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Medicina (Ribeirão Preto) 2010;43(3): 223-30 Simpósio: Condutas em enfermaria de clínica médica de hospital de média complexidade - Parte 2 Capítulo I Exacerbação da doença pulmonarExacerbação da doença pulmonarExacerbação da doença pulmonarExacerbação da doença pulmonarExacerbação da doença pulmonar obstrobstrobstrobstrobstrutiutiutiutiutivvvvva crônicaa crônicaa crônicaa crônicaa crônica Exacerbation of chronic obstructive pulmonary disease Alexandre B. de Figueiredo1,2, Silvio R. B. da Silva Filho1,3, Rômulo R. Lôbo1,3, Julio C. Moriguti4 RESUMO A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é altamente prevalente e permanece como grande pro- blema de saúde pública em todo o mundo. Exacerbações são eventos característicos da história natu- ral desta doença e estão associados com significante morbidade e mortalidade. A presente revisão aborda aspectos diagnósticos e terapêuticos da exacerbação aguda da DPOC. Palavras-chave: Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica. Infecções. Fatores de Risco. Ventilação Não- Invasiva. 1 Médico Assistente da Clínica Médica do Hospital Estadual de Ribeirão Preto. 2 Mestre em Clínica Médica pela Área de Clínica Médica da FMRP- USP. 3 Pós-graduando da Área de Clínica Médica da FMRP-USP. 4 Diretor de Atividades Clínicas do Hospital Estadual de Ribeirão Preto e Professor Livre-Docente da Divisão de Clínica Médica Geral e Geriatria da FMRP-USP. Correspondência: Alexandre Baldini de Figueiredo Hospital Estadual de Ribeirão Preto Avenida Independência, 4750. 14026-160- Ribeirão Preto - SP Telefone: 16-3602-7100 Lista de AbreviaturasLista de AbreviaturasLista de AbreviaturasLista de AbreviaturasLista de Abreviaturas DPOC = Doença Pulmonar Obstrutiva Crôni- ca; GOLD = Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease; VEF1 = volume expiratório forçado do primeiro segundo; CVF = capacidade vital forçada; PaO2 = pressão parcial arterial de O2; PaCO2 = pres- são parcial arterial de CO2; EP = embolia pulmonar; BNP = peptídeo natriurético; VNI = ventilação não invasiva; CPAP = continuous positive airway pressure. IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) é caracterizada por limitação do fluxo aéreo, usual- mente progressiva, não totalmente reversível, as- sociada à resposta inflamatória anormal dos pulmões a partículas e gases nocivos, principalmente à fumaça do cigarro. Embora afete primariamente os pulmões, produz também importantes manifestações sistêmicas. Trata-se de doença passível de prevenção e tratável.1,2 A limitação ao fluxo aéreo característica da DPOC é causada por uma combinação de doença das vias aéreas (bronquite) e destruição do parênquima (enfisema), sendo que a contribuição relativa de cada componente varia de pessoa para pessoa. Uma das características mais marcantes da his- tória natural da DPOC é a ocorrência de períodos de exacerbação caracterizados por piora aguda dos sin- tomas de dispnéia, tosse e/ou expectoração, acima das variações normais do dia a dia, normalmente acompa- nhadas de piora da função pulmonar.2 224 Medicina (Ribeirão Preto) 2010;43(3): 223-30 http://www.fmrp.usp.br/revista Figueiredo AB, Silva Filho SRB, Lôbo RR, Moriguti JC. Exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica EpidemiologiaEpidemiologiaEpidemiologiaEpidemiologiaEpidemiologia Se considerarmos que a prevalência do taba- gismo na população brasileira é estimada em 32% e que os dados epidemiológicos mostram que cerca de 15% dos tabagistas desenvolvem DPOC clinicamen- te significativa, então podemos assumir que algo em torno de 7.500.000 brasileiros são portadores de DPOC e que neste grupo ocorrem cerca de 275.000 interna- ções ao ano, grande parte delas por exacerbações.3 O número total de casos de DPOC em todo o mundo pode chegar a 280 milhões.4 De longe, a maior causa de DPOC é o tabagis- mo.5 Habitualmente, pacientes com DPOC apresen- tam sintomas após fumarem um maço de cigarros por dia durante aproximadamente 20 anos ou mais. En- tretanto considera-se hoje que o desenvolvimento da doença resulte de interação entre predisposição ge- nética e exposição a gases e partículas tóxicas e, em- bora muitos tabagistas nunca venham a apresentar doença clinicamente manifesta, outros podem exibir piora intensa e precoce da função pulmonar.2 Além do cigarro devem ser lembrados como potenciais causadores de DPOC o uso de fogão a le- nha ou de outros combustíveis fósseis, a inalação de partículas ambientais ou exposições ocupacionais como sílica, berílio, pólvora, vapores de Cádmio, isocianato, formaldeído, poeiras derivadas de cereais e grãos. Doenças genéticas como a deficiência de α1-antitrip- sina também estão associadas ao desenvolvimento de doença pulmonar.2 FisiopatologiaFisiopatologiaFisiopatologiaFisiopatologiaFisiopatologia Segundo o grupo de estudo GOLD (Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease)2 a DPOC é definida, do ponto de vista de função pul- monar, como redução do volume expiratório forçado do primeiro segundo (VEF1) < 80% do predito após o uso do broncodilatador ou uma relação VEF1 sobre a capacidade vital forçada (CVF) < 70%. Além da di- minuição da VEF1 e da relação VEF1/CVF, outras alterações comumente encontradas são o aumento do volume residual e da capacidade residual funcional, aumento da capacidade pulmonar total e redução da capacidade vital. Como dito anteriormente, a limitação ao fluxo aéreo característica da DPOC é causada pela combi- nação de doença das vias aéreas e destruição do pa- rênquima, sendo ocasionada principalmente pela di- minuição da retração elástica do parênquima pulmo- nar, pela hipersecreção de glândulas mucosas e pela inflamação crônica das vias aéreas e consequente fibrose e estreitamento das mesmas.2 A vasoconstri- ção hipóxica e a redução do leito vascular pulmonar acabam por provocar aumento da pressão arterial pulmonar e numa fase mais tardia cor pulmonale. Pacientes com DPOC parecem exibir resposta inflamatória amplificada em resposta aos irritantes crônicos como o cigarro. Os mecanismos responsá- veis por esta amplificação não são totalmente conhe- cidos, podem ser geneticamente determinados e pa- recem envolver desequilíbrio na relação entre a pro- dução de proteinases (elastases, metaloproteinases, proteinase 3 e catepsinas) e antiproteinases (α1-anti- tripsina, inibidores teciduais de metaloproteinases).2,3,6 O estresse oxidativo e a produção de peróxido de hidrogênio e óxido nítrico também parecem exer- cer papel importante na patogênese da DPOC. O ta- bagismo, as infecções respiratórias, fatores genéticos e dietéticos têm efeitos no balanço oxidante-antioxi- dante7 e o estresse oxidativo pode levar a aumento da atividade inflamatória, aumento da secreção de muco e inativação de anti-proteinases.2 Talvez como consequência da atividade infla- matória sistêmica cronicamente mantida ou por fato- res ainda não comprovados ou identificados, pacien- tes com DPOC avançada apresentam comumente manifestações sistêmicas como perda de massa cor- poral, piora da função muscular, anemia, osteoporose e depressão.1,4,8 Exacerbação Aumentos agudos nos sintomas respiratórios que excedam a variação diária normal e que levem a ne- cessidade de mudanças nas medicações regularmen- te em uso pelo paciente caracterizam a exacerbação da DPOC.2 As exacerbações são características da história natural desta doença e ocorrem, em média, uma a duas vezes por ano, embora esta frequência geralmente aumente conforme a doença progride.9 Após décadas de pesquisas e controvérsias, aceita-se hoje que a maior parte das exacerbações em pacientes com DPOC seja causada por infecções, sen- do que as manifestações clínicas resultam diretamen- te dos efeitos dos microorganismos sobre a árvore res- piratória e/ou da resposta do hospedeiro. Fatores am- bientais como poluição atmosférica e alterações de tem- peratura aumentando a inflamação de vias aéreas e o tônus broncomotor seriam responsáveis por algo em torno de 15 a 20% dos episódios de exacerbação.9 Medicina(Ribeirão Preto) 2010;43(3): 223-30 http://www.fmrp.usp.br/revista 225 Figueiredo AB, Silva Filho SRB, Lôbo RR, Moriguti JC. Exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica Cerca de 50% das exacerbações são causadas por bactérias. Apesar de uma grande proporção de pacientes com DPOC estável ter sua via aérea colo- nizada por bactérias, os trabalhos mostram que a aqui- sição de novas cepas de Haemophilus influenzae (20- 30%), Moraxella catarrhallis (10-15%), Streptococ- cus pneumoniae (10-15%) e Pseudomonas aerugi- nosa (5-10%, principalmente em pacientes com doença pulmonar avançada, hospitalização recente e uso frequente de antibióticos) está fortemente associada à ocorrên- cia de exacerbações dos sintomas de DPOC.10-13 Ainda está por ser determinado se esta associação vale para outras bactérias comumente isoladas no escarro como os estafilococos e as enterobactérias.9 Vírus respiratórios podem ser detectados em um a dois terços dos casos de exacerbação, embora seja difícil precisar a proporção de casos em que eles realmente sejam a causa da intensificação dos sinto- mas. Os rinovírus parecem ser os agentes virais mais comumente associados às exacerbações14, mas em casos mais graves que necessitem de hospitalização o influenza é mais comum.9 Parainfluenza, coronavírus e adenovírus também são frequentes durante as exa- cerbações.14 O vírus sincicial respiratório e metap- neumovírus foram recentemente reconhecidos como causas de exacerbações.15,16 Exacerbações causadas por associações de ví- rus e bactérias tendem a ser mais graves. Os vírus alteram a expressão de receptores nas células epiteliais respiratórias, facilitando a aderência e a invasão das bactérias e a infecção bacteriana prévia também au- menta a suscetibilidade a infecções virais.9 QQQQQuadro clínicouadro clínicouadro clínicouadro clínicouadro clínico O aumento da dispnéia é o principal sintoma da exacerbação, geralmente acompanhado de sibilância, aumento da tosse e da produção de escarro, mudan- ças na coloração e consistência do escarro. Outras quei- xas comumente associadas são a palpitação, cansaço, insônia, depressão e confusão mental. Cianose e si- nais de cor pulmonale como edema de membros infe- riores, estase jugular e hepatomegalia podem ser evi- denciados ao exame físico em alguns casos. Mudanças no volume e coloração do escarro apontam para in- fecção bacteriana como causa da exacerbação.2 A gravidade da exacerbação deve ser avaliada com base na história prévia do paciente, presença de co-morbidades, sintomas, exame físico, gasometria arterial e outros testes laboratoriais. Idade avançada, doença de base avançada, dispnéia intensa em repou- so pouco responsiva ao tratamento padrão, cianose, sinais de cor-pulmonale, rebaixamento do nível de consciência, hipoxemia, hipercapnia e acidose respi- ratória são indicadores de gravidade.2 Diagnóstico e exames complemen-Diagnóstico e exames complemen-Diagnóstico e exames complemen-Diagnóstico e exames complemen-Diagnóstico e exames complemen- tarestarestarestarestares O diagnóstico de DPOC deve ser considerado em pacientes com dispnéia e/ou tosse crônicas, pro- dução crônica de escarro e história de exposição a fatores de risco para DPOC (tabagismo, forno a le- nha, produtos químicos, gases etc.) e confirmado com a espirometria. Na exacerbação, entretanto, a espiro- metria pode ser difícil de ser realizada e não é rotinei- ramente indicada.2 A gasometria arterial é exame de extrema va- lia em paciente com exacerbação de DPOC. Geral- mente revela hipoxemia e hipercapnia. PaO2 abaixo de 60mmHg em ar ambiente e/ou saturação < 90% indicam insuficiência respiratória. A hipercapnia ob- servada nestes casos leva a acidose respiratória, ao contrário do que se observa em retentores crônicos de CO2, nos quais o aumento do bicarbonato mantém o pH dentro dos limites da normalidade. PaO2 abaixo de 40mmHg, PaCO2 persistentemente > 60mmHg e pH<7,25 indicam gravidade e necessidade de interna- ção em unidade de terapia intensiva. A radiografia de tórax pode sugerir sinais da presença de DPOC (retificação do diafragma, aumento do espaço retroesternal, aumento do espaço entre os arcos costais) identificar ou sugerir diagnósticos asso- ciados ou alternativos (pneumonia, câncer, insuficiên- cia cardíaca). Tomografia de tórax e cintilografia pul- monar podem ser usadas em casos específicos (diag- nóstico diferencial com tromboembolismo pulmonar por exemplo).2 Hemograma, função renal, eletrólitos e glicemia também são exames úteis na avaliação de co-morbi- dades. Outros testes de avaliação bioquímica devem ser considerados caso a caso. Cultura de escarro não deve ser rotineiramente solicitada, mas pode ter utili- dade nas exacerbações infecciosas que não respon- deram ao tratamento antibiótico inicial e naqueles pa- cientes com fatores de risco para infecção por Pseu- domonas aeruginosa (hospitalização recente, uso fre- quente de antibióticos, DPOC avançado (FEV1<50% do predito) e isolamento de P. aeruginosa em exa- cerbação prévia).2 226 Medicina (Ribeirão Preto) 2010;43(3): 223-30 http://www.fmrp.usp.br/revista Figueiredo AB, Silva Filho SRB, Lôbo RR, Moriguti JC. Exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica Diagnóstico diferencialDiagnóstico diferencialDiagnóstico diferencialDiagnóstico diferencialDiagnóstico diferencial Várias condições clínicas podem mimetizar os sinais e sintomas de exacerbações de DPOC. Entre elas detacam-se pneumonia, insuficiência cardíaca, derrame pleural, pneumotórax, embolia pulmonar, cân- cer de pulmão, tuberculose, bronquiectasias.2 A embolia pulmonar (EP) é particularmente di- fícil de ser diferenciada de uma exacerbação, princi- palmente em pacientes com DPOC avançado e pode gerar dificuldades de interpretação mesmo de exa- mes complementares mais sofisticados como cintilo- grafia pulmonar. Pressão sistólica baixa e incapacida- de de elevar a PaO2 acima de 60mmHg apesar do uso de O2 suplementar sugerem a ocorrência de EP. Caso exista a suspeita clínica de EP deve-se tratar concomitantemente as duas condições até que se te- nha o diagnóstico definitivo.2 Outro diagnóstico diferencial desafiador é in- suficiência cardíaca descompensada. História, exame físico e exames complementares simples nem sempre conseguem distinguir as duas condições de forma confiável. Neste sentido, a avaliação dos níveis do peptídeo natriurético (BNP) tem se mostrado de ex- trema valia na diferenciação entre causas cardíacas e não cardíacas de dispnéia aguda no pronto socorro, sendo que níveis acima de 100pg/ml sugerem a parti- cipação de disfunção ventricular e aumento das pres- sões de enchimento na gênese dos sintomas respira- tórios.17 TTTTTrrrrraaaaatamentotamentotamentotamentotamento Embora muitos dos pacientes com exacerba- ções dos sintomas de DPOC possam ser tratados ambulatorialmente, é frequente a necessidade de in- ternação (Figura 1). Pacientes idosos, com doença de base avançada com uso de oxigênio domiciliar, sinto- mas intensos em repouso, cianose, alterações do nível de consciência, co-morbidades graves não controla- das, hipoxemia intensa, acidose respiratória, ou aque- les com suporte domiciliar inadequado devem ser in- ternados.2 O tratamento objetiva a correção da hipoxe- mia, a melhora da ventilação e controle dos fatores desencadeantes e o tratamento das co-morbidades. Figura 1. Abordagem dos pacientes com DPOC exacerbada (adaptado de Celli BR4) EXACERBAÇÃO DE DPOC Exacerbação Leve DPOC leve VEF1 > 50% do previsto Ausência de co-morbildades Exacerbação moderada a grave DPOC moderada a grave VEF1<50% do previsto Co-morbidades Dispnéia grave Tratamento ambulatorial Aumentar dose do β-agonista Adicionar anticolinérgico Considerar corticóide sistêmico Internação hospitalar Hipercapnia e pH < 7,35 Rx de tórax – excluir pneumonia, pneumotórax, ICC Broncodilatador inalatório (B2-agonista +anticolinérgico Corticóide sistêmico Antibióticos se escarro sugesti- vo de infecção bacteriana Hipoxemia. PaCO2< 45mmHg Considerar antibiótico se escarro purulento O2 suplementar – manter saturação entre 88-90% Considerar VNI Medicina (Ribeirão Preto) 2010;43(3): 223-30 http://www.fmrp.usp.br/revista 227 Figueiredo AB, Silva Filho SRB, Lôbo RR, Moriguti JC. Exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica Oxigênio suplementar A primeira medida a ser iniciada em paciente admitidos na sala de urgência é a administração de oxigênio suplementar naqueles em que a saturação de oxigênio for menor que 90%.2 Em casos de DPOC grave, o uso de altos fluxos de oxigênio suplementar pode levar a retenção de CO2 e piora da acidose res- piratória. Por isso, o fornecimento de oxigênio suple- mentar deve ser titulado a fim de que se consiga satu- ração entre 88-90% e recomenda-se coleta de gaso- metria arterial 30 a 60 minutos após o inicio da oxige- noterapia para garantir que a melhora da oxigenação não ocasionou piora da retenção de CO2 e da acidose.2 Broncodilatadores Os broncodilatadores agem por ação direta de relaxamento da musculatura lisa das vias aéreas.18 Três classes de broncodilatadores podem ser usadas em pacientes com exacerbações de DPOC: 1. Agonistas de receptores adrenérgicos βββββ2 - pre- feridos no tratamento da exacerbação de DPOC, os agonistas β2 de curta duração tem início de ação rápido e são efetivos no alívio dos sintomas. As dro- gas mais comumente utilizadas são o salbutamol e o fenoterol (10 a 20 gotas) diluídos em 5 ml de soro fisiológico, podendo-se utilizar até mesmo nebuliza- ção contínua no início do tratamento de pacientes graves, aumentando o intervalo entre as doses pro- gressivamente conforme a resposta terapêutica ou o surgimento de efeitos colaterais. Os efeitos cola- terais mais importantes estão relacionados à dose e incluem taquicardia, arritmias, tremores, alterações do sono e hipocalemia.6,18 2. Anticolinérgicos - a atividade parassimpática nas vias aéreas de médio e largo calibre é mediada por receptores muscarínicos e resulta de contração de musculatura lisa e secreção de muco. O tônus coli- nérgio aumentado é importante na fisiopatologia do DPOC, justificando teoricamente o uso de agentes anticolinérgicos.18 O GOLD recomenda o uso des- tes agentes nas exacerbações apenas se houver pouca resposta ao β2 adrenérgico ou em paciente mais graves.2 Embora sejam drogas bem toleradas, deve-se ter cuidado no uso em pacientes com sin- tomas prostáticos e glaucoma. O efeito colateral mais comumente referido é boca seca.6 3. Metilxantinas - inibidores não seletivos da fosfo- diesterase, as metilxantinas agem por fraco efeito broncodilatador e como estimulante respiratório.18 Embora bastante utilizadas, o papel destas medi- cações nas exacerbações de DPOC permanece controverso. As metilxantinas têm janela terapêu- tica estreita, efeitos tóxicos potencialmente graves e necessidade de monitoramento dos níveis plas- máticos durante o tratamento.6 Consideradas atual- mente drogas de segunda linha no tratamento do DPOC, não devem ser usadas rotineiramente, sen- do possivelmente úteis nos casos que apresenta- ram resposta inadequada aos broncodilatadores de curta ação.2 Corticóides Corticóides sistêmicos orais ou endovenosos são formalmente indicados no tratamento da exacerbação do DPOC, com fortes evidências de que eles redu- zem o índice de falhas terapêuticas.2,19 Entretanto a dose exata e o tempo de duração do tratamento ainda não estão determinados. Doses elevadas estão asso- ciadas a um aumento do risco de efeitos colaterais. Tratamentos prolongados (acima de 2 semanas) não trazem benefícios adicionais19 e podem ser particular- mente deletérios em pacientes idosos, sabidamente susceptíveis às complicações decorrentes do uso dos corticóides como catarata, diabetes, osteoporose, re- tenção hídrica, infecção secundária e psicose. Assim a dose recomendada atualmente é de 30 a 40mg de prednisona e o tratamento deve durar de 7 a 14 dias. Nestas doses, o efeito colateral mais comumente re- latado é a hiperglicemia.19 O uso do corticóide inalatório como terapêutica de manutenção após a compensação do quadro e sus- pensão dos corticóides sistêmicos em pacientes com DPOC grave ainda é controverso. Embora os corti- cóides inalatórios reduzam a frequência de novas exa- cerbações eles também parecem aumentar a frequên- cia de pneumonias e efeitos significativos em sobrevi- da não foram demonstrados.20 Estudo recente mos- trou que o uso combinado de corticóides inalatórios com β2 de ação longa reduziu o declínio da função pulmonar.21 Alguns subgrupos de pacientes com sin- tomas persistentes, exacerbações frequentes e VEF1 < que 50% do predito podem se beneficiar do uso com- binado de corticóides inalatórios e β2 de longa dura- ção e agentes anti-muscarínicos de longa duração (ti- otrópio).2,6 Antibióticos As evidências atualmente disponíveis mostram que os antibióticos reduzem a falência de tratamento 228 Medicina (Ribeirão Preto) 2010;43(3): 223-30 http://www.fmrp.usp.br/revista Figueiredo AB, Silva Filho SRB, Lôbo RR, Moriguti JC. Exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica e melhoram a sobrevida de pacientes hospitalizados por DPOC exacerbado.19 O GOLD indica o uso de antibióticos nos seguintes grupos de pacientes2: 1. Pacientes com exacerbação de DPOC e três sinto- mas cardinais: piora da dispnéia, aumento da pro- dução de escarro e escarro que se torna purulento. 2. Pacientes com exacerbação de DPOC e dois sin- tomas cardinais, desde que um deles seja a modifi- cação do aspecto de purulência do escarro. 3. Pacientes com exacerbação grave do DPOC que necessitem de ventilação mecânica (invasiva ou não invasiva). O tipo de antibiótico a ser utilizado vai depen- der do padrão local de resistência bacteriana. Como os principais germes envolvidos nas exacerbações são a moraxella, pneumococo e hemófilos, o antibiótico escolhido deve ter ação contra estes grupos de ger- mes. Entre os mais utilizados encontram-se amoxaci- lina-clavulanato, cefalosporinas de 2º ou 3º geração, azitromicina e fluoroquinolonas. Em pacientes com fatores de risco para infecção por pseudomonas, mas sem indicação para hospitalização, ciprofloxacina é uma opção. Em pacientes mais graves, cefepime, ceftazi- dima ou piperacilina-tazobactan (Figura 2). Ventilação não invasiva A ventilação não invasiva (VNI) com pressão positiva é uma técnica que fornece suporte ventilatório mecânico ao paciente sem a necessidade de via aé- rea artificial (tubo orotraqueal ou traqueostomia).22 Neste modo ventilatório, podem ser utilizados diferen- tes tipos de máscaras como interface entre o paciente Figura 2: Algoritmo para tratamento antibiótico em pacientes com DPOC exacerbada (adaptado de Sethi S, Murphy T9) TRATAMENTO ANTIBIÓTICO EM PACIENTES COM DPOC EXACERBADO EXACERBAÇÃO Leve Apenas 01 sintoma cardinal Moderada ou grave 2 ou mais sintomas cardinais Não prescrever antibióticos Fluoroquinolonas: levofloxacina Amoxicilina+clavulanato Fatores de risco p/Pseudomonas: con- siderar ciprofloxacina e obter cultura de escarro DPOC complicado 01 ou mais fatores de risco: - Idade > 65 anos - VEF1<50% - >3 exacerbações /ano - Doença cardíaca associada DPOC não complicada sem fatores de risco: - Idade < 65anos - VEF1> 50% - < 3 exacerbações /ano - Sem doença cardíaca Macrolídeos: azitromicina, claritromicina Cefalosporinas: cefuroxima, cefpodoxima Amoxicilina+clavulanato Doxicilina Sulfametoxazol-trimetoprima Reavaliar resposta após 72horas Medicina (Ribeirão Preto) 2010;43(3): 223-30 http://www.fmrp.usp.br/revista 229 Figueiredo AB, Silva Filho SRB, Lôbo RR, Moriguti JC. Exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica e o ventilador. Os modos mais comumente utilizados são o CPAP (do inglês continuous positive airway pressure) no qual uma pressão constante é fornecida pelo sistema durante todo o ciclo respiratório e a pres- são suporte que combina suporte inspiratório com pres- são positiva expiratória em dois níveis diferentes de pressão. Este último é o maisutilizado em pacientes com exacerbações de DPOC.22 Diversos estudos têm demonstrado a importân- cia da ventilação não invasiva no tratamento de pa- cientes com graves exacerbações. Quando compara- da ao tratamento padrão isoladamente, a ventilação não invasiva está associada à menor mortalidade, re- dução da necessidade de intubação, menor probabili- dade de falha terapêutica, melhora do pH e da fre- quência respiratória, menor taxa de complicações re- lacionadas ao tratamento e menor tempo de interna- ção hospitalar.23 Assim, pacientes que não respondam adequa- damente à terapêutica padrão e persistam com dispnéia moderada a grave, hipoxêmicos, com retenção de CO2 ou em acidose (pH<7,35) são considerados candida- tos à VNI. Os pacientes devem estar conscientes, res- pirando espontaneamente, serem capazes de prote- ger as vias aéreas e eliminar secreções. Devem per- manecer monitorizados. São consideradas contra-in- dicações para a VNI a parada respiratória, instabili- dade hemodinâmica, síndromes coronarianas agudas, arritmias graves, rebaixamento importante do nível de consciência, sangramento gastrintestinal ativo, trau- ma de face, vômitos, risco de aspiração e recusa do paciente.2 Com a experiência acumulada com o uso da VNI e seus benefícios, ela vem sendo aplicada em estágios cada vez mais avançados de insuficiência respiratória aguda e embora a possibilidade de falha nestes casos seja maior, uma tentativa de estabilizar uma paciente grave com VNI antes de proceder a intubação não parece ser prejudicial, desde que res- peitadas as contraindicações e que se atente para a monitorização contínua do paciente.22 Medidas Adicionais Algumas outras medidas e cuidados têm reco- nhecidamente impacto positivo sobre a evolução de pacientes internados com exacerbações de DPOC e a atuação de equipe multidisciplinar tem se mostrado de grande importância neste tipo de abordagem.2 O acompanhamento conjunto de profissionais de fisiote- rapia (clearence de escarro com estímulo a tosse, ex- pirações forçadas, percussão torácica manual, mecâ- nica, drenagem postural), nutrição (desnutrição e so- brepeso estão associados à maior taxa de complica- ções6), enfermagem, psicologia e assistente social é fundamental. Pacientes imobilizados, policitêmicos, desidra- tados, com ou sem história prévia de doença trombo- embólica têm indicação de profilaxia para trombose venosa profunda. Administração judiciosa de fluidos com monitorização do balanço hídrico também é im- prescindível. A internação é sempre uma oportunidade para reforçar junto aos pacientes e familiares a importân- cia da interrupção do tabagismo. Todos os tabagistas, aqueles em risco de desenvolver DPOC e aqueles já portadores da doença, devem ser fortemente encora- jados e auxiliados a interromper o hábito. Aconselha- mento, informação, apoio e farmacoterapia (reposição de nicotina, bupropiona) podem auxiliar o processo.2,6 Alta hospitalarAlta hospitalarAlta hospitalarAlta hospitalarAlta hospitalar Pacientes clinicamente estáveis por 24 horas, capazes de comer, dormir e caminhar pelo quarto, necessitando de β2 agonista no máximo a cada 4 ho- ras podem receber alta hospitalar, desde que estejam orientados quanto ao uso correto das medicações no domicílio.2 Vale lembrar aqui que, naqueles pacientes que mantém PaO2 menor que 60mmHg após tratamento adequado da exacerbação e retorno ao estado clínico basal, não existe necessidade de aguardar liberação do oxigênio domiciliar (pela família ou pelo estado) antes da alta. Os benefícios da oxigenoterapia domi- ciliar demonstrados na sobrevida e qualidade de vida de pacientes com DPOC e PaO2 menor que 55mmHg ocorreram no uso em longo prazo.24,25 Além disso, é conveniente esperar um estado clínico relativamente estável para avaliar a real indicação de O2 domiciliar. A gasometria deve ser avaliada antes da alta e após 3 meses e se o paciente permanecer hipoxêmico, indi- car oxigenoterapia domiciliar de longo prazo. Medicamentos que reduzam o número de exa- cerbações e hospitalizações como β2 agonista de lon- ga ação, anticolinérgico de longa ação e corticóide inalatório devem ser considerados para uso domiciliar. Reavaliações clínicas ambulatoriais devem ser agen- dadas para no máximo 6 semanas após a alta hospita- lar. Lembrar ainda de indicar a vacinação para pneu- mococo e vírus influenza.2,6 230 Medicina (Ribeirão Preto) 2010;43(3): 223-30 http://www.fmrp.usp.br/revista Figueiredo AB, Silva Filho SRB, Lôbo RR, Moriguti JC. Exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica Referências BibliográficasReferências BibliográficasReferências BibliográficasReferências BibliográficasReferências Bibliográficas 1. Celli BR, MacNee W. Standards for the diagnosis and treat- ment of COPD. Eur Respir J 2004; 23:932-46. 2. Rabe KF, Hurd S, Anzueto A, Barnes PJ, Buist SA, Calverley P, et al. Global strategy for the diagnosis, management and prevention of chronic obstructive pulmonary disease: GOLD executive summary. Am J Respir Crit Care Med 2007;176:532- 55. 3. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. I Consenso Brasileiro de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC). J Pneumol 2000;26:S1-52. 4. Celli BR. Update on the management of COPD. Chest 2008;133:1451-62. 5. Barnes PJ. Chronic obstructive pulmonary disease. N Engl J Med 2000;343:269-80. 6. Fromer L, Cooper CB. A review of GOLD guidelines for the diagnosis and treatment of patients with COPD. Int J Clin Pract 2008;62:1219-36. 7. 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