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131 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* 1. E+#%#,$%#) $) 1*'"#) * $) !"51#%) Afi gura-se um elemento difi cultador de sua interpreta- ção e aplicação o caráter fl uído e multifacetado do princípio da efi ciência, ensejando a necessidade de instrumentalizar a objetivação,1 a fi m de viabilizar o controle intersubjetivo por essa via.2 Quanto ao aspecto da intersubjetividade, Habermas assere: Somos os seres que essencialmente tomam parte na prá- xis do ‘dar e exigir razões’. Na medida em que pedimos conta uns dos outros, respondemos por nossas ações uns perante os outros. Deixamo-nos afetar por razões, ou seja, 1 Adverte Diogo de Figueiredo Moreira Neto que “o conceito jurídico de efi - ciência jamais poderá ser subjetivo, pois de outro modo, chegar-se-ia ao arbítrio no controle”. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Admi- nistrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 117. Cf HABERMAS, Jür- gen. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989, p. 42-46. 2 Com efeito, essa é uma das críticas lançadas à efi ciência, a exemplo do que preleciona Celso Antônio Bandeira de Mello, ao pontifi car que o tal princí- pio “é juridicamente tão fl uido e de tão difícil controle ao lume do Direito, que mais parece um simples adorno agregado ao art. 37 ou o extravasamento de uma aspiração dos que burilam no texto”. MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 110. Eduardo.indd 131 28/6/2012 11:23:17 Eduardo Azeredo Rodrigues 132 deixamo-nos reivindicar pela obrigatória ‘força do melhor argumento’.3 Para tanto, Diogo de Figueiredo Moreira Neto reputa imprescindível a fi xação de parâmetros objetivos, estabeleci- dos pela lei, por ato administrativo simples ou complexo ou por contrato, para possibilitar a aferição dos resultados alcan- çados pela atuação do poder público.4 No que toca à delegação de serviços públicos, por exemplo, faz-se recomendável que o contrato de concessão contenha cláusula que estabeleça os critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros, de forma objetiva, que sirvam de re- ferência para avaliação da qualidade do serviço.5 Nesse sen- tido, poderia dispor o contrato, por exemplo, que seria con- siderada efi ciente a concessionária de determinada rodovia que socorresse os acidentados dentro de determinado tempo após a ocorrência do evento, ou que mantivesse um dado número de ambulâncias e reboques para auxiliar nos aciden- tes e na remoção de veículos avariados. Por sua vez, no que toca à avaliação funcional a que se submete o servidor pú- blico para adquirir estabilidade,6 é conveniente que sejam estabelecidos critérios objetivos a fi m de permitir a aferição de seu desempenho funcional. No que concerne à sua acepção como postulado jurídico, ao exemplo do que ocorre com a proporcionalidade, no exame da adequação, a relação de causalidade entre o meio e o fi m é suscetível de ser aferida sob diversos aspectos, ensejando a percepção de mútua interação entre teoria e práxis. 3 HABERMAS, Jürgen. Verdade e justifi cação: ensaios fi losófi cos. São Paulo: Loyola, 2004, p. 136. 4 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Op. cit., p. 117. 5 Art. 23, III da Lei nº 8.987/95. 6 Art. 41, §4o da Constituição Federal. Eduardo.indd 132 28/6/2012 11:23:17 133 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* Humberto Ávila considera que a análise da adequação envolve três dimensões: abstração/concretude; generalidade/ particularidade e antecedência/posteridade.7 Na primeira delas (abstração/concretude) pode-se avaliar a relação de causalidade no plano meramente abstrato, vale dizer, “a me- dida será adequada se o fi m for possivelmente realizado com a sua adoção”,8 ainda que, na prática, algo possa levar a outros re- sultados; ou no plano concreto, sendo a medida adequada so- mente se o fi m for efetivamente atingido no caso em aprecia- ção. Na segunda dimensão (generalidade/particularidade), pode-se exigir a adequação genérica, vale dizer, na maioria dos casos; ou particular, afi gurando-se exigível a promoção do fi m em todos os casos individuais. Na terceira dimensão (antecedência/posteridade), “pode-se exigir a adoção de uma me- dida que seja adequada no momento em que foi adotada”9 ou “exigir a adoção de uma medida que seja adequada no momento em que ela vai ser julgada”,10 vale dizer, no momento do controle. A bem da verdade, a relação entre teoria e prática, desde a metafísica clássica, sempre foi objeto de questionamento da própria Filosofi a, assim como a indagação acerca do seu papel nos contextos de espaço público e privado.11 Como incursiona Habermas, para Platão, assim como na tradição aristotélica e estóica, a teoria e a contemplação absorta do cosmo tinham um signifi cado próprio no processo de salvação, promovendo a catarse da alma e libertando-a do corpo e de interesses e paixões inferiores.12 7 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da defi nição à aplicação dos princípios jurídicos. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 167. 8 Loc. cit. 9 Loc. cit. 10 Ibidem, p. 167-168. 11 HABERMAS, Jürgen. Verdade e justifi cação: ensaios fi losófi cos. São Paulo: Loyola, 2004, p. 313. 12 Ibidem, p. 314. Eduardo.indd 133 28/6/2012 11:23:17 Eduardo Azeredo Rodrigues 134 Também na Antiguidade helenística, o conhecimento te- órico afi gurava-se modelo de vida mas, por seu caráter eli- tista, a Filosofi a não apresentava o efeito de massa, deixando às religiões redentoras as tarefas de consolação, educação moral e salvação do espírito, voltando-se, mais, às funções cognitivas.13 Desde o pensamento pós-metafísico, inclusive em Kant, verifi ca-se que a ética fi losófi ca abandona seus conteúdos subs- tanciais e passa a não mais prescrever um modelo de vida ideal, estimulando a refl exão acerca de uma vida autêntica.14 Há, con- tudo, um deslocamento na teoria moral, de uma perspectiva aristotélica individualista (o que é bom para mim) para um consciência moral e política coletiva, baseada no assentimento universal dos sujeitos racionais (o que é bom para todos).15 Com efeito, é indiscutível que as grandes revoluções hu- manas deitam raízes na Filosofi a, sendo o ponto de partida a racionalidade,16 tendo o “partido da ação”, inspirado nas crí- ticas idealistas formuladas por Feuerbach e Marx, pretendido superar a Filosofi a para realizá-la.17 Contudo, a transposição da teoria para prática, sob as vestes da exaltada crítica econômica formulada por Marx fra- cassou e já era atacada antes mesmo do catastrófi co experi- mento soviético, quer porque rompeu com o pensamento me- tafísico, quer porque estava calcada nos macro-sujeitos (classe social, cultura, povo, etc.),18 de sorte que o impulso de liber- tação não levava em consideração a fi nitude do indivíduo.19 13 Loc. cit. 14 Ibidem, p. 315. 15 Loc. cit. 16 Conforme testifi ca Habermas, “como Hegel pensou, a Revolução Francesa ‘partiu da fi losofi a’”. Loc. cit. 17 Idem. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989, p. 26. 18 Idem. Verdade e justifi cação: ensaios fi losófi cos. São Paulo: Loyola, 2004, p. 317. 19 Ibidem, p. 318. Eduardo.indd 134 28/6/2012 11:23:17 135 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* Desde a Idade Média, a Filosofi a, que estabelece íntima relação com o Direito, a moral e a arte, é ciência fundamen- tal, da qual se deriva o conhecimento, conquanto tenham dela se diferenciado outros saberes.20 A interação é inevitá- vel, restando ao especialista científi co oferecer respostas e soluções técnicas para os problemas da vida e aos fi lósofos (enquanto especialistas) responderem às questões de base;21 por outro lado, ao “mediador terapêutico de sentido” compete ajudar na busca da compreensão pelo sentido da vida, po- dendo a Filosofi a, enquanto ética, mostrar o caminho rumo a uma autoclarifi cação racional”.22 Nomesmo sentido, indagado acerca do papel atual do intelectual no contexto social, Michel Foucault destaca que sempre, “pela sua escolha moral, teórica e política, quer ser portador desta universalidade”.23 Contudo, foram estabelecidos novos modos de interação entre teoria e prática, fazendo emergir a fi gura de um “intelectual específi co”24 (em contraposição ao “intelectual universal” - que era, por excelência, o escritor)25 atuando em setores determinados (o hospital, a moradia, a universidade, etc.) e produzindo o conhecimento técnico, cor- respondente à função do especialista científi co. Pode-se estabelecer uma aproximação entre o caráter retroalimentativo que se dá entre a teoria e a prática e a 20 Para Habermas, “a fi losofi a não pode senão reagir ao desenvolvimento independente das ciências tornadas autônomas” e “sem pretensão fundamentalista e com consciência falibilista, entra em cooperação com outras ciências”. Ibidem, p. 321. 21 Segundo Habermas, “os fi lósofos são consultados sobre questões acerca de fronteiras, questões de método e de crítica das ciências, mas principalmente sobre questões normativas da ecologia ou da tecnologia genética, e em geral sobre questões relativas aos riscos e aos problemas resultantes do emprego de novas tecnologias”, assim como “questões de autoclarifi cação político-éticas”. Ibidem, p. 322. 22 Ibidem, p. 323. 23 FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979, p. 8. 24 Ibidem, p. 9. 25 Loc. cit. Eduardo.indd 135 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 136 concepção de Anthony Giddens acerca da refl exividade característica da ação humana, no seguinte sentido:26 A refl exividade da vida social moderna consiste no fato de que as práticas sociais são constantemente examinadas e reformadas à luz de informação renovada sobre estas próprias práticas, alterando assim constitutivamente seu caráter. [...] Em todas as culturas, as práticas sociais são rotineiramente alteradas à luz de descobertas sucessivas que passam a informá-las.27 Dado à possibilidade de interagir com outras ciências28 e com o senso comum, podendo compreender e conectar diversas linguagens e apresentar respostas críticas, a Filosofi a assumiu o papel de autocompreensão e de autoclarifi cação da sociedade, apresentando respostas às questões fundamentais da vida.29 Essa interação permite um reabastecimento em específi - cos domínios do saber, propiciando uma analise crítico-refl e- xiva e um feedback na relação entre teoria e prática, como no seguinte exemplo: O indivíduo leigo não pode necessariamente fornecer defi - nições formais de termos como ‘capital’ ou ‘investimento’, 26 GIDDENS, Anthony. As consequências da Modernidade. São Paulo: Editora Universidade Estadual Paulista, 1991, p. 43. 27 Ibidem, p. 45. 28 Habermas reconhece a falibilidade da fi losofi a e a saudável e necessária cooperação entre as diversas ciências: “vejo exemplos dessa inclusão da fi losofi a na cooperação científi ca por toda parte em que os fi lósofos atuam trazendo subsídios para uma teoria da racionalidade, sem elevar pretensões fundamentalistas ou, mesmo, de tudo englobar num abraço absolutista. Eles trabalham, ao contrário, na consciência falibilista de que aquilo de que a fi losofi a outrora se julgara capaz sozinha de agora em diante só se pode esperar da coerência feliz de diferentes fragmentos teóricos”. HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989, p. 30-31. 29 Idem. Verdade e justifi cação: ensaios fi losófi cos. São Paulo: Loyola, 2004, p. 324. Eduardo.indd 136 28/6/2012 11:23:18 137 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* mas todo mundo que, digamos, utiliza uma conta bancária, demonstra um domínio implícito e prático destas noções. Conceitos como estes, e as teorias e informação empírica a eles ligados, não são meramente dispositivos convenientes por meio dos quais os agentes estão de algum modo mais aptos a compreender seus comportamentos do que esta- riam de outra forma. Eles constituem ativamente o que o comportamento é e informam as razões pelas quais ele é compreendido. Não pode haver uma separação defi nida entre a literatura disponível aos economistas e a que é lida ou fi ltrada para setores interessados na população: homens de negócios, membros do governo e elementos do público. O ambiente econômico está constantemente sendo alte- rado à luz destes inputs, criando assim uma situação de contínuo envolvimento mútuo entre o discurso econômico e as atividades a que ele se referem.30 Do mesmo modo, ainda que defi nida a efi ciência por pa- râmetros objetivos, haverá interação recíproca entre a teoria e a prática, fortemente infl uenciada por uma análise crítica e refl exiva das relações de causalidade entre meios e fi ns. 2. E+#%#,$%#) * (#2%"#%#'$)"#*()(* Enceta-se na problemática acerca das formas de controle dos atos do poder público pela via da efi ciência, em suas múl- tiplas acepções, a sua estreita relação com a discricionarie- dade, tema sobre o qual já foram vertidos rios de tinta,31 e que, plurissignifi cativo, acomoda-se, em algumas nuances e com certo esforço teórico-conceitual, no ordenamento jurídico e na idéia de direito. 30 GIDDENS, Anthony. Op. cit., p. 48. 31 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e Controle Judicial. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 09. Eduardo.indd 137 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 138 Intenta-se, nesse passo, apenas situar o debate acerca dos limites e possibilidades de controle pela efi ciência, fazendo-se necessária, em alguma medida, tecer considerações pontuais e estabelecer uma aproximação teórico-conceitual com a dis- cricionariedade sem a pretensão, no entanto, de focalizar ou exaurir o estudo daquele denso, controvertido e multifário fe- nômeno jurídico. O termo discricionariedade comporta mais de uma acep- ção em Direito,32 mas somente faz sentido, como adverte Ro- nald Dworkin, em situações nas quais alguém deve tomar de- cisões baseadas em determinados padrões estabelecidos por alguma autoridade,33 tratando-se, portanto, de um conceito relativo.34 O notável catedrático norte-americano vislumbra um primeiro sentido fraco quando, por alguma razão, os pa- drões a serem observados não permitem uma aplicação mecâ- nica, do tipo axiomático-dedutiva, mas exigem uma especial capacidade por parte do aplicador, o que ocorre, por exem- plo, no caso do uso de conceitos indeterminados. Em um se- gundo sentido fraco, o poder discricionário pode traduzir a circunstância da irrecorribilidade devido à instância ou hie- rarquia daquele que toma a decisão, assim como não cabe ao árbitro principal, no beisebol, rever a decisão do árbitro de segunda base acerca de se foi a bola ou o corredor que che- gou antes àquela base.35 Em um sentido forte, aquele que de- cide simplesmente não está limitado pelos padrões da auto- ridade em questão, como ocorre no caso do sargento a quem o tenente determina a escolha de quaisquer cinco homens de 32 Utilizando-se da nomenclatura utilizada em Perelman, Fábio de Olivei- ra constata que discricionariedade é uma noção confusa. OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Morte e vida da constituição dirigente. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 354 33 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 50. 34 Ibidem, p. 51. 35 Ibidem, p. 52. Eduardo.indd 138 28/6/2012 11:23:18 139 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* uma tropa para uma operação de patrulha,36 diferentemente do que ocorreria se lhe fosse determinado escolher os cinco homens mais experientes, com a pretensão de direcionar a sua decisão. Mesmo no sentido forte, a decisão discricionária não está infensa a críticas e deve ser exercido com esteio em padrões de bom senso e equidade.37 Solidifi ca-se o entendimento de que, em suas va- riadas formas de expressão,a discricionariedade é sem- pre conformada,38 vale dizer, não se traduz em um poder absoluto,39 em arbitrariedade, tendo como balizas os princí- pios constitucionais40 e como norma implícita o direito fun- 36 Loc. cit. 37 Ibidem, p. 53. 38 Fábio de Oliveira registra que, noutro tempo, a discricionariedade já foi in- controlável, despótica, uma liberdade absoluta de escolha arbitrária mas, com o passar do tempo, passou-se a admitir balizas ao juízo de mérito, con- fi rmadas pelo Judiciário quanto à legalidade e legitimidade do ato. OLIVEI- RA, Fábio de. Por uma teoria dos princípios: o princípio constitucional da razoa- bilidade. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 128. No mesmo sentido, Batista Júnior adverte que não tem o administrador o poder de adotar uma opção meramente subjetiva, que melhor lhe aprouver, segundo os seus va- lores pessoais. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Princípio constitucional da efi ciência administrativa. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 333. 39 Vaníce Lírio do Valle manifesta a correta observação no sentido de que “poder imune a controle se revelará sempre e sempre uma ameaça”. VALLE, Vaníce Lírio do. Direitos fundamentais e boa administração: uma associação indispensável no caminho da efetividade. In: KLEVENHUSEN, Renata Braga (coord.). Temas sobre direitos humanos: estudos em homenagem a Vicente de Paulo Barreto. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 202. 40 FREITAS, Juarez. Discricionariedade administrativa e o direito fundamental à boa Administração Pública. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 10. No mesmo sen- tido, e citando diversos julgados do Excelso Pretório e do Superior Tribunal de Justiça, Alexandre de Moraes pontifi ca que “não há dúvida, portanto, de que o controle jurisdicional do ato administrativo, em face do desvio de poder no exercício das competências administrativas, pode ser realizado em confronto com os princípios constitucionais da Administração Pública”. MORAES, Alexandre de. Princípio da efi ciência e controle jurisdicional dos atos administrativos discricionários. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro n. 243, p. 13- 28, set./dez. 2007, p. 19. Eduardo.indd 139 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 140 damental à boa administração pública,41 sendo, portanto, passível de controle jurídico, principalmente pela via da razo- abilidade. Esse exame provém da elaboração do détournement de pouvoir42 pelo Conselho de Estado francês e tem se desen- volvido histórica e gradativamente, a partir da segunda me- tade do século XIX, com o surgimento das teorias relativas ao desvio de poder ou fi nalidade e dos motivos determinantes.43 Com efeito, a dogmática da insindicabilidade do mé- rito do ato administrativo44 resume-se, na verdade, à iden- tifi cação das fronteiras entre o que é discricionário e o que é arbitrário,45 haja vista que os critérios administrativos de conveniência e oportunidade que estejam em consonância 41 Ibidem, p. 9. Com efeito, o art. 41 da Carta dos Direitos Fundamentais de Nice estatui, in verbis: “Artigo 41.o - Direito a uma boa administração - 1. Todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições e ór- gãos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável. 2. Este direito compreende, nomeadamente: - o direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afecte desfavoravel- mente, - o direito de qualquer pessoa a ter acesso aos processos que se lhe refi ram, no respeito dos legítimos interesses da confi dencialidade e do segredo profi ssional e comercial, - a obrigação, por parte da administração, de fundamentar as suas decisões. 3. Todas as pessoas têm direito à reparação, por parte da Comunidade, dos danos causados pelas suas instituições ou pelos seus agentes no exercício das respectivas funções, de acordo com os princípios gerais comuns às legislações dos Estados-Membros. 4. Todas as pessoas têm a possibilidade de se dirigir às institui- ções da União numa das línguas ofi ciais dos Tratados, devendo obter uma resposta na mesma língua”. UNIÃO EUROPEIA. Carta dos Direitos Fundamentais. Jornal Ofi cial das Comunidades Européias , Bruxelas, v. 43, n. C364, p. 1-22, 18 dez. 2000. Disponível em: <h9 p://www.europarl.europa.eu/charter/pdf/ text_pt.pdf>. Acesso em 11 out. 2009. 42 OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria... cit., p. 127. 43 MORAES. Alexandre de. Op. cit., p. 18. No mesmo sentido, Batista Júnior. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves.Op. cit., p. 301. 44 Para uma visão geral da posição clássica acerca da insidicabilidade pelo Judiciário do mérito do ato administrativo: Fábio de Oliveira. OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria... cit., p. 128-130. 45 Ibidem, p. 130. Eduardo.indd 140 28/6/2012 11:23:18 141 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* com o ordenamento jurídico46 de fato não podem ser revis- tos pelo juiz, sob pena de quebra da separação dos poderes, razão pela qual “toda discricionariedade é sempre legal, caso con- trário será arbitrariedade”.47 Sendo assim, a discricionária pode e deve ser aferida, até porque o seu exame é pressuposto para se concluir se o juízo de mérito foi efetivamente exercido de forma legítima,48 afi gurando-se em autêntica discricionariedade ou em arbitra- riedade travestida, haja vista que ”discrição não signifi ca, no Estado Constitucional, liberdade para o erro teratológico ou para vantagens indevidas e voluntarismos de matizes irracio- nais, ainda que dissimulados em ideologia”.49 A discricionariedade, em sua origem, aproxima-se da idéia de efi ciência, na medida em que, diante da impossibili- dade de se antever todas as possibilidades de escolha,50 ins- trumentaliza a adoção de apenas uma (ou algumas) delas, à luz de circunstâncias factuais presentes no momento de sua implementação. Na verdade, o poder discricionário, como de resto ocorre como todas as demais prerrogativas de ordem pública cometidas à autoridade, afi gura-se, antes de tudo, como um 46 Na concepção de Juarez Freitas, trata-se de discricionariedade legítima, vinculada aos princípios constitucionais. FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 10. 47 OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria... cit., p, 130. Idem. Morte e vida da constituição dirigente. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 361. 48 OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria... cit., p. 132. 49 FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 10. 50 Para Celso Antônio Bandeira de Mello, “a única razão lógica capaz de justifi car a outorga de discrição reside em que não se considerou possível fi xar, de antemão, qual seria o comportamento administrativo pretendido como imprescindível e reputado capaz de assegurar, em todos os casos, a única solução prestante para atender com perfeição ao interesse público que inspirou a norma”. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle judicial. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 33. Na mesma direção, Batista Júnior testifi ca que “a norma legislada não consegue dar conta da realidade crescentemente heterogênea, pluralista e policêntrica”. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Op. cit., p 326. Eduardo.indd 141 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 142 dever, a fi m de que seja atingida a fi nalidade preconizada pelo ordenamento jurídico para aquela função, em prol da satisfação do interesse alheio,51 ao revés do que ocorre, via de regra, no âmbito do Direito Privado, em que o sujeito exercita determinada faculdade em proveito próprio. Daí porque “o eixo metodológico do Direito Público não gira em torno da idéia de poder, mas gira em torno da idéia de dever”.52 No mesmo sentido, Juarez Freitas sublinha o caráter co- gente da discricionariedade, afi gurando-se como verdadeira competência, e formula a seguinte enunciação: Pode-se conceituar a discricionariedade administrativa legítima como a competência administrativa (não mera faculdade) de avaliar e de escolher; no plano concreto, as melhores soluções,mediante justifi cativas válidas, coe- rentes e consistentes de conveniência ou oportunidade (com razões juridicamente aceitáveis), respeitados os requisitos formais e substanciais da efetividade do direito fundamental à boa administração pública.53 Nessa medida, também o que se denomina poder discricionário cinge-se a viabilizar o cumprimento do dever de alcançar a fi nalidade sobrejacente54 e não pode se confundir com a idéia da possibilidade de fazer escolhas livres, ainda que comportadas em abstrato pela norma.55 É bem de ver que, da mesma forma como ocorre nas hi- póteses em que a norma jurídica estabelece um único compor- tamento para atingir determinada fi nalidade, por ser possível fazê-lo objetivamente (vinculação), também nos casos em que 51 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 13. 52 Ibidem, p. 14. 53 FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 24. 54 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 15. 55 Ibidem, p. 16. Eduardo.indd 142 28/6/2012 11:23:18 143 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* não se possa antever a conduta ideal, a discrição56 prevista em abstrato na norma serve justamente para possibilitar a melhor escolha, diante das peculiaridades que se apresentem concre- tamente ao aplicador, sempre voltada a alcançar a fi nalidade buscada pela ordem jurídica. É, destarte, “a mais completa prova de que a lei sempre impõe o comportamento ótimo”.57 Não fosse assim, se o ato de escolha fosse meramente aleatório, fá- -lo-ia o próprio legislador. Nesse sentido, pontifi ca Celso An- tônio Bandeira de Mello: Deveras, não teria sentido que a lei, podendo fi xar uma solução por ela reputada ótima para atender o interesse público, e uma solu- ção apenas sofrível ou relativamente ruim, fosse indiferente perante essas alternativas. É de presumir que, não sendo a lei um ato mera- mente aleatório, só pode pretender, tanto nos casos de vinculação, quanto nos casos de discrição, que a conduta do administrador atenda excelentemente, à perfeição, a fi nalidade que a animou. Em outras palavras, a lei só quer aquele específi co ato que venha 56 Cabe consignar, nesse passo, a arguta observação de Juarez Freitas, no sen- tido de que discricionariedade e vinculação são dois modelos teóricos extre- mados, vale dizer, não há, na prática, uma discricionariedade ilimitada, ou uma “zona interditada à sindicabilidade”, tampouco uma vinculação absoluta. Isto porque, “no mundo da vida, o sistema administrativo não se mostra auto- -regulável por inteiro – ainda que completável -, tampouco a liberdade se apresenta absolutamente franqueada ao agente público por habilitação legislativa”. FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 13-14. Não existem, destarte, a pura discricionariedade e a pura vinculação, tratando-se de questão de medida (maior ou menor dose de vinculação). Ibidem, p. 39 e 50. Também para Fábio de Oliveira, discri- cionariedade e vinculação “podem conviver na mesma deliberação ou no mesmo ato”. OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Morte e vida da constituição dirigente. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 354. No mesmo sentido, Batista Júnior e Rodrigo Benício Jansen Ferreira. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Op. cit., p. 289. FERREIRA, Rodrigo Benício Jansen. Princípio da efi ciência administrativa e legalidade: (conceituação teórica do princípio da efi ciência e releitura da legalidade e da discricionariedade à luz da teoria dos princípios). 2004. Dis- sertação (Mestrado em Direito)–Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2004, p. 21 e 123-124. 57 Ibidem, p. 32. Em abono dessa idéia, Davi Chicóski. CHICÓSKI, Davi. O princípio da efi ciência e o procedimento administrativo. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 237, p. 93-118, jul./set. 2004, p. 102. Eduardo.indd 143 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 144 a calhar à fi veleta para o atendimento do interesse público. Tanto faz que se trate de vinculação, quanto de discrição. O comando da norma sempre propõe isto. Se o comando da norma sempre propõe isto e se uma norma é uma imposição, o administrador está, então, nos casos de discricionariedade, perante o dever jurídico de praticar, não qualquer ato dentre os comportados pela regra, mas única e exclusivamente aquele que atenda com absoluta perfeição à fi nalidade da lei.58 A discricionariedade nasce, portanto, com o propósito de permitir que, diante do caráter polifacético e multifário dos fatos da vida,59 o aplicador possa amoldar a decisão à rea- lidade que se lhe apresenta em concreto, em busca da solução ótima,60 que atenda com excelência à fi nalidade legal.61 58 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle judicial. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 32-33. 59 Ibidem, p. 35. 60 Batista Júnior compactua do entendimento segundo o qual a Administração Pública está obrigada a buscar a solução ótima (não bastando uma solução mediana), sob pena de responsabilidade, sendo a discricionariedade um instrumento para tanto. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Op. cit., p. 309, 326-327 e 335-337. Conquanto esta seja a melhor orientação, há entendimento em contrário, no sentido de que bastaria uma solução adequada, dentro do esperado, sendo sufi ciente que não fosse sofrível. FERREIRA, Rodrigo Benício Jansen. Op. cit., p. 101-102. 61 Celso Antônio Bandeira de Mello dá um bom exemplo no qual a utilização de um conceito jurídico indeterminado permite uma melhor adequação na interpretação das peculiaridades do caso em cotejo com a fi nalidade almejada. Trata-se de duas hipotéticas normas, sendo a primeira, inteiramente vinculada, que dissesse ter direito à internação gratuita em hospitais públicos as pessoas que auferissem apenas um salário mínimo; enquanto a segunda, que dispusesse que teria direito a tal internação os doentes que fossem “pobres”, sem que houvesse uma fi xação objetiva para a caracterização do pressuposto normativo. Em face dessas duas alternativas, suponha-se que se apresentassem duas pessoas, pretensas necessitadas do serviço: a primeira, que percebesse um salário mínimo e meio mas fosse casada, tivesse 12 fi lhos dependentes e sustentasse a sogra; a segunda, auferindo exatamente um salário, mas sendo solteira e fi lha de pais muito ricos e com os quais morasse. É evidente que, se concebida em termos vinculados, a lei não permitiria, se aplicada ao pé da letra, o cumprimento de sua fi nalidade inspiradora. Eduardo.indd 144 28/6/2012 11:23:18 145 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* Em sua gênese - e isso que mais merece se destacar para os fi ns aqui buscados - aproxima-se a discricionariedade da efi ciência, na medida em que a primeira operacionaliza um ideal de otimização no alcance da fi nalidade preconizada na ordem jurídica. Esse é o substrato da lição daquele notá- vel publicista: Então, a discrição nasce precisamente do propósito nor- mativo de que só se tome a providência excelente, e não a providência sofrível e eventualmente ruim, porque, se não fosse por isso, ela teria sido redigida vinculadamente.62 Talvez por conta dessa simbiose entre a efi ciência e o es- correito exercício de determinada prerrogativa (poder) ine- rente ao cumprimento de um dever ou de uma fi nalidade preconizada pelo ordenamento jurídico no interesse alheio, caracterizando uma função,63 que o Celso Antônio Bandeira de Mello tenha a concebido “senão na intimidade do princípio da legalidade”,64 ou como “uma faceta de um princípio mais amplo já superiormente tratado, de há muito, no Direito italiano: o princípio da ‘boa administração’”.65 Isto porque “jamais uma suposta busca de efi ciência justifi caria postergação daquele que é o dever adminis- trativo por excelência”.66 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle judicial. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 34-35. 62 Ibidem, p. 35. 63 Ibidem, p. 13. 64 Idem. Curso de Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo: Malheiros,2006, p. 110. 65 Loc. cit. Para Batista Júnior, “o Princípio da Efi ciência é a expressão juridicizada do Princípio da Boa Administração”. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Op. cit., p. 317. 66 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 110. Eduardo.indd 145 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 146 No mesmo sentido, Juarez Freitas entende o exercício da discricionariedade legítima condicionado ao princípio da boa administração pública, dentro do qual se insere o dever de efi ciência e a observância de todos os demais princípios co- gentes à Administração Pública.67 E, para tanto, faz-se neces- sário o aprofundamento da sindicabilidade dos atos do poder públicos,68 sendo imprescindível uma consistente motivação.69 E, também, por conta dessa relação que se asseriu que a discrição (liberdade legítima ou com limites), bem como o aumento na confi ança no agente público,70 associados a uma forma de controle a posteriori são fatores de simplifi cação e desburocratização, sendo condições para a implementação de inovações71 e promoção gradual da efi ciência.72 Dessa obrigação de excelência avulta que a discriciona- riedade prevista em abstrato é maior do que o espaço no qual se pode conduzir o aplicador diante do caso concreto, na me- dida em que “o plexo de circunstâncias fáticas vai compor balizas suplementares à discrição que está traçada abstratamente na norma (que podem até mesmo, chegar ao ponto de suprimi-la)”.73 67 Com efeito, pontifi ca o insigne publicista que “o estado da discricionariedade legí- tima, na perspectiva adotada, consagra e concretiza o direito fundamental à boa administração pública, que pode ser assim compreendido: trata-se do direito fun- damental à administração pública efi ciente e efi caz, proporcional cumpridora de seus deveres, com transparência, motivação, imparcialidade e respeito à moralidade, à participação social e à plena responsabilidade por suas condu- tas omissivas e comissivas. A tal direito corresponde o dever de a administra- ção pública observar; nas relações administrativas, a cogência da totalidade dos princípios constitucionais que a regem”. FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 22. 68 FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 30-48. 69 Ibidem, p. 49-63. 70 BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Op. cit., p 308. 71 FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 31. 72 Vide seção 6.2.4. No mesmo sentido, quanto a esse aspecto, Rodrigo Benício Jansen Ferreira FERREIRA, Rodrigo Benício Jansen. Op. cit., p. 21 e 84-87. 73 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle judicial. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 36. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Op. Eduardo.indd 146 28/6/2012 11:23:18 147 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* Também nos casos de utilização de conceitos jurídicos indeterminados, que traduzam noções fl uidas e imprecisas, tais como “pobreza”, “notável saber”, “boa reputação”, “ur- gência”, “mulher honesta”, haverá, em inúmeras ocasiões, mais de uma intelecção razoavelmente admissível, não se podendo afi rmar, com a objetividade necessária, que tal en- tendimento tenha sido equivocado.74 Isto não signifi ca que esses conceitos não possuam algum conteúdo, ainda que determinável,75 uma densidade mínima, compreendendo, por assim dizer, uma zona de certeza positiva e uma zona de cer- teza negativa,76 cingindo-se “a um campo delimitado pela inte- lecção razoável, corrente, isto é, aquela que é normalmente captada pelos administrados”,77 sendo adensados, em alguma medida, pelo todo contextual no qual estão inseridos.78 A discriciona- riedade decorrente da fl uidez signifi cativa dos conceitos inde- terminados adscreve-se, pois, ao campo de inelimináveis dú- vidas sobre o cabimento de tais conceitos, fora do qual haverá vinculação79 e plena possibilidade de controle jurisdicional.80 Tanto na interpretação e aplicação dos conceitos inde- terminados (atos de intelecção) como nas decisões de mérito, acerca da conveniência e oportunidade entre dois ou mais comportamentos igualmente ensejados pela norma (atos de cit., p. 334. 74 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 22. 75 Ibidem, p. 28. 76 Ibidem, p. 29. 77 Ibidem, p. 30. 78 Ibidem, p. 31. 79 Ibidem, p. 31-32. 80 Nesse sentido, dá conta Alexandre Moraes acerca do “surgimento no direito bra- sileiro da possibilidade de controle judicial, em relação aos atos discricionários, quando da existência de expressões legais que não apresentem noções precisas”, permitindo-se “ao Poder Judiciário defi nir o real conceito dessas expressões, de forma a substituir a defi nição anteriormente dada pela Administração pela sua própria defi nição, na hipótese de verifi cação de abusos ou arbitrariedades”. MORAES. Alexandre de. Op. cit., p. 19. Eduardo.indd 147 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 148 volição)81 os efeitos jurídicos que compõem o que se concebe por discricionariedade são os mesmos,82 tendo o Judiciário que concluir que o ato não era passível de censura se não houve excesso na esfera de intelecção razoável ou na decisão do comportamento que era mais conveniente e oportuno,83 mantendo-se fi elmente nos limites da razoabilidade,84 como se depreende da seguinte lição: Podemos falar em (de)limitação e condicionamento dos con- ceitos indeterminados via princípio da razoabilidade. [...] O princípio da razoabilidade atua na estipulação da zona de certeza negativa e da zona de certeza positiva. Na primeira, há um impedimento de adotar o conceito. Na segunda, há uma obrigação. Portanto, no âmbito estatal, o princípio limita a ação do Poder Público pela certeza negativa e condiciona a con- duta do Estado pela certeza positiva.85 Também a discricionariedade legislativa86 e a jurisdicional,87 como de resto toda e qualquer manifestação 81 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 24. 82 Ibidem, p. 25. 83 Para Juarez Freitas, o controlador atuará como administrador negativo no exame do demérito ou do vício no exercício da discricionariedade, quer por excesso, quer por omissão, não sendo sindicável o merecimento por via di- reta. FREITAS, Juarez. Op. cit, p. 25, 27 e 51-52. 84 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 27. 85 OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria dos princípios: o princípio constitucional da razoabilidade. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 171. 86 Com efeito, “a liberdade de que dispõe o legislador ordinário para promulgar normas é evidentemente colocada sob os auspícios da Norma Normarum”, daí que “toda discricionariedade comporta um grau de vinculação”. Ibidem, p. 148. Conquanto seja ampla, por se tratar função política, com caráter criativo e inovador da ordem jurídica, o juízo discricionário parlamentar é conforma- do pela razoabilidade. Ibidem, p. 152. 87 Ibidem, p. 156-167. Eduardo.indd 148 28/6/2012 11:23:18 149 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* discricionária exercida pelo poder público, deve sempre ser suscetível de conformação, limitando-se ao princípio da ra- zoabilidade. É lapidar no pensamento de Fábio de Oliveira a idéia de que a discricionariedade deve se acomodar ao ordenamento jurídico88 e que só se verifi ca, na sua forma legítima e plena, havendo mais de uma opção que atenda à razoabilidade, ou quando não há apenas uma única resposta certa: “A discricionariedade jurídica pode ser entendida genericamente como o juízo ponderativo que, conformado (limitado e condicionado) pelos princípios e regras de Direito, é capaz de eleger, com segurança, um ato dentre dois ou mais igualmente razoáveis, quando não há univocidade axiológica”.89 Existe discricionariedade, portanto, diante da impossibilidade de identifi car a solução ótima, ante a fi nitude e a limitação da própria inteligência e capacidade humana,90 sendo em muitos casos a solução ideal objetivamente incognoscível.91 Nesse diapasão, “a discricionariedade é pura e simplesmenteo resultado da impossibilidade da mente humana poder saber sem- pre, em todos os casos, qual a providência que atende com precisão capilar a fi nalidade da regra de Direito”;92 ou, nas palavras de Fábio de Oliveira, “há discricionariedade quando existe dúvida razoável acerca de qual é o posicionamento correto, quando se tem 88 Do mesmo modo, Juarez Freitas pontifi ca que não é admissível discricionariedade sem limites ou “inteiramente livre da Carta”. FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 9 e 27. 89 OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria... cit., p. 134. 90 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 42. 91 Ibidem, p. 43. 92 Loc. cit. Eduardo.indd 149 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 150 a certeza de que existem dois ou mais posicionamentos igualmente acertados”.93 Quanto, então, não existir a priori uma única solução ideal94 passível de ser identifi cada pelo intérprete, vale dizer, quando os meios em análise forem proporcionais e houver discricionariedade ante o caso concreto em apreciação, o dever de efi ciência, assim tomado como postulado jurídico, signifi cará um plus na análise da adequação, exigindo que o meio promova satisfatoriamente o fi m, já que a relação de causalidade pode ser compreendida sob vários aspectos, e que nenhum deles teria premência sobre os demais, em vir- tude das especifi cidades em questão.95 Isto não ocorrerá sempre que se puder encontrar, à luz das circunstâncias envolvidas, a melhor solução, não havendo discri- cionariedade nessas hipóteses mas “o dever de escolher bem”.96 Retomando o exemplo de Humberto Ávila,97 agora já de posse do conceito de discricionariedade, suponha-se, no com- bate a uma epidemia, que a vacina M1 acabe com todos os sintomas da doença (superior em termos quantitativos) mas que leve mais tempo para produzir esse efeito na maioria dos pacientes, enquanto a vacina M2, inferior em termos quantita- tivos, surta comprovadamente os seus efeitos em relação aos principais e mais graves efeitos da doença, em um curto es- paço de tempo, ainda que remanesçam algumas poucas se- 93 OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Morte e vida da constituição dirigente. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 364. 94 Considerações pontuais acerca da tese da única resposta serão tecidas adiante (seção 7.3). 95 Vide capítulo 5. 96 FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 15. 97 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da defi nição à aplicação dos princípios jurídicos. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 165-166; Idem. Moralidade, razoabilidade e efi ciência na atividade administrativa. Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, n. 4, out./dez. 2005. Disponível em: <www.direi- todoestado.com/revista/REDE-4-OUTUBRO-2005-HUMBERTO%20AVILA. pdf>. Acesso em: 30 set. 2009, p. 22. Eduardo.indd 150 28/6/2012 11:23:18 151 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* quelas. Suponha-se, ainda, que dentre esses graves efeitos da doença esteja o elevado grau de contágio pela bactéria, e que a vacina M2 consiga, poucas horas após a sua aplicação, conter a fúria de disseminação desse agente etiológico. Imagine-se, ainda, que o poder público esteja premido pelo rápido avanço da epidemia, já com inúmeros óbitos computados. Diante des- sas circunstâncias, e necessitando primordialmente conter o avanço da doença, indaga-se: há dúvidas acerca de que, em- bora promovendo o fi m de combate à doença em diferentes aspectos, a vacina M2, levando-se em consideração a circuns- tância de que o fator tempo é preponderante no alastramento da epidemia, é a que melhor atende o interesse de conter o seu avanço? Não há, portanto, discricionariedade na escolha das vacinas M1 e M2 pelo simples fato de promoverem o fi m sob aspectos diferentes. Afi gura-se obrigatória a escolha da vacina M2, quer em função do dever inerente à função administrativa de encontrar a solução que cumpra com perfeição a fi nalidade almejada pelo ordenamento jurídico (boa administração),98 quer em nome da efi ciência propriamente dita. Por outro lado, se não houvesse uma circunstância a pre- valecer na ponderação de razões contrárias e a favor do uso de cada uma das vacinas M1 e M2, supondo-se que ambas atendessem ao fi m almejado sob diferentes aspectos (adequa- ção), não se podendo discernir qual delas traria mais restri- ções aos interesses contrapostos (necessidade), sendo as van- tagens superiores às desvantagens também nos dois casos (proporcionalidade em sentido estrito), seria indiferente, pelo prisma da proporcionalidade, a adoção de M1 ou de M2, 98 Para Celso Antônio Bandeira de Mello, o dever de boa administração, “como quer Guido Falzone, é mais que um dever moral ou de ciência da administração; é um dever jurídico, porque quando não há a boa administração, não há satisfação da fi nalidade legal e quando não há satisfação da fi nalidade legal não há satisfação real da regra de Direito, mas violação dela, pois uma regra de Direito depende inteiramente da fi nalidade, por ser ela que lhe ilumina a compreensão”. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 45. Eduardo.indd 151 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 152 restando as seguintes questões: ambas as vacinas promovem satisfatoriamente o fi m buscado?; qual das duas apresenta o melhor custo X benefício? Se as respostas apontarem compro- vadamente para uma delas, será a sua escolha que emprestará maior efetividade ao princípio constitucional da efi ciência, es- tando o administrador vinculado a adotá-la. Neste último exemplo, o direito fundamental à boa ad- ministração, materializado especifi camente no dever de efi ci- ência pelo poder público, estará mais uma vez conformando a discricionariedade e viabilizando o seu controle jurídico. 3. O C'$1"'.* !*.) *+#%#,$%#), ) �/2%) () 4*.�'" 2'./67' * ) 1*2* () �$#%) "*2!'21) Assim compreendido o fenômeno da discricionariedade e estabelecida a sua aproximação com a efi ciência, cumpre constatar, malgrado a complexidade e inerente difi culdade no trato do tema, a existência de entendimentos doutrinários discrepantes, dentre os quais no sentido insindicabilidade da efi ciência pelo Poder Judiciário.99 Para Vladimir da Rocha França, é vedado o exame in- tegral, pelo Judiciário, da efi ciência dos atos,100 sendo este objeto de controle interno de cada poder,101 incluindo-se, em especial, as atribuições das Cortes de Contas.102 Nesse sen- tido, o autor entende estar a análise da efi ciência afeta à es- fera de discricionariedade,103 caracterizando-se por ser um 99 Cf. MORAIS, Dalton Santos. Os custos da atividade administrativa e o princípio da efi ciência. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 237, p. 165-196, jul. /set. 2004, p. 191. 100 FRANÇA, Vladimir da Rocha. A efi ciência administrativa na Constituição Federal. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n 220, p. 165-177, abr./jun. 2000, p. 173. 101 Art. 74, inciso II da Carta Magna. 102 Art. 70 e seguintes da Constituição da República. 103 FRANÇA, Vladimir da Rocha. Op. cit., p. 174. Eduardo.indd 152 28/6/2012 11:23:18 153 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* exame de efetividade, e não de juridicidade,104 sendo vedada a invalidação judicial exclusivamente por razão de inefi ci- ência, conquanto admita possa o Judiciário aplicar o refe- rido princípio conjuntamente com os demais, especialmente a moralidade e a proporcionalidade,105 além de se afi gurar possível a responsabilização civil do Estado por perdas e danos decorrentes de atos inefi cientes.106 Na mesma linha, Dalton Santos Morais sustenta não ser possível que o Estado-juiz se faça substituir à Administração Pública na escolha de alternativas mais efi cientes, haja vista condicionantes factuais e técnicas, bem como os limites im- postos pela escassez de recursos fi nanceiros a que está sujeito o administrador.107 Para o referido autor, “no campo da discri- cionariedade administrativa, a qual recai sobrea escolha de qual a atividade administrativa mais efi ciente a ser adotada pela Adminis- tração Pública, ‘o Poder Judiciário não pode compelir a tomada de decisão que entende ser de maior grau de efi ciência’”.108 Com efeito, esse entendimento, tomado em termos abso- lutos, não é compatível com a linha de orientação perfi lhada nesta obra, inicialmente, porque não há discricionariedade le- gítima na escolha de alternativas quando uma delas verda- deiramente se afi gure melhor ou mais efi ciente do que as de- mais, estando o poder público vinculado à adotá-la; é o que se passa no caso das vacinas M1 e M2, no exemplo citado alhu- res, sendo passível o controle da efi ciência (ainda que exclu- siva ou integralmente) em hipóteses tais. Não se pode perder de vista a compreensão de que a discricionariedade justifi ca- -se exatamente para que o poder público encontre a melhor 104 Ibidem, p. 173. 105 Ibidem, p. 175. 106 Ibidem, p. 176. 107 MORAIS, Dalton Santos. Op. cit, p. 191-192. 108 Loc. cit. Eduardo.indd 153 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 154 solução em concreto,109 estando, portanto, conformada pelo direito fundamental à boa administração,110 assim caracteri- zado como “lídimo plexo de direitos, regras e princípios”,111 den- tre os quais se acomoda o da efi ciência. Em segundo lugar, a idéia de que o controle de efi ciência circunscreve-se ao âmbito do mérito,112 e não da juridicidade, ou que a invalidação necessitaria da violação conjunta de ou- tros princípios representa um capitis diminutio para a efi ciên- cia, atenuando-lhe, ainda que implicitamente, o seu caráter normativo e recusando-lhe a devida operatividade jurídica. No mesmo sentido, Ana Paula Costa admite a plena possibilidade de intervenção do Poder Judiciário nos atos discricionários em razão da inobservância do princípio da efi ciência, sendo a discricionariedade um dos meios de alcançar o referido princípio, e não um escudo à possibilidade de sindicância dos atos do poder público.113 Se, por um lado, a Administração Pública está jungida, pelo dever de boa administração, a encontrar a melhor alter- nativa, insta refl etir se realmente existe e se é sempre possível chegar-se a uma melhor opção. Em boa parte das hipóteses, é possível se obter uma única resposta. Ronald Dworkin sustenta que, em sistemas jurídicos avançados, é mínima a possibilidade de não haver uma única resposta correta, chegando a por em dúvida se 109 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Discricionariedade e controle judicial. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 32-35. 110 FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 9. 111 Ibidem, p. 22. 112 Para Batista Júnior, nem mesmo o mérito do ato administrativo seria uma fai- xa insindicável, não havendo em nenhum aspecto a possibilidade de opções inteiramente livres, não podendo a Administração Pública se eximir do dever de boa administração. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Op. cit., p. 450. 113 COSTA, Ana Paula. O princípio da efi ciência administrativa e a possibilidade de intervenção do Poder Judiciário nos atos discricionários da Administração Pública. IDAF, Curitiba, v. 6, n. 63, p. 258-265, out. 2006. Eduardo.indd 154 28/6/2012 11:23:18 155 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* essas hipóteses – as quais denomina juízos de empate – real- mente existem.114 Na sua concepção, o fato de pessoas razoá- veis divergirem não infi rma a pouca possibilidade de inexistir uma única resposta, mas demonstra a incapacidade humana de obtê-la, conquanto pudesse o juiz Hércules115 chegar a ela. Por outro lado, pode ocorrer, de fato, uma impossibi- lidade de se defi nir, de forma plenamente objetiva116 e se- gundo uma racionalidade intersubjetivamente controlável,117 mediante uma argumentação jurídica consistente, qual é a melhor ou mais efi ciente alternativa - circunstância em que se confi gura a discricionariedade legítima - sendo infensa a substituição da preferência do controlador em detrimento da do administrador (operador da discricionariedade). Isto porque o Direito, enquanto ciência social, imbricada com os fenômenos e complexidades do homem, está calcada essencialmente em juízos de valor (e não de fato). Se nem 114 OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria... cit., p. 196. 115 Para Dworkin, o juiz Hércules é “um jurista de capacidade, sabedoria, paciência e sagacidade sobre-humanas”. DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 165. 116 Como adverte Luís Roberto Barroso, “o ideal positivista de objetividade e neu- tralidade é insuscetível de realizar-se”, e ”jamais foi possível a transposição total- mente satisfatória dos métodos das ciências naturais para a área de humanidades”. BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e fi losófi cos do novo di- reito constitucional brasileiro: (pós-modernidade, teoria crítica e pós-posi- tivismo). Revista Diálogo Jurídico, Salvador, v. 1, n. 6, set. 2001. Disponível em: <www.direitopublico.com.br/pdf_6/DIALOGO-JURIDICO-06-SETEM- BRO-2001-LUIS-ROBERTO-BARROSO.pdf>. Acesso em: 6 out. 2009. 117 Não se pode desconhecer, por exemplo, o fenômeno da pré-compreensão, que impede a construção de uma verdade ou interpretação atemporalmen- te inabalável, tampouco existe um objetivismo extremado. FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 41. Com bem sintetiza Luís Roberto Barroso, “toda interpretação é produto de uma época, de um momento histórico, e envolve os fatos a serem enqua- drados, o sistema jurídico, as circunstâncias do intérprete e o imaginário de cada um”. BARROSO, Luís Roberto. Op. cit., p. 2. Não, há, portanto, neutralidade, no sentido de completo distanciamento entre o sujeito e o objeto, que inva- riavelmente suscetível às suas experiências, memórias, valores e sentimentos, dado às complexidades da subjetividade humana. Ibidem, p. 6. Eduardo.indd 155 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 156 mesmo nas ciências exatas foi possível, por vezes, a produ- ção de uma verdade acrítica e atemporal,118 quanto mais na esfera das sociais. A tese da única resposta, baseada na idéia de uma racio- nalidade unívoca deve ser transposta para a noção de razoa- bilidade, que admite uma pluralidade de soluções aceitáveis,119 margem dentro da qual de fato existirá discricionariedade, desde que o exame pelo prisma da efi ciência não possa apon- tar as escolhas que se afi gurem as melhores. A percepção dessa impossibilidade de, muitas vezes, ob- ter-se a melhor solução, do mesmo modo como se pode utili- zar um silogismo objetivo que conduza a uma única resposta correta (hipótese factível nos casos fáceis)120 não implica na incessante busca da melhor alternativa,121 conquanto restrinja a possibilidade de controle. É o que constata Batista Júnior: A melhor solução possível é melhor à luz de ponderações levadas a cabo pela AP; se o peso relativo atribuído a cada interesse for alterado conforme o critério valorativo admi- nistrativo, a solução passa a ser outra. Portanto, a melhor solução é a melhor à luz de dado peso relativo atribuído aos interesses intervenientes pelo decisor, ou seja, ela é a melhor possível e é relativa. 118 Apenas à guisa de exemplo, pode-se citar a Revolução Copernicana e a Teoria da Relatividade. 119 Nesse sentido, Fábio de Oliveira sublinha que “o razoável em Perelman aparece como uma alternativa conciliatória, um meio termo, entre uma perspectiva unilateralmente racionalista e uma outra unilateralmente voluntarista (entregue ao subjetivismo)”. OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria... cit., p. 194. 120 Ibidem, p. 193. 121 Para Robert Alexy, a única resposta correta só poderia ser obtida sob cir- cunstâncias especiais que, na prática, são inatingíveis, o que não deve impli- car no abandono da busca da única resposta. ALEXY, Robert. Derecho y razón práctica. México: Fontamara, 1993, p. 22.. Para Fábio de Oliveira, cogita-se, portanto, de uma pretensão de correção, e não de uma correção absoluta. OLIVEIRA, Fábio de. Por umateoria... cit., p. 195. Eduardo.indd 156 28/6/2012 11:23:18 157 C!"#$%&' 7 E+#%#,$%#): .#4#1*2 * !'22#�#.#()(*2 (* %'$1"'.* Na realidade, pois, a melhor solução, a única, a ideal, é um norte para o decisor; entretanto, para fi ns de controle, ela depende de ponderações de interesses, e daí existe de fato uma zona duvidosa na qual ninguém pode dizer que a solução é a melhor, ou não, para o interesse público, que, certamente, será insindicável. O controle, por certo, pode ser feito, mas ele vai incidir se patente restar que a melhor solução tomada, sob qualquer critério pondera- tivo, razoável (juízo de razoabilidade), não foi buscada, ou melhor, se a solução, razoavelmente, nem de perto pode ser considerada a melhor para o bem comum, isto é, se estivermos perante o erro manifesto.122 Como se salientou acima, é preciso ter cautelas quanto à idéia de que todo juízo ponderativo é suscetível de produ- zir mais de um resultado juridicamente razoável, inclusive nos hard cases, e de que qualquer deles seria correto. Há ju- ízos ponderativos que levam apenas a uma resposta razoa- velmente válida e, nesse caso, amplia-se a possibilidade do controle. Contudo, nos casos em que não seja possível obter- -se uma única resposta pelo prisma da proporcionalidade, o controle pela efi ciência poderá se dar ainda que pela via nega- tiva, quanto houver, por exemplo, uma inefi ciência manifesta. Perfeita é a constatação de Fábio de Oliveira no sentido de que “nos casos difíceis pode haver ou não uma única resposta certa”,123 o que se averigua pela argumentação e pelo pro- cesso dialético do debate, ao fi m dos quais se pode mesmo concluir que somente havia uma única resposta correta.124 Conclui, portanto, no sentido de que “é nos hard cases que ad- mitem duas ou mais medidas que há, então, discricionariedade pro- priamente dita”. E prossegue o eminente professor, concluindo que geralmente o princípio da razoabilidade gera uma única 122 BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Op. cit., p 455-456. 123 OLIVEIRA, Fábio de. Por uma teoria... cit., p. 196. 124 Ibidem, p. 197. Eduardo.indd 157 28/6/2012 11:23:18 Eduardo Azeredo Rodrigues 158 resposta, sendo a vinculação a regra, e a discricionariedade (multiplicidade de respostas admissíveis) a exceção, mesmo nos casos difíceis.125 Em abono da tese aqui esposada, Alexandre de Moraes sustenta a plena possibilidade de controle dos atos pelo Poder Judiciário,126 que não pode ignorar o desrespeito ao princípio da efi ciência, sob o infundado argumento da intangibilidade do mérito nos atos discricionários,127 mas também não pode in- validar a escolha legítima, exercida em conformidade com as opções constitucionais, nas hipóteses do regular exercício da discricionariedade pela Administração Pública.128 125 OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Morte e vida da constituição dirigente. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 366. 126 MORAES. Alexandre de. Op. cit., p. 24. 127 Ibidem, p. 22. 128 Ibidem, p. 21. Eduardo.indd 158 28/6/2012 11:23:18