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Reflexões sobre Educação e Sociedade

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LICENCIATURA EM LETRAS PORTUGUÊS / INGLÊS
PRÁTICA DE ENSINO: TRAJETÓRIA DA PRÁXIS (PE:TP)
 
POSTAGEM 2
ATIVIDADE 2 – CARTA AO PROFESSOR ANDRÉ
JOÃO HENRIQUE DE OLIVEIRA – 1949684
CAMPINAS
2023
Campinas, 08 de Maio de 2023
Caro Professor André,
Ao tomar conhecimento de sua história, não pude deixar de passar algumas
noites pensando e refletindo sobre o caso. Ao ler o episódio por algumas vezes, confesso
que meu instinto era buscar por uma alternativa pontual, assim como você fez. Buscar
ajuda dos mais experientes, explorar a possibilidade de uma saída legitimada por lei, até
mesmo recorrer à polícia local parecem ser as únicas formas de encerramento desse
caso tão delicado. Infelizmente a situação que se encontra não é uma exclusividade,
muito pelo contrário, esse cenário é bastante comum em centenas de escolas pelo Brasil
e, mesmo sabendo disso, não pude deixar de me assustar com o relato.
Antes de mais nada, gostaria de expressar minha profunda preocupação com sua
atual conjuntura e dedicar todo o meu apoio e carinho. Isto posto, quero deixar aqui,
também um relato que presenciei em minha breve carreira como professor e, ao fim,
talvez tirar alguma reflexão de tudo isso.
Sou estudante de Letras e ao longo do meu estágio tive a oportunidade de
observar aulas em duas distintas escolas distintas. Uma delas, pública com todas as
dificuldades e lições que se pode tirar. Foi maravilhoso aprender com professores
dedicados, alunos interessados, a escola inserida na comunidade ao redor que formava
uma bela sinergia. Obviamente haviam muitos problemas, porém nada que fora do
comum. Já a outra escola, a qual não revelarei o nome, era o completo oposto, particular,
uma das mais prestigiadas da cidade com um histórico quase centenário de fundação e
fortíssimo cunho religioso. Em meados de setembro de 2022, estávamos em uma aula de
produção de texto quando um aluno – que chamaremos de Antônio –, que até aquele
momento seguia atrapalhando a aula, fez uma brincadeira de muito mau gosto com um
colega de sala que ficou visivelmente incomodado com a situação. A professora em sala,
observou aquela situação e repreendeu Antônio veementemente que por sua vez rebateu
as palavras em um tom muito agressivo em direção a professora. A discussão se
intensificou quando outros alunos tentaram acalmar o ambiente, mas o menino elevou
mais a voz e continuou a desrespeitar a professora dizendo que ele é quem paga seu
salário portanto ela devia respeito a ele, dizia que professores são de uma classe inferior,
que sua família era importante e que acabaria com a carreira da professora, além de
insultos de cunho político e palavras de baixo calão. A cena toda durou pouco menos de
cinco minutos, porém foram o suficiente para deixar a professora desconcertada que
apenas saiu de sala já com os olhos marinados. Enquanto o aluno se sentou e apenas
esperou que alguém viesse chamá-lo, pois já sabia que aquilo não passaria em branco,
mas não parecia temer ou se arrepender do que fizera.
A professora foi transferida para outra o colégio irmão da mesma rede, enquanto
o aluno teve alguns dias de suspensão e logo estava de volta sem aparentar nenhum
remorso.
Professor André, ao presenciar toda aquela situação eu fiquei perplexo com
tamanha audácia de um menino entre doze e treze anos e, assim como você, só
conseguia pensar em possíveis soluções para aquele momento. Entretanto, depois de ler
e reler a sua história, passei a pensar em uma situação mais abrangente. Uma punição
pontual não cura as feridas e nem evita futuras. Não é que falta algo em nossas escolas,
existe uma enorme insuficiência de humanidade em nossa sociedade como um todo. Em
seu caso, Carlos é vítima de uma sociedade desigual e carente. Em meu caso, Antônio se
beneficia desse mesma sociedade e assim reproduz o que, provavelmente seus espelhos
o ensinam. Carlos sabe que é por culpa de alguns Antônios que ele precisa se esforçar
dez vezes mais para, no máximo, conseguir cem vezes menos ao longo de toda a vida.
Por sua vez, Antônio projeta o que lhe é ensinado de maneira intrínseca, pois vive em um
meio poluído por atitudes como essa.
Mas se é um problema estrutural, então devemos apenas ignorar e nem tentar
uma solução imediata? Não. Devemos sim pensar em uma medida pontual, mas não
podemos deixar de refletir sobre como diminuir essas ocorrências tão comuns. A
professora de produção textual não poderia mais dar aula naquela sala, a situação seria
insustentável, assim como, em minha humilde opinião aconselho você a trocar de escola
por medo do que possa acontecer, mas não deixar isso para trás. Iniciar um projeto de
aconselhamento psicológico em escolas de nível fundamental seria uma excelente
maneira de combater alguns tipos de atitudes tóxicas. Tanto para escolas públicas ou
particulares, os alunos precisam entender que pertencem a um grupo, a uma comunidade
inserida em uma sociedade de diversos pensamentos, diferentes classes sociais e ter a
consciência que todos têm um lugar e merecem o devido respeito. Em sua posição, como
morador de uma cidade não muito grande, talvez buscar auxílio e iniciar esse trabalho em
uma ou duas escolas e depois expandir aos poucos. Um projeto a longo prazo que
certamente traria excelentes resultados e talvez, um dia, situações como essas deixem de
ser normalizadas em nosso país.
Do seu colega de profissão,
João Oliveira

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