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Roteiro Aula 9 [2024] doc

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Roteiro Bioquímica
Bioquímica – Aula 9
Mecanismos da Hipoglicemia
Tópicos abordados na aula:
1. Metabolismo da Glicose: Glicólise (Catabolismo da Glicose);
2.Importância do armazenamento dos carboidratos: Glicogenólise (Catabolismo do Glicogênio),
Glicogênese (Anabolismo do Glicogênio);
3. Gliconeogênese (Síntese endógena da Glicose);
4. Controle do metabolismo dos carboidratos: glucagon, adrenalina e insulina.
5. Hipoglicemia
A glicose é um carboidrato que é considerado um combustível metabólico essencial
para o organismo. Por esse motivo vários mecanismos metabólicos atuam em conjunto para
manter o nível glicêmico adequado (normoglicemia). Aumento (hiperglicemia) ou redução
(hipoglicemia) dos níveis glicêmicos acarreta prejuízos ao organismo. Na presente discussão
serão abordados os mecanismos associados à hipoglicemia assim como as consequências desse
quadro para o organismo. Esses mecanismos envolvem o metabolismo da glicose e por esse
motivo iniciaremos a discussão abordando as principais características desse carboidrato.
Glicose
A glicose é o principal combustível metabólico da maioria dos organismos, sendo
encontrada em sua forma livre no sangue (molécula polar) ou armazenada na forma de
glicogênio (polímero formado por moléculas de glicose ligadas entre si) no fígado e no músculo
esquelético (Figura 1). O aumento da demanda energética induz maior liberação da glicose dos
polímeros, ou seja, maior quebra do glicogênio em moléculas de glicose. A glicose é, então,
empregada para produzir ATP de maneira aeróbica ou anaeróbica.
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Figura 1: Molécula de glicogênio e glicose. O glicogênio (esquerda) é um polissacarídeo formado por
moléculas de glicose que estão ligadas de forma linear ou ramificada. A glicose (direita) é um carboidrato
(açúcar) polar que tem como principal função servir como fonte de energia para as células (geração de
ATP).
O organismo dispõe de três fontes de glicose: 1) Alimentação: glicose contida em
alimentos na forma de amido ou compondo outros açúcares como a lactose (presente no leite) e
frutose (presente nas frutas); 2) Glicose contida no glicogênio que é um polissacarídeo de
reserva que está presente no fígado e músculo esquelético; 3) Glicose proveniente da síntese
endógena: glicose sintetizada no fígado a partir de aminoácidos, lactato e glicerol por um
processo metabólico denominado gliconeogênese. A dinâmica de interação entre essas três
fontes de glicose na manutenção dos níveis glicêmicos será discutida a seguir.
A glicose sanguínea (“açúcar do sangue”) é uma fonte energética facilmente disponível.
A molécula de glicose é a única fonte de energia (através do processo de glicólise) para algumas
células/tecidos como, por exemplo, os eritrócitos, medula renal, cérebro e esperma. Isso ocorre,
pois esses tecidos não possuem maquinaria enzimática para metabolizar outras moléculas que
também servem como fonte de energia para vários tecidos como os lipídeos e aminoácidos.
Destaque: a glicose é a única fonte de energia para o cérebro e por esse motivo o organismo
coordenará a ativação de diferentes vias metabólicas para a manutenção dos níveis glicêmicos.
Baixos níveis de glicose (hipoglicemia) comprometem a função cerebral podendo levar ao coma
e morte.
Para que sirva de fonte de energia para o organismo (geração de ATP) a glicose deve ser
quebrada em uma via metabólica chamada de via glicolítica (ou glicólise). A glicólise é um
processo citoplasmático no qual a glicose sofre a ação de diversas enzimas. A glicólise é a via
central do catabolismo (quebra) da glicose, no qual a molécula de glicose (com 6 átomos de
carbono) é degradada por uma sequência de 10 reações enzimáticas para formar duas moléculas
de piruvato (com 3 átomos de carbono cada). Durante a glicólise são formados 2 ATP (Figura
2).
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Figura 2. Etapas da glicólise. A glicólise ocorre no citoplasma das células e consiste na quebra
da glicose (com 6 carbonos) em duas moléculas de piruvato (com 3 carbonos cada). Durante esse
processo há formação de 2 ATP. Em condições aeróbicas cada piruvato irá originar uma molécula de
Acetil-CoA que entrará no Ciclo de Krebs que amplificará a geração de energia. No total a quebra de uma
molécula de glicose forma 38 ATP.
O estudo do metabolismo da glicose é dividido didaticamente em glicólise e Ciclo de
Krebs para que possa ser entendido mais facilmente. No entanto, na célula a glicólise está
integrada ao Ciclo de Krebs que dará continuidade ao processo de geração de energia a partir da
glicose (Figura 3). Os 2 piruvatos formados pela quebra da glicose serão transformados (em
condições aeróbicas) pela enzima piruvato desidrogenase em 2 moléculas de Acetil-CoA que
entrarão no Ciclo de Krebs. Uma das funções do Ciclo de Krebs é promover a amplificação da
geração de energia da glicólise. Portanto, após ativação do Ciclo de Krebs pelas 2 Acetil-CoA
haverá a formação de 36 ATP que somados aos 2 ATP da via glicolítica totalizarão 38 ATP.
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Figura 3. Integração do Ciclo de Krebs com a glicólise. Note que os 2 piruvatos (ou ácido pirúvico) são
transformados em 2 moléculas de Acetil-CoA que posteriormente entram no Ciclo de Krebs para
amplificação da geração de ATP. A gçicólise ocorre no citoplasma enquanto as reações do Ciclo de Krebs
ocorrem na mitocôndria.
Como dito, a glicólise é um processo citoplasmático. Portanto, para que a glicose possa
produzir ATP e gerar energia, ela precisa chegar até o meio intracelular. Como mostrado na
Figura 1, a glicose é um composto polar que não atravessa facilmente a membrana celular.
Observação: lembre-se de que a membrana celular é formada principalmente por uma camada
bilipídica que permite passagem de compostos apolares e dificulta a passagem de compostos
polares. Dessa forma, a entrada de glicose para o meio intracelular acontece por meio de
proteínas transportadoras específicas denominadas GLUTs (do inglês glucose transportes –
GLUT). As GLUTs formam uma família de proteínas transportadoras de glicose sendo que os
subtipos protéicos que compõem essa família (GLUT1, GLUT2, GLUT3, GLUT4 ou GLUT5)
são expressos em diferentes tecidos (Tabela 1).
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Tabela 1. Expressão das GLUTs em diferentes tecidos. As GLUTs são expressas em diferentes tecidos
onde tem como função promover a captação da glicose (composto polar) do meio extracelular para o
intracelular. A GLUT2 pode ainda promover o transporte da glicose do meio intracelular para o
extracelular.
O processo de captação da glicose do meio extracelular para o intracelular está
esquematizado na Figura 4. A glicose presente no meio extracelular se liga a GLUT que está na
membrana celular e faz com que essa mude sua conformação. Ao mudar sua conformação a
GLUT transporta a glicose para o meio intracelular. Dependendo do tipo de célula a glicose
poderá ser usada para gerar energia pela glicólise ou ainda poderá ser armazenada na forma de
glicogênio (como veremos a seguir).
Figura 4. Captação de glicose pela GLUT. A glicose é um composto polar que não atravessa a
membrana celular e que por esse motivo é transportada do meio extracelular para o intracelular por
proteínas transportadoras específicas denominadas GLUT (do inglês glucose transporters).
Em alguns tecidos as GLUTs estão presentes na membrana celular (como no exemplo
da Figura 4). No entanto, em outros tecidos a GLUT está no citoplasma em vesículas. Nesses
casos, para que possa promover o transporte de glicose as vesículas contendo as GLUTs devem
se translocar do citoplasma para a membrana. A translocação dessas vesículas é estimulada por
hormônios como, por exemplo, a insulina. Alguns tecidos como o fígado, músculo esquelético e
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adipócitos dependem da insulina para promover a captação de glicose. Após refeição a glicose
advinda da dieta induz aumento da liberação de insulina das células β-pancreáticas (Figura 5).
Figura 5. Liberação de insulina. A insulina é produzida nas células β-pancreáticas das Ilhotasde
Langerhans. A glicose absorvida da dieta estimula a liberação de insulina dessas células para que a
insulina possa induzir captação de glicose em alguns tecidos como fígado, músculo esquelético e
adipócitos.
Nos tecidos dependentes de insulina para captação de glicose esse hormônio atua em
seus receptores (localizados na membrana) e induz translocação das vesículas citoplasmáticas
que contém a GLUT para membrana (Figura 6). Após promover a captação da glicose as
GLUTs são novamente internalizadas. Destaque: nem todos os tecidos precisam de insulina
para captação da glicose. Em alguns tecidos as GLUTs já se encontram expressas na membrana
da célula não necessitando, portanto da ação da insulina. Já em outros tecidos a insulina terá que
induzir a translocação das vesículas citoplasmáticas contendo GLUTs para que a célula possa
captar glicose. Esses tecidos dependentes de insulina incluem o fígado, adipócitos e músculo
esquelético.
Figura 6. Translocação das GLUTs pela insulina. Ao se ligar em seus receptores de membrana (em
vermelho a esquerda) a insulina ativa vias intracelulares que promovem a translocação (para a membrana)
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de vesículas citoplasmáticas contendo as GLUTs (em azul). Esse processo ocorrerá em tecidos que são
dependentes da insulina para a captação de glicose como fígado, adipócitos e músculo esquelético.
A glicose captada poderá ser usada para geração de energia pela glicólise/Ciclo de
Krebs como resumido abaixo (Figura 7). Em alguns tecidos como fígado e músculo esquelético,
além de ser captada para gerar energia pela via glicolítica, a glicose também será armazenada na
forma de glicogênio como veremos a seguir.
Figura 7. Resumo dos eventos de captação e utilização da glicose pela via glicolítica. Glicose advinda
da circulação é captada pela GLUT e no citoplasma sofre a ação das enzimas da via glicolítica (glicólise).
As duas moléculas de piruvato formadas a partir da glicose geram 2 moléculas de Acetil-CoA que entram
no Ciclo de Krebs favorecendo a formação de energia na forma de ATP. [Glicose → GLUT → citoplasma
→ glicólise (2 ATP) →Piruvato →Acetil-CoA → Ciclo de Krebs → 38 ATP].
Importância do armazenamento da glicose
Nesse primeiro momento será apresentado um panorama geral dos mecanismos
metabólicos que o organismo utiliza para manutenção dos níveis glicêmicos. Esses mecanismos
envolvem os seguintes processos metabólicos: glicogênese (síntese do glicogênio),
glicogenólise (quebra do glicogênio) e gliconeogênese (síntese endógena de glicose).
As hemácias e o cérebro consomem 80% da glicose diária. Refeições que contém
carboidratos são importantes fontes dessa glicose, que é absorvida pelo trato gastrointestinal e
contribui por período de 2-3 horas após a ingestão para manutenção dos níveis glicêmicos. Para
que as hemácias e o cérebro continuem tendo glicose disponível para consumo no período entre
refeições, parte da glicose ingerida é convertida em glicogênio, um polissacarídeo de reserva
hepática de glicose. Ou seja, parte da glicose advinda da dieta é armazenada sob a forma de
glicogênio, principalmente no fígado. O estoque de glicose tem como principal objetivo a
manutenção dos níveis glicêmicos durante o período entre refeições já que o cérebro depende
exclusivamente da glicose para gerar energia na forma de ATP. O processo de formação do
glicogênio a partir da glicose é denominado glicogênese.
Dessa forma, o glicogênio é importante para a manutenção dos níveis de glicose
sanguínea no período entre refeições. Para isso, o glicogênio é quebrado e convertido em glicose
pelo processo denominado glicogenólise, ou seja, a quebra do glicogênio armazenado no tecido
hepático. Entretanto, a glicose advinda do glicogênio é suficiente para manter os níveis
sanguíneos de glicose por apenas 12 a 16 horas (Figura 8). Destaque: Note que para que haja
síntese de glicogênio (glicogênese) é necessária glicose vinda da alimentação. Dessa forma, uma
alimentação pobre em carboidratos terá como consequência menor armazenamento de glicose
na forma de glicogênio.
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Figura 8. Dinâmica hepática de armazenamento e liberação de glicose. Parte da glicose
obtida da alimentação será transformada em glicogênio no fígado (glicogênese). Durante o período entre
refeições (quando não há glicose vinda da alimentação) o glicogênio formado será quebrado
(glicogenólise) para que a glicose seja disponibilizada para corrente sanguínea e levada para os tecidos
como, por exemplo, o cérebro.
Durante períodos de abstinência alimentar longos (como ocorre durante o sono), o
organismo recorre ao processo de gliconeogênese para manutenção dos níveis glicêmicos. Esse
processo é definido como a síntese endógena de glicose, ou seja, formação de glicose pelo
próprio organismo. A gliconeogênese é um processo hepático que utiliza algumas moléculas
como fontes doadoras de carbono para a síntese de glicose. As principais moléculas que são
transformadas em glicose são os aminoácidos (da alimentação ou da degradação de proteínas do
músculo esquelético), lactato (proveniente do metabolismo anaeróbico da glicose) e glicerol
(proveniente do metabolismo do triacilglicerol).
Em suma, o organismo dispõe de três principais fontes de glicose sanguínea: 1) glicose
proveniente da dieta que é absorvida no intestino; 2) Glicose proveniente da glicogenólise que é
definida como a quebra da reserva de glicogênio armazenada no tecido hepático; e 3) glicose
proveniente da gliconeogênese que é definida como a síntese endógena de glicose a partir de
alguns precursores não glicídicos (principalmente aminoácidos). A Figura 9 ilustra a dinâmica
dessas três fontes de glicose durante o dia para a manutenção de níveis glicêmicos adequados. O
carboidrato consumido no café da manhã (representado em azul) elevará a concentração
plasmática da glicose sendo, nesse momento, a principal fonte de glicose para o organismo. A
glicose da dieta será captada pelos tecidos para que seja metabolizada (glicólise) para geração
de ATP. Essa glicose também irá estimular a liberação de insulina pancreática que irá estimular
a captação de glicose no fígado. A glicose captada pelo fígado será armazenada na forma de
glicogênio (glicogênese). Quando a concentração de glicose vinda da dieta começar a cair o
organismo sinalizará (via adrenalina e glucagon) para ativação da glicogenólise (representada
em verde) que será, nesse momento, a principal fonte de glicose para o organismo. Esse
processo se repete ao longo do dia e notamos que durante a noite, além da glicogenólise há
grande contribuição da gliconeogênese (representada em vermelho) na manutenção dos níveis
glicêmicos. Isso ocorre, pois, como dito anteriormente a quantidade de glicogênio é limitada e
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dependente do consumo de carboidratos na alimentação. Nesse momento em que a
glicogenólise não é mais capaz de suprir a necessidade do organismo, a gliconeogênese é
ativada (também pelos hormônios glucagon e adrenalina). Os detalhes do controle hormonal
desses processos bioquímicos serão descritos a seguir.
Figura 9. Glicose proveniente de diferentes fontes (dieta, glicogenólise e gliconeogênese) mantém os
níveis glicêmicos normais ao longo do dia. Note que quando a glicose de uma das fontes está se
esgotando há ativação (hormonal) de outra fonte para manutenção da glicemia.
Serão discutidos a seguir os detalhes dos seguintes processos metabólicos: glicogênese,
glicogenólise e gliconeogênese.
Para que o processo de glicogênese possa ocorrer, o primeiro passo é a entrada da
glicose no tecido hepático. A glicose advinda da alimentação sofre absorção intestinal e
estimula a liberação de insulina pelo pâncreas (Figura 10). No fígado a insulina se liga a seus
receptores de membrana e promove a translocação da GLUT citoplasmática para a membrana
(como descrito na Figura 6). Dessa forma, a insulina é um hormônio que estimula a glicogênese.
Figura 10. Captação da glicose pelos hepatócitos é o primeiro passo para glicogênese. A glicose
sanguíneaadvinda da dieta cai na circulação e estimula a liberação de insulina pelo pâncreas. A insulina
estimula a captação da glicose pelos hepatócitos para que a mesma seja estocada na forma de glicogênio.
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Após a captação da glicose sanguínea para o meio intracelular, ocorre o processo
denominado glicogênese, definido como o processo de formação do glicogênio. A glicose sofre
ação de diversas enzimas para formar posteriormente o glicogênio, como descrito na Figura 11.
O glicogênio (Figura 1) nada mais é do que um polímero ramificado formado por múltiplas
subunidades de glicose.
Figura 11. Processo de glicogênese. Note que o processo se inicia com a molécula de glicose que será
ligada a outras moléculas de glicose para formação do polissacarídeo glicogênio. É importante notar que a
glicose que formará o glicogênio é proveniente da dieta, ou seja, o consumo de baixas quantidades de
carboidrato na dieta irá reduzir a capacidade de formação de glicogênio.
O glicogênio produzido é agora armazenado. Lembre-se que a função do glicogênio
armazenado no fígado é voltada à manutenção dos níveis de glicose sanguínea no período entre
refeições, como já citado. A musculatura esquelética também é capaz de sintetizar glicogênio e
assim como o fígado depende da insulina para captação da glicose. No entanto, na musculatura
esquelética, a glicose liberada do glicogênio é toda utilizada no metabolismo energético
muscular uma vez que esse é um processo que demanda muita energia. Portanto, o glicogênio
muscular não contribui para manutenção dos níveis glicêmicos. Assim, sempre que discutimos a
importância do glicogênio na manutenção dos níveis glicêmicos nos referimos ao glicogênio
hepático. A Tabela 2 mostra a contribuição do fígado e músculo esquelético no armazenamento
de glicogênio. Destaque: A lesão hepática pode prejudicar o armazenamento de glicogênio
modificando dessa forma a dinâmica de manutenção dos níveis glicêmicos mostrados na Figura
9.
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Tabela 2. Glicogênio no fígado e músculo esquelético. O glicogênio armazenado no fígado é destinado
à manutenção da glicose sanguínea, enquanto o glicogênio armazenado no músculo esquelético será
quebrado para a formação de energia necessária para a atividade muscular.
Tecido Tipo Quantidade % da massa tecidual
Fígado Glicogênio 75 g 3 – 5%
Músculo Esquelético Glicogênio 250 g 0,5 – 1%
A glicogenólise é o processo de quebra do glicogênio para a formação de glicose. Para
que possa ser quebrado, o glicogênio sofre ações de algumas enzimas que convertem a molécula
do glicogênio em glicose-6-P. Posteriormente, a glicose-6-P sofre ação da enzima
glicose-6-fosfatase, originando a glicose (Figura 12). A glicogenólise é estimulada
principalmente pelos hormônios glucagon e adrenalina. Os detalhes dessa regulação serão
descritos a seguir. A glicose é, então, transportada pela GLUT-2 para o meio extracelular
chegando até os tecidos onde será usada para gerar ATP. Note que, como descrito na Tabela 1 a
GLUT-2 pode fazer o transporte da glicose do meio extracelular para o intracelular, mas também
pode fazer o transporte contrário levando a glicose do meio intracelular para o extracelular.
Figura 12. Etapas da glicogenólise. O glicogênio é convertido em glicose-6-P, que sofre ação da enzima
glicose-6-fosfatase, originando a glicose. A glicose sai da célula através dos transportadores GLUT-2,
chegando aos tecidos para gerar ATP através da glicólise.
Como já dito, a glicogenólise é muito importante para a manutenção dos níveis
adequados de glicose sanguínea no período entre refeições. Note que, como descrito na Figura 9
a quebra do glicogênio e a produção endógena de glicose (gliconeogênese) aumentam no
período entre refeições, no qual a glicose proveniente da dieta já foi carreada da corrente
sanguínea para os tecidos. Dessa forma, exames laboratoriais de glicemia em jejum (feitos pela
manhã) detectam a glicose proveniente da glicogenólise e a gliconeogênese. Destaque: Em
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exames para avaliação da glicemia o paciente deve estar em jejum para que a glicose
proveniente da dieta não interfira nos resultados.
A gliconeogênese é o processo de formação endógena da glicose. Esse é um processo
hepático estimulado principalmente pelo hormônio glucagon. Ele exige fontes de carbonos para
a formação da glicose. O esqueleto carbônico da glicose tem três fontes de carbono:
aminoácidos (principal), lactato (produzido pelo metabolismo anaeróbico da glicose) e glicerol
(produzido a partir da quebra do lipídeo triacilglicerol) (Figura 13). Dessa forma o organismo
usa compostos que não açúcares para gerar a glicose, ou seja, o organismo usa fontes não
glicídicas para gerar o açúcar glicose.
A gliconeogênese é um processo muito relevante, pois consegue promover a síntese de
glicose em um momento no qual o organismo não dispõe de uma fonte de glicose (dieta ou
glicogenólise). Por exemplo, os aminoácidos que formam as proteínas da musculatura
esquelética podem ser usados para gerar glicose, prevenindo assim qualquer dano ao
funcionamento cerebral (que tem na glicose sua única fonte de energia). Dessa forma, a
degradação da musculatura esquelética é comum durante jejum ou em indivíduos que tem dieta
pobre em carboidratos.
Figura 13. Fontes de carbono para gliconeogênese. Aminoácidos, glicerol e lactato são substratos não
glicídicos que servem como fonte de carbono para geração hepática de glicose. Dentre esses, destaque é
dado aos aminoácidos que são considerados a principal fonte de carbonos para síntese de glicose.
Os aminoácidos figuram como a principal fonte não glicídica para geração de glicose.
Como mostrado na Figura 14, os aminoácidos são convertidos a piruvato ou a intermediários do
Ciclo de Krebs para que possam ser utilizados na geração de glicose. O processo de formação
da glicose a partir de aminoácidos é um processo complexo que envolve vários passos
reacionais. No entanto, de maneira simplificada podemos notar na Figura 14 que a glicose é
originada a partir de um intermediário do Ciclo de Krebs chamado oxaloacetato. Os
aminoácidos destacados em rosa são aqueles capazes de originar glicose (Figura 14). Podemos
observar que independente do ponto onde esses aminoácidos entram no Ciclo Krebs eles
acabam por gerar oxaloacetato, que posteriormente será convertido em glicose.
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Figura 14. Uso de aminoácidos para gliconeogênese. Aminoácidos glicogênicos (em rosa) entram no
Ciclo de Krebs e são posteriormente convertidos em glicose.
A gliconeogênese é acelerada em situações de jejum onde a ingestão de carboidratos é
baixa. Pode também estar aumenta em indivíduos que consomem grande quantidade de proteína
em sua dieta (o aminoácido vindo dessa proteína irá formar a glicose). Ou seja, o processo de
gliconeogênese é utilizado para manutenção dos níveis sanguíneos de glicose quando as
reservas de glicogênio começam a se esgotar. Durante a gliconeogênese, o organismo pode
perder tecido adiposo (para maior disponibilização de ácidos graxos que serão oxidados para
fornecer energia ao processo de gliconeogênese) e massa muscular (já que os aminoácidos que
compõem as proteínas do músculo precisarão ser convertidos em glicose).
Controle hormonal do metabolismo dos carboidratos
O metabolismo da glicose é controlado pelos hormônios glucagon e adrenalina que
favorecem a glicogenólise e gliconeogênese e também pela insulina que favorece a glicogênese.
O glucagon é uma proteína secretada pelas células α-pancreáticas localizadas nas
Ilhotas de Langerhans (no pâncreas). Ele induz a glicogenólise através da ativação da enzima
glicogênio fosforilase (ou seja, tem ação de catabolismo). Esse hormônio também promove
regulação positiva da gliconeogênese. Os níveis sanguíneos de glucagon são regulados
principalmente pelos níveis plasmáticos de glicose e também pelos níveis plasmáticos de
aminoácidos. Níveis de glicose sanguínea baixos induzem a liberação de glucagon (Figura 15).
Da mesma forma, alta concentraçãode aminoácidos no plasma (exemplo: após dieta rica em
proteínas) induz a liberação de glucagon para que os aminoácidos sejam utilizados na
gliconeogênese. Dessa forma, os níveis sanguíneos de glucagon decaem após as refeições e
aumentam nos períodos entre refeições, jejum, ou em situações de dietas pobres em
carboidratos. Nessas condições o glucagon irá estimular a glicogenólise e a gliconeogênese para
manter os níveis glicêmicos.
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Figura 15. Liberação de glucagon e insulina em resposta aos níveis de glicose sanguínea. A produção
de glucagon é estimulada pelas baixas taxas de glicose sanguínea. O objetivo é ativar a glicogenólise. Já a
insulina é liberada quando há alta concentração de glicose na corrente sanguínea. O objetivo é promover a
captação tecidual da glicose.
A adrenalina é um hormônio produzido nas glândulas supra-renais (ou adrenais)
(Figura 16). Esse hormônio possui receptores nos hepatócitos (receptores β2) que ao serem
ativados irão promover a ativação da enzima glicogênio fosforilase, que é responsável pela
quebra do glicogênio (Figura 12). Além disso, a adrenalina também favorece a gliconeogênese.
Dessa forma, as ações da adrenalina são semelhantes àquelas do glucagon.
Figura 16. Local de produção da adrenalina. A adrenalina recebe esse nome, pois é produzida na
medula da glândula supra-renal (ou adrenal). A adrenalina é liberada quando há ativação do Sistema
Nervoso Autônomo Simpático ou pela ação do hormônio corticotrófico (ACTH) produzido na hipófise.
Na Figura 17 está representado o mecanismo de ativação de liberação de adrenalina em
resposta a queda dos níveis glicêmicos. A queda dos níveis glicêmicos será percebida
centralmente e levará à liberação de hormônio corticotrófico (ACTH) pela hipófise. Esse
hormônio atuará na supra-renal induzindo a liberação de adrenalina.
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Figura 17. Liberação de adrenalina em resposta à hipoglicemia. Queda dos níveis glicêmicos de
glicose irá induzir liberação de hormônio corticotrófico (ACTH) que promoverá a liberação de adrenalina
da supra-renal. A adrenalina liberada atuará em receptores β2 no fígado para induzir a glicogenólise e
tentar restabelecer os níveis glicêmicos.
No entanto, os receptores para adrenalina não são encontrados exclusivamente no
fígado. Como os receptores de adrenalina estão presentes em diversos tecidos, as ações desse
hormônio são variadas. Receptores (subtipos α e β) de adrenalina são encontrados em vários
tecidos onde promovem diferentes respostas: taquicardia (coração), sudorese (glândulas
sudoríparas), tremor (músculo esquelético), dilatação pupilar e vasoconstrição (que pode causar
palidez) (Figura 18). Portanto, quando ocorre queda dos níveis glicêmicos o organismo pode
apresentar alguns sinais característicos (taquicardia, tremor, palidez e sudorese) que são
mediados pela adrenalina que, na realidade, tem como objetivo ativar a glicogenólise no fígado,
mas que de maneira inespecífica atua em outros órgãos promovendo esses sinais característicos
da hipoglicemia.
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Figura 18. Ações do Sistema Nervoso Autônomo Simpático em diferentes órgãos. A ativação
simpática induz liberação da adrenalina das supra-renais. A adrenalina circulante ativa seus receptores
(subtipos α e β) em diferentes tecidos promovendo respostas variadas.
A insulina é um hormônio secretado pelas células β-pancreáticas localizadas nas Ilhotas
de Langerhans. A atividade das células β-pancreáticas é influenciada pelos níveis de glicose
sanguínea. Assim, alta taxa de glicemia estimula as células β-pancreáticas e promove maior
liberação de insulina (Figura 15). A insulina induz a captação e armazenamento de glicose na
forma de glicogênio como já discutido anteriormente. A Figura 19 ilustra os mecanismos
moleculares pelos quais a glicose induz a liberação de insulina das células β-pancreáticas. O
aumento da glicemia leva a maior captação de glicose pela GLUT-2 localizada nas células
β-pancreáticas. No meio intracelular, a glicose é metabolizada (glicólise) e gera ATP. O ATP
formado inibe canais para K+ sensíveis ao ATP levando ao fechamento desses canais. Como não
há saída de K+ a célula β-pancreática despolariza o que induz a abertura de canais para Ca2+
sensíveis à voltagem. O Ca2+ que entra na célula β-pancreática se liga às vesículas que contém
em seu interior insulina fazendo com que elas migrem até a membrana. As vesículas se fundem
à membrana e a insulina é liberada (Figura 19).
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Figura 19. Mecanismos moleculares da liberação de insulina pela célula β-pancreática. Glicose →
GLUT-2 → Citoplasma → Glicólise → ATP → inibe canal K+→ despolarização → abertura canal Ca2+
→migração de vesículas contendo insulina → liberação.
A insulina liberada pela célula β-pancreática irá estimular a captação de glicose
principalmente pelo músculo esquelético, adipócito e fígado. Nesses tecidos, a insulina promove
a translocação das GLUT citoplasmáticas para a membrana afim de que a glicose extracelular
possa ser captada. No fígado, a glicose captada pode ter vários destinos como mostrado na
Figura 20. Esses incluem seu metabolismo pela via glicolítica (para geração de ATP), seu
armazenamento na forma de ácidos graxos ou seu armazenamento como glicogênio. Portanto, a
insulina favorece a glicogênese. Dessa forma, note que, diferentemente do glucagon e
adrenalina, a insulina tem ação de anabolismo.
Figura 20. Ações da insulina e destinos celulares da glicose. A insulina ativa seus receptores e ocorre
translocação da GLUT do citoplasma para membrana. A glicose captada pela GLUT pode gerar energia
pela glicólise, ser transformada em ácidos graxos ou ser transformada em glicogênio (glicogênese).
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Hipoglicemia
A hipoglicemia é constatada em situações em que os níveis de glicose sanguínea se
encontram abaixo de 60 mg/dl. A faixa de referência para a normoglicemia está entre 75 e 100
mg/dl. Novamente é importante destacar que a glicose é a única fonte de energia para o cérebro
e, portanto a redução dos níveis plasmáticos de glicose estimula mecanismos de defesa que tem
por objetivo restaurar os níveis glicêmicos. Esses mecanismos incluem liberação inicial de
adrenalina e liberação de glucagon para que esses hormônios possam estimular a glicogenólise e
a gliconeogênese. No entanto, como descrito anteriormente a adrenalina atua em vários tecidos e
sua liberação está associada a sudorese, tremores, aumento da frequência cardíaca (taquicardia)
e palidez (vasoconstrição periférica) que são considerados sinais característicos da hipoglicemia.
Além dos sinais mediados pela adrenalina, a hipoglicemia também é caracterizada por
sinais decorrentes da falta de glicose no cérebro. A função cerebral comprometida durante a
hipoglicemia é chamada de neuroglicopenia e está associada à visão turva, dor de cabeça,
confusão mental e desmaio. Se os níveis glicêmicos não forem restabelecidos a hipoglicemia
pode levar a um quadro comatoso e morte. A Figura 21 ilustra as alterações que ocorrem
conforme os níveis glicêmicos vão abaixando.
Figura 21. Manifestações fisiológicas da hipoglicemia. A redução dos níveis glicêmicos (esquerda) está
relacionada a vários sinais fisiológicos (direita). Note que conforme os níveis de glicose sanguínea
diminuem, os sintomas se tornam mais graves, podendo chegar à morte cerebral.
Em indivíduos sadios as principais causas da hipoglicemia são: exercício físico intenso,
grande intervalo sem alimentação e consumo de grande quantidade de etanol (reduz a
gliconeogênese). Observação: O etanol inibe a gliconeogênese sendo considerada uma droga
hipoglicemiante. Outras condições que podem levar à hipoglicemia incluem o uso
farmacológico de insulina por indivíduos diabéticos.
Destaque: Por mais contraditório que pareça os indivíduos diabéticos são frequentemente
encontrados apresentando quadros de hipoglicemia. Isso ocorre devido ao uso farmacológico
inadequado da insulina que pode ocorrerpor: aplicação de dose superior à prescrita,erro na
administração e longo intervalo de tempo sem se alimentar após aplicação de insulina. Nessas
condições onde o indivíduo diabético em uso de insulina encontra-se em estado hipoglicêmico,
os níveis glicêmicos devem ser restabelecidos.
As medidas a serem tomadas para o tratamento da hipoglicemia visam o
restabelecimento dos níveis glicêmicos. As estratégias tomadas dependem das características do
paciente. Em pacientes conscientes, busca-se a ingestão de carboidratos de rápida absorção.
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Uma porção de 15 gramas de carboidrato pode ser encontrada nos itens ilustrados na Figura 22.
Após consumo de um desses itens o indivíduo apresentará melhora em um período de
aproximadamente 20 minutos. Em pacientes inconscientes não é indicada a ingestão por via oral
devido à diminuição do reflexo de mastigação e deglutição. Para essa condição é indicada a
administração endovenosa de solução de glicose ou a aplicação de glucagon (intramuscular,
intravenosa ou subcutânea). O soro glicosado irá disponibilizar a glicose imediatamente para o
organismo. No caso do glucagon, o objetivo é que esse hormônio induza a gliconeogênese e
glicogenólise.
Figura 22. Alimentos que contém porção de 15 gramas de carboidratos. O consumo de um desses
itens irá restabelecer rapidamente os níveis glicêmicos.
Hipoglicemia pode gerar corpos cetônicos
A cetogênese é a formação dos corpos cetônicos (acetoacetato, β-hidroxibutirato e
acetona). É um processo hepático que pode ocorrer em resposta à hipoglicemia. A cetogênese
tem relação direta com a gliconeogênese. Com a queda da glicose plasmática o organismo
precisa usar outros combustíveis metabólicos (para gerar ATP) ao mesmo tempo em que precisa
manter os níveis plasmáticos de glicose para que não haja comprometimento da função cerebral.
Portanto, como já discutido, quando os níveis glicêmicos caem há liberação de glucagon e
adrenalina para que ocorra a glicogenólise e também a gliconeogênese. No entanto, adrenalina e
glucagon também participam do metabolismo dos lipídeos, mais especificamente do
metabolismo do triacilglicerol. Portanto, quando a adrenalina e o glucagon são liberados para
promover a gliconeogênese eles também estimulam o metabolismo do triacilglicerol. Esse é um
mecanismo metabólico muito eficiente do organismo. Isso porque ao mesmo tempo em que
esses hormônios estarão induzindo a síntese de glicose pela gliconeogênese (garantindo assim a
glicose para o cérebro), eles também estarão induzindo a quebra do triacilglicerol para geração
de energia na forma de ATP (garantindo assim energia para os tecidos).
O triacilglicerol armazenado nos adipócitos é mobilizado para geração de energia (na
forma de ATP). Os hormônios glucagon e adrenalina ativam receptores específicos nos
adipócitos levando a quebra do triacilglicerol em glicerol e ácidos graxos (Figura 23). Os ácidos
graxos produzidos por esse processo atingem a corrente sanguínea e, por serem apolares são
transportados pela albumina até os tecidos, onde sofrem a oxidação para geração de ATP,
processo conhecido como β-oxidação (ou lipólise) (Figura 24).
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Figura 23. Mobilização de triacilglicerol dos adipócitos para geração de energia. A adrenalina e o
glucagon interagem com receptores específicos nos adipócitos levando a quebra do triacilglicerol. O
ácido graxo proveniente dessa quebra será levado até os tecidos pela albumina para que seja metabolizado
e gere energia na forma de ATP.
A β-oxidação (ou lipólise) do ácido graxo ocorre na mitocôndria de diferentes tecidos.
Consiste na remoção oxidativa de sucessivas unidades de dois átomos de carbono na forma de
uma molécula chamada Acetil-CoA (Figura 25).
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Figura 24. Esquema ilustrativo da β-oxidação (lipólise). A degradação do ácido graxo ocorre pela
remoção sucessiva de dois átomos de carbono na forma de Acetil-CoA que irá entrar no Ciclo de Krebs
levando à produção de ATP.
Por exemplo, o Ácido Palmítico é um ácido graxo formado por 16 carbonos que sofre 7
passagens oxidativas para formar 8 Acetil-CoA. Cada molécula de Acetil-CoA “gira” o Ciclo de
Krebs uma vez para gerar ATP e nesse caso uma molécula de Ácido Palmítico conseguirá ativar
o Ciclo de Krebs 8 vezes gerando um total de 129 ATP.
Figura 25. Molécula de Acetil-CoA. Note a presença (destacada no quadro em vermelho) de dois
átomos de carbono que formam o grupo acetil da Acetil-CoA.
O Ciclo de Krebs também recebe o nome de Ciclo do Ácido Cítrico, pois tem nessa
molécula o seu primeiro intermediário (Figura 26). De fato, o ácido cítrico é formado pelo
último intermediário do Ciclo de Krebs, o oxaloacetato que ao reagir com o grupo acetil da
Acetil-CoA gera o ácido cítrico (primeiro intermediário do Ciclo de Krebs). Dessa forma, temos
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uma via metabólica cíclica onde o último intermediário da via (oxaloacetato) origina o primeiro
(ácido cítrico). Observe na Figura 26 que o grupo acetil (com 2 carbonos) da Acetil-Coa reage
com o oxaloacetato (que tem 4 carbonos) para formar o ácido cítrico (com 6 carbonos).
Portanto, sem os dois carbonos do grupo acetil da Acetil-CoA não ocorre a manutenção da
ativação do Ciclo de Krebs. Uma vez “ativado” o Ciclo de Krebs irá oxidar seus intermediários
levando a geração de ATP.
Figura 26. Ciclo de Krebs. O grupo acetil (com 2 carbonos) da Acetil-Coa reage com o oxaloacetato
(que tem 4 carbonos) para formar o ácido cítrico (com 6 carbonos).
Durante jejum pode ocorrer redução dos níveis glicêmicos e esse quadro influencia
diretamente na formação dos corpos cetônicos. Isso ocorre, pois a redução da glicemia durante
jejum induz a liberação de adrenalina e glucagon que irão favorecer a gliconeogênese. O
oxaloacetato (último intermediário do Ciclo de Krebs) é desviado para a formação de glicose
durante a gliconeogênese. Isso acarreta em redução da quantidade disponível de oxaloacetato
para se ligar a Acetil-CoA (Figura 27). A Acetil-CoA que se ligaria ao oxaloacetato começa a se
acumular e reage entre si para formar os corpos cetônicos. É importante lembrar que a
adrenalina e glucagon que foram liberados para estimular a gliconeogênese também estimulam a
β-oxidação (lipólise). Dessa forma, ao mesmo tempo em que o oxaloacetato está sendo desviado
para gerar glicose está também ocorrendo um aumento da β-oxidação, fato que irá levar a uma
grande produção de Acetil-CoA (que agora não reagirá com o oxaloacetato, pois esse está sendo
desviado para geração de glicose). Dessa forma dizemos que o jejum promove uma
desaceleração do Ciclo de Krebs, pois o oxaloacetato que ao se ligar ao grupo acetil da
Acetil-CoA iria originar o ácido cítrico irá agora ser usado para formar glicose. O resultado da
desaceleração do Ciclo de Krebs é o acúmulo de moléculas de Acetil-CoA.
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Figura 27. Jejum desacelera o Ciclo de Krebs e aumenta a cetogênese. O Oxaloacetato é usado para
geração de glicose. Com isso a Acetil-CoA que se ligaria a ele para formar o ácido cítrico se acumula
levando a geração dos corpos cetônicos.
O processo de formação dos corpos cetônicos se inicia a partir da condensação de duas
moléculas de Acetil-CoA. Uma terceira molécula de Acetil-CoA é condensada às duas primeiras
levando à formação de um composto denominado β-hidróxi-β-metilglutaril-CoA. Esse
composto é posteriormente clivado para originar os corpos cetônicos acetoacetato,
β-hidróxibutirato e acetona (Figura 28). Os dois primeiros são ácidos, enquanto a acetona é uma
molécula volátil que pode ser identificada no hálito (hálito cetônico). Portanto, o hálito cetônico
é um sinal comum de indivíduos em jejum.
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Figura 28. Formação dos corpos cetônicos. A condensação de moléculas de Acetil-CoA leva à
formação de 3 corpos cetônicos: acetoacetato, β-hidróxibutirato e acetona.
Caso para Discussão 1
RN nascido de mãe desnutrida (hipoglicêmica). RN apresenta-se fraco e magro ao
nascer. Com 1 hora de vida neonatal apresenta sinais de estresse (aumento do batimento
cardíaco).A glicose sanguínea ao nascer é 63 mg/dl. Após 1 hora a glicose sanguínea é 27
mg/dl. RN apresenta-se irresponsivo (neuroglicopenia). Quadro apresenta melhora significativa
após infusão de glicose e dieta rica em carboidratos. O RN melhorou nas 2 semanas seguintes
antes da alta hospitalar.
Resolução Caso 1
1. Estresse após 1 hora?
Liberação de adrenalina para aumentar glicogenólise.
2. Queda dos níveis de glicose após 1 hora?
RN obtinha glicose pela circulação placentária. Após nascimento depende da
gliconeogênese/glicogenólise para manutenção da normoglicemia. Desnutrição da mãe
comprometeu reserva hepática de glicogênio e aminoácido para glicogenólise/gliconeogênese.
3. Infusão de Glicose?
Reverter rapidamente estado de hipoglicemia (e neuroglicopenia).
4. Dieta rica em carboidratos (só glicose não basta)?
Fonte de glicose para formar os estoques de glicogênio.
Caso para Discussão 2
RN nascido de mãe diabética não controlada (cronicamente hiperglicêmica). RN é bem
desenvolvido (5 kg) e aparentemente normal. Em 1 hora apresenta todos os sintomas de
hipoglicemia descritos no caso anterior. Quadro semelhante ao da criança desnutrida.
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Resolução Caso 2
1. RN desenvolvido?
Ambiente hiperglicêmico da mãe induz formação de grande quantidade de insulina pelo RN.
Insulina tem ação semelhante ao do hormônio de crescimento.
2. RN hipoglicêmico?
Ocorre hipoglicemia insulino-dependente.
3. Qual tratamento recomendado?
Infusão de Glicose.
4. Há necessidade de dieta rica em carboidratos?
Não, pois RN contém grande reserva de glicogênio. 1 a 2 dias após o parto a gliconeogênese é
ativada.
Caso para Discussão 3
Menino diabético (12 anos) recebeu dose de insulina normal pela manhã. Brincou com
amigos até a hora do almoço sem se alimentar. Tornou-se confuso e desmaiou. Recebeu injeção
(IM) de glucagon que tinha em um Kit de emergência.
Resolução Caso 3
1. Qual a causa do desmaio?
Hipoglicemia (uso de insulina + longo período sem alimentação + exercício físico).
2. Porque usar glucagon?
Estimula glicogenólise e gliconeogênese.
3. Poderia ser usada glicose ao invés de Glucagon?
Sim. Disponibilização direta do carboidrato.
4. Justifica-se o uso de insulina nesse caso?
Não. Insulina acentuaria a hipoglicemia.
5. A causa do desmaio poderia estar relacionada à atividade física?
Sim. Uso de insulina associado ao aumento da demanda de carboidrato leva à hipoglicemia.
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