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Amar-amaro é um canto de "malestar", é cantilena zoando nos ouvidos, ferrinho de dentista sarcástico porém compreensivo, "cantarino escarninho piedoso". Há que perceber a gravidez das palavras que parem umas às outras vertiginosamente nos versos finais, como bactérias se multiplicando em cultura propícia: (Clique aqui) (CLIQUE AQUI) cantarino escarninho piedoso este querer consolar sem muita convicção o que é inconsolável de ofício a morte é esconsolável consolatrix consoadíssima a vida também tudo também mas o amor car(o,a) colega este não consola nunca de núncaras Consolo (consolação), inconsolável (que não se consola), esconsolável (esconso, escondido, com consolo, o que pode ser) consolatrix (no latim, lá longe, a consoladora), consoadíssima (consoada, ceia, refeição, mas que soa junto, consoa e rima). Mas do amor não espere consolo, "nunca de núncaras", eco profundo no infinito insondável. Composição e decomposição. Concluindo, essa parte da Antologia que contém a temática do amor revela com nitidez a trajetória do poeta. Sua expressão, inicialmente sincronizada com os modernismos mais ruidosos dos anos trinta, evolui para uma inquietação contemplativa e introspectiva, calma e silenciosa, em que os temas humanos são trabalhados com um certo distanciamento, porém com subjetividade e profundidade, numa forma estética mais universal, conseguintemente mais formal, até desabrochar na plenitude de linguagem mostrada em "Amar-amaro". 7. POESIA CONTEMPLADA Fonte [7] Este é o momento em que o poeta vai falar sobre poesia, sobre fazer poesia, sobre ler poesia. É o momento da metalinguagem, da explicação, ou tentativa de, sobre o processo criativo e sobre o processo recriativo, de leitura. O lutador - 1942 115