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Celso Furtado


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O pensamento Econômico de Celso Furtado (revisão e continuação)
I – Desenvolvimento e Subdesenvolvimento
O Conceito de subdesenvolvimento
O subdesenvolvimento é uma “estrutura econômica” construída historicamente.
O subdesenvolvimento é uma condição que não pode ser explicada (e consequentemente superada) pela análise neoclássica de equilíbrio geral (equilíbrio livre em todos os mercados).
O subdesenvolvimento é uma característica do modelo centro-periferia.
Centro: os países industrializados, também centro das inovações tecnológicas.
Periferia: produção primário exportadora, que não consegue se beneficiar totalmente dos frutos das inovações tecnológicas. 
Evidências: deterioração dos termos de troca em decorrência da baixa elasticidade renda da demanda por produtos. primários em comparação à alta elasticidade renda da demanda por produtos industrializados; efeito demonstração.
A industrialização em países subdesenvolvidos cria distorções:
Dependência externa: a industrialização gera pressões sobre o balanço de pagamentos
Dependência tecnológica: a tecnologia é desenvolvida nos países industrializados
Baixa utilização de mão de obra (e alta de capital)
Mercado interno limitado => indústrias ineficientes.
A superação do subdesenvolvimento requer mudanças nas estruturas produtivas => industrialização porém sob a coordenação do Estado => superar as distorções e atender as necessidades da sociedade.
II – a Formação Econômica do Brasil
II – A formação econômica do Brasil
Muito mais do que analisar o passado, Furtado busca entender a formação de uma estrutura econômica subdesenvolvida a partir dos mecanismos de geração e propagação da renda na economia. Em sua análise, considera a formação econômica do Brasil em quatro grandes períodos ou grupos de análise:
o sistema escravista da economia açucareira: séculos XVI e XVII;
o sistema escravista da economia mineira: século XVIII; 
a economia cafeeira em uma economia de mão de obra assalariada: século XIX;
a economia de transição para um sistema industrial: século XX.
O Complexo da cana-de-açúcar na época colonial
Características gerais:
Sistema escravista de produção => impede a formação de um mercado interno (escravo não recebe salário).
Baixa participação dos salários na renda total da economia
Alta participação dos lucros dos produtores rurais e dos comerciantes na renda total da economia => concentração da renda.
Grande parte da renda é remetida para a Europa na forma de lucros (comerciantes) e importações (bens de luxo, materiais de construção, aquisição de escravos etc.).
Inexistência de um mercado interno que pudesse estimular outras atividades na economia.
	
O Complexo da cana-de-açúcar na época colonial
“Como os fatores de produção em sua quase totalidade pertenciam ao empresário, a renda monetária gerada no processo produtivo revertia em sua quase totalidade às mãos desse empresário” (...) O fluxo de renda se estabelecia portanto, entre a unidade produtiva, considerada em conjunto, e o exterior”. (Furtado, 2000, p. 53)
Dada que a renda monetária interna criada pelo trabalho escravo era praticamente nula:
“Não havia, portanto, nenhuma possibilidade de que o crescimento com base no impulso externo originasse um processo de desenvolvimento de autopropulsão”. (Furtado, 2000, p. 53)
A economia mineira
Características gerais:
 Sistema escravista
 Apesar de gerar uma renda média menor em relação à economia açucareira, contempla características favoráveis ao desenvolvimento de atividades produtivas voltadas ao mercado interno. Motivos:
menor demanda por importações, dada a distancia das regiões mineradoras dos portos, que encareciam o preço dos produtos importados;
maior proporção da mão de obra livre maior do que na economia açucareira;
renda menos concentrada em relação à economia açucareira.
A economia mineira
Contudo, a ausência de capacidade técnica necessária ao estabelecimento de atividades manufatureiras e a rápida decadência das regiões mineradoras impediram o desenvolvimento econômico endógeno. 
Para o autor, a decadência da região mineradora resultou no retorno às atividades de subsistência e elevação da pobreza em regiões antes prósperas, particularmente no Centro-Oeste.
Observação: não há consenso em torno da decadência econômica nas regiões mineradoras. Ver por exemplo, o texto “Metais e pedras preciosas”, de Sérgio Buarque de Holanda (Em Holanda, Sérgio Buarque. História Geral da Civilização Brasileira: A Época Colonial – Administração, Economia e Sociedade, tomo I, 2º. volume, 7ª. Edição, São Paulo: Editora Bertrand Brasil S.A., 1993, p. 259 – 310).
A Economia Cafeeira – características gerais
De uma forma geral, a economia cafeeira que se desenvolve no século XIX criou uma economia monetária e um fluxo circular da renda muito mais favorável ao desenvolvimento econômico em relação àquelas presentes nas economias escravistas tropicais e de mineração. A imigração europeia, além de elevar a oferta de mão de obra assalariada e contribuir para o crescimento do mercado interno, também trouxe novos conhecimentos tecnológicos que seriam importantes para a produção de bens destinados ao mercado interno. 
Em suma, a economia cafeeira, por se desenvolver em um sistema de trabalho assalariado, resultará em novas possibilidades de desenvolvimento econômico.
Porém, e já no final do século XIX, o setor passa a enfrentar crises de superprodução e preços baixos. Neste contexto, são criados mecanismos de intervenção do Estado.
A Economia Cafeeira e as intervenções do Estado
Segundo Furtado, desde o final do século XIX:
“Os estoques de café, que se avoluma ano a ano, pesam sobre os preços, provocando uma perda permanente de renda para os produtores e para o país. A ideia de retirar do mercado parte desses estoques amadurece cedo no espírito dos dirigentes dos Estados cafeeiros, cujo poder político e financeiro fora amplamente acrescido pela descentralização republicana”. (Furtado, 2000, p. 193). 
Tratava-se de uma situação que demandava ações compensatórias por parte do Governo. Tais demandas resultaram na criação da denominada “política de valorização do café” (a partir do Convênio de Taubaté, de 1906).
Neste contexto, cresce a percepção de que o Estado pode ser um “condutor” das estruturas econômicas
 (a favor de quem?)
Algumas conclusões
No início do século XX, e pelo menos até o início da primeira guerra mundial, o Brasil estabeleceu uma estrutura produtiva baseada na produção primária voltada para o mercado internacional: modelo primário exportador. 
Apesar do dinamismo criado pela economia cafeeira, o modelo primário exportador impediu o Brasil de “aproveitar” melhor “as correntes de expansão do comércio internacional” que se intensificam a partir da segunda metade do século XIX. Situação diversa estaria presente na Europa e nos EUA:
Brasil: modelo primário exportador voltada para o mercado internacional; mercado interno pouco dinâmico; estrutura econômica “dual” (setor desenvolvido convivendo com setor atrasado)
Europa: produção industrial voltada para o mercado internacional
EUA: economia protegida e desenvolvimento industrial voltado para o mercado interno
Algumas conclusões
A análise de Furtado no Formação Econômica do Brasil contempla:
Método de análise keynesiana: i) a formação de uma estrutura econômica subdesenvolvida a partir dos mecanismos de geração e propagação da renda na economia; e ii) as formas de atuação do Estado na economia, particularmente no contexto da política de valorização do café (compra e queima do café).
Comparação de alguns aspectos da formação econômica do Brasil com a dos EUA.
III – A industrialização e as novas formas de dependência
Os desequilíbrios estruturais da “industrialização periférica” 
i) concentração da renda;
ii) dualidade econômica e social; e
iii) “novas formas de dependência”:
	=> financiamento externo 
	=> acesso à tecnologia de produção
	=> controle das atividades produtivas por grupos estrangeiros (controle externo), e a consequente... 
	=> perda de autonomianas decisões políticas internas => “estrutura de poder” incompatível com os “interesses da sociedade”. 
(Furtado, Celso. A economia latino-americana: formação histórica e problemas econômicos. 4ª. Edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2007)
A industrialização como alternativa de desenvolvimento econômico
Furtado defende a posição da CEPAL: a necessidade da industrialização como forma de superação da condição de subdesenvolvimento econômico.
Porém, a industrialização por si só não garante o desenvolvimento econômico. É necessário “superar” as novas formas de dependência:
i) as pressões que a industrialização gera sobre o balanço de pagamentos (ou dependência da poupança externa);
ii) dependência tecnológica => a industrialização é conduzida por empresas estrangeiras que dominam a tecnologia de produção e, consequentemente, as formas de utilização dos fatores de produção (trabalho, capital físico, capital financeiro e terra), das matérias primas e dos demais recursos naturais do país.
iii) alta participação relativa do fator capital (e baixa relativa do fator trabalho);
iv) no caso de um país como o Brasil, com grande extensão territorial, tendência ao desequilíbrio regional;
v) mercado interno limitado => “economias de escala reduzidas”;
vi) baixa autonomia nas decisões políticas internas (em relação à destinação dos investimentos produtivos, por exemplo).
A industrialização como alternativa de desenvolvimento econômico e o papel do Estado
Para Furtado, o Estado deveria “conduzir” a industrialização substitutiva de importações no sentido de: i) eliminar as distorções gerada pela industrialização substitutiva de importações (as formas de dependência do slide anterior); ii) considerar os interesses da sociedade, particularmente em relação à redução da pobreza, das disparidades regionais do país (Nordeste x Sudeste) e da utilização dos recursos naturais. 
IV – Desenvolvimento econômico e a estrutura social e de poder
Desenvolvimento econômico e a estrutura social
“A concepção de desenvolvimento de uma sociedade não é alheia a sua estrutura social” (Furtado, Celso. Pequena Introdução ao Desenvolvimento Econômico: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1980).
Desenvolvimento econômico e a estrutura de poder
“A composição do excedente (que se destina aos investimentos produtivos) é em grade parte um reflexo do sistema de dominação social, o que significa que, sem um conhecimento da estrutura de poder não podemos avançar no estudo do desenvolvimento das forças produtivas” (Furtado, Celso. Prefácio a Nova Economia Política. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976).
Desenvolvimento econômico e a estrutura de poder
“Os mercados operam em espaços politicamente delimitados pelo Estado”. Celso Furtado 
(In Ciro, Biderman, Luís Felipe L. Cozac e José Marcio Rego. Conversas com economistas brasileiros. São Paulo: Editora 34, 1997. Ver capítulo 4: Celso Monteiro Furtado)
Desenvolvimento econômico e a estrutura de poder
Questão:
Qual a estrutura de poder mais adequada à superação do subdesenvolvimento econômico?
Resposta:
“Os centros de decisão mais importantes, aqueles que são de natureza política e estão capacitados para interpretar as aspirações da coletividade...”
(Furtado, Celso. A economia latino-americana: formação histórica e problemas econômicos. 4ª. Edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2007)
Ou seja, aquela que consegue melhor perceber as aspirações da sociedade. 
Para Furtado, a superação do subdesenvolvimento depende do grau de autonomia das decisões políticas.
A militância de Celso Furtado
A “militância” de Celso Furtado
Como Economista, Celso Furtado buscou:
i) compreender as estruturas econômicas subdesenvolvidas como resultado de um processo histórico;
ii) desenvolver uma teoria do desenvolvimento econômico aplicado à América Latina;
iii) demonstrar o caráter interdisciplinar da análise do desenvolvimento econômico, principalmente nas relações entre a Economia, a História, a Sociologia e a Ciência Política;
iv) contribuir para a formulação de técnicas de planejamento econômico destinados à pesquisadores e técnicos latino-americanos.
A “militância” de Celso Furtado
Foi membro da CEPAL, onde contribuiu, junto com Raul Prebisch, para a compreensão dos problemas econômicos da América Latina.
Presidiu Grupo CEPAL-BNDE, que elaborou estudo que serviria de base ao Plano de Metas do Governo JK.
Foi um dos responsáveis pela criação da SUDENE e de propostas para o desenvolvimento do Nordeste do Brasil
Foi ministro do planejamento do Governo de João Goulart, e responsável pela elaboração do Plano Trienal
Foi ministro da cultura do Governo de José Sarney.
A “militância” de Celso Furtado
“O crescimento econômico pode ocorrer espontaneamente pela interação das forças de mercado, mas o desenvolvimento social é fruto de uma ação política deliberada” (Celso Furtado)
(In Ciro, Biderman, Luís Felipe L. Cozac e José Marcio Rego. Conversas com economistas brasileiros. São Paulo: Editora 34, 1997. Ver capítulo 4: Celso Monteiro Furtado).
 
Bibliografia utilizada nesta apresentação
História:
Formação Econômica do Brasil 
A Economia Latino-Americana 
Teoria:
Desenvolvimento e Subdesenvolvimento (1961) 
Teoria Política do Desenvolvimento Econômico (1967) 
Prefácio a Nova Economia Política (1976) 
Pequena Introdução ao Desenvolvimento Econômico: enfoque interdisciplinar (1980)
Bibliografia para o nosso curso
Ver livro do Ricardo Bielschowsky indicado na bibliografia do curso: 
Pensamento Econômico Brasileiro 1930-1964: o Ciclo Ideológico do Desenvolvimento.

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