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CATEGORIAS E CONCEITOS DA GEOGRAFIA APRESENTAÇÃO Professora Esp. Karitta da Silva Lopes ● Licenciada em Geografia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). ● Especialista em “História da África e Cultura Afro-Brasileira, Práticas Docentes, Relações Raciais e a Aplicação da Lei 10.639/03” pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). ● Atuou como professora de Geografia pelo Processo Seletivo Simplificado do Paraná da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED-PR). ● Link do Currículo na Plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/2751506907806550. Ampla experiência como docente na rede pública de Ensino Básico do Estado do Paraná, atuando em instituições como o Colégio Estadual João de Faria Pioli, Colégio Estadual Silvio Magalhães Barros, Instituto de Educação Estadual de Maringá, Colégio Estadual Antônio Francisco Lisboa e Colégio Estadual Jardim Independência, estes dois últimos, localizados no município de Sarandi-PR. APRESENTAÇÃO DA APOSTILA Olá, seja muito bem vinda(o) à disciplina “Categorias e conceitos da Geografia”! Prezada(o) aluna(o), é com grande satisfação e apreço que lhe introduzo às temáticas e assuntos que compõem esta disciplina. Se você se interessou pelos conhecimentos apresentados e dinamizados aqui, o presente material será o início de uma grande jornada que vamos trilhar juntos a partir de agora. Desde já te adianto que o desenvolvimento do conhecimento em Geografia se faz por meio de uma construção coletiva, ou seja, por relações conjuntas e recíprocas e nunca individuais ou unilaterais. Desta forma, é a partir do compartilhamento e socialização dos saberes geográficos, divididos em quatro unidades, que vamos estudar alguns dos princípios históricos, teóricos, metodológicos e epistemológicos da construção e consolidação da Geografia como ciência. Na unidade I vamos conhecer a disciplina de Geografia ao longo da História, com destaque ao seu desenvolvimento por meio das correntes do pensamento geográfico, das suas tendências mundiais e brasileiras e dos seus conceitos e categorias analíticas principais. Já na unidade II você irá saber mais sobre questões acerca da ação humana na natureza e as relações estabelecidas entre a sociedade e o meio ambiente, como também, sobre o impacto da sociedade na natureza e vice e versa, e algumas técnicas sustentáveis desenvolvidas para diminuir esse impacto. Na sequência, na unidade III falaremos a respeito das divisões da Geografia entre Geografia Humana e Geografia Física, das relações entre Geografia e interdisciplinaridade, dos princípios da Geografia Crítica enquanto uma corrente teórica presente nos estudos geográficos e dos diversos ramos da Geografia, como a Geomorfologia, Climatologia, Geografia Social e Geopolítica, entre outros. Em nossa unidade IV, vamos finalizar o conteúdo dessa disciplina com estudos à respeito da leitura do espaço geográfico por meio das categorias geográficas de lugar e paisagem, do conceito de território e espaço geográfico de forma mais específica e aprofundada e, por último, da representação do espaço geográfico, em especial, através do ensino de Geografia nas escolas. Aproveito para reforçar o convite a você, para junto comigo, percorrer esta jornada de conhecimento a fim de multiplica-los a partir de tantos assuntos tratados em nosso material. Almejamos que esta disciplina possa contribuir para seu crescimento pessoal, profissional e acadêmico. Muito obrigada pela companhia e bons estudos! Se puder, fique em casa. UNIDADE I CONCEITOS DA GEOGRAFIA Professora Esp. Karitta da Silva Lopes Plano de Estudo: ● A Geografia ao longo da História. ● As correntes do pensamento geográfico. ● As tendências da Geografia mundial e Brasileira. ● Conceitos fundamentais na compreensão do espaço Geográfico Objetivos de Aprendizagem: ● Compreender o processo histórico de evolução do pensamento geográfico. ● Analisar os pressupostos da geografia como ciência e sua relação com outras áreas do conhecimento, através do tempo histórico. ● Estabelecer relações entre a sociedade humana e o ambiente natural. ● Classificar as categorias geográficas e compreender como os fenômenos espaciais se manifesta através delas. INTRODUÇÃO Prezada(o) Aluna(o), seja bem vinda(o) a disciplina “Categorias e conceitos da Geografia”. É com grande satisfação e estima que te convido a compartilhar conhecimentos acerca das bases teóricas do pensamento geográfico. O presente material foi desenvolvido para introduzi-la(o) ao horizonte das discussões à respeito da Geografia enquanto ciência, portanto, é destinado à estudantes e pesquisadores interessadas(os) em compreender o processo histórico de constituição da ciência geográfica, cujo o objetivo é pensar epistemologicamente o espaço que vivemos, suas condições naturais, modificações territoriais e relações com práticas e intervenções humanas. Durante a trajetória escolar, você certamente cursou Geografia e teve contato com diversos conceitos específicos dessa disciplina, como território, espaço, lugar e região. A apresentação que você tem em mãos (ou à vista por meio de arquivos digitais) pretende aprofundar esses conhecimentos, obtidos no seu percurso educacional no decorrer do Ensino Básico, à respeito da formação do pensamento geográfico e sua consolidação como ciência pertencente às Humanidades. A Unidade 1 “Conceitos da Geografia” é composta por quatro tópicos que correspondem à um plano de estudo estruturado para que você possa obter conhecimento sobre a Geografia ao longo da História, as correntes do pensamento geográfico, as tendências da Geografia mundial e brasileira e os conceitos fundamentais na compreensão do espaço geográfico. Almejamos que esta unidade possa contribuir com sua aprendizagem, com a expansão do seu pensamento crítico e com o aprimoramento de suas habilidades cognitivas e investigativas em Geografia. Bons estudos! 1 A GEOGRAFIA AO LONGO DA HISTÓRIA Imagem do Tópico: https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/old-vintage-retro-compass- on-ancient-1014403549 Ao darmos início aos estudos acerca da Geografia enquanto uma disciplina essencial para compreendermos o espaço que vivemos, suas condições naturais, modificações territoriais e intervenções humanas, precisamos, a priori, identificar a etimologia da palavra a fim de contextualizá-la ao longo da história. Logo, o termo em destaque, tem sua origem na junção dos radicais gregos geo, cujo significado é terra, e grafia, que significa descrição, ou seja, o estudo da superfície da terra. Nascida no berço do pensamento filosófico grego, a base científica da Geografia é reconhecida como uma das mais longínquas da Grécia Antiga, sendo classificada enquanto uma filosofia natural ou história natural. Nesse período histórico, os objetivos e análises que envolviam a ciência geográfica estavam voltadas a entender a localização da Terra no universo, bem como, a dimensão de sua superfície por meio de cálculos matemáticos e representações cartográficas. Em virtude disso, podemos dizer que as origens dos estudos geográficos se dão a partir do surgimento da geografia geral e da geografia matemática. De acordo com Paulo R. Teixeira de Godoy (2010), a utilização do termo Geografia foi motivada pela necessidade de designar aportes do cotidiano da sociedade grega, como relatos de viagens, descrição de lugares, escritos literários, relatórios estatísticos, registros cosmológicos, entre outros. Por esta razão, pesquisas históricas e evidências arqueológicas e etnológicas apontam que o mapa é a mais antiga forma de comunicação gráfica realizada pela humanidade Nesse momento histórico na Grécia,havia um esforço intelectual voltado para a compreensão do mundo, do universo e da realidade, ou como era conhecido à época, o cosmos. Para os gregos, o cosmos era uma totalidade organizada racionalmente, que só poderia ser descrito pela razão, levando a visualização de uma ordem, uma unidade e uma harmonia, onde coexistem uma multiplicidade caótica das coisas e acontecimentos (GODOY, 2010, p. 13). https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/old-vintage-retro-compass-on-ancient-1014403549 https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/old-vintage-retro-compass-on-ancient-1014403549 Contudo, embora a construção e formulação das bases científicas da Geografia remonte a Era Clássica (entre o século VIII a.C. e o século V d.C) a partir da perspectiva dos estudos sobre as dimensões, formas e o campo gravitacional da Terra, não havia uma unidade de análise compreendida como método, de modo que, até o final do século XVIII, não é possível falar de um conhecimento geográfico sistematizado que apresentasse as conexões metodológicas necessárias para ser categorizada como ciência. Com o fim da Idade Média, período histórico marcado por uma organização social definida pelas aristocracias feudais, pelas imposições eclesiásticas da Igreja Católica e por um sistema econômico baseado na troca e no escambo, surge a necessidade de legitimar a ciência a partir do método a fim de racionalizar os seus procedimentos e descobrimentos, antes, desacreditados e questionados pelo clero, poder religioso da estrutura medieval que operava diretamente nas decisões políticas da sociedade europeia. Neste sentido, o pensamento moderno, inaugurado com as mudanças históricas proporcionadas pelo Iluminismo, pelo capitalismo e pelo positivismo, estipulou o método (baseado exclusivamente em concepções empiristas e quantitativas da época Moderna) como uma condição imprescindível para se fazer ciência. O conhecimento da realidade em diversas sociedades e na maior parte da história da humanidade foi buscado nos signos religiosos, nas lendas, na poesia e na religião. Foi rompendo com estas formas, até então tradicionais de explicação da realidade, que o pensamento moderno tomou forma inaugurando um novo período na história da humanidade onde o conhecimento foi tomado como ação racional (LEITÃO, 2017, p.12). Figura 1: O Homem Vitruviano (1490), obra renascentista de Leonardo da Vinci (1452 - 1519) que se tornou símbolo do Antropocentrismo (homem no centro), conceito característico da Modernidade. https://www.shutterstock.com/pt/image-vector/homo-vitruviano-vitruvian-man- leonardos-detailed-602705321 Desta forma, foi a partir do século XIX que a ciência geográfica inicia os primeiros passos na sistematização de um método por meio dos estudos dos intelectuais alemães Carl Ritter (1779 - 1859) e Alexander Von Humboldt (1759 - 1859), que no mesmo período histórico, dedicaram-se a estudar as interações entre o homem e a natureza. Portanto, podemos afirmar que Humboldt e Ritter, são os percursores da geografia sistematizada e de metodologias para se pensar tal ciência. Carl Ritter (1779 – 1859), ao lado de Alexander Von Humboldt (1769 – 1859), é apontado como um dos organizadores das bases da Geografia Moderna. Apesar de nenhum destes dois geógrafos ter sido pioneiro no estudo da Geografia na Modernidade, foram os primeiros a proporem uma ciência geográfica, cujo objetivo fosse compreender as leis que regem a relação entre a natureza e a sociedade (LEITÃO, 2017, p. 12). Ao analisarmos a contribuição dos autores para a sistematização da geografia e, por consequência, sua consolidação enquanto ciência racionalizada por uma metodologia testada, podemos perceber que o que os diferenciavam teoricamente era o método de análise que propunham para desenvolver seus estudos. Segundo Leitão (2017), Humboldt era um naturalista empirista que viajou por diversos locais do mundo enquanto Ritter compôs sua obra a partir de atividades de revisão bibliográfica, propondo um sentido para a relação homem-natureza. Ambos os autores se encontravam inseridos em um contexto de profundas transformações na história na Alemanha e, sobretudo, na história Ocidental. A ciência, nesse período, estava fundamentada em uma compreensão mecanicista do universo, ou seja, estava ancorada na razão exacerbada, herança do positivismo iluminista, como vimos anteriormente. “Efetivamente, a epistemologia dominante fundamenta-se em contextos culturais e políticos bem definidos: o mundo moderno cristão ocidental, o colonialismo e o capitalismo” (TAVARES, 2009, p. 183). O pensamento moderno baseado nas contribuições da física de Newton iniciou a modernidade enquanto corrente científica. A física Newtoniana, concretizou a forma mecânica de compreender a natureza, afirmando que nada poderia fugir das relações de causa e efeito, sendo assim, as explicações dos fenômenos seriam logicamente medidas e traduzidas em equações matemáticas adequadas a explicar todos os eventos que acontecem no espaço. Contudo, a inspiração científica de Ritter, não foi somente instigada pela corrente racionalista que permeou a Modernidade, sua geografia preocupava-se em dar respostas aos dilemas do seu tempo e as questões que preocupavam sua geração, afirmando que a geografia seria capaz de encontrar leis racionais e universais que gerissem a conexão entre a humanidade e a natureza quando compreendesse, que mesmo a razão, era detentora de contradições e complexidades inerentes ao agir e pensar humano. Ao analisar as mudanças políticas, sociais, econômicas, culturais e epistemológicas que ocorreram no continente europeu pós-Revolução Francesa, relacionando-as com a corrente científica racionalista, o autor aponta: Muitos daqueles que esperavam que a Revolução Francesa fosse capaz de inspirar em toda a Europa uma sociedade mais igualitária e livre, assistiram à queda do tradicional Antigo Regime sem que isso representasse mudanças significativas na vida da maior parte da população. O homem moderno continuava refém das fraquezas humanas, mas em contrapartida, havia perdido seu elo com a natureza, aberto mão de sua tradição e perdido o contato integral da vida comunitária (LEITÃO, 2017, p. 13). À vista disto, Carl Ritter preocupou-se em sistematizar o conhecimento geográfico ao elaborar uma interpretação científica e racional para entender a interação entre o homem e a natureza e encontrar um significado para a existência humana. O geógrafo acreditava que a vontade de Deus havia desenvolvido a ciência racional como condição da humanidade se reconectar com a natureza e, consequentemente, se reconectar com Deus através da contemplação da mesma. Corroboramos que, mesmo com o fim da Idade Média e a ocorrência da Modernidade, tais transformações históricas não ocorreram do dia para a noite, logo, vale ressaltar que a religião, como instituição que molda as ações e pensamentos humanos, continuou a exercer grandes influências nas práticas sociais modernas. Tal fato explicaria a crença e pertença religiosa manifestada por Carl Ritter em seus estudos a respeito da geografia. Para Ritter, as adversidades da natureza moldam o caráter e o espírito de um povo, da mesma maneira que o homem é capaz de alterar a natureza. É desta relação, que é por essência conflituosa, que são moldadas as regiões em suas particularidades. As regiões, a natureza e os homens são, portanto, portadores de história. É a partir da história que o geógrafo se torna capaz de compreender os meandros da relação homem-natureza (LEITÃO, 2017, p. 29). A fim de compreender de que forma os fenômenos apresentam-se na superfície da Terra por meio de uma razão universal, ainda que estivesse focado em entender as particularidades de cada região, o autor encontrou um método que relaciona a parte e o todo. Logo, a partir de suas contribuições epistemológicas,Carl Ritter é reconhecido como o percursor da Geografia Humana como método científico. Ainda que Ritter tenha vivido no século XVIII, em um momento em que a própria concepção de ciência era concebida de forma mais holística, seu interesse foi o de utilizar a Geografia como forma de superar a fragmentação imposta pelo avanço da razão em sua época (MOREIRA, 2010 apud LEITÃO, 2017, p. 14). Por outro lado, Alexander von Humboldt buscou formular teorias sobre a Terra a partir do empirismo racionado e do método intuitivo, isto é, a compreensão dos conhecimentos relativos a terra se dará a partir da observação como suporte para a prática e assimilação direta da realidade para além da razão. Durante suas expedições, o autor observou que as características da flora e da fauna de uma região estão estreitamente relacionadas com as condições climáticas, latitudes e tipo de relevo existentes nesse ambiente. A partir dessa elaboração analítica, Humboldt desenvolveu o conceito de “meio ambiente geográfico”, sendo reconhecido como percursor da Geografia Física. As respostas encontradas por Ritter e Humboldt para os impasses de sua época e suas formas de pensar a Geografia podem não ser adequadas às nossas pretensões atuais, mas entendê-los é fundamental para que possamos revisar nosso passado encontrando elementos que possam auxiliar as respostas que buscamos dar em nosso próprio tempo. Ao longo do presente tópico, buscamos apresentar os primeiros passos da sistematização da ciência geográfica como uma importante ferramenta de compreensão da realidade, cuja formulação e desenvolvimento teórico-metodológico vem a contribuir para que a humanidade possa entender a natureza e sua relação com ela, que pode vir a ser, tanto saudável e respeitosa, quanto nefasta e destrutiva. 2 AS CORRENTES DO PENSAMENTO GEOGRÁFICO Imagem do Tópico: https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/aircraft-spotter- searches-sky-binoculars-during-249573040 Prezada (o) Aluna (o), estudamos no tópico anterior que as contribuições de Carl Ritter e Alexandre Von Humboldt, asseguraram caminhos abertos para as discussões teóricas acerca do pensamento geográfico, formulada por levantamentos experimentais e contagens esgotantes sobre distintos lugares da Terra. Vimos, também, a importância dos processos de sistematização do saber geográfico, de forma particular e autônoma, para que o mesmo fosse considerado uma ciência específica e com métodos próprios. Tendo em vista o conteúdo trabalhado anteriormente, neste tópico iremos dar continuidade aos estudos referentes a Geografia enquanto ciência e campo investigativo, focando nas correntes teóricas em que o pensamento geográfico foi construído, metodizado e elaborado cientificamente, pois para compreendermos as epistemologias da Geografia, precisamos conhecer o desenvolvimento das principais correntes que surgiram após a sua legitimação enquanto ciência sistematizada. Os primeiros princípios teóricos desenvolvidos para nortear as análises geográficas, presente em estudos até os dias atuais, foram realizados nos processos de sistematização metodológica que estudamos no tópico passado. Como afirma Antonio Carlos Robert Moraes (1994), fazem parte desse repertório o conhecimento acerca da extensão do planeta, o levantamento de informações a respeito da superfície terrestre, o desenvolvimento de técnicas cartográficas e o surgimento das teorias raciais do evolucionismo. Tais princípios, foram os primeiros passos rumo a consolidação da ciência geográfica, influenciando diretamente o surgimento de correntes teóricas cujo o objetivo é o de pensar a ciência em destaque e de servir como aporte teórico para investigações a respeito das problemáticas que envolvem a Geografia. Logo, as correntes do pensamento geográfico, com suas especificidades analíticas, semelhanças e cisões, podem ser identificadas em dois grandes grupos: a Tradicional, entendendo o agrupamento das correntes que não dialogam com as questões sociais, mas estudam a https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/aircraft-spotter-searches-sky-binoculars-during-249573040 https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/aircraft-spotter-searches-sky-binoculars-during-249573040 relação entre a humanidade e a natureza amparada na percepção da Geografia como ciência descritiva e de observação dos fenômenos naturais, ou seja, positivista; e a Moderna, que questiona o tradicionalismo e o positivismo amparando a Geografia como ciência atenta às questões sociais e complexidades humanas. 2.1 Geografia Tradicional A corrente teórica da Geografia Tradicional têm seu desenvolvimento e consolidação possibilitada por três escolas distintas, sendo elas: 1- Determinismo, cujo o principal teórico é o alemão Friedrich Ratzel, que sustenta o argumento de que as circunstâncias naturais definem a relação com o homem e , por consequência, intervêm nas suas condições de evolução; 2- Possibilismo, estabelecido pelas ideias do francês Paul Vidal de La Blache, que defendia que a natureza oferece oportunidades para que o homem a transforme sem necessariamente indicar comportamentos; 3- Regionalismo, escola amparada pelo norte-americano Richard Hartshorne e, também, por Paul Vidal de La Blache, que afirmavam que o conhecimento das regiões geográficas e suas diferenças se davam por meio do detalhamento dos lugares e fragmentações territoriais. 2.1.1 Determinismo Geográfico Teoria formulada no século XIX pelo geógrafo alemão Friedrich Ratzel, que aponta as influências que as condições naturais exercem sobre os seres humanos, a escola determinista sustenta a ideia de que o meio natural determina o homem, nesse sentido, os homens procurariam organizar o espaço para garantir a manutenção da vida. Segundo Moraes (1994), para Ratzel “A perda de território seria a maior prova de decadência de uma sociedade. Por outro lado, o progresso implicaria a necessidade de aumentar o território, logo, de conquistar novas áreas (p. 19)”. As análises de Ratzel estavam ligadas fortemente ao momento histórico que se encontrava inserido, compreendendo o período de unificação da Alemanha no século XIX. O expansionismo do império alemão, arquitetado pelo primeiro-ministro da Prússia Otto Von Bismarck (1815-1898), foi legitimado pelas duas principais correntes do pensamento Ratzeliano, o determinismo geográfico - que explicaria a superioridade de algumas raças, nesse caso a alemã, que naturalmente se desenvolveriam mais do que outras - e o espaço vital, que justificaria a conquista de novos territórios de formas violentas para suprir a maior demanda de recursos para seu desenvolvimento, ou seja, o expansionismo. Ratzel elabora o conceito de “espaço vital”; este representaria uma proporção de equilíbrio, entre a população de uma dada sociedade e os recursos disponíveis para suprir suas necessidades, definindo assim suas potencialidades de progredir e suas premências territoriais. É fácil observar a íntima vinculação entre estas formulações de Ratzel, sua época e o projeto imperial alemão. Esta ligação se expressa na justificativa do expansionismo como algo natural e inevitável, numa sociedade que progride, gerando uma teoria que legitima o imperialismo bismarckiano. Também sua visão do Estado como um protetor acima da sociedade, vem no sentido de legitimar o Estado prussiano, onipresente e militarizado. (MORAES, 1994, p. 19). Os discípulos da escola determinista foram além das proposições de Ratzel, chegando a afirmar que o homem seria um produto do meio ao defenderem que um ambiente mais hostil proporcionaria um maior nível de desenvolvimento ao exigir um alto grau de organização social para suportar todas as contrariedades impostas pelo meio. Ex: O inverno justificaria o desenvolvimento das sociedades europeias, que não tiveram grandes dificuldades em subjugaros povos tropicais, isto é, sociedades africanas e americanas, que segundo tal pensamento, seriam mais indolentes, incivilizados e atrasados. Essa ideia falaciosa serviu de justificativa para a colonização, a escravidão e o expansionismo neocolonial na África e na Ásia entre o fim do século XIX e o início do século XX. Pensamentos que, mais tarde, foram aproveitados pelos cientistas e políticos da Alemanha Nazista durante a Segunda Guerra Mundial a fim de sustentar as atrocidades do Holocausto e o extermínio de populações consideradas racialmente inferiores, como judeus, negros, ciganos e pessoas com deficiência. Em acordo com Moraes (1994), a característica principal do Determinismo “[...] reside no fato de haver trazido, para o debate geográfico, os temas políticos e econômicos, colocando o homem no centro das análises. Mesmo que numa visão naturalizante, e para legitimar interesses contrários ao humanismo” (p. 21). 2.1.2 Possibilismo Geográfico A escola possibilista teve origem na França com Paul Vidal De La Blache, teórico que estava inserido no pensamento político dominante da sociedade francesa em um momento em que a nação tornou-se uma grande soberania. Para compreender o processo de eclosão do pensamento geográfico na França, e o tipo de reflexão que este engendrou, é necessário enfocar os traços gerais do desenvolvimento histórico francês no século XIX, e, em detalhe, a conjuntura da Terceira República e o conflito de interesses com a Alemanha (MORAES, 1994, p. 22). Paul Vidal De La Blache realizou estudos regionais procurando provar que a natureza exercia influências sobre o homem, mas que o homem tinha possibilidades de modificar e de melhorar o meio, ideia chave do Possibilismo. O autor delineou o enfoque da Geografia a partir da interação homem-natureza, na concepção da paisagem, inserindo o homem como um ser dinâmico, que sente a influência do meio, mas que opera sobre este, modificando-o. A partir dessa elaboração, constatou que as urgências humanas são influenciadas pela natureza, e que a humanidade procura recursos para satisfazê-las nos elementos e nas possibilidades ofertadas pelo meio. Conforme afirmado por Moraes (1994) a geografia vidalina tem como enfoque a população, o agrupamento social, e nunca a sociedade em si, isto é, tal escola aborda os estabelecimentos e feitos humanos a partir de técnicas e de instrumentos de trabalho, não as relações e dinamizações sociais ocorridas através de processos de produção e exploração. “Enfim, discute a relação homem-natureza, porém sem abordar as relações entre os homens. É por esta razão que a carga naturalista é mantida, apesar do apelo à História, contido em sua proposta” (MORAES, 1994, p. 26). Por fim, podemos dizer que o Possibilismo considera a natureza como fornecedora de possibilidades e o homem como o principal agente geográfico que atua e modifica a natureza. 2.1.3 Regionalismo Geográfico Essa corrente do pensamento geográfico tradicional, tem suas bases propostas pelo diálogo entre Paul Vidal de La Blache, que como já vimos é o teórico principal da escola possibilista, e Richard Hartshorne, norte-americano que afirma que os aspectos próprios da Geografia eram o espaço e os lugares. O método adotado por essa vertente compreendia em comparar regiões, sobre os critérios de semelhança e diferença, dedicando-se a coleta de informações descritiva sobre lugares ao dividir a Terra em regiões. Para Hartshorne, os espaços eram divididos em áreas nas quais os elementos mais homogêneos determinariam cada classe e, assim, as descontinuidades destes espaços trariam as divisões das áreas. Hartshorne argumentou que os fenômenos variam de lugar a lugar, que as suas inter-relações também variam, e que os elementos possuem relações internas e externas à área. O caráter de cada área seria dado pela integração de fenômenos inter-relacionados. Assim, a análise deveria buscar a integração do maior número possível de fenômenos inter-relacionados. (MORAES, 1994, p. 32). Logo, podemos afirmar que para o teórico em destaque, o pesquisador faria a análise de um só lugar, tentando compreender diversos elementos que levariam à construção de um importante e significativo conhecimento sobre determinado local. Buscamos visualizar e compreender tal método a partir dos exemplos expostos por Moraes: [...] o pesquisador seleciona dois ou mais fenômenos (p. ex. clima, produção agrícola, tecnologia disponível), observa-os na área escolhida, relaciona-os. Seleciona outros (p. ex. topografia, estrutura fundiária, relações de trabalho), observa-os, relaciona-os; repete várias vezes este procedimento, tentando abarcar o maior número de fenômenos (tipo de solo, destinação da produção, número de cidades, tamanho do mercado consumidor, hidrografia etc.); uma vez de posse de vários conjuntos de fenômenos agrupados e inter-relacionados, integra-os inter-relacionando os conjuntos; repete todo este procedimento, com novos fenômenos, ou novos agrupamentos dos mesmos fenômenos, em conjuntos diferentes; afinal, integram-se, entre si, os conjuntos já integrados separadamente (MORAES, 1994, p. 32). As propostas dessa corrente abriram inúmeras possibilidades para os estudos geográficos e foram amplamente discutidas, pois possibilitou análises locais, focadas na união de temas conectados, à exemplo de uma geografia dos recursos naturais e uma geografia dos transportes, relacionando e integrando uma diversidade de fenômenos relacionados a essas temáticas específicas. Tal pensamento geográfico definido como método regional, possibilitou um trabalho investigativo com uma quantidade diversa de elementos, relacionando interesses cada vez mais planejados e ágeis sobre determinada região. A partir do exposto durante o presente tópico, a Geografia Tradicional contribuiu para a fundamentação de um campo amplo de investigações sistematizadas ao organizar uma continuidade de discussões estruturadas em conhecimentos metodológicos. Nesse processo, elaborou um temário válido, independente das teorias que desenvolveu; esse temário restou como a grande herança do pensamento geográfico tradicional. Assim, seu grande feito foi a identificação de problemas, o levantamento de questões válidas, às quais deu respostas insatisfatórias ou equivocadas (MORAES, 1994, p. 33). Concomitante à isso, a Geografia Tradicional contribuiu com uma quantidade vasta de informações e levantamento de diversas realidades, constituindo um material essencial para pesquisadores que vieram depois, beneficiados pelo caráter descritivo das informações levantadas e dados minuciosos sobre uma pluralidade de fenômenos, inclusive, para que tais teóricos subsequentes formulassem críticas e correntes divergentes às aqui explanadas. Para concluir, apesar de suas limitações generalistas e naturalistas, o pensamento geográfico tradicional contribuiu para a elaboração de alguns conceitos bases da Geografia atual como ambiente, território, região, habitat, etc. (reestruturados e ressignificados posteriormente). O cenário apresentado diz respeito às primeiras vertentes teórica-metodológicas da Geografia, as críticas levantadas a essa corrente, proporcionou avanços científicos na construção do pensamento geográfico e na produção epistemológica acerca dessa ciência. 2.2 Geografia Moderna Por volta da década de 1950, com o fim da II Guerra Mundial (1939 e 1945) e a expansão do sistema capitalista, as correntes do pensamento geográfico tradicional foram questionadas, trazendo para as novas análises a defesa de fazer da Geografia uma ciência humana e social. Sobre a estruturação de novas formas e sentidos para pensar a disciplina nos anos seguintes, podemos apontar que A crise da Geografia Tradicional, e o movimento de renovação a ela associado, começam a se manifestar já em meadosda década de cinquenta e se desenvolvem aceleradamente nos anos posteriores. A década de sessenta encontra as incertezas e os questionamentos difundidos por vários pontos. A partir de 1970, a Geografia Tradicional está definitivamente enterrada; suas manifestações, dessa data em diante, vão soar como sobrevivências, resquícios de um passado já superado. Instala-se, de forma sólida, um tempo de críticas e de propostas no âmbito dessa disciplina. Os geógrafos vão abrir-se para novas discussões e buscar caminhos metodológicos até então não trilhados. Isto implica uma dispersão das perspectivas, na perda da unidade contida na Geografia Tradicional. Esta crise é benéfica, pois introduz um pensamento crítico, frente ao passado dessa disciplina e seus horizontes futuros. Introduz a possibilidade do novo, de uma Geografia mais generosa (MORAES, 1994, p. 34). Em virtude disso, o surgimento e consolidação da Geografia Moderna se deu a partir de duas grandes escolas teóricas: a Pragmática, que está ligada a Geografia aplicada e que acredita na tecnologia geográfica, mediada por dados estatísticos e diagnósticos que subsidiaram a estruturação das relações capitalistas ao incentivar tomadas de decisões de governos e empresas; e a Crítica, que apresenta propostas heterogêneas que se aproximam de análises acerca da realidade social, com suas desigualdades, assimetrias e contradições, apontando assim, a Geografia como uma ciência que vislumbra mudanças sociais em busca de uma coletividade mais justa e engajada politicamente junto ao meio ambiente. 2.2.1 Geografia Pragmática (Nova Geografia, Geografia Teorética ou Quantitativa) A Geografia Pragmática corresponde a um corrente do pensamento geográfico desenvolvida a partir da década de 50, emergente a partir da urgência da obtenção de dados exatos, calcados em conceitos teóricos, que fossem apoiados em análises estatísticas, matemáticas e exatas da realidade. A escola foi utilizada como forte ferramenta para a consolidação dos poderes do Estado através de soluções baseadas em dados quantitativos. Desta forma, seu intuito geral é o de uma “renovação metodológica”, o de buscar novas técnicas e uma nova linguagem, que dê conta das novas tarefas postas pelo planejamento. A finalidade explícita é criar uma tecnologia geográfica, um móvel utilitário. Daí sua denominação de pragmática (MORAES, 1994, p. 37). As características principais dessa corrente são de que todo o conhecimento está apoiado na experiência (empirismo) e que deve existir uma linguagem comum entre todas as ciências. Desse modo, tal interpretação recusa a ideia de um dualismo científico e forças complementares expressas entre as ciências naturais e as ciências sociais, exigindo assim, uma exatidão maior na aplicação da metodologia quantitativa e no uso de técnicas das ciências exatas. Portanto, os resultados das investigações científicas sob a alçada da Geografia Pragmática devem ser apresentados de forma lógica e apurada por meio do uso da linguagem matemática. Em razão disso, tais investigações ampliam a utilização da tecnologia na intervenção da realidade, pois se apresentam como uma artilharia de dominação para os interesses do Estado planejador que propõe suas ações balizadas em categorias técnicas, onde esconde os interesses de dominação almejadas, defendendo uma suposta neutralidade científica. A Geografia Pragmática é um instrumento da dominação burguesa, um aparato do Estado capitalista. Seus fundamentos, enquanto um saber de classe, estão indissoluvelmente ligados ao desenvolvimento do capitalismo monopolista. Assim, são interesses claros os que ela defende: a maximização dos lucros, a ampliação da acumulação de capital, enfim, a manutenção da exploração do trabalho. Nesse sentido, mascara as contradições sociais, legitima a ação do capital sobre o espaço terrestre. É uma arma prática de intervenção, mas também uma arma ideológica, no sentido de tentar fazer passar como “medidas técnicas”, logo, neutras e cientificamente recomendadas” a ação do Estado na defesa de interesses de classe (MORAES, 1994, p. 40). Enfim, essa corrente predominou nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, principalmente na década de 1960 e meados da década de 1970. Contudo, é a partir dos anos 60 que a Geografia Pragmática começa a sofrer diversas críticas, cuja principal delas está relacionada ao fato da escola não considerar as particularidades dos fenômenos ao reduzi-los a explicações estritamente exatas. Corroboramos que o método matemático não é eficiente para explicar sozinho os intervalos existentes entre diferentes momentos históricos, pois não alcança as especificidades das relações estabelecidas entre ação humana e espaço geográfico ao compreender o meio apenas de forma homogênea e quantificada em números. 2.2.2 Geografia Crítica A Geografia Crítica surgiu na França, em 1970, e depois foi desenvolvida por pesquisas em diferentes realidades do mundo, como na Alemanha, Brasil, Itália, Espanha, México e outros países, ganhando força e se legitimando como um grande movimento de renovação da Geografia na década de 80. As primeiras referências à essa corrente do pensamento geográfico foram realizadas com ênfase na obra “A Geografia serve, antes de mais nada, para fazer a guerra” do Francês Yves Lacoste. Ao estabelecer o rompimento da suposta neutralidade da Geografia Pragmática e propor maior engajamento e criticidade junto a toda a conjuntura social, econômica, política e cultural do mundo, a Geografia Crítica possibilita uma leitura honesta e coerente frente aos problemas e interesses que envolvem as relações de poder e os embates históricos por território, defendendo a diminuição das assimetrias sociais, econômicas e regionais presentes nas dinâmicas de cada sociedade. Propõe, ainda, uma mudança significativa no ensino de Geografia ao promover uma educação que estimule e pensamento crítico e interpretações contextualizadas historicamente que não reduzem e simplifiquem a Geografia por reducionismos, generalismos e preconceitos. O designativo de crítica diz respeito, principalmente, a uma postura frente à realidade, frente à ordem constituída. São os autores que se posicionam por uma transformação da realidade social, pensando o seu saber como uma arma desse processo. São, assim, os que assumem o conteúdo político de conhecimento científico, propondo uma Geografia militante, que lute por uma sociedade mais justa. São os que pensam a análise geográfica como um instrumento de libertação do homem (MORAES, 1994, p. 42). Nas ideias de Yves Lacoste (1988), o Estado possui uma visão estruturada do espaço, pois tem o poder de agir sobre todos os lugares, exercendo mais uma ferramenta de dominação. Logo, faz-se necessário construir uma visão integrada do espaço e da sociedade a partir de interpretações que socializem este saber, pois possuem estratégias fundamentais para momentos de disputas políticas e para uma organização social que pense o espaço de forma justa com as necessidades humanas de sobrevivência, não com ganâncias de consumo e esgotamento de terras, matérias-primas e recursos naturais. [...] a função ideológica essencial do discurso da geografia escolar e universitária foi sobretudo o de mascarar por procedimentos que não são evidentes a utilidade prática da análise do espaço, sobretudo para a condução da guerra, como ainda para a organização do Estado e prática do poder. É sobretudo quando ele parece “inútil” que o discurso geográfico exerce a função mistificadora mais eficaz, pois a crítica de seus objetivos “neutros” e “inocentes” parece supérflua. A sutileza foi a de ter passado um saber estratégico, militar e político como se fosse um discurso pedagógico ou científico perfeitamente inofensivo. Nós veremos que as consequências desta mistificação são graves (LACOSTE, 1988, p. 25).No Brasil, o grande nome da renovação da Geografia foi o teórico baiano Milton Santos, que publicou as primeiras contribuições dessa nova abordagem no país. O autor defende que toda manifestação produtiva do homem, implica em uma ação modificadora da superfície terrestre. Santos afirma que a organização do espaço é determinada pela tecnologia, pela cultura e pela organização social da sociedade, que a empreendem. Na sociedade capitalista, a organização espacial é imposta pelo ritmo de acumulação. Na verdade, esta representa uma dotação diferencial de instrumentos de trabalho, na superfície do planeta, uma fixação de capital no espaço, obedecendo a uma distribuição “desigual e combinada”. Diz que, desta forma, os lugares manifestam uma combinação de capital, trabalho, tecnologia e trabalho morto, expresso nas “rugosidades” (MORAES, 1994, p. 46). O pensamento crítico na Geografia significou principalmente uma aproximação com os movimentos sociais, na busca da ampliação dos direitos civis e humanos, expressa pelo acesso à educação gratuita e de qualidade, à moradia, à terra, combate à pobreza e à violência ambiental, como o desmatamento, poluição, extinção de organismos vivos pertencentes a fauna e a flora, entre outras temáticas. 3 AS TENDÊNCIAS DA GEOGRAFIA MUNDIAL E BRASILEIRA Imagem do Tópico: https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/national-flags- different-countries-world-brazilian-453959620 www.shutterstock.com/ Cara (o) Aluna (o), nos tópicos anteriores estudamos os paradigmas que marcaram a evolução do pensamento geográfico e a estruturação dos métodos que fundamentaram cientificamente a Geografia ao longo dos séculos. Faz-se necessário historicizar o processo de evolução do pensamento geográfico a fim de analisarmos e entendermos os pressupostos da Geografia como ciência e sua relação com outras áreas do conhecimento através do contexto histórico de sua produção. No presente tópico, temos por objetivo dar continuidade aos estudos acerca da Geografia como ciência de referência ao nos debruçarmos pelas tendências da Geografia mundial e, em específico, da brasileira. Corroboramos que o processo de desenvolvimento do pensamento geográfico, ocorrido desde a Grécia Antiga, possibilitou o surgimento de vertentes teóricas das quais são imprescindíveis para compreendermos a ciência geográfica atualmente. Logo, a História torna-se importante para pensarmos nossos objetivos de estudo, pois nos auxilia a confluir passado e presente para que possamos almejar direcionamentos à respeito da Geografia no futuro. Há um consenso entre a comunidade científica que, atualmente, a Geografia é considerada uma ciência interativa e sistêmica. Interativa pois proporciona uma relação com diversos elementos presentes nos fenômenos estudados a partir de um caráter multidisciplinar, dialogando com outros saberes científicos e áreas do conhecimento, à exemplo da História (como já vimos anteriormente). Sistêmica devido à premissas teóricas que definem o objeto de pesquisa ao conjugar métodos necessários para sua formulação e identificar conexões complexas presentes no mundo globalizado. Nas últimas décadas, a Geografia distanciou-se da preocupação em descrever fenômenos e repassar informações decoradas e repetitivas, como exemplo, as capitais dos países e estados, a quantidade populacional de um determinado lugar, a extensão dos rios e etc. Por conseguinte, os estudos geográficos se fortaleceram por meio de novas metodologias de análise, priorizando uma investigação sistêmica dos processos https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/national-flags-different-countries-world-brazilian-453959620 https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/national-flags-different-countries-world-brazilian-453959620 demográficos, econômicos, urbanos, sociais que dêem ênfase ao desenvolvimento das pesquisas a partir das necessidades da nova ordem mundial. Os estudos geográficos físicos, populacionais, econômicos e geopolíticos são, atualmente, abordados por metodologias científicas, produzindo conceitos e interpretações a partir de análises sobre as causas das realidades geográficas. A relação causa-efeito só produzirá resultado científico se for estabelecida a razão geográfica da realidade em determinadas escalas regionais e macrorregionais. A territorialidade e as interações sistêmicas com os ambientes naturais, os processos demográficos e as mudanças geopolíticas nas transterritorialidades constituem, pois, a razão da ruptura epistêmica ocorrida na Geografia nas últimas décadas (VIEIRA, 2013, p. 74 - 75). Uma das grandes inovações ocorridas na Geografia atual é a utilização de ferramentas de alta tecnologia que proporcionam uma melhor análise e identificação das ocorrências e fenômenos que modificam a superfície da Terra, usufruídas por geógrafos e geógrafas em seus estudos e pesquisas. Como afirma Euripedes Falcão Vieira (2013), “técnicas de geoprocessamento e imagens de satélites facilitam localizações, movimentos da hidrodinâmica fluvial, devastação de ambientes florestais, dinâmica marinha costeira e tantos outros” (p. 78). Desta forma, podemos afirmar que a tecnologia advinda do desenvolvimento e democratização da internet, dos satélites e de uma comunicação global em alta escala, configura-se como mudanças significativas e essenciais para a ciência geográfica e para suas produções epistemológicas nos dias de hoje. Outra tendência importante para os estudos atuais da Geografia diz respeito às migrações que acontecem em escala global, evidenciando dinâmicas sociais de forte impacto na geopolítica dos espaços que sofrem e recebem grandes deslocamentos populacionais. Para compreendermos essa complexa temática é preciso utilizar diversas categorias analíticas, pois tal fenômeno interfere ativamente na vida social, na estrutura econômica, nas condições culturais e na dinâmica entre territorialidades e população. As migrações humanas ocorrem desde o Período Mesolítico – (10.000 – 8.000 a.C.), momento histórico de diversas modificações geológicas e climáticas na Terra, fato que caracterizou a transição de uma sociedade nômade para uma sociedade sedentária do homem pré-histórico. Podemos observar, também, migrações durante os processos de colonização europeia nas invasões de territórios africanos e americanos no século XVI. As migrações em larga escala estão muitas vezes ligadas a antigas relações de conquista e domínios coloniais. Mas é preciso considerar, também, as que ocorrem por força da nova ordem econômica mundial, que globalizou a produção e criou, consequentemente, uma nova divisão internacional do trabalho. Há, ainda, o fator da intelectualidade global, ativando a mobilidade da população mais jovem (VIEIRA, 2013, p. 79). Desta forma, apesar de não ser um fenômeno atual, ou seja, um fenômeno que tem uma longevidade histórica, as migrações humanas ganharam novos sentidos e significados devido à globalização. É necessário pensarmos nos motivos que levam uma quantidade significativa de pessoas a migrar do seu local de origem para uma análise geográfica precisa, sem preconceitos ou reducionismos das populações migrantes, e que interconecte as categorias de uma sociedade global. Já no Brasil, as tendências da Geografia perpassam as preocupações acerca da nossa realidade histórica e social, como por exemplo análises capazes de responder questões referentes à estrutura fundiária e o agronegócio, à pobreza e desigualdade, à segurança política e defesa, à ameaças globais e transnacionais, à matriz energética e meio ambiente, ao minério e indústria extrativa, à riqueza genética e biodiversidade, à população e diversidade social, étnica-racial e de gênero, entre outras. Tais temáticas tornam-se relacionadas à posição do Brasil frente ao mundo globalizado, apresentando- se como novas linhas e tendências analíticas napesquisa geográfica. De acordo com Armen Mamigonian (1999), as tendências atuais da Geografia aspiram dar resposta à crise da sociedade, da civilização e da própria disciplina. O autor nos aponta que o desenvolvimento do modo de produção capitalista levou o Brasil a mundialização da economia, fato que forçou uma redefinição dos espaços nacionais, regionais e locais, seus papéis na divisão territorial e social do trabalho, intervenções mais incisivas do Estado e novas tendências à concorrência internacional que provocaram assimetrias na distribuição geográfica do nosso território. Além do processo de urbanização tão brutal como nós vivemos nas últimas décadas e intimamente acoplado a ele afloraram novas problemáticas, que estão estimulando linhas de pesquisa que já existiam, mas foram renovadas: 1) a preocupação por decifrar os processos espaciais no interior das cidades, aprofundando os conhecimentos de renda capitalista da terra (também na agricultura), sobre influência marxista; 2) a preocupação por combinar desenvolvimento econômico e preservação ambiental, como nas propostas de eco-desenvolvimento (Ignacy Sachs na França, Aziz Ab’Saber no Brasil, por exemplo), procurando soluções de crescimento, com vantagens sociais (por exemplo, códigos de empregos) e ambientais (controle dos gases da combustão nas cidades, por exemplo); 3) a preocupação por uma geografia da percepção, cuja raiz está na crescente alienação das pessoas, incapazes de realizar “mapas mentais”, mas também vinculada à psicologia comportamental, de potencial totalitário (Skinner, por exemplo) conforme seu uso (MAMIGONIAN, 1999, p. 177). Diante dessas novas realidades, podemos afirmar que as tendências em vigência na teoria e na prática da ciência geográfica perpassam as demandas da sociedade atual, se apresentando em quatro grandes eixos: 1) diversidade de correntes teóricas e premissas filosóficas; 2) interdisciplinaridade no diálogo e interação epistemológica entre as disciplinas no interior da Geografia e da própria Geografia em relação a outras áreas do conhecimento; 3) aumento e popularização de linhas de pesquisas destinadas à perspectivas que estabeleçam relações dinâmicas entre a sociedade humana e o ambiente natural, como a geopolítica por exemplo; 4) reconfigurações de saberes e conceitos concomitantes às mudanças advindas da urbanização, globalização e democratização das tecnologias. 4 CONCEITOS FUNDAMENTAIS NA COMPREENSÃO DO ESPAÇO Imagem do Tópico: https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/aerial-view-cars- trains-intersection-junction-1457094053 www.shutterstock.com/ Estimada (o) Aluna (o), no presente tópico temos por objetivo conhecer conceitos fundamentais para a compreensão do espaço. A priori, devemos ter em vista que o conceito de espaço se apresenta como uma das mais importantes categorias analíticas para o estudo da Geografia. Tal estrutura conceitual é o início de inúmeras produções científicas de autores que dedicaram seus estudos à conceituação de espaço geográfico como uma categoria abrangente e democrática para as pesquisas referentes à ciência geográfica. Iniciaremos nossas análises acerca da categoria de espaço por meio da obra A natureza do espaço (1996) do geógrafo brasileiro Milton Santos, onde propõe que o espaço é “formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá” (p. 63). Para o autor, a natureza é o início, ela provê a matéria-prima as quais são transformadas em objetos pela ação humana através da técnica, isto é, “a principal forma de relação entre o homem e a natureza”, definida como “um conjunto de meios instrumentais e sociais, com os quais o homem realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço” (1996, p. 29). Desta forma, para a ciência geográfica, o espaço pode ser conceituado como a parte da superfície da Terra onde ocorrem as interações entre o ser humano e o ambiente natural, ou seja, o espaço geográfico é interpretado e dinamizado a partir de ações e práticas humanas, que por sua vez, são impulsionadas pela natureza, se dando em uma relação recíproca de influências. Milton Santos (1996) nos oferece argumentos críticos para compreendermos que apesar de recíproca, essa relação se dá, muitas vezes, por meio de extremas assimetrias e desigualdades ao elaborar que No princípio, tudo eram coisas, enquanto hoje tudo tende a ser objeto, já que as próprias coisas, dádivas da natureza, quando utilizadas pelos https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/aerial-view-cars-trains-intersection-junction-1457094053 https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/aerial-view-cars-trains-intersection-junction-1457094053 homens a partir de um conjunto de intenções sociais, passam, também, a ser objetos (SANTOS, 1996, p. 65). Em virtude disto, o estudo do espaço geográfico nos possibilita compreender a nossa organização social no presente, que se deu a partir de transformações históricas ocorridas durantes os séculos que, por consequência, permitiram a existência e continuidade da humanidade hoje e, quiçá, no futuro. Conforme o ser humano interfere na natureza de determinado lugar, ele gera e promove o espaço geográfico, categoria imprescindível para o estudo da Geografia. A partir da conceituação de espaço geográfico, buscamos dar ênfase a outras categorias conceituais e analíticas em Geografia, fundamentais para a compreensão de fenômenos espaciais que se manifestam através delas, são elas: região, lugar e território. Região é a categoria geográfica que busca estabelecer características comuns entre diferentes áreas espaciais, ou seja, há elementos pertencentes a determinada região que irão caracterizar todos as localidades que a integram, estabelecendo assim, critérios de qualidades e traços específicos compartilhados por essa região. Elas podem ser utilizadas para divisões e organizações administrativas, como bairros, municípios ou estados, um exemplo são as categorias designadas para agrupar a população brasileira em cinco grandes regiões geopolíticas: Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sul e Sudeste. Em sua obra Região e Organização Espacial (2003), Roberto Lobato Corrêa discorre acerca do conceito de região a partir das diversas correntes do pensamento geográfico que, como já vimos no tópico 2, estão dispostas em: Geografia Tradicional (Determinismo, Possibilismo e Regionalismo) e Geografia Moderna (Pragmática e Crítica). Para o autor, os conceitos de região e organização espacial são essenciais para o entendimento do “[...] caráter distinto da geografia no âmbito das ciências sociais, indicando a via geográfica de conhecimento da sociedade, quer dizer, das relações entre natureza e história” (p.5). Apesar das divergências teóricas e metodológicas, todas as correntes compartilham do pressuposto que as raízes da Geografia estão na busca da compreensão e diferenciação de lugares, regiões, países e continentes, resultados das relações sociais entre homem e natureza. É a partir dessa premissa que o conceito de região torna-se importante para os estudos geográficos, pois possibilita que agrupemos lugares com características semelhantes ao amparar a contextualização do espaço no qual os territórios estão inseridos. Já o conceito de lugar consiste em uma área da superfície terrestre à qual são conferidas especificidades e significados particulares, pois para a formação e constituição de um lugar não basta apenas explicações descritivas a respeito da configuração espacial ocorrida, faz-se preciso que se tenha o entendimento de como se deu o processo da sua composição a partir das interações entre as pessoas que vivem e produzem esse espaço. De acordo com Ana Fani Alessandri Carlos (2007), A produção espacial realiza-se no plano do cotidianoe aparece nas formas de apropriação, utilização e ocupação de um determinado lugar, num momento específico e, revela-se pelo uso como produto da divisão social e técnica do trabalho que produz uma morfologia espacial fragmentada e hierarquizada. Uma vez que cada sujeito se situa num espaço, o lugar permite pensar o viver, o habitar, o trabalho, o lazer enquanto situações vividas, revelando, no nível do cotidiano, os conflitos do mundo moderno (CARLOS, 2007, p. 20). Desta maneira, visualiza-se que cada indivíduo é único e constituído por experiências no tempo e no espaço de formas muito específicas, apesar de partilhadas e com interligação entre si. Logo, um lugar terá significados diferentes para cada indivíduo que nele vive, interfere e experiencia acontecimentos de vida. Por fim, o significado do conceito de território se encontra ligado à demarcação de espaços delimitados, definidos, geralmente, a partir de fronteiras, visíveis ou não, formadas e motivadas por interesses sociais, políticos, econômicos, culturais, religiosos e geográficos, os quais podem ser transformados de acordo com dinâmicas sociais que produzem novos interesses e relações de poder. Tais demarcações ocorrem tanto naturalmente, promovidas pelo meio ambiente, quanto socialmente, desenvolvidas pela ação humana pelas razões citadas acima. O conceito de Território, tratamos o espaço geográfico a partir de uma concepção que privilegia o político ou a dominação-apropriação. Historicamente, o território da Geografia foi pensado, definido e delimitado a partir de relações de poder. Observa-se que, historicamente, a concepção de território associa-se à ideia de natureza e sociedade configuradas por um limite de extensão de poder. Territórios são no fundo relações sociais projetadas no espaço. Por consequência, estes espaços concretos podem formar-se e dissolver-se de modo muito rápido, podendo ter existência regular, porém periódica, podendo o substrato material permanecer o mesmo (SUERTEGARAY, 2001). A partir das contribuições da autora, corroboramos que a divisão de territórios, em especial, a partir da consolidação do Estado como instituição que normatiza formas de controle social, torna-se importante para a ocupação e distribuição humana, pois regula áreas administrativas de organização política, instituindo marcadores em determinada área por um determinado código cultura. Exemplos de território: o Estado, as fronteiras que limitam países, regiões, estados, cidades, bairros e favelas, o narcotráfico, as zonas de guerra, etc. Diante das conceituações atribuídas às categorias de espaço geográfico, região, lugar e território, buscamos apontar que a Geografia expressa uma identidade particular em seu arcabouço teórico, devido seu caráter de ciência social com interface a ciências naturais e exatas. Segundo Corrêa (2003), devemos compreender que as correntes do pensamento geográfico representam conceitos e categorias antagônicas que, apesar de convergirem ou se completarem em alguns aspectos teórico-metodológicos, tiveram sua emergência em um determinado espaço e tempo a partir de uma elaboração sócio- histórica específica. SAIBA MAIS Você sabia que o Geógrafo Brasileiro Milton Santos, é um dos intelectuais mais premiados da América Latina? Recebeu em 1994 o Prêmio Internacional Vautrin Lud, correspondente ao Nobel da Geografia. Pela primeira vez na história desse prêmio, ele era outorgado a um geógrafo que não era nem francês nem norte-americano. Para mais informações a respeito do professor Milton Santos, consulte o site oficial do mesmo, administrado por sua família. SANTOS, Nina. Site Milton Santos, 2011. Disponível em: http://miltonsantos.com.br/site/. Acesso em: 26/04/2021. REFLITA ‘’O geógrafo é, antes de tudo, um filósofo, e os filósofos são otimistas, porque diante deles está a infinidade’’. Milton Santos. CONTEÚDOS de Geografia Geral e do Brasil. Horizonte Geográfico, 2016. Disponível em: https://horizontegeografico.wordpress.com/. Acesso em: 26/04/2021. CONSIDERAÇÕES FINAIS Prezada (o) Aluna (o) Vimos no Tópico 1 que as contribuições de Carl Ritter e Alexandre Von Humboldt, asseguraram caminhos abertos para as discussões teóricas acerca do pensamento geográfico, formulada por levantamentos experimentais e contagens esgotantes sobre distintos lugares da Terra. Vimos, também, a importância dos processos de sistematização do saber geográfico, de forma particular e autônoma, para que o mesmo fosse considerado uma ciência específica e com métodos próprios. Buscamos apresentar os primeiros passos da sistematização da ciência geográfica como uma importante ferramenta de compreensão da realidade, cuja formulação e desenvolvimento teórico-metodológico vem a contribuir para que a humanidade possa entender a natureza e sua relação com ela, que pode vir a ser, tanto saudável e respeitosa, quanto nefasta e destrutiva. No tópico 2 demos continuidade aos estudos referentes a Geografia enquanto ciência e campo investigativo, focando nas correntes teóricas em que o pensamento geográfico foi construído, metodizado e elaborado cientificamente, pois para compreendermos as epistemologias da Geografia, conhecemos o desenvolvimento das principais correntes que surgiram após a sua legitimação enquanto ciência sistematizada. Vimos que o pensamento crítico na Geografia significou principalmente uma aproximação com os movimentos sociais, na busca da ampliação dos direitos civis e humanos, expressa pelo acesso à educação gratuita e de qualidade, à moradia, à terra, combate à pobreza e à violência ambiental, como o desmatamento, poluição, extinção de organismos vivos pertencentes a fauna e a flora, entre outras temáticas. Em seguida no Tópico 3 seguimos refletindo acerca da Geografia como ciência de referência ao nos debruçarmos pelas tendências da Geografia mundial e, em específico, da brasileira. Entendemos que o processo de desenvolvimento do pensamento geográfico, ocorrido desde a Grécia Antiga, possibilitou o surgimento de vertentes teóricas das quais são imprescindíveis para compreendermos a ciência geográfica atualmente. Logo, a História tornou-se importante para pensarmos nos nossos objetivos de estudo, pois nos auxilia a confluir passado e presente para que possamos almejar direcionamentos à respeito da Geografia no futuro. E por fim no tópico 4 conhecemos os conceitos fundamentais para a compreensão do espaço, tendo em vista que o conceito de espaço se apresenta como uma das mais importantes categorias analíticas para o estudo da Geografia. Tal estrutura conceitual é o início de inúmeras produções científicas de autores que dedicaram seus estudos à conceituação de espaço geográfico como uma categoria abrangente e democrática para as pesquisas referentes à ciência geográfica. Compreendemos que as correntes do pensamento geográfico representam conceitos e categorias antagônicas que, apesar de convergirem ou se completarem em alguns aspectos teórico-metodológicos, tiveram sua emergência em um determinado espaço e tempo a partir de uma elaboração sócio- histórica específica. Desejo que o estudo dessa unidade seja de grande valia para sua jornada nessa disciplina. Bons estudos! LEITURA COMPLEMENTAR SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula. (Orgs.) Epistemologias do Sul. São Paulo; Editora Cortez. 2010. 637 páginas. O sociólogo português Boaventura de Sousa Santos vem desde o início dos anos noventa produzindo trabalhos significativos de análise sobre a estrutura e construção do conhecimento moderno. Podemos afirmar que inventariando as diversas raízes que organizaram e ainda sustentam as bases do conhecimento ocidental como culturalmente homogêneo, vem instigando a comunidade científica a debater sobre a eficácia da ciência na construçãoda realidade imediata das pessoas normais. O livro em questão, “Epistemologias do Sul” é um desdobramento desta jornada intelectual e uma busca de novas referências epistêmicas das ciências humanas. LIVRO • Título: Por uma Geografia Nova- Da Crítica da Geografia a uma Geografia Crítica • Autor: Milton Santos • Editora: Edusp • Sinopse: Há cerca de vinte anos, quando foi publicada a primeira edição de Por Uma Geografia Nova, a geografia vivia uma crise interna no mundo todo, impondo à ciência a necessidade de discussões de ordem metodológica, conceitual e epistemológica. A publicação deste livro contribuiu para a renovação crítica da geografia: A verdade, porém, é que tudo está sujeito à lei do movimento e da renovação, inclusive as ciências. O novo não se inventa, descobre-se , propõe o autor na introdução deste que se tornou um livro clássico desde então. Milton Santos contribuiu com esta obra para a superação dos impasses que se apresentavam, propondo uma análise acurada do objeto da ciência: o espaço, mostrando a necessidade de torná-lo verdadeiramente humano, relacionando-o com outras disciplinas afins. FILME/VÍDEO • Título: O Nome da Rosa • Ano: 1986 • Sinopse: Em uma atuação impecável, o ator Sean Connery dá vida ao questionador monge franciscano Guilherme de Baskerville, chamado às pressas a um mosteiro italiano medieval para investigar vários casos de religiosos que tiveram mortes enigmáticas no lugar. A trama baseada no livro do escritor Umberto Eco se desenrola em 1327, época em que a Igreja Católica já exercia poderio absoluto em todo o continente europeu. As mortes, é claro, foram tidas desde o princípio como obra do demônio. Mas a investigação minuciosa conduzida por Guilherme acabou provando o óbvio: o mistério tinha uma explicação muito mais racional (e controversa) do que aparentava. Por embasar seus julgamentos em evidências e não em dogmas ou verdades reveladas, o frade é representado como uma espécie de precursor do cientista moderno. O filme também discute a relação de intolerância do pensamento religioso para com o científico. •disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=s0cdAv4ZODE. REFERÊNCIAS CARLOS, Ana Fani Alessandri. O lugar no/do mundo. São Paulo: FFLCH, 2007. CORRÊA, Roberto Lobato. Região e Organização Espacial. São Paulo: Editora Ática, 2003. 7ª ed. Série Princípios. GODOY, Paulo R. Teixeira de. (Org.). História do pensamento geográfico e epistemologia em Geografia. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/109157/ISBN9788579831270.pdf?s equence=2&isAllowed=y. Acesso em: 20/02/2021. LACOSTE, Yves. A geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. Campinas: Papirus, 1988. LEITÃO, Joyce Oliveira. O contexto histórico-filosófico da obra “Geografia Comparada” de Carl Ritter. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Geociências. Campinas, SP: [s.n.], 2017. 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Objetivos de Aprendizagem: • Contextualizar a ação humana na natureza a partir das transformações históricas ao longo do tempo • Compreender os impactos da sociedade sobre a natureza e da natureza sobre a sociedade • Estabelecer a importância da adesão de técnicas sustentáveis para a preservação ambiental INTRODUÇÃO Prezada(o) Aluna(o), seja bem vinda(o) a disciplina “Categorias e conceitos da Geografia”. É com grande satisfação e estima que te convido a compartilhar conhecimentos acerca das bases teóricas do pensamento geográfico. O presente material foi desenvolvido para introduzi-la(o) ao horizonte das discussões à respeito da Geografia enquanto ciência, portanto, é destinado à estudantes e pesquisadores interessadas(os) em compreender o processo histórico de constituição da ciência geográfica, cujo o objetivo é pensar epistemologicamente o espaço que vivemos, suas condições naturais, modificações territoriais e relações com as práticas e intervenções humanas. Durante a trajetória escolar, você certamente cursou Geografia e teve contato com diversos conceitos específicos dessa disciplina, como território, espaço, lugar e região. A apresentação que você tem em mãos (ou à vista por meio de arquivos digitais) pretende aprofundar esses conhecimentos, obtidos no seu percurso educacional no decorrer do Ensino Básico, à respeito da formação do pensamento geográfico e sua consolidação como ciência pertencente às Humanidades. A Unidade 2 “Natureza e Relação Humana” é composta por quatro tópicos que correspondem a um plano de estudo estruturado para que você possa obter conhecimento acerca da ação humana na natureza, do impacto da sociedade sobre a natureza, do impacto da natureza sobre a sociedade e das técnicas sustentáveis. Almejamos que esta unidade possa contribuir com sua aprendizagem, com a expansão do seu pensamento crítico e com o aprimoramento de suas habilidades cognitivas e investigativas em Geografia. Bons estudos! 1 AÇÃO HUMANA NA NATUREZA Imagem do Tópico: https://www.shutterstock.com/pt/image-illustration/silhouette-farmer-raking- earth-hoe-philosophical-1721503573 O ser humano (taxonomicamente nomeado como Homo Sapiens), assim como as demais espécies animais, atua sobre a natureza com o objetivo de satisfazer suas necessidades de sobrevivência, buscando abrigo, proteção e alimentos para si e seu grupo. Contudo, como a única espécie animal viva de primata bípede do gênero Homo cujo o cérebro altamente desenvolvido o torna um animal racional, consciente e sapiente, o ser humano é capaz de pensar, refletir sobre suas ações, inventar, planejar, construir pensamentos e ideologias e gerar resultados, com isso, criar conhecimento e desenvolver técnicas e cultura. No início, a humanidade pouco interferia na natureza, pois vivia da coleta, da caça e da pesca. Ainda que de forma nômade, era a natureza que determinava a obtenção de recursos para a manutenção e sobrevivência de grupos humanos. De acordo com Milton Santos (2014), “[...] em cada momento histórico os modos de fazer sãodiferentes, o trabalho humano vai se tornando cada vez mais complexo exigindo mudanças correspondentes às inovações" (p. 74). Neste sentido, é a partir do agir e pensar humano no tempo e no espaço, que se dão as transformações históricas. Deste modo, por volta de 12 mil anos atrás, no período intitulado por Neolítico, o ser humano começou a domesticar os animais e a cultivar a terra ao mesmo tempo que passou a utilizar instrumentos fabricados a partir da descoberta da técnica da pedra polida, marco que possibilitou grandes transformações sociais e culturais para a humanidade, como uma maior autonomia perante as alterações climáticas da natureza e uma vida sedentária. As novas técnicas de domesticação de animais e cultivo de sementes foram responsáveis pelo desenvolvimento da agricultura e da pecuária, melhorando a expectativa de vida dos homens pré-históricos e contribuindo para o crescimento das taxas populacionais. O homem deixa de ser nômade, assentando-se na terra, apropriando-se da natureza e utilizando-a para satisfazer seus interesses. A presença do homem na face da Terra muda o sistema do mundo. Torna-se, o homem, centro da Terra, do Universo, imprimindo-lhe uma nova realidade com sua simples presença. O homem é um dado da valorização dos elementos naturais, físicos, porque é capaz de ação. Usa suas forças intelectuais e físicas contra um conjunto de objetos naturais que seleciona como indispensável para se manter como grupo. Assim o homem é sujeito, enquanto a terra é objeto. É em torno do homem que o sistema da natureza conhece uma nova valorização e, por conseguinte, um novo significado. (SANTOS, 2014, p. 98) A partir de então a natureza tem sido cada vez mais transformada de suas condições naturais, pois através de suas ações humanas é que florestas são derrubadas para plantar lavouras, morros deslocados para abrir túneis e enseadas niveladas para construir cidades. A ação humana nesse processo, exige cada vez mais conhecimentos sobre os elementos que compõem a natureza e suas dinâmicas de funcionamento, nutrindo a ideia de domínio do homem sobre a natureza. Atualmente esse ponto de vista é legitimado por grande parte da humanidade, pois prevalece em nós a ideia de que homem e natureza são opostos um do outro, onde o homem detentor de inteligência, domina a natureza para retirar dela tudo o que necessita para sobrevivência, e a natureza, por sua vez, é reduzida como despretensiosa e inesgotável fonte de recursos naturais. De acordo com Igor Moreira (2004), podemos definir o conceito de recursos naturais como: [...] todos os bens oferecidos ao homem pela natureza. Eles podem ser dois tipos: renováveis e não renováveis. Os recursos naturais não renováveis são aqueles que se esgotam depois de aproveitados pelo homem, como o carvão, o petróleo, o ferro e os demais minerais. Os recursos naturais renováveis são aqueles que se multiplicam ou não se esgotam facilmente, como a água, o ar e o solo, chamados pela sua importância de recursos básicos (MOREIRA, 2004, p. 11). Neste panorama, a conexão do homem com a natureza é continuamente decorrente do trabalho, este entendido como a operação de transformar recursos naturais em produtos capazes de satisfazer e suprir as carências humanas. 1.1. As transformações técnicas e científicas Entendemos como técnica o modo de fazer algo por meio de instrumentos de trabalho utilizados na ação, logo, as intervenções na natureza e, consequentemente, as modificações nela introduzidas são realizadas através de instrumentos e ferramentas criadas para esse fim. Para Milton Santos (1996), a técnica é “a principal forma de relação entre o homem e a natureza”, sendo definida como “um conjunto de meios instrumentais e sociais, com os quais o homem realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço” (p. 29). Ao desenvolver novas técnicas, o ser humano cria novos instrumentos, visando aumentar o rendimento do seu trabalho, motivado por interesses ou por alguma necessidade apresentada pelo meio. Em geral, as inovações técnicas conduzem a novos problemas, desafios e necessidade de resolvê-los, resultando na evolução da técnica, ou seja, na continuidade de novas formas do fazer humano. Um exemplo disso se dá na invenção do pneu, que ocorreu logo após a criação do automóvel, em 1887, pois havia a necessidade de uma roda adaptável a esse novo modelo de transporte. Gradativamente, os instrumentos utilizados para o trabalho vão se tornando mais complexos, pois além de serem instrumentos manuais empregados para a transformação de elementos naturais em produtos, as técnicas de engenharia, por exemplo, podem se desenvolver em grandes empreendimentos impostos a natureza, como referência à técnica de represamento das águas de um rio que cria uma queda d'água artificial, utilizada para obter a força hidráulica necessária ao funcionamento de uma hidrelétrica. Figura 1: represamento das águas de um rio para geração de energia em hidrelétrica FOTO Fonte: https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/hydroelectric-power-plant-on-river- 475746370 Desta forma, o aperfeiçoamento dos instrumentos de trabalho e as inovações técnicas, fixam desenvolvimento das engrenagens de tomada da natureza, significando grandes modificações e controle intenso sobre o meio natural. A intensificação da dominação do homem na natureza, assim como a pressa em desenvolver e difundir inovações técnicas, é marcada pelo início do modo de produção capitalista nos séculos XV e XVI. Anterior a isso, as relações econômicas eram praticamente de subsistência, os produtos artesanais eram fabricados manualmente e destinavam-se a utilização direta do homem, não possuindo valor de troca, mas sim, de uso. Na produção artesanal um mesmo trabalhador tinha o domínio de operar todas as fases produtivas. O homem vai construindo novas maneiras de fazer coisas, novos modos de produção que reúnem sistemas de objetos e sistemas sociais. Cada período se caracteriza por um dado conjunto de técnicas. Em cada período histórico, temos um conjunto próprio de técnicas e de objetos correspondentes. (SANTOS, 2014, p. 74). O modo de produção capitalista, buscando aumentar paulatinamente a produção de bens, entendida agora como mercadoria, promoveu a divisão do trabalho, nesse sistema cada tarefa é realizada por um trabalhador que se torna especialista na etapa do processo que desenvolve, gerando assim, etapas produtivas e a invenção de ferramentas específicas e adaptadas a cada categoria de trabalho. No século XIX, com a expansão da Revolução Industrial e intensificação do modo de produção capitalista, novas ferramentas adquiriram funções industriais, mecanizando o trabalho e produzindo mercadorias em grandes escalas. Com o aumento da produtividade, aumenta, consequentemente, o uso de matérias primas retiradas da natureza, impulsionando a exploração dos recursos naturais. Ainda, sobre as consequências da Revolução Industrial, Igor Moreira (2004) aponta: Fomentada por uma verdadeira corrida tecnológica e objetivando a acumulação de riqueza, a produção diversifica-se extraordinariamente, e os bens produzidos, inclusive os instrumentos de trabalho, tornam-se obsoletos em prazo cada vez mais curto, impondo sua substituição por outros mais “modernos”, isso ocasiona um consumo maior de recursos naturais, reforçado pela visão cada vez mais aprofundada da natureza como manancial à disposição dos homens (MOREIRA, 2004, p. 22). Faz-se necessário ressaltar que a concepção de supervalorizar a inteligência humana a serviço da técnica e exploração do meio natural, contribui para estabelecer a ideia colonizadora de que o controle do homem sobre a natureza tem possibilidades ilimitadas e que os recursos não se esgotam, partindo de uma ideia de dominação, universalizada por valores ocidentais impostos