRE MERCADO DE IDEIAS” – O SENTIDO DA EXISTÊNCIA DO “FREE MARKETPLACE OF IDEAS” COMO ELEMENTO FUNDAMENTAL E INERENTE AO REGIME DEMOCRÁTICO ( AC 2.695-MC/RS, REL. MIN. CELSO DE MELLO) - A IMPORTÂNCIA DO CONTEÚDO ARGUMENTATIVO DO DISCURSO FUNDADO EM CONVICÇÕES DIVERGENTES – A LIVRE CIRCULAÇÃO DE IDEIAS COMO SIGNO IDENTIFICADOR DAS SOCIEDADES ABERTAS, CUJA NATUREZA NÃO SE REVELA COMPATÍVEL COM A REPRESSÃO AO DISSENSO E QUE ESTIMULA A CONSTRUÇÃO DE ESPAÇOS DE LIBERDADE EM OBSÉQUIO AO SENTIDO DEMOCRÁTICO QUE ANIMA AS INSTITUIÇÕES DA REPÚBLICA – AS PLURISSIGNIFICAÇÕES DO ART. 287 DO CÓDIGO PENAL: NECESSIDADE DE INTERPRETAR ESSE PRECEITO LEGAL EM HARMONIA COM AS LIBERDADES FUNDAMENTAIS DE REUNIÃO, DE EXPRESSÃO E DE PETIÇÃO – LEGITIMIDADE DA UTILIZAÇÃO DA TÉCNICA DA INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO NOS CASOS EM QUE O ATO ESTATAL TENHA CONTEÚDO POLISSÊMICO - ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL JULGADA PROCEDENTE.
30 E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO (LEI Nº 12.322/2010)– EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO RECURSO DE AGRAVO – QUEIXA-CRIME – CONDENAÇÃO PENAL IMPOSTA A JORNALISTA – DELITO DE INJÚRIA ( CP, ART. 140)– RECONHECIMENTO, NO CASO, PELO COLÉGIO RECURSAL, DA OCORRÊNCIA DE ABUSO NO EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE OPINIÃO – DECISÃO DO COLÉGIO RECURAL QUE SE APOIOU, PARA TANTO, EM ELEMENTOS DE PROVA (INCLUSIVE NO QUE CONCERNE À AUTORIA DO FATO DEITUOSO) PRODUZIDOS NO PROCESSO PENAL DE CONHECIMENTO – PRETENDIDA REVISÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO DEPENDENTE DE EXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA, INSUSCETÍVEL DE ANÁLISE EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO (SÚMULA 279/STF) – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. – O direito à livre manifestação do pensamento, embora reconhecido e assegurado em sede constitucional, não se reveste de caráter absoluto nem ilimitado, expondo-se, por isso mesmo, às restrições que emergem do próprio texto da Constituição, destacando-se, entre essas, aquela que consagra a intangibilidade do patrimônio moral de terceiros, que compreende a preservação do direito à honra e o respeito à integridade da reputação pessoal. – A Constituição da República não protege nem ampara opiniões, escritos ou palavras cuja exteriorização ou divulgação configure hipótese de ilicitude penal, tal como sucede nas situações que caracterizem crimes contra a honra (calúnia, difamação e/ou injúria), pois a liberdade de expressão não traduz franquia constitucional que autorize o exercício abusivo desse direito fundamental. Doutrina. Precedentes. – O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o apelo extremo, deve fazê-lo com estrita observância do conjunto probatório e da situação fática, tais como reconhecidos, soberanamente (RTJ 152/612 – RTJ 153/1019 – RTJ 158/693,v.g.), inclusive quanto à autoria do fato delituoso, pelo órgão judiciário “a quo”, a significar que o quadro fático-probatório pautará, delimitando-a, a atividade jurisdicional da Corte Suprema em sede recursal extraordinária. Precedentes. Súmula 1289712454/sumulan 279-do-stf"target=" _blank "rel=" nofollow ">279/STF.
31 [...] (a) os escritos anônimos não podem justificar, só por si, desde que isoladamente considerados, a imediata instauração da persecutio criminis, eis que peças apócrifas não podem ser incorporadas, formalmente, ao processo, salvo quando tais documentos forem produzidos pelo acusado, ou, ainda, quando constituírem, eles próprios, o corpo de delito (como sucede com bilhetes de resgate no delito de extorsão mediante sequestro, ou como ocorre com cartas que evidenciem a prática de crimes contra a honra, ou que corporifiquem o delito de ameaça ou que materializem o crimen falsi, por exemplo); (b) nada impede, contudo, que o Poder Público provocado por delação anônima (“disque-denúncia”, por exemplo), adote medidas informais destinadas a apurar, previamente, em averiguação sumária, “com prudência e discrição”, a possível ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, desde que o faça com o objetivo de conferir a verossimilhança dos fatos nela denunciados, em ordem a promover, então, em caso positivo, a formal instauração da persecutio criminis, mantendo-se, assim, completa desvinculação desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas; e (c) o Ministério Público, de outro lado, independentemente da prévia instauração de inquérito policial, também pode formar a sua opinio delicti com apoio em outros elementos de convicção que evidenciem a materialidade do fato delituoso e a existência de indícios suficientes de sua autoria, desde que os dados informativos que dão suporte à acusação penal não tenham, como único fundamento causal, documentos ou escritos anônimos.
32 FILHO, João T. C. O discurso de ódio na jurisprudência alemã, americana e brasileira. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 60-61.
33 LENZ, Fernanda Schirmer. O tratamento jurídico da imunidade parlamentar em face do discurso de ódio: um conflito não previsto pela Constituição de 1988. Curitiba: CRV, 2017, p. 60.
34 STRECK, Lênio Luiz. Pode-se, em nome da democracia, propor a sua extinção ? https://www.conjur.com.br/2020-jun-22/streck-cattoni-nome-democracia-propor-extincao.Acesso em 28 de setembro de 2021.
35 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p.24.
36 https://g1.globo.com/política/eleicoes/2022/noticia/2022/05/31/candidato-que-divulgar-fake-news-nas-...
37 TSE RO 0603975-98, Rel. Min. Luís Felipe Salomão
38 STF Medida Cautelar na Tutela Provisória Antecedente 39.
39 op. cit. p. 590.
40 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35ª ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 245.
41 SARMENTO, Daniel. Cood. Exec. LEONCY, Léo Ferreira. Comentários à Constituição do Brasil. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 266.
42 FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de direito constitucional. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 427.
43 op. cit. p. 102-103.
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/direito-fundamental-a-liberdade-de-expressao-e-sua-limitacao-constitucional/1615718722
A liberdade de expressão é um direito fundamental que permite a manifestação de opiniões, ideias e pensamentos sem interferência do Estado. No entanto, essa liberdade também implica responsabilidade pelos danos morais, materiais e à imagem causados por suas manifestações.
O tema da liberdade de expressão permanece atual. Seja pela existência de casos emblemáticos envolvendo humoristas, pela tentativa de censura em governos ditatoriais, ou pela modificação legislativa, conhecer o direito do livre discurso está na pauta do dia. 
Neste artigo, abordaremos o conceito de liberdade expressão segundo a formulação estadunidense e brasileira, sua extensão e limites segundo a jurisprudência mais recente e discutiremos o tema sensível da regulação das plataformas digitais. 
Continue a leitura para saber mais! 😉
O que é liberdade de expressão? 
Conforme estabelecida na teoria constitucional clássica, a liberdade de expressão protege o direito das pessoas de expressarem livremente suas opiniões e ideias, desde que não violem as restrições legais estabelecidas para proteger outros direitos ou a segurança pública.
Sendo assim, a sua principal finalidade é garantir um ambiente democrático em que as pessoas possam se expressar livremente, contribuindo para o debate público, o pluralismo de ideias e o desenvolvimento da sociedade.
Ainda, de acordo com a teoria constitucional brasileira, a liberdade de expressão abrange uma ampla gama de manifestações, como a liberdade de imprensa, de pensamento, de opinião, a liberdade acadêmica, a liberdade de crítica, entre outras formas de expressão individual e coletiva.
Também chamado de liberdade de discurso, o direito de se expressar foi alçado ao status de fundamental, inicialmente, pela Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que declara:
Congresso não fará nenhuma lei… restringindo a liberdade de expressão ou de imprensa”.
Por outro lado, a teoria constitucional dos Estados Unidos também reconhece que a liberdade de expressão está sujeita a restrições razoáveis, como regulamentações do tempo, lugar e maneira do discurso, desde que não sejam discriminatórias ou sejam utilizadas como meios para suprimir opiniões impopulares
Qual lei assegura a liberdade de expressão?
No Brasil, a liberdade de expressão é um direito fundamental assegurado pela Constituição Federal de 1988. Ela está prevista no artigo 5º, incisos IV e IX, que estabelece que:
IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato
IX- é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.”
Mesmo prescrevendo a liberdade de expressão, o inciso IV do art. 5º é categórico ao estabelecer uma vedação: o anonimato. Isso porque, ao passo em que a Constituição assegura o livre discurso, também protege o direito de resposta, além da indenização por dano material, moral ou à imagem. É conforme o inciso V, do mesmo artigo: 
V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;”
Se uma pessoa prejudicada por um discurso tem o direito de buscar reparação legal, é crucial que o autor do discurso seja identificado, justificando assim a proibição do anonimato. No contexto das redes sociais, onde usuários fictícios frequentemente difundem ofensas, o abuso da liberdade de expressão é comum.
Quais os limites da liberdade de expressão?
No caso da liberdade de expressão, as limitações decorrem da colisão com outros direitos fundamentais. Isso porque direito fundamental não se confunde com direito absoluto.
Um direito é fundamental porque foi positivado na Constituição Federal, detendo superioridade hierárquica frente a direitos subjetivos infraconstitucionais, e não pode ser revogado por emenda constitucional.
Na perspectiva clássica, os principais direitos que entram em atrito com a liberdade de expressão são:
· a intimidade (exposição de fatos ou imagens íntimas de terceiros); 
· e a honra (ofensa ou humilhação a terceiros). 
Porém, nas plataformas digitais, o abuso da liberdade de expressão agora se choca com:
· a propriedade privada (manipulação de mercado por fake news); 
· a integridade física;
· e a vida (desinformação sobre crises sanitárias). 
Na colisão abstrata de direitos fundamentais, cabe o Poder Judiciário decidir pela tutela in concreto de algum deles, em detrimento parcial do outro. Para a tomada de decisão, aplica-se a regra da proporcionalidade desenvolvida por Robert Alexy.
Leia mais sobre direitos fundamentais aqui no Portal da Aurum!
Limites da liberdade de expressão ao redor do mundo
Embora o tema esteja em constante transformação, os tribunais constitucionais de diversas nações já se debruçaram sobre casos ilustrativose que nos fornecessem guias para compreender a limitação em concreto da liberdade de expressão.
Aplicação concreta nos Estados Unidos
A título de exemplo, a Suprema Corte dos Estados Unidos (inspiração de diversos julgados brasileiros) estabelece diferentes categorias de discurso protegido e não protegido pela liberdade de expressão. O discurso protegido inclui opiniões, crenças, informações, críticas políticas, protestos pacíficos e expressões artísticas. 
Por outro lado, estabeleceu cinco limites e exceções ao discurso protegido.
· Discurso difamatório: declarações falsas de fatos que prejudicam a reputação de uma pessoa.
· Discurso obsceno: material que, de acordo com padrões comunitários, é considerado ofensivo, sem valor artístico, científico ou literário sério.
· Incitação à violência iminente: discurso que provoca e instiga diretamente a violência imediata e ilegal.
· Discurso de ódio direcionado: discurso que incita a violência ou o ódio com base em características como raça, religião, origem nacional, gênero, orientação sexual ou deficiência.
· Discurso que causa perigo claro e presente: discurso que representa uma ameaça substancial à segurança nacional ou à segurança pública imediata.  
Aplicação concreta no Brasil
Os Tribunais brasileiros, por outro lado, são menos permissivos quanto à extensão da liberdade de expressão. Entre nós, outros critérios foram adotados para diferenciar o exercício regular de direito de seu abuso.
A primeira limitação brasileira é o dever verossimilhança do pensamento expresso. Quando o discurso veicular “fato” – e não “opinião” – a informação deve ser minimamente verossímil. Ou seja, não é permitido imputar ou atribuir a outrem fato sabidamente falso. Por colidir com a honra, o abuso de liberdade de expressão neste caso é considerado conduta criminosa de calúnia.
Veja-se que é necessário que o perpetrador saiba que o ofendido não cometeu crime e, ainda assim, decida promover a mentira. Se, por outro lado, houver indícios de que o fato criminoso é verossímil, não há ilícito. Resta compreender a extensão desses indícios e quão a fundo o cidadão comum deve ir na investigação para que não cometa calúnia. 
A jurisprudência do STJ é firme ao esclarecer que o dever investigativo imposto a particulares antes da divulgação pública de informações não pode ser equiparado a uma cognição estatal exauriente que esgote todo tipo de informação antes de se manifestar sobre os fatos. Em caso paradigmático, dissertou a ministra Nancy Andrighi:
Não se tratava, portanto, de um mexerico, fofoca ou boato que, negligentemente, se divulgava em cadeia nacional (…) Embora se deva exigir da mídia um mínimo de diligência investigativa, isso não significa que sua cognição deva ser plena e exauriente à semelhança daquilo que ocorre em juízo (…) isso se dá, em primeiro lugar, porque a recorrente, como qualquer outro particular, não detém poderes estatais para empreender tal cognição (REsp n. 984.803/ES, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 26/5/2009, DJe de 19/8/2009.)
Isto é, no exercício da liberdade de expressão, não se exige que o cidadão que tenha a mesma diligência que o Poder Judiciário ao exercer a cognição plena e exauriente dos casos que lhe chegam. 
O mesmo princípio da verossimilhança pode ser aplicado para resolver abusos da liberdade de expressão relacionados à mentira. Por outro lado, é possível que haja ofensa à intimidade e à honra sem deturpação da verdade, sobretudo quando se trata de discurso de opinião.  
É o que ocorre nas práticas criminosas da difamação e da injúria, também ilícitos civis. Neste caso, o ofensor humilha a vítima perante terceiros (difamação) ou em seu íntimo (injúria). 
Indenização por abuso da liberdade de expressão
João Paulo Capelotti realizou estudo pioneiro sobre a formação da jurisprudência acerca da tutela reparatória em casos envolvendo a liberdade de expressão, sobretudo quando há conteúdo humorístico. A fim de distinguir o exercício regular da liberdade de discurso do ato ilícito indenizável, os Tribunais procuraram identificar a intenção de fazer rir. 
Muitas vezes, isso significa ir além da opinião do autor e exagerar sobre fatos, leciona Capelotti. As representações ridículas e sarcásticas, que operem mediante a deformação da realidade com intuito de crítica humorística não poderiam, per se, caracterizar ilícito. A caricatura, em outras palavras, não se confunde com a mentira, tampouco com o dano moral.
Por mais que precedentes moldem a interpretação dos julgadores, as decisões vacilam em aspectos subjetivos. É quando o humor não é compreendido como tal e, no entendimento das Cortes, revestem-se de intenção meramente difamatória ou injuriante, a fim de desonrar o destinatário. 
Liberdade de Expressão x Censura na Internet
A Constituição de 1988 é avessa à censura. Basta lembrar que a Assembleia Constituinte foi convocada no crepúsculo da ditadura militar, a fim de se opor às arbitrariedades e abusos perpetrados por seus representantes. 
No contexto da ditadura, em 1968 foi decretado o Ato Institucional n. 05 (AI-5), ordem que, entre medidas de fechamento do Congresso e suspensão do direito de habeas corpus para presos políticos, também estabeleceu a censura prévia à expressão e à comunicação. Assim, os órgãos estatais poderiam impedir a circulação de ideias. 
Com a consolidação da democracia, a Constituição foi categórica em proibir a censura em seu art. 5º, inciso IX. Isto significa que nenhuma lei poderá ser criada, tampouco poderá o Estado agir, no sentido de controlar ou suprimir a informação circulante. 
Ocorre que 35 anos se passaram desde 1988. De lá para cá, muita coisa mudou, especialmente no campo da tecnologia da informação. Se o constituinte estava preocupado com os riscos que o Estado totalitário poderia causar com a limitação de ideias, certamente não possuía dimensão dos efeitos de uma notícia fraudulenta nas redes sociais. 
À época da assembleia constituinte, aquele que desejasse circular suas ideias precisaria buscar meios de comunicação regulados (imprensa, rádio e televisão) e cativar espectadores por alguns segundos. Encerrada a comunicação, os leitores e ouvintes poderiam entrar em contato com ideias divergentes, mas novos desafios surgiram. 
Atualmente, qualquer pessoa pode espalhar fake news para milhões de pessoas a um custo ínfimo. Seus destinatários, por sua vez, continuarão a utilizar as redes sociais e a consumir conteúdo idêntico. Diante da ubiquidade da internet e da presença de algoritmos de preferência, o usuário está refém das notícias que chegam a eles. 
Os resultados são conhecidos: 
· manipulação de mercados;
· crises sanitárias;
· instabilidade política. 
É neste contexto que emerge o debate sobre a regulamentação das plataformas digitais – erroneamente apelidado de censura na internet. Um contexto muito distinto daquele existente em 1988 e, mais ainda, da teoria clássica sobre liberdade de expressão. 
Regulamentação das plataformas digitais
O Projeto de Lei 2630/2020, denominado de PL das Fake News, inaugura esse debate em âmbito legislativo. Não se trata, em nenhuma hipótese, de instituir uma censura, mas um processo de moderação de conteúdo e de responsabilização das plataformas digitais por violação de direitos. 
Algo similar ao que já ocorre – e sempre ocorreu – com as demais plataformas de expressão do pensamento, notadamente a imprensa e as telecomunicações. Em artigo sobre a liberdade de imprensa, expus como a própria Constituição estabeleceu deveres às empresas de comunicação. A jurisprudência, por sua vez, foi firme ao consolidar o dever primordial da veracidade. 
Se os veículos de comunicação clássicos já detêm um regime jurídico de responsabilidade, não deveria ser diferente com as plataformas digitais. Assim, deve ser obrigação da plataforma (não do Estado) analisar se o conteúdo publicado em sua rede corresponde a condutas tipificadas como crimes. 
O PL 2630/2020 estabelece, assim, vedações às plataformas digitais de autorizar:
1. contas inautênticas;
2. disseminadoresartificiais não rotulados e de desinformação;
3. redes de disseminação artificial de desinformação;
4. conteúdos patrocinados não rotulados.
A proibição de contas inautênticas (perfis fakes) corresponde à já clássica proibição do anonimato, prevista no art. 5º, IV, da Constituição. O uso de pseudônimos não conhecidos dificulta a identificação do eventual perpetrador do ato ilícito e sua consequente responsabilização. Não são raros os crimes contra honra cometidos na internet, nos quais os usuários criam contas ad hoc para humilhar quem quer que seja. 
As vedações referentes ao uso de disseminadores artificiais e patrocinadores de desinformação refletem também proibições há muito existentes. Nunca se permitiu a veiculação de informações não verossímeis nos canais de comunicação, precisamente por se compreender o potencial lesivo ao direito de terceiros. 
Nesse sentido, o PL 2630/2020 passa longe de qualquer tentativa de censura. O que se almeja, simplesmente, é que as relações digitais sejam um espelho das relações reais, e vice-versa. Ou seja, o que é crime e ato ilícito no mundo offline, também deve ser no mundo online.  
O paradoxo da tolerância 
O filósofo contemporâneo Karl Popper apresenta esse desafio dos limites da liberdade de expressão naquilo que denominou “o paradoxo da tolerância.” Em suma, defende Popper que para preservar a liberdade e a democracia, é necessário ser intolerante com a intolerância.
Ou seja, se uma sociedade tolerar indiscriminadamente todas as formas de expressão, incluindo aquelas que pregam a intolerância, o resultado pode ser a destruição dos próprios princípios democráticos e da liberdade que se pretende proteger.
 Permitir que ideias e discursos extremistas e intolerantes se propaguem sem restrições pode levar ao enfraquecimento da coexistência pacífica e dos direitos fundamentais de grupos marginalizados ou minorias.
Dessa forma, o paradoxo da tolerância questiona até que ponto é possível ser tolerante com ideias e discursos que incitam a intolerância. Segundo Popper, a tolerância deve ter seus limites, e esses limites devem ser definidos para garantir a preservação dos valores democráticos. 
Ele argumenta que, para proteger a liberdade e a pluralidade, a sociedade deve se opor ativamente àqueles que buscam destruir esses princípios. A defesa da tolerância não pode se estender àqueles que desejam suprimir a diversidade de opiniões, a igualdade de direitos ou o próprio sistema democrático.
Assim, embora a liberdade de expressão seja um direito fundamental, já se explicou que ela não é absoluta (como nenhum direito fundamental) e pode ser restringida quando colidir com demais direitos fundamentais. 
No contexto da liberdade de expressão, o paradoxo da tolerância nos lembra da necessidade de discernimento e responsabilidade ao lidar com discursos de ódio, intolerância e extremismo, a fim de preservar os valores democráticos e garantir que todos os membros da sociedade possam desfrutar plenamente de seus direitos e liberdades.
Conclusão
A liberdade de expressão é a marca de regimes democráticos. Por abranger a liberdade de crítica, de opinião e veiculação de pensamento, seja de modo individual, seja no coletivo, o Direito Constitucional alçou o livre discurso como ferramenta de excelência contra o abuso estatal.
Por outro lado, verifica-se o uso abuso do discurso diariamente, com a ofensa a direitos de terceiros. Seja através do uso de anonimato nas redes sociais, seja com a disseminação de notícias fraudulentas, são inúmeros os casos em que coube ao Poder Judiciário limitar o discurso para proteger a dignidade de sujeitos e coletividades. 
Neste artigo, tivemos a oportunidade de pincelar alguns critérios jurídicos para se diferenciar o exercício regular do direito, de seu abuso e configuração de ato ilícito. Por mais que o tema esteja em constante atualização e mudanças, o histórico jurisprudencial fornece pistas do que mais está por vir.
Dúvidas frequentes sobre liberdade de expressão
Chegou ao final da leitura e ainda tem dúvidas? Confira nosso tópico especial com as perguntas mais frequentes relacionadas ao tema!
Qual é o conceito de liberdade de expressão?
A liberdade de expressão, prevista no art. 5º da Constituição Federal, consiste na garantia de livre manifestação, na proteção jurídica de um espaço para que cada indivíduo possa se exprimir socialmente e no direito de se pronunciar ou de se manifestar de qualquer outra forma.
Qual o artigo da liberdade de expressão no Brasil?
A liberdade de expressão está prevista no art. 5º da Constituição Federal e no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, adotado pela XXI Sessão da Assembleia-Geral das Nações Unidas de 1996 (e em vigor no Brasil em 1992), através do Decreto n. 592.
Quais são as consequências da liberdade de expressão?
As consequências da liberdade de expressão podem incluir o fortalecimento da democracia, permitindo o livre debate de ideias e o escrutínio público; a promoção da diversidade de opiniões e perspectivas; o avanço do conhecimento e da inovação. Por outro lado, também podem ocorrer manifestações de discurso de ódio, desinformação e propagação de conteúdo prejudicial.
Qual o limite da liberdade de expressão?
O limite da liberdade de expressão seria, na verdade, a responsabilização por eventuais condutas causadoras de dano na esfera cível ou criminal. Não há que se falar em um limite prévio, uma proibição da abstenção de alguma conduta, um limite propriamente dito à possibilidade de se expressar. 
Quando a liberdade de expressão passa a ser crime?
A liberdade de expressão pode se tornar crime quando suas manifestações ultrapassam os limites legais, como difamação, calúnia, incitação à violência, discurso de ódio ou divulgação de informações sigilosas, colocando em risco direitos fundamentais ou a ordem pública.
https://www.aurum.com.br/blog/liberdade-de-expressao/
image1.jpeg

Mais conteúdos dessa disciplina