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Finanças Corporativas Módulo de Estudo 2 AuLA 5 Desempenho Operacional e Alavancagem Financeira voltar para o sumário 62 Um dos instrumentos financeiros mais importantes na avaliação do desempenho operacional e planejamento é a alavancagem financeira. A aplicação prática desse modelo no Brasil encontra algumas dificuldades adicionais que envolvem principalmente a própria definição de nosso ambiente econômico e cálculo do lucro operacional nas demonstrações financeiras. Graficamente, pode-se entender a estrutura de resultados de uma empresa da maneira seguinte: 63 FIGURA 7: ESTRUTURA DE RESULTADOS DE UMA EMPRESA Passivo Oneroso Ativo (Investimentos) Patrimônio Líquido Resultado Operacional Despesas Financeiras Resultado Líquido Fonte: Elaborado pelo autor, 2022. LUCRO OPERACIONAL = +LUCRO LÍQUIDO DESPESAS FINANCEIRAS Lucro operacional é gerado pelas atividades (operações) da empresa. O seu valor independe da forma como a empresa é financiada. Equivale à remuneração total gerada aos proprietários de capital (credores e acionistas): Despesas Financeiras (juros de dívidas onerosas) + Lucro Líquido (resultado do acionista). (ASSAF NETO, 2020, p.91). 64 O resultado líquido da empresa é determinado pelo retorno das decisões de investimento (ativos) e pelos custos das decisões de financiamento. O resultado operacional, por seu lado, é formado exclusivamente pelas decisões de ativos, pelo desempenho operacional da empresa, não sendo influenciado pelos passivos. O genuíno resultado operacional é aquele proveniente das decisões de ativos, formado pela atividade principal da empresa, não sendo influenciado pela forma como a empresa é financiada. FIQUE ATENTO! 65 5.1 Desempenho operacional Suponha, para melhor ilustrar o entendimento e o cálculo do lucro operacional, o demonstrativo de resultados da Cia. ABC publicado ao final de determinado exercício segundo padrões da legislação societária vigente (Tabela 1). O cálculo do genuíno lucro operacional com base no demonstrativo de resultados elaborado de acordo com a legislação societária exige que se reverta a dedução das despesas financeiras. Nesse caso, o resultado operacional (antes do Imposto de Renda) atinge $ 1.860,00 ($ 1.480,00 + $ 380,00). O lucro operacional bruto de $ 1.860,00 equivale, em outras palavras, ao resultado antes do Imposto de Renda dos acionistas da empresa na hipótese de suas operações serem financiadas exclusivamente por capital próprio. Utilizando passivos onerosos (empréstimos e financiamentos) para financiar seus ativos, o resultado do acionista (lucro antes do Imposto de Renda) reduz-se para $ 1.480,00 pela presença de encargos financeiros cobrados sobre as dívidas. 66 TABELA 1: DEMONSTRATIVO DE RESULTADOS – Cia. ABC Receita operacional de vendas $7.800,00 Custo dos produtos vendidos $4.500,00 Lucro Bruto: $3.300,00 Despesa com vendas $460,00 Despesas Gerais e Administrativas $980,00 Despesas financeiras $380,00 Lucro antes do (IR): $1.480,00 Provisão para (IR) (34%) $506,60 Lucro Líquido: $973,40 Fonte: Elaborado pelo autor, 2022. 67 Outra denominação comumente adotada para o lucro operacional antes do Imposto de Renda é a Lucro Antes dos Juros e Impostos (LAJI), correspondendo em inglês à sigla Earning Before Interest and Taxes (EBIT). O lucro operacional líquido do Imposto de Renda é representado em inglês geralmente por Net Operating Profit After Taxes (NOPAT). O conceito de Earning Before Interest, Taxes, Depreciation/Depletion and Amortization (EBITDA), amplamente usado na análise financeira como medida de capacidade de geração operacional de caixa, é determinado pela soma do lucro operacional (antes do Imposto de Renda) e as despesas não desembolsáveis (depreciação, basicamente). É um indicador financeiro equivalente ao fluxo operacional bruto de caixa, evidenciando a capacidade financeira da empresa em remunerar os proprietários de capital (credores e acionistas). 68 TABELA 2: CÁLCULO DO EBITDA PELAS FORMULAÇÕES SUGERIDAS EBITDA PELO EBIT $ EBITDA PELO LUCRO LÍQUIDO $ Receita de venda 7.800,00 Lucro Líquido 973,40 (-) Custo prod. Vendidos (4.500,00) (+) IR/CSLL 506,60 (-) Desp. Com vendas (460,00) (+) Despesas financeiras 380,00 (-) Desp. Administrativas (980,00) (+) Depreciação/ amortização 870,00 (+) Depreciação 870,00 (=) EBITDA 2.730,00 (=) EBITDA 2.730,00 Fonte: Elaborado pelo autor, 2022. 69 O resultado operacional, medida relevante para a avaliação do desempenho econômico e viabilidade de um negócio, pode ser apurado através de seu conceito amplo ou restrito. O lucro operacional amplo engloba todas as receitas e despesas apuradas pela empresa em determinado período e provenientes unicamente de suas decisões de ativos. Já o lucro operacional, nesse conceito mais restrito, deve englobar somente resultados diretamente vinculados à atividade operacional objeto da empresa, basicamente receitas de vendas e custos e despesas operacionais. A escolha dos itens que formam esse resultado restrito obedece a critérios gerenciais, seguindo o detalhamento exigido pelo analista. 70 5.2 Alavancagem financeira Consideremos que o fluxo de caixa de uma empresa possui três donos: os credores, os acionistas e o governo. Ao pegarmos dívida na empresa, se não houvesse benefício fiscal, o pedaço do governo ficaria constante (se a despesa financeira não fosse dedutível de imposto, ele não se alteraria ao aumentarmos ou diminuirmos a despesa financeira), e o restante, ou seja, o pedaço dos credores e o pedaço dos acionistas, também ficaria constante. Como existe o benefício fiscal, do ponto de vista micro ou apenas da empresa, ao aumentarmos o endividamento da empresa, o governo “abre mão” de uma parte do seu pedaço da geração de caixa da empresa, aumentando a parte dos outros dois donos (credores e acionistas). 5.2.1 Retorno do investimento se tudo for financiado com capital próprio Imagine que os acionistas da recém-fundada Cia. ABC concluam que precisam de investimentos totais de $ 5 milhões para montar e fazer operar uma empresa, dos quais $ 2 milhões para 71 aplicação em ativo imobilizado e os restantes $ 3 milhões para o capital de giro (ativo circulante). Os acionistas sabem que há possibilidade de se conseguir financiamento para parte desses ativos totais e, inclusive, precisam disso, pois não possuem recursos próprios suficientes. Suponha ainda que as taxas de juros para os financiamentos sejam de 12% ao ano, e que se espera um retorno (lucro) de $ 800 mil por ano, antes dos encargos financeiros (lucro operacional antes do Imposto de Renda). Admita neste exemplo, ainda, que não exista Imposto de Renda e que não haja inflação nessa economia. A apuração de tal resultado previsto está demonstrada na tabela 3. 72 TABELA 3: DEMONSTRAÇÃO PROJETADA DO RESULTADO $ (mil) Receita de venda $ 10.000,00 Custo prod. Vendidos $ (6.000,00) Lucro Bruto $ 4.000,00 Despesa com vendas $ (1.200,00) Despesas Administrativas $ (2.000,00) Lucro: $ 800,00 Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.93) Os acionistas avaliam se, caso fossem capazes de financiar com recursos próprios os $ 5 milhões totais de ativo, teriam um retorno sobre o investimento total de 16%, e isso ocorreria com seus próprios investimentos (patrimônio líquido): 73 $ 800 mil de lucro = =ROI 16% =$ 5 milhões de ativo idem de patrimônio líquido ROI = Retorno sobre o ativo (investimento) total ROE = Retorno sobre o patrimônio líquido 5.2.2 Retorno do investimento se 50% fossem financiados com recursos de terceiros Diante da escassez de seus capitais próprios, os acionistas decidem diminuir desse lucro de $ 800 mil o custo de tomar emprestados $ 2,5 milhões à taxa de 12% ao ano, conforme é ilustrado na tabela 4. Os acionistas da Cia. ABC analisam agora: qual o retorno produzido pelos ativos (investimentos)?Deve ser apurado antes ou após os encargos financeiros? = = 16% $ 800.000,00 5.000.000,00 ROI (Antes das despesas financeiras) = = 10% $ 500.000,00 5.000.000,00 ROI Após das despesas financeiras 74 TABELA 4: DEMONSTRAÇÃO PROJETADA DE RESULTADO COM DÍVIDA $ (mil) Lucro após as despesas operacionais (vendas e administração) – Tabela 3 $ 800,00 Despesas Financeiras: 12% x $ 2,5 milhões $ (300,00) Lucro: $ 500,00 Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.94) Quanto ao retorno sobre o capital próprio investido: $ 500.000,00 = =ROE 20% 2,5 milhões de capital próprio investido Pode-se perceber agora que o retorno dos acionistas subiu bastante, passando de 16% 75 para 20% do capital próprio investido. Sem financiamentos, o lucro dos acionistas era de $ 800 mil e o investimento próprio de $ 5 milhões; com o financiamento, o lucro reduziu-se para $ 500 mil, mas o capital próprio investido desceu pela metade, $ 2,5 milhões. Exatamente, isto é a alavancagem financeira: o efeito de tomar, numa ponta, recursos de terceiros a determinado custo, aplicando-os na outra ponta (nos ativos) a outra taxa de retorno: a diferença vai para os proprietários e altera seu retorno sobre o patrimônio líquido, para mais ou para menos do que aquele que seria obtido caso todo o investimento fosse feito apenas com recursos próprios. Nesse caso, o efeito da alavancagem foi positivo, já que os recursos, tomados a 12%, foram aplicados nos ativos e geraram 16%. Os acionistas da Cia. ABC decidem promover algumas simulações de como financiar seu negócio. A tabela 5 apresenta seus cálculos. 76 TABELA 5: RESULTADOS SE O CAPITAL DE TERCEIROS FINANCIAR 70% $ (mil) Lucro Gerado pelos Ativos = Lucro operacional antes dos Encargos Financeiros $ 800,00 Encargos Financeiros: 12% x $ 3,5 milhões $ (420,00) Lucro após Encargos Financeiros $ 380,00 Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.94) Calculando o ROI: = = 16% $ 800.000,00 $ 5.000.000,00 ROI (Antes das despesas financeiras) Existe, porém, uma diferença significativa no retorno sobre o patrimônio líquido: 77 = = 25,33% $ 380.000,00 $ 1.500.000,00 ROE Os acionistas estariam tendo, nessa situação, um retorno sobre seu investimento muito maior, em termos percentuais. Isso se deve a uma utilização maior de recursos de terceiros, numa alavancagem financeira favorável. Nesse exemplo, os ativos da empresa produzem retorno de 16% a.a., mas os acionistas estão ganhando 25,3% a.a. Diz-se que está havendo alto grau de alavancagem financeira, já que este é definido por: = ROE ROI GAF Ou seja: = = 1,58 25,33% 16% GAF (grau de alavancagem financeira) 78 ROI × ROE: na literatura contábil, é comum encontrar os termos Return on Investment (ROI), que é a mesma coisa que Taxa de Retorno sobre Investimento, e Return on Equity (ROE), que é a mesma coisa que Taxa de Retorno sobre Patrimônio Líquido. FIQUE ATENTO! AuLA 6 Risco, Retorno e Custo de Oportunidade (Parte 1) voltar para o sumário 80 Na prática, as decisões financeiras não são tomadas em ambiente de total certeza com relação a seus resultados. Na verdade, por estarem essas decisões fundamentalmente voltadas para o futuro, é imprescindível que se introduza a variável incerteza como um dos mais significativos aspectos do estudo das finanças corporativas. De uma maneira bem simples, risco é a chance de perda financeira. Assim, ativos que possuem 81 chances maiores de perda são vistos como sendo mais arriscados. E os que possuem menor chance de perda, são classificados como menos arriscados. Formalmente, o termo risco é usado de maneira alternada com incerteza para se referir à variabilidade dos retornos que está associada a um determinado ativo. A ideia de risco, de forma mais específica, está diretamente associada às probabilidades de ocorrência de determinados resultados em relação a um valor médio esperado. É um conceito voltado para o futuro, revelando uma possibilidade de perda (ou ganho) nos retornos de um ativo. (ASSAF NETO, 2020, p.142). Imagine que tenhamos um fluxo de caixa de R$ 100 daqui a um ano. Para calcular o valor (preço) desse fluxo de caixa precisamos de uma taxa de desconto (Figura 8). Sabemos que quanto maior o risco do fluxo de caixa, maior a taxa de desconto a ser utilizada. Assim, (i) caso a taxa de desconto a ser utilizada seja 10% a.a., o preço do fluxo de caixa será 91, e (ii) caso a taxa de desconto a ser utilizada seja 16% a.a., o preço do fluxo de caixa será 86. 82 FIGURA 8: FLUXO DE CAIXA DE UM ATIVO ESPECÍFICO 100 1 Preço = FC1 (1 + i)1 (i) Para i = 10%; Preço = 91 (ii) Para i = 16%; Preço = 86Preço = ? Fonte: Elaborado pelo autor, 2022. Nota-se que a taxa de desconto depende do risco, ou seja, deve ser calculada em função do risco. Portanto, nossa necessidade é de um modelo que estabeleça uma relação entre o retorno requerido e uma medida objetiva de risco do fluxo de caixa em questão. O modelo mais comumente utilizado é o chamado modelo de precificação de títulos com risco (em inglês, capital asset pricing model – CAPM). Esse modelo pressupõe que o investidor exige uma taxa de desconto mínima para os títulos sem risco, a chamada taxa livre de risco ou rf (risk free rate), e que a taxa de desconto aumenta linearmente com o aumento do risco. 83 FIGURA 9: RELAÇÃO RISCO/RETORNO Risco Taxa de desconto rf Fonte: Serra (2019, p.11). A equação de uma reta é expressa por Y = a + bX. No nosso caso, Y é a taxa de desconto a ser utilizada para descontar o fluxo de caixa a valor presente, a é o intercepto (rf), b é a inclinação da reta e X é o risco do título. 84 6.1 Fundamentos de probabilidade e medidas estatísticas O conceito básico de probabilidade refere-se à possibilidade (ou chance), expressa normalmente em porcentagem, de ocorrer determinado evento. Por exemplo, ao se assumir uma probabilidade de 70% de que ocorra um fluxo de caixa de $ 800 em determinado período de um projeto, está-se, na verdade, introduzindo um risco de 30% de que tal não se verifique (1 – 0,70), dada sua chance conhecida de 70%. Na prática das decisões de investimentos, porém, a distribuição de probabilidades não se resume geralmente a um único resultado (evento) esperado, mas a diversos valores possíveis de ocorrer. O raciocínio básico é dividir os resultados esperados (elementos de incerteza da decisão) nos valores possíveis de se verificar e identificar, em cada um deles, uma probabilidade de ocorrência. Nesse caso, há um conjunto de eventos incertos (variáveis aleatórias), representado pelos resultados possíveis de serem gerados, e estruturados sob a forma de uma distribuição de probabilidades. 85 6.1.1 Medida de Risco – Desvio padrão O primeiro candidato à medida de risco é o desvio- padrão de uma série histórica de retornos da ação. O desvio-padrão, nesse caso, é uma medida da dispersão da série de retornos ou do quanto os retornos podem estar afastados da média, ou seja, o risco de não ser a média – sua imprevisibilidade. É comum considerar que a série de retornos segue uma distribuição normal ou alguma distribuição próxima à normal. Para entendermos melhor, vamos ao seguinte exemplo: Admita ilustrativamente que se esteja avaliando o risco de dois investimentos: A e B. Baseando-se em sua experiência de mercado e em projeções econômicas, o investidor desenvolve a seguinte distribuição de probabilidades dos resultados monetários previstos: 86 TABELA 6: COMPARAÇÃO DOS RETORNOS DE DOIS INVESTIMENTOS INVESTIMENTO A Resultados esperados Probabilidades $600,00 10% $650,00 15% $700,00 50% $750,00 15% $800,00 10% INVESTIMENTO B Resultados esperados Probabilidades $300,00 10% $500,00 20% $700,00 40% $900,00 20% $1.100,00 10% Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.145) Segundo Assaf Neto (2020) a primeira medida importante para o estudo do risco a ser mensurada é o valor esperado de cadadistribuição de probabilidades considerada. Essa medida representa uma média dos vários resultados 87 esperados ponderada pela probabilidade atribuída a cada um desses valores, sendo seu cálculo processado por meio da multiplicação das diversas estimativas pelas respectivas porcentagens (probabilidades de ocorrência), conforme demonstrado a seguir: = =E(R) Pk x Rk n k = 1 R onde: E(R) = R retorno (valor) esperado de um ativo; PK = probabilidade de ocorrência de cada evento RK = valor de cada resultado considerado. Substituindo a expressão de cálculo para os investimentos anteriores, tem-se: Valor esperado do Investimento A E(RA) = (0,10 x $ 600) + (0,15 x $ 650) + (0,50 x $ 700) + (0,15 x $ 750) + (0,10 x $ 800) E(RA) = $ 700,00 88 Valor esperado do Investimento B E(RA) = (0,10 x $ 300) + (0,20 x $ 500) + (0,40 x $ 700) + (0,20 x $ 900) + (0,10 x $ 1.100) E(RB) = $ 700,00 Uma distribuição muito utilizada nos modelos financeiros para descrever o comportamento dos valores é a distribuição normal. Essa distribuição assume a forma de um sino (curva simétrica), concentrando a maior parte dos valores em torno da média. Ao se afastar do valor médio da distribuição, considerando qualquer um dos lados, o risco se eleva de maneira simétrica. Observa-se na Figura 10 que as duas alternativas de investimentos apresentam o mesmo valor esperado de $ 700, podendo-se considerar, em termos de retorno prometido, como indiferente a implementação de uma ou outra. Uma forma ilustrativa de representar os vários retornos (fluxos de caixa) esperados é efetuada por meio de um gráfico que envolva as distribuições de probabilidades das duas alternativas de investimento em avaliação, conforme demonstra a Figura 10. 89 A medida do valor esperado não demonstra o risco associado a cada proposta de investimento, o que faz com que seja necessário conhecer o grau de dispersão dos resultados em relação à média calculada de $ 700. Essa quantificação, que denota o risco do investimento, pode ser efetuada mediante os cálculos do desvio-padrão e variância. FIGURA 10: DISTRIBUIÇÃO NORMAL DOS INVESTIMENTOS A E B Pr ob ab ili da de Resultados esperados ($) 300 600 700 800 1.100 Investimento A Investimento B Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.145) 90 Essas medidas de dispersão indicam como os valores de um conjunto distribuem-se (dispersam) em relação a seu ponto central (média). Quanto maior se apresenta o intervalo entre os valores extremos de um conjunto, menor é a representatividade estatística da média, pois os valores em observação encontram-se mais distantes dessa medida central. Tanto o desvio-padrão como a variância têm por objetivo medir estatisticamente a variabilidade (grau de dispersão) dos possíveis resultados em termos de valor esperado. Representam, em outras palavras, medidas de risco, e são determinados pelas seguintes expressões de cálculo: =σ n k = 1 Pk x (Rk – R)2 VAR = σ2 onde: 91 σ = símbolo grego (sigma) representando o desvio-padrão; VAR = variância. É o desvio-padrão elevado ao quadrado; PK = probabilidade atribuída a cada resultado; RK = retorno do ativo K; R = ∑(RK) = retorno esperado do ativo K. Aplicando-se essas identidades para a mensuração do risco das alternativas de investimento consideradas no exemplo ilustrativo, tem-se: TABELA 7: INVESTIMENTO A Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.146) 92 TABELA 8: INVESTIMENTO B Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.146) Os resultados obtidos, em consonância com as conclusões obtidas da representação gráfica das distribuições probabilísticas dos investimentos (Figura 10), indicam um desvio-padrão (dispersão dos possíveis resultados) maior para a alternativa B, sendo esta classificada como a de maior risco. Dessa forma, por apresentar o mesmo retorno esperado, a alternativa A, ao assumir um nível mais baixo de risco (menor desvio-padrão), é considerada como a mais atraente. Racionalmente, o investidor dá preferência a alternativas de investimento que ofereçam maior retorno esperado e menor risco associado. 93 6.1.2 Coeficiente de variação (CV) Enquanto o desvio-padrão (e a variância) mede o grau de dispersão absoluta dos valores em torno da média, o coeficiente de variação, geralmente expresso em porcentagem, indica a dispersão relativa, ou seja, o risco por unidade de retorno esperado. O coeficiente de variação é obtido pela simples relação entre o desvio-padrão e a média aritmética da amostra (ou população), ou seja: σ =CV X σ = desvio-padrão X = média A grande utilidade do coeficiente de variação é permitir que se proceda a comparações mais precisas entre dois ou mais conjuntos de valores. Quanto maior se apresentar o coeficiente de variação, mais alto será o risco do ativo. AuLA 7 Risco, Retorno e Custo de Oportunidade (Parte 2) voltar para o sumário 95 7.1 Curvas de possibilidade A postura de um investidor em relação ao risco é pessoal, não se encontrando uma resposta única para todas as situações. A preocupação maior nas decisões de investimento em situação de incerteza é expressar as preferências do investidor em relação ao conflito risco/retorno inerente a toda alternativa financeira. Em outras palavras, deseja- se refletir sobre suas preferências com relação a determinado nível de consumo atual, ou maior no futuro, porém associado a um certo grau de risco. 96 A teoria da preferência tem por objetivo básico revelar como um investidor se posiciona diante de investimentos que apresentam diferentes combinações de risco e retorno. Em decisões que envolvem este conflito, é esperado que o investidor implicitamente defina como objetivo maximizar sua utilidade esperada. A utilidade, nesse contexto de análise de risco, é definida de forma subjetiva, expressando a satisfação proporcionada pelo consumo de determinado bem. A escala de preferência do investidor é representada pela denominada curva de indiferença. Essa curva é compreendida como um reflexo da atitude que um investidor assume diante do risco de uma aplicação e do retorno produzido pela decisão e envolve inúmeras combinações igualmente desejáveis. Qualquer combinação inserida sobre a curva de indiferença é igualmente desejável, pois deve proporcionar o mesmo nível de utilidade (satisfação). A quantidade de curvas de indiferença de um investidor é praticamente ilimitada. A Figura 11 ilustra a escala de preferências de um investidor representada por mais de uma curva de indiferença. Convencionalmente, o mapa de 97 curvas é apresentado de acordo com uma ordem de preferência. As mais distantes são preferíveis às anteriores; estas, por sua vez, destacam-se em relação às precedentes; e assim por diante. Por exigir pequenas elevações no retorno esperado, essas curvas de indiferença (gráfico (a) da Figura 11) retratam um investidor propenso ao risco. Já as curvas retratadas no gráfico (b) refletem um investidor com perfil mais conservador, que exige em contrapartida a uma elevação nos níveis de risco do investimento, aumentos mais relevantes nas taxas de retorno esperadas (observe que as curvas apresentam maior inclinação). 98 FIGURA 11: MAPA DE CURVAS DE INDIFERENÇA σ (Risco) E (R) Retorno esperado R3 R2 R1 (a) σ (Risco) E (R) Retorno esperado R3 R2 R1 (b) Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.152) Um caso extremo de curvas de indiferença encontra-se descrito nos gráficos (c) e (d) Figura 12. Essa ilustração retrata o comportamento de um investidor com ausência de aversão ao risco, demonstrando aceitar o mesmo retorno para 99 qualquer nível de risco, ou o mesmo risco para qualquer nível de retorno esperado. FIGURA 12: CASO EXTREMO DE CURVAS DE INDIFERENÇA σ E (R) R3 R2 R1 (c) σ E (R) R3 R2 R1 (d) Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.152) 100 7.2 Diversificação do risco Nessa ampla abrangência do entendimento do risco, a avaliação de uma empresadelimita-se aos componentes de seu risco total: econômico e financeiro. As principais causas determinantes do risco econômico são de natureza conjuntural (alterações na economia, tecnologia etc.), de mercado (crescimento da concorrência, por exemplo) e do próprio planejamento e gestão da empresa (vendas, custos, preços, investimentos etc.). O risco financeiro, de outro modo, está mais diretamente relacionado com o endividamento (passivos) da empresa, sua capacidade de pagamento, não com as decisões de ativos, conforme definidas para o risco econômico. Dessa maneira, o risco total de qualquer ativo é mensurado da seguinte forma: = RISCO NÃO SISTEMÁTICO RISCO TOTAL RISCO SISTEMÁTICO+ A mensuração do risco de um investimento processa-se geralmente por meio do critério probabilístico, o qual consiste em atribuir probabilidades – subjetivas ou objetivas – aos diferentes estados de natureza esperados e, 101 em consequência, aos possíveis resultados do investimento. Dessa maneira, é delineada uma distribuição de probabilidades dos resultados esperados e mensuradas suas principais medidas de dispersão e avaliação do risco. Por outro lado, pode-se introduzir que o risco total de qualquer ativo é definido por sua parte sistemática (risco sistemático ou conjuntural) e não sistemática (risco específico ou próprio do ativo). Risco não sistemático (específico): Identificado nas características do próprio ativo (intrínseco) e pode ser total ou parcialmente diluído pela diversificação da carteira. Risco sistemático: É inerente a todos os ativos e determinado por eventos externos à empresa e não pode ser eliminado ou reduzido. SAIBA MAIS 102 O risco, conforme foi desenvolvido nas seções precedentes, envolve o estudo de decisões de uma carteira composta preferencialmente de um só ativo. Nesse particular, foram ilustrados os vários conceitos de seleção e desenvolvidas medidas de avaliação do risco e retorno das alternativas. Não obstante essa situação mais simplificada ser válida para diversas ocorrências práticas e permitir, ainda, melhor compreensão de seus principais aspectos conceituais, é importante para o estudo do mercado financeiro que se analise o risco de uma carteira composta por mais de um ativo. A orientação formulada que se assume nessas decisões financeiras é selecionar alternativas que levem à melhor diversificação e, consequentemente, redução do risco dos investimentos e produzam, ao mesmo tempo, um retorno admitido como aceitável no âmbito dos investidores de mercado. O risco é eliminado na hipótese de se implementarem, por exemplo, duas alternativas de investimentos que possuam correlações perfeitamente opostas e extremas, ou seja, que apresentem coeficientes de correlação iguais a – 1 e + 1, respectivamente. Essa situação hipotética, difícil de ser constatada na prática, encontra-se ilustrada na Figura 13. 103 FIGURA 13: CORRELAÇÃO ENTRE INVESTIMENTOS a) Investimento com relação perfeitamente negativa Anos E (R) b) Investimento com relação perfeitamente positiva Anos E (R) A B Fonte: Adaptado de Assaf Neto (2020, p.154) 104 A existência de aplicações negativamente correlacionadas gráfico (a) da Figura 13, indica a formação de carteiras com investimentos que produzem retornos inversamente proporcionais, isto é, quando o retorno de um deles decrescer, o retorno do outro ativo se elevará na mesma intensidade, anulando os reflexos negativos produzidos. Já a opção por projetos positiva e perfeitamente correlacionados, conforme demonstra o gráfico (b) da Figura 13, define maior risco dos ativos da empresa por convergirem seus resultados para uma única decisão. Não se verifica uma compensação do risco assumido pelos ativos como a demonstrada, no contexto de uma carteira negativamente correlacionada; a correlação positiva perfeita pode gerar altos lucros e elevados prejuízos. A ideia fundamental inserida nessa teoria do portfólio é que o risco particular de um único ativo é diferente de seu risco quando mantido em carteira. Uma grande vantagem das carteiras é que elas permitem que se reduza o risco mediante um processo de diversificação dos ativos que as compõem. (ASSAF NETO, 2020, p.155). 105 Como resumo do exposto, pode-se afirmar que o risco de um ativo pode ser reduzido mediante um processo de diversificação, permanecendo unicamente o elemento sistemático, que está relacionado com o comportamento do mercado em geral. Dessa forma, ao compor uma carteira de ativos, sua medida relevante passa a ser o risco sistemático, já que o outro componente pode ser eliminado pela diversificação. FIGURA 14: RISCO SISTEMÁTICO E NÃO SISTEMÁTICO Número de ativos Ri sc o to ta l d o po rt fó lio Risco sistemático Risco não sistemático Risco total Fonte: Elaborado pelo autor, 2022. AuLA 8 Teoria do Portfólio voltar para o sumário 107 A teoria moderna do portfólio ou, em inglês, Modern Portfolio Theory (MPT) é uma teoria sobre como os investidores avessos ao risco podem construir carteiras para maximizar o retorno esperado com base em um determinado nível de risco de mercado. Harry Markowitz foi pioneiro nessa teoria em seu artigo “Portfolio Selection”, que foi publicado no Journal of Finance em 1952. Mais tarde, ele recebeu um Prêmio Nobel por seu trabalho na teoria moderna do portfólio. 108 A teoria moderna do portfólio argumenta que as características de risco e retorno de um investimento não devem ser vistas individualmente, mas devem ser avaliadas pela forma como o investimento é afetado em relação ao risco e pelo retorno do portfólio como um todo. O MPT mostra que um investidor pode construir uma carteira de múltiplos ativos que maximizará os retornos para um determinado nível de risco. Da mesma forma, dado o nível desejado de retorno esperado, um investidor pode construir uma carteira com o menor risco possível. Segundo Assaf Neto (2021) o risco de uma carteira depende não somente do risco de cada elemento que a compõe e de sua participação no investimento total, mas também da forma como seus componentes se relacionam (covariam) entre si. Ao relacionar ativos com baixa correlação (ou covariância inversa), é possível reduzir-se o risco total de uma carteira. Nessas condições, o risco de uma carteira constituída de dois ativos (X e Y) pode ser obtido com base na seguinte expressão: 109 TABELA 9: RISCO DE UMA CARTEIRA CONSTITUÍDA DE DOIS ATIVOS (X E Y) Ativo Participação (W) Retorno (R) Risco X Wx Rx σx Y Wy Ry σy Carteira 100% E(RP) = RP Markowitz Fonte: Assaf Neto (2020, p.161) σp = [(W2 x x σ2 x) + (W2 y x σ2 y) + 2 x Wx x Wy x COVx,y] 1/2 Onde: Wx,Wy = respectivamente, participação do ativo X e do ativo Y no portfólio; σx 2, σy2 = variância dos retornos dos ativos X e Y, respectivamente; COVX,Y = covariância entre os ativos X e Y. Observe que o desvio-padrão de um portfólio de dois ativos não é obtido unicamente pela soma do desvio-padrão de cada ativo ou até mesmo 110 por sua média aritmética ponderada. A expressão de cálculo considera também a covariância entre os ativos, de forma a expressar a contribuição de diversificação sobre o risco do portfólio. Assaf Neto (2021) ainda afirma, que a redução do risco de uma carteira pode ser promovida pela seleção de ativos que mantenham alguma relação inversa entre si. A expressão geral de cálculo do risco (desvio-padrão) de uma carteira que contém n ativos, baseando-se no modelo de portfólio desenvolvido por Markowitz, é a seguinte: =σp N i = 1 W2 i x σ2 i + N i = 1 N j = 1 Wi Wj ρi,j σi σj 1/2 8.1 Fronteira eficiente Agora que entendemos os benefícios da diversificação, surge a questão de como identificar o melhor nível de diversificação. Para cada nível de retorno existe uma carteira que oferece o menor risco possível e, para cada nível de risco existe uma carteira que oferece o maior 111 retorno. Essas combinaçõespodem ser plotadas em um gráfico, e a linha resultante é a fronteira eficiente. A Figura 15 mostra a fronteira eficiente para apenas duas ações – uma ação de tecnologia de alto risco/retorno (como Facebook) e uma ação de bem de consumo de baixo risco/ retorno (como Coca-Cola). FIGURA 15: FRONTEIRA EFICIENTE ENTRE DOIS ATIVOS Risco (desvio-padrão - %) dos retornos Re to rn o da a çã o (% ) Capital market line Facebook Coca-Cola Portfólio ótimo Risk free Fonte: Elaborado pelo autor, 2020. 112 Qualquer carteira que esteja na parte superior da curva é eficiente: dá o retorno máximo esperado para um determinado nível de risco. Um investidor racional só terá uma carteira que esteja em algum lugar na fronteira eficiente. O nível máximo de risco que o investidor assumirá determina a posição da carteira na linha. Quando uma carteira é bem equilibrada, o risco individual de cada ação tem pouco impacto no risco geral da carteira; em vez disso, é a diferença entre o nível de risco de cada ação que influencia o risco geral. A teoria moderna do portfólio teve um impacto marcante sobre como os investidores percebem o risco, o retorno e a gestão do portfólio. A teoria demonstra que a diversificação da carteira pode reduzir o risco de investimento. 113 A curva inserida no triângulo KWZ indica os possíveis resultados de risco e retorno esperados da carteira constituída por ativos considerados como não perfeitamente correlacionados. SAIBA MAIS FIGURA 16: LINHA DO CONJUNTO DE COMBINAÇÕES E(R) = RP (Retorno esperado) Desvio-padrão (σP) W (ativo X) – 1 < ρX,Y < + 1 ρX,Y = – 1 ρX,Y = + 1M K (ativo Y) Z Fonte: Assaf Neto (2020, p.166) 114 A reta KW reflete os possíveis resultados que os ativos apresentariam se fosse apurada uma correlação perfeitamente positiva (ρx, y = + 1,0). Observe ainda na referida Figura 16 que essa linha une as carteiras compostas exclusivamente pelo ativo X e ativo Y. Como a curva KMW está destacada dessa reta (situada a sua esquerda), isso sugere o efeito da diversificação da carteira pela redução do risco. Conforme foi colocado, ainda, os ativos X e Y não apresentam correlação positiva perfeita (ρx, y < 1,0) e promovem, em consequência, redução do risco da carteira. (ASSAF NETO. 2021, p.166).