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DIREITOS HUMANOS E DIVERSIDADE PROF.A MA. MALU ROMANCINI Reitor: Prof. Me. Ricardo Benedito de Oliveira Pró-reitor: Prof. Me. Ney Stival Diretor de Ensino a Distância: Prof. Me. Fábio Oliveira Vaz PRODUÇÃO DE MATERIAIS Diagramação: Alan Michel Bariani/ Thiago Bruno Peraro Revisão Textual: Gabriela de Castro Pereira/ Letícia Toniete Izeppe Bisconcim/ Mariana Tait Romancini Produção Audiovisual: Eudes Wilter Pitta / Heber Acuña Berger/ Leonardo Mateus Gusmão Lopes/ Márcio Alexandre Júnior Lara Gestão da Produção: Kamila Ayumi Costa Yoshimura Fotos: Shutterstock © Direitos reservados à UNINGÁ - Reprodução Proibida. - Rodovia PR 317 (Av. Morangueira), n° 6114 Prezado (a) Acadêmico (a), bem-vindo (a) à UNINGÁ – Centro Universitário Ingá. Primeiramente, deixo uma frase de Só- crates para reflexão: “a vida sem desafios não vale a pena ser vivida.” Cada um de nós tem uma grande res- ponsabilidade sobre as escolhas que fazemos, e essas nos guiarão por toda a vida acadêmica e profissional, refletindo diretamente em nossa vida pessoal e em nossas relações com a socie- dade. Hoje em dia, essa sociedade é exigente e busca por tecnologia, informação e conheci- mento advindos de profissionais que possuam novas habilidades para liderança e sobrevivên- cia no mercado de trabalho. De fato, a tecnologia e a comunicação têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, diminuindo distâncias, rompendo fronteiras e nos proporcionando momentos inesquecíveis. Assim, a UNINGÁ se dispõe, através do Ensino a Distância, a proporcionar um ensino de quali- dade, capaz de formar cidadãos integrantes de uma sociedade justa, preparados para o mer- cado de trabalho, como planejadores e líderes atuantes. Que esta nova caminhada lhes traga muita experiência, conhecimento e sucesso. Prof. Me. Ricardo Benedito de Oliveira REITOR UNIDADE 3WWW.UNINGA.BR ENSINO A DISTÂNCIA SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................. 4 A AFIRMAÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS ........................................................................................ 5 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS HUMANOS ............................................................................. 10 TERMINOLOGIA: DIREITOS HUMANOS, DIREITOS FUNDAMENTAIS E DIREITOS DO HOMEM ..................... 13 AS GERAÇÕES (OU DIMENSÕES) DE DIREITOS HUMANOS ............................................................................... 16 DOS DIREITOS HUMANOS PROF.A MA. MALU ROMANCINI 01 4WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO Os direitos humanos surgiram na era moderna, no século XVII, como uma teoria abstrata, cujo objetivo inicial era limitar o poder do Estado, por meio do controle da ação dos seus governantes. Sua concretização pode ser observada a partir do século XVIII, com o constitucionalismo, que previa a organização do Estado e também a liberdade e igualdade entre os cidadãos. Com isso, começaram a ser garantidos aos cidadãos alguns direitos individuais, como as liberdades, que eram exercidas inicialmente pelos indivíduos (liberdade de expressão, de iniciativa econômica) e depois pela coletividade (como o direito de sindicalização, de greve). Essa retrospectiva histórica será estudada inicialmente para, em seguida, serem tecidas considerações sobre o conceito e as características dos direitos humanos. Logo após, serão abordadas as semelhanças e diferenças entre as diversas nomenclaturas de direitos. Conforme foram surgindo, os direitos foram divididos em gerações, que serão aprofundadas posteriormente neste estudo. 5WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA A AFIRMAÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS O reconhecimento do homem à imagem e semelhança de Deus é um aspecto religioso- filosófico bastante importante, pois a partir disso deu-se início à proteção do homem contra o próprio homem justamente por ser descendente de um ser divino. Contudo, como observa Comparato (2013, p. 31), “essa igualdade universal dos filhos de Deus só valia, efetivamente, no plano sobrenatural, pois o cristianismo continuou admitindo, durante muitos séculos, a legitimidade da escravidão, a inferioridade natural da mulher em relação ao homem”, dentre outras desigualdades. A filosofia kantiana teve grande contribuição para o reconhecimento dos direitos humanos por ressaltar a natureza racional do homem, como um fim em si mesmo, e não como coisa, ou seja, um meio para se atingir um fim. No entanto, a máxima kantiana foi totalmente relegada, na Revolução Industrial com a consideração do trabalhador como mercadoria ou insumo no processo de produção, bem como no século XX pelos nazistas e soviéticos, estes considerados “gigantescas máquinas de despersonalização dos seres humanos (COMPARATO, 2013, p. 36-38). O reconhecimento científico da natureza humana se deu com a teoria evolucionista de Charles Darwin, que coloca o homem no topo da cadeia evolutiva das espécies vivas. O pensamento do século XIX contribuiu para a compreensão de que o homem age de acordo com os seus valores éticos e isso transformou a teoria jurídica, pois “Os direitos humanos foram identificados como os valores mais importantes da convivência humana, aqueles sem os quais as sociedades acabam perecendo, fatalmente, por um processo irreversível de desagregação” (COMPARATO, 2013, p. 41). A evolução da filosofia, sobretudo o pensamento existencialista do século XX, bem como a evolução da biologia, foram importantes para reconhecer o caráter único e insubstituível de cada pessoa, que é portadora de um valor próprio, demonstrando que sua dignidade existe singularmente em todo indivíduo. O reconhecimento do homem como ser sujeito de direitos declarados num documento com um sentido universal se deu apenas com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948, que trouxe esse sentido de que “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos”. No entanto, tal consideração não resolveu o problema dos direitos humanos, que sofre mais com a falta de efetivação nos dias atuais, do que por reconhecimento. Os direitos humanos nem sempre tiveram a mesma concepção, ou abrangeram os mesmos direitos, como vemos hoje em dia. Diversos doutrinadores como Flávia Piovesan, Fábio Konder Comparato e André de Carvalho Ramos afirmam que os direitos humanos vêm sendo construídos ao longo do tempo, “são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas” (BOBBIO, 2004, p. 25). Para saber um pouco mais, este vídeo apresenta uma breve apre- sentação da história dos direitos humanos. Disponível em: https://youtu.be/kcA6Q-IPlKE Acesso em: 03 nov. 2017. 6WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Como se pode observar, os direitos foram sendo conquistados como frutos de lutas em razão do sofrimento físico e moral do homem. Nesse sentido, Bobbio explica que: [...] a liberdade religiosa é um efeito das guerras de religião; as liberdades civis, da luta dos parlamentos contra os soberanos absolutos; a liberdade política e as liberdades sociais, do nascimento, crescimento e amadurecimento do movimento dos trabalhadores assalariados, dos camponeses com pouca ou nenhuma terra, dos pobres que exigem dos poderes públicos não só o reconhecimento da liberdade pessoal e das liberdades negativas, mas também a proteção do trabalho contra o desemprego, os primeiros rudimentos de instrução contra o analfabetismo, depois a assistência para a invalidez e a velhice, todas elas carecimentos que os ricos proprietários podiamsatisfazer por si mesmos. (BOBBIO, 2004, p. 25). A concepção inicial dos direitos humanos se deu com a necessidade de limitação do poder do Estado, representado por seus governantes, que deveriam atuar a serviço do povo e não para o bem próprio. Esse sentido pode ser observado em 1215, na Magna Carta, que preconizou algumas limitações ao poder do rei (COMPARATO, 2013, p. 103-108). Ato contínuo, observa-se em 1679, com a instituição da Lei de Habeas Corpus, uma garantia processual adequada à criação de direitos subjetivos na Inglaterra, já que neste país a ação judicial é o meio efetivo de assegurar a existência de direitos. Essa lei foi criada para proteger a liberdade de locomoção, um direito fundamental. Em 1689, a Inglaterra fez com que os sucessores de Jaime II, que fugiu para a França, Guilherme III e Maria II, assinassem a Declaração de Direitos (Bill of Rights) que delegou ao Parlamento os poderes de legislar e de criar tributos, retirando esta prerrogativa do monarca. Por meio desta Declaração, criava-se uma organização do Estado cuja função era “proteger os direitos fundamentais da pessoa humana”, bem como ficou garantido “o direito de petição e a proibição de penas inusitadas ou cruéis.” (COMPARATO, 2013, p. 125-135). A Declaração de Independência das antigas treze colônias britânicas ocorrida em 1776 e a Constituição dos Estados Unidos da América do Norte representaram o ato inaugural da democracia moderna. É importante lembrar que estes eventos representaram a cultura local existente na época, cujos reflexos podem ser observados até os dias atuais. Dentre os aspectos culturais, destacam-se: a propagação da ideia de igualdade jurídica entre os cidadãos americanos; a defesa (por todos) das liberdades dos indivíduos; e a necessidade de consentimento do povo para os atos governamentais. Esse espírito de liberdade religiosa e de expressão, e de igualdade que consta na Declaração de Independência, é que a qualifica como “o primeiro documento político que reconhece, a par da legitimidade da soberania popular, a existência de direitos inerentes a todo ser humano, independentemente das diferenças de sexo, raça, religião, cultura ou posição social” (COMPARATO, 2013, p. 149). Em seguida, surgem as declarações de direitos norte-americanas, que vieram para proteger os direitos individuais. A Declaração do bom povo de Virgínia ocorreu em 1776, seguida da Pensylvania, no mesmo ano, e de Massachussetts em 1780. Essas declarações tiveram importância pelo reconhecimento de tais direitos humanos pelo Estado, transformando-os em direitos fundamentais. A principal finalidade de se colocar os direitos humanos na Constituição é a de proteger os indivíduos contra os abusos dos governantes (COMPARATO, 2013, p. 152). 7WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA A Revolução Francesa, que veio em seguida, tinha a intenção de alterar toda a concepção pré-existente e levar este novo pensamento para o restante do mundo. O objetivo da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, era justamente a universalização dos direitos do homem, ou seja, de conferi-los a todos os homens de todos os lugares. A declaração francesa é de extrema importância, pois consagra os direitos de liberdade, de igualdade e de fraternidade já que “todos os homens nascem livres e com direitos iguais”. Além da abolição dos privilégios de alguns poucos, essa declaração impulsionou ideias que foram garantidas em Constituições e tratados posteriores de “soberania popular, sistema de governo representativo, igualdade de todos perante a lei, presunção de inocência, direito à propriedade, à segurança, liberdade de consciência, de opinião, de pensamento” e o dever de garantir os direitos humanos pelo Estado (RAMOS, 2014, p. 40). Em 1848, a Constituição Francesa trouxe algumas questões relevantes à evolução dos direitos humanos, como os valores do trabalho, a abolição da pena de morte em matéria política e o fim da escravidão em terra francesa. A Convenção de Genebra, de 1864, inaugurou a introdução dos direitos humanos na esfera internacional, o que se denominou “direito humanitário [...]; isto é, o conjunto das leis e costumes da guerra, visando minorar o sofrimento de soldados doentes e feridos, bem como de populações civis atingidas por um conflito bélico” (COMPARATO, 2013, p. 167). No século XX, destaca-se, inicialmente, a Constituição Mexicana, de 1917, que foi a primeira a qualificar os direitos trabalhistas como direitos fundamentais, além das consagradas liberdades individuais e dos direitos políticos. Em 1918, eclodiu a Revolução Russa e com ela a Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, documento em que, influenciado pelos movimentos socialistas e pela persistência da miséria, ganhou apoio popular. O objetivo dos movimentos socialistas era garantir direitos sociais às pessoas, no intuito de conferir-lhes condições mínimas de existência. A Carta Mexicana influenciou a Constituição de Weimar, de 1919, e a criação da Organização Internacional do Trabalho no mesmo ano, ambas instituídas após o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Esta Constituição estabeleceu uma estrutura elaborada do Estado da democracia social, sobretudo no que tange ao direito à educação e aos direitos trabalhistas, sendo retomada após o fim da Segunda Guerra. De acordo com Fábio Comparato, A democracia social representou efetivamente, até o final do século XX, a melhor defesa da dignidade humana, ao complementar os direitos civis e políticos — que o sistema comunista negava — com os direitos econômicos e sociais, ignorados pelo liberal-capitalismo (COMPARATO, 2013, p. 185). Enquanto os direitos individuais constituem instrumentos de defesa contra o Estado, os direitos sociais demandam uma atuação positiva do Estado para garantir, por meio de políticas públicas, o direito à educação, à saúde, ao trabalho, à previdência social, dentre outros. Com a tendência de consolidação dos direitos sociais, em 1926 é aprovada a Convenção de Genebra sobre a Escravatura pela Assembleia da Liga das Nações. Até esta data, muitos países aceitavam a escravidão e o tráfico de escravos era um negócio de alta lucratividade no mercado nacional e internacional. 8WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) foi palco de muitas atrocidades contra o ser humano, sobretudo pela quantidade de vítimas, sendo a maior parte delas civis, contrapondo todas as normativas já analisadas de proteção dos direitos humanos. O fim desta guerra é marcado pela conscientização da comunidade internacional de que o respeito à dignidade humana era medida que demandaria esforços de todas as nações, mas que deveria ser respeitada incondicionalmente, especialmente para se evitar um novo conflito. A criação da Organização das Nações Unidas, em 1945, evidencia essa conscientização, que culminou na internacionalização dos direitos humanos de forma mais efetiva. O art. 55, da Carta de São Francisco (tratado que cria a ONU) determina que a Organização deve favorecer “o respeito universal e efetivo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião”, ao passo que o art. 56 estabelece que os membros devem agir em cooperação para alcançar o disposto no artigo anterior (ONU, 1945). Em 1948, foi aprovada a Resolução da Assembleia Geral da ONU denominada Declaração Universal dos Direitos Humanos, que explicita o rol dos direitos humanos, sendo eles enumerados em direitos políticos e liberdades individuais, direitos econômicos, sociais e culturais. André de Carvalho Ramos explica que: Entre os direitos civis e políticos constam o direito à vida e à integridade física, o direito à igualdade, o direito de propriedade, o direito à liberdade de pensamento, consciência e religião, o direitoà liberdade de opinião e de expressão e à liberdade de reunião. Entre os direitos sociais em sentido amplo constam o direito à segurança social, ao trabalho, o direito à livre escolha da profissão e o direito à educação, bem como o ‘direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis (direito ao mínimo existencial - art. XXV) (RAMOS, 2014, p. 43). Ainda em 1948, foi aprovada a Convenção para prevenção e a repressão do crime de genocídio, ainda como resposta às atrocidades da Segunda Guerra Mundial cometidas contra judeus e outras minorias étnicas. O genocídio foi definido como crime contra a humanidade no Tribunal de Nuremberg, criado para julgar os criminosos nazistas em 1945, sendo que a Convenção definiu que tal crime não se liga necessariamente a um estado de guerra, bem como determinou a imprescritibilidade dos crimes de guerra e dos crimes contra a humanidade. Em 1950 foi aprovada a Convenção Europeia dos Direitos Humanos para a proteção dos direitos das liberdades fundamentais. A Convenção limitou-se à proteção dos direitos individuais clássicos, mas inovou ao instituir órgãos incumbidos de fiscalizar o respeito aos direitos ali declarados, bem como a competência para julgar as eventuais violações pelos signatários, como o Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Essa inovação é de fundamental importância, sobretudo porque mais do que declarar os direitos, é importante efetivamente garanti-los. Em 1966 foram aprovados dois Pactos Internacionais de Direitos Humanos pela Assembleia Geral da ONU, um sobre Direitos Civis e Políticos e outro sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Essa divisão se deu porque os membros ocidentais queriam reconhecer apenas os direitos individuais clássicos, ao passo que os países comunistas e africanos destacavam os direitos sociais e econômicos. Na verdade, “a liberdade individual é ilusória, sem um mínimo de igualdade social” (COMPARATO, 2013, p. 316). 9WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA A Convenção Americana sobre Direitos Humanos foi aprovada em 1969 na Conferência de São José da Costa Rica e reproduz boa parte do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966, mas ampliou a proibição do restabelecimento da pena capital para os países que a tenham abolido, bem como vedou sua aplicação a crimes políticos ou comuns. Além disso, a Convenção criou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte interamericana de Direitos Humanos como órgãos competentes para proteger os direitos constantes neste tratado. Em 1981, foi aprovada a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Direitos dos Povos, que garante dentre outros, seu direito à existência enquanto tal, à livre disposição de suas riquezas e recursos naturais, ao desenvolvimento, à paz e à segurança e à preservação do equilíbrio ecológico. Este último direito foi introduzido pela primeira vez em uma convenção internacional pela Carta Africana. A Convenção sobre o Direito do Mar, assinada em 1982, em Montego Bay, afirma a existência de direitos fundamentais da humanidade sobre os mares e oceanos. Por certo que todos querem explorar e aproveitar os fundos marinhos e oceânicos e o subsolo, o que se contrapõe à necessidade de conservação dos recursos vivos e de proteção e preservação do meio marinho. Nessa Convenção há o reconhecimento de que o leito do mar, os fundos marinhos, o subsolo são patrimônio da humanidade. Figura 1 - Limites do mar. Fonte: Google images (2017). Em 1992, a Convenção sobre a Diversidade Biológica foi assinada no Rio de Janeiro e regula o direito da humanidade à preservação da biosfera, mantendo uma harmonia ambiental no planeta, sobretudo pela aplicação do princípio da solidariedade entre as gerações presentes e as futuras. Em 1998, foi criado o Tribunal Penal Internacional, em decorrência da ideia de que, por vivermos numa cidadania mundial, todas as pessoas, de qualquer nacionalidade, precisam ser responsáveis por suas práticas, sobretudo a responsabilização penal e a respectiva sanção de práticas que violem a dignidade humana. O Tribunal é permanente e tem competência para julgar os autores dos crimes de genocídio, contra a humanidade, de guerra e de agressão. 10WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS HUMANOS De acordo com Ramos (2014, p. 25), “Os direitos humanos constituem em um conjunto de direitos considerado indispensável para uma vida humana pautada na liberdade, igualdade e dignidade. Os direitos humanos são os direitos essenciais e indispensáveis à vida digna”. Como as necessidades humanas variam de acordo com a época, não há como se estabelecer um rol de direitos fixado, sendo que novas demandas vão surgindo com o tempo e inserindo novos direitos nesta lista. Ramos ainda explica que “os direitos humanos representam valores essenciais, que são explicitamente ou implicitamente retratados nas Constituições ou nos tratados internacionais”, revelando que uma sociedade pautada na defesa dos direitos tem como consequências “o reconhecimento de que o primeiro direito de todo indivíduo é o direito a ter direitos”, bem como, que os direitos de um indivíduo devem conviver com os direitos dos outros (RAMOS, 2014, p. 26). Esta segunda afirmação traz diversos desdobramentos, tendo em vista que numa vida em sociedade, o exercício do direito de uma pessoa sempre entrará em conflito com o exercício do direito de outra. Para ilustrar, menciona-se o direito da vida privada em conflito com o direito à liberdade de informação, o direito à propriedade e o direito ao meio ambiente equilibrado, o direito à vida do bebê e o direito reprodutivo da mulher (aborto). São questões ainda sem uma resposta definitiva, que serão construídas no tempo, no sentido de criar uma interação na sociedade, em que as pessoas convivam tendo seus direitos garantidos. A Organização das Nações Unidas assim determina: Os direitos humanos são direitos inerentes a todos os seres humanos, independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição. Os direitos humanos incluem o direito à vida e à liberdade, à liberdade de opinião e de expressão, o direito ao trabalho e à educação, entre e muitos outros. Todos merecem estes direitos, sem discriminação.” (ONUBR) Para Flávia Piovesan, a concepção contemporânea de direitos humanos é caracterizada pela universalidade e pela indivisibilidade desses direitos: Universalidade, porque clama pela extensão universal dos direitos humanos, sob a crença de que a condição de pessoa é o requisito único para a titularidade de direitos, considerando o ser humano como um ser essencialmente moral, dotado de unicidade existencial e dignidade. Indivisibilidade, porque a garantia dos direitos civis e políticos é condição para a observância dos direitos sociais, econômicos e culturais – e vice-versa. Quando um deles é violado, os demais também o são (PIOVESAN, 2004, p. 22). Os direitos humanos apresentam características que lhes são comuns, que são: historicidade, universalidade, essencialidade, irrenunciabilidade, inalienabilidade, imprescritibilidade, vedação ao retrocesso (MAZZUOLI, 2015, p. 899-901). 11WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA A historicidade mostra que os direitos humanos foram sendo construídos com o decorrer do tempo e ganhando maior relevância com as reivindicações da revolução burguesa, passando pela revolução industrial, garantindo direitos sociais aos trabalhadores, posteriormente, desenvolvendo-se o Estado social, ampliando-os mais tarde para os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, do meio ambiente, do desenvolvimento,da paz, etc. A universalidade indica que todas as pessoas são titulares dos direitos humanos, bastando- lhes a condição de “ser humano”. Isto também significa que qualquer pessoa, em qualquer lugar, pode reclamar a proteção deste direito, independente de raça, sexo, cultura, posição social, etc. A essencialidade atribui aos direitos humanos a característica de serem essenciais por natureza, ou seja, são valores indispensáveis e todos têm o dever de protegê-los. A irrenunciabilidade significa que ainda que os direitos humanos não são passíveis de renúncia. Ainda que o titular do direito não o exerça efetivamente, isto não implica em renúncia. Essa característica também determina que ainda que seu titular autorize expressamente, a violação dos seus direitos não será convalidada por essa autorização. A inalienabilidade determina que os direitos humanos são inalienáveis por não permitirem que seu titular os aliene, os transfira ou ceda tais direitos, de forma onerosa ou gratuita. Em outras palavras, ainda que tenha o consentimento do titular, esses direitos são indisponíveis, inegociáveis. A imprescritibilidade é uma característica que estabelece que os direitos humanos são imprescritíveis, não importando o decurso do tempo, significando que a pessoa não perde esses direitos. A vedação ao retrocesso, por fim, é uma das características que impede que os direitos humanos sejam diminuídos. Por meio dessa característica, o Estado não pode proteger menos, ou conferir menos direitos, pois isto seria considerado um retrocesso na proteção dos direitos humanos. O objetivo é sempre alcançar melhorias, normas mais benéficas de proteção, e não limitações, restrições, qualquer coisa que nulifique ou restrinja direitos anteriormente garantidos. Tal característica também impede que as normas já postas sejam interpretadas de forma a limitar ou restringir direitos já garantidos. De acordo com a Organização das Nações Unidas, as características mais importantes dos direitos humanos são: Quadro 1 - ONU. Fonte: Nações Unidas (2017). 12WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Em 1993, na Conferência Mundial sobre Direitos Humanos da ONU, algumas características desses direitos foram afirmadas solenemente, como a universalidade desses direitos, o que trouxe maior respaldo e maior responsabilidade aos Estados para garanti-los. Uma vez que são universais, ultrapassam os limites dos territórios, e devem ser respeitados pelos Estados onde quer que se encontrem. Figura 2 - Crianças no mundo. Fonte: IPED (2017). O resultado dessa Conferência foi a Declaração e Programa de Ação de Viena, que assim ficou determinado: 5. Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos de forma global, justa e equitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase. Embora particularidades nacionais e regionais devam ser levadas em consideração, assim como diversos contextos históricos, culturais e religiosos, é dever dos Estados promover e proteger todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, sejam quais forem seus sistemas políticos, econômicos e culturais. 13WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Observa-se, com isso, que a Declaração veio para reforçar que os direitos humanos possuem essas características, especialmente a universalidade, que determina que os direitos humanos devem ser garantidos a todas as pessoas, independentemente de raça, cor, religião, sexo, ou mesmo de estarem localizadas neste ou naquele território. Além dessas características já abordadas, Carlos Weis atribui, no contexto da contemporaneidade, a indivisibilidade, a interdependência e a transnacionalidade também como características dos direitos humanos. Para o autor, Ao se afirmar que os direitos humanos são indivisíveis, se está a dizer que não existe meio-termo: só há vida verdadeiramente digna se todos os direitos previstos no Direito Internacional dos Direitos Humanos estiverem sendo respeitados, sejam civis e políticos, sejam econômicos, sociais e culturais. [...] A interdependência diz respeito aos direitos humanos considerados em espécie, ao se entender que um certo direito não alcança a eficácia plena sem a realização simultânea de alguns ou de todos outros direitos humanos (WEIS, 1998). Além disso, Weis destaca que a transnacionalidade decorre da internacionalização dos direitos humanos, e da ratificação dos principais tratados internacionais pela grande maioria dos países. Isso significa que os direitos humanos devem ser respeitados em todo o globo (WEIS, 1998). TERMINOLOGIA: DIREITOS HUMANOS, DIREITOS FUNDAMENTAIS E DIREITOS DO HOMEM Alguns doutrinadores apresentam distinções doutrinárias acerca das expressões “direitos do homem”, “direitos fundamentais” e “direitos humanos”, que serão analisadas a seguir. Acerca da expressão “direitos humanos”, André de Carvalho Ramos alerta para o fato de que alguns autores argumentam ser uma expressão redundante. No entanto, isso só faz parte do reconhecimento de que “esses direitos são de todos, sem qualquer outra consideração ou aspecto qualificativo. Trata-se, então de ênfase e valorização da condição humana como atributo para o exercício desses direitos” (RAMOS, 2014, p. 49). Valério Mazzuoli explica que “Direitos do homem - é a expressão de cunho mais naturalista do que jurídico-positivo. [...] São direitos que, em tese, ainda não se encontram nos textos constitucionais ou nos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos”. De acordo com o autor, são raros exemplos que ainda não se encontram em algum documento escrito (MAZZUOLI, 2015, p. 896). “Direitos fundamentais - é a expressão mais afeta à proteção constitucional dos direitos dos cidadãos. Liga-se, assim, aos aspectos ou matizes constitucionais (internos) de proteção, no sentido de já se encontrarem positivados nas Constituições contemporâneas. São direitos garantidos e limitados no tempo e no espaço, objetivamente vigentes numa ordem jurídica concreta.” (MAZZUOLI, 2015, p. 896). Para Gilmar Mendes, “Os direitos fundamentais assumem posição de definitivo realce na sociedade quando se inverte a tradicional relação entre Estado e indivíduo e se reconhece que o indivíduo tem, primeiro, direitos, e, depois, deveres perante o Estado, e que os direitos que o Estado tem em relação ao indivíduo se ordenam ao objetivo de melhor cuidar das necessidades dos cidadãos.” (MENDES, 2014, p. 121). 14WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA “Direitos humanos - são, por sua vez, inscritos (positivados) em tratados ou decorrentes de costumes internacionais. Trata-se daqueles direitos que já ascenderam ao patamar do Direito Internacional Público.” (MAZZUOLI, 2015, p. 896). Com isso, pode-se observar que embora pareçam a mesma coisa, não são, já que os direitos do homem são aqueles que ainda não estão normatizados, os direitos fundamentais são aqueles garantidos nas Constituições de cada país e os direitos humanos são os assegurados nos tratados internacionais. Fábio Comparato esclarece que: A doutrina jurídica alemã contemporânea distingue, nitidamente, os direitos humanos dos direitos fundamentais. Estes últimos são os direitos que, consagrados na Constituição, representam as bases éticas do sistema jurídico nacional, ainda que não possam ser reconhecidos, pela consciência jurídica universal, como exigências indispensáveis de preservação da dignidade humana. Daí por que os direitos humanos autênticos existem, independentemente de seu reconhecimento na ordem jurídica estatal, e mesmo contra ela, ao passo que alguns direitos, qualificados como fundamentais na Constituição de um país, podem não ter a vigência universal, própria dos direitos humanos (COMPARATO, 2013,p. 174). É importante lembrar que nem todos os direitos humanos estão garantidos nas Constituições, sobretudo a brasileira. Enquanto os direitos humanos podem ser reclamados por qualquer pessoa que sofrer uma violação em qualquer lugar do planeta, nem todos os direitos fundamentais podem ser exercidos por todas as pessoas. É o caso do direito de voto, que é um direito fundamental do brasileiro, mas que não pode ser exercido pelo estrangeiro no Brasil. Figura 3 - Mãos e o mundo. Fonte: Dreanstime (2017). 15WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA André de Carvalho Ramos apresenta diversas terminologias para os direitos humanos consignadas na Constituição Federal do Brasil e em diversos tratados internacionais. O autor explica que “essa imprecisão terminológica é resultado da proteção de certos direitos essenciais do indivíduo, pela qual a denominação de tais direitos foi sendo alterada, a partir do redesenho de sua delimitação e fundamentação.” (RAMOS, 2014, p. 46). No início do entendimento, “direito natural” seria o reconhecimento de que os direitos são inerentes à natureza do homem, sendo que “direitos do homem” também adviria dessa concepção jusnaturalista, mas que foi carreado de um caráter sexista, por restringir às pessoas do sexo masculino, preterindo os direitos da mulher. Já os “direitos individuais” abrangeriam apenas os direitos relacionados ao indivíduo, excluindo os direitos coletivos ou considerados em sua coletividade. Dentre outras denominações, a doutrina francesa trata das “liberdades públicas”, enquanto a escola alemã de Direito Público do século XIX aborda os “direitos públicos subjetivos”, ou seja, aqueles tidos contra o Estado (RAMOS, 2014, p. 47). Já no Século XXI, predominam as expressões “direitos humanos” e “direitos fundamentais”. Os primeiros seriam aqueles estabelecidos em tratados internacionais, enquanto os segundos seriam aqueles reconhecidos e positivados pelas Constituições de cada Estado. No entanto, essa máxima não é absoluta, como se observa na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia (que é um tratado) e a Constituição Federal do Brasil que menciona em algumas passagens os “direitos da pessoa humana”. O autor argumenta que já não se deve mais reproduzir o discurso de que os direitos humanos não são válidos nos Estados que não os tiverem positivados em suas regras internas, como direitos fundamentais. A internacionalização dos direitos humanos, ou o Direito Internacional dos Direitos Humanos, retira esta necessidade de prever a regra no direito interno, como se observa tanto no sistema interamericano como no sistema europeu, em que os Estados podem ser responsabilizados pelo descumprimento das normas de direitos humanos previstas nos tratados (RAMOS, 2014, p. 48). Além disso, o art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, cuja redação foi incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004, determina que: § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais (BRASIL, 1988). Em outras palavras, caso um tratado internacional de direitos humanos seja aprovado com o mesmo rito das emendas constitucionais, serão equivalentes, ou seja, um direito previsto num tratado de direitos humanos será considerado constitucional e, portanto, um direito fundamental. 16WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA AS GERAÇÕES (OU DIMENSÕES) DE DIREITOS HUMANOS Na contemporaneidade, os direitos humanos estão divididos em gerações que se fortalecem mutuamente e se complementam em prol de cada ser humano. Essa divisão só ocorreu posteriormente, pela análise histórica das lutas para a conquista dos direitos humanos, e não param de ocorrer, já que não basta a mera declaração dos mesmos nos textos internacionais ou constitucionais. Antes de mais nada, é preciso garanti-los a todas as pessoas. Nesse sentido, as gerações são fruto das lutas de cada momento histórico, como bem explica Norberto Bobbio: “[...] o desenvolvimento dos direitos do homem passou por três fases: num primeiro momento, afirmaram-se os direitos de liberdade, isto é, todos aqueles direitos que tendem a limitar o poder do Estado e a reservar para o indivíduo, ou para os grupos particulares, uma esfera de liberdade em relação ao Estado; num segundo momento, foram propugnados os direitos políticos, os quais - concebendo a liberdade não apenas negativamente, como não impedimento, mas positivamente, como autonomia - tiveram como consequência a participação cada vez mais ampla, generalizada e frequente dos membros de uma comunidade no poder político (ou liberdade no Estado); finalmente, foram proclamados os direitos sociais, que expressam o amadurecimento das novas exigências - podemos mesmo dizer, de novos valores -, como os de bem-estar e da igualdade não apenas formal, e o que poderíamos chamar de liberdade através ou por meio do Estado.” (BOBBIO, 2004, p. 52) Esses momentos históricos podem ser divididos em gerações de direitos. Em breve resumo, o que se tem, inicialmente, é o indivíduo que se encontra em posição de submissão em relação ao Estado. Em seguida, o indivíduo passa a exigir limitações à ação do Estado, ou seja, uma atuação negativa. Ato contínuo, o indivíduo passa a demandar uma atuação positiva do Estado, garantindo-lhe os seus direitos. Por fim, o indivíduo passa a ter uma postura mais ativa, participando da formação de vontade do Estado e da tomada de decisões. A teoria das gerações foi abordada pela primeira vez pelo jurista francês Karel Vasak, em 1979, que classificou os direitos humanos em três gerações até esta data. Posteriormente, os estudiosos do tema foram acrescentando outras gerações, como serão vistas a seguir. O autor relacionou cada uma das gerações aos componentes da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade. A primeira geração de direitos humanos foi associada à liberdade, tendo surgindo no século XVIII como reflexo das revoluções liberais na Europa e nos Estados Unidos, que visavam restringir o poder absoluto dos monarcas. A liberdade engloba os direitos a ela relativos e que demandam uma atuação negativa do Estado, sendo chamados, também, de direitos de defesa. O sentido atribuído a essa geração, é que o Estado deve proteger a esfera de autonomia individual, prevenindo intervenções desnecessárias. Fazem parte desta geração, os direitos civis e políticos, por isso são tidos como liberdades individuais, além do direito de propriedade, intimidade e segurança. 17WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Figura 4 - Liberdade de imprensa. Fonte: Estado de Direito (2017). Norberto Bobbio explica que a liberdade tem dois significados relevantes, sendo um negativo e outro positivo. Para o autor, “a liberdade negativa é uma qualificação da ação; a liberdade positiva é uma qualificação da vontade”. Quando se observa, com isso, a perspectiva histórica, a liberdade negativa faz parte do direito de primeira geração, e se refere ao indivíduo singular, enquanto a liberdade positiva é atribuída ao indivíduo considerado em sua coletividade, ou do corpo social no qual o indivíduo está inserido e faz parte (BOBBIO, 2004, p. 50). Nesse sentido, “Por liberdade negativa, na linguagem política, entende-se a situação na qual um sujeito de a possibilidade de agir sem ser impedido, ou de não agir sem ser obrigado, por outros sujeitos”. Essa liberdade também costuma ser delineada tanto à “ausência de impedimento, ou seja, a possibilidade de fazer, quanto a ausência de constrangimento, ou seja, a possibilidade de não fazer”. (BOBBIO, 2004, p. 49). Sobre a liberdade positiva, Bobbio fundamenta ser “a situação na qual umsujeito tem a possibilidade de orientar seu próprio querer no sentido de uma finalidade, de tomar decisões, sem ser determinado pelo querer de outros”. A essa forma, também é dado o nome de autodeterminação ou de autonomia, ou seja, “determinar-se sem ser, por sua vez, determinado.” (BOBBIO, 2004, p. 50). A segunda geração de direitos humanos passa a exigir um papel mais ativo do Estado e se refere à igualdade, concepção esta nascida a partir do século XX. Eles são os direitos sociais, econômicos e culturais, além dos direitos coletivos ou das coletividades, trazidos com o advento do Estado social. De acordo com Norberto Bobbio, “a igualdade constitui um valor”, e a máxima de que todos os homens são iguais tem sido reproduzida desde os estoicos até os dias atuais, sobretudo por que a igualdade é um ideal a ser atingido (BOBBIO, 2004, p. 22). A questão da igualdade gera uma amplitude de definições, especialmente para se identificar igualdade “entre quem” deve ser garantida e “igualdade em que”. A reflexão é importante, sobretudo porque delimitar a igualdade em algum aspecto não implica automaticamente igualdade num outro aspecto, como exemplo, igualdade de renda entre duas pessoas e igualdade de saúde. 18WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Para essa geração, exige-se do Estado um papel mais ativo, principalmente para garantir os direitos trazidos sob a influência das doutrinas socialistas, advindos dos movimentos sociais de reivindicações desses direitos que teriam por fim garantir uma condição mínima de sobrevivência dos indivíduos. Os direitos sociais de segunda geração compreendem o direito à saúde, à educação, à previdência social, à habitação, dentre outros. Como se pode observar, esses direitos demandam uma atuação positiva do Estado para garanti-los aos indivíduos, especialmente aos mais necessitados que são incapazes de satisfazê-los sozinhos. Eles são denominados direitos de igualdade pois pretendem garantir aos menos favorecidos uma equivalência em direitos, especialmente concretizar as liberdades abstratas reconhecidas nas primeiras declarações internacionais. Como visto anteriormente, eles podem ser encontrados na Constituição Mexicana de 1917, na Constituição de Weimar de 1919, pela criação da Organização Internacional do Trabalho neste mesmo ano. Esses direitos de segunda geração também são denominados de direitos programáticos “em virtude de não conterem para sua concretização aquelas garantias habitualmente ministradas pelos instrumentos processuais de proteção aos direitos da liberdade” (MAZZUOLI, 2015, p. 902). A terceira geração de direitos humanos contempla aqueles direitos de titularidade de uma comunidade, num aspecto mais amplo, ultrapassando a esfera do indivíduo. Essa geração contém o desenvolvimento de uma consciência coletiva, de que os direitos são dos indivíduos, não mais considerados apenas em si, mas dentro de uma coletividade, de um grupo do qual faz parte. Esses direitos estão relacionados à fraternidade, ou solidariedade, e contemplam o direito ao desenvolvimento, direito à paz, direito à autodeterminação, o direito ao meio ambiente equilibrado, aos recursos naturais, hídricos, à qualidade do ar, direito à comunicação, direito ao patrimônio comum da humanidade. Esses direitos advêm de uma constatação de que os recursos naturais são finitos, gerando uma preocupação com as futuras gerações, além de que as riquezas da terra devem ser divididas de forma igualitária, questão que pode ser identificada pela evidente distribuição desigual de riquezas (tanto materiais quanto naturais). Todas essas concepções fazem parte de uma visão mais solidária dos direitos. A terceira geração tem seu surgimento a partir da década de 60 e pode ser observada pelos diversos documentos internacionais que tratam do tema, como, por exemplo, o Pacto dos Direitos Civis e Políticos, de 1966, que previu o direito à autodeterminação dos povos, a Conferência de Estocolmo sobre o Meio Ambiente, em 1972, a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, adotada pela ONU em 1986, dentre outras. A quarta geração dos direitos humanos é entendida como aquela que é resultante da globalização dos direitos humanos. Essa geração tem seu surgimento no final do século XX, [...] correspondendo aos direitos de participação democrática (democracia direita), direito ao pluralismo, bioética e limites à manipulação genética, fundados na defesa da dignidade da pessoa humana contra intervenções abusivas de particulares ou do Estado. (RAMOS, 2014, p. 53). Alguns autores também acrescentam o direito à informação que, aliado ao pluralismo e à democracia, concretizarão “[...] a sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência”, como relata Valério Mazzuoli (2015, p. 902). 19WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA As críticas a essa teoria das gerações não são poucas. Ramos explica que, em primeiro lugar, a teoria apresenta uma forma errônea e dá a entender que uma geração é substituída por outra. Na verdade, uma geração deve interagir com a outra, como o direito de propriedade que deve interagir com o direito ao meio ambiente equilibrado (RAMOS, 2014). Em seguida, o autor apresenta outra crítica de que a ideia das gerações sugere que um direito de primeira geração nasceu antes de outro de terceira geração, por exemplo, o que na prática não ocorreu, tendo em vista que diversos direitos de terceira geração foram consagrados antes mesmo dos de primeira (RAMOS, 2014, p. 54). Além disso, Ramos argumenta que a teoria das gerações apresenta os direitos humanos de forma fragmentada, o que ofenderia a indivisibilidade, uma das características já abordadas. Por fim, o autor sugere que a divisão em gerações dificulta as novas interpretações acerca do conteúdo dos direitos, exemplificando que o direito à vida seria da primeira geração, mas que atualmente, demanda atuação do Estado para a garantia da vida digna, da saúde, por exemplo, direitos esses inseridos na segunda geração (RAMOS, 2014, p. 54). Como já mencionada anteriormente, a questão fundamental neste momento não é quais são os direitos humanos ou a que geração eles pertencem. O verdadeiro problema a ser enfrentado é a criação de mecanismos ou de ferramentas para efetivamente garantir esses direitos a todas as pessoas. UNIDADE 20WWW.UNINGA.BR ENSINO A DISTÂNCIA SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................ 21 RETROSPECTIVA HISTÓRICA E CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ................................................................. 22 TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS E O DIREITO BRASILEIRO ....................................... 25 INSTITUIÇÕES DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS - PARTE I ..................................................................... 28 INSTITUIÇÕES DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS - PARTE II .................................................................... 32 A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL PROF.A MA. MALU ROMANCINI 02 21WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO Antes de aprofundar no tema, é importante lembrar que a proteção dos direitos humanos se dá em duas esferas, uma interna, como dispõe a Constituição Federal de 1988, e uma internacional, que é estudada pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos. Conheceremos, nesta unidade, esses dois contextos. 22WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA RETROSPECTIVA HISTÓRICA E CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Como já abordado anteriormente, com o advento do constitucionalismomoderno, os direitos humanos começaram a ser inseridos nas Constituições dos Estados, ganhando o status de direitos fundamentais. No Brasil não foi diferente. Já na Constituição de 1824 foram considerados alguns direitos fundamentais. O cenário da época caracteriza o poder concentrado nas mãos do imperador, a continuação da existência da escravidão, o que evidenciam as violências contra os escravos, que estavam à mercê de seus senhores, sendo tratados como seu produto e sua propriedade. Os escravos perderam sua liberdade, tinham sua integridade física violada, sendo que alguns perdiam até a vida. No entanto, alguns direitos fundamentais foram concedidos à pequena parcela da população, cujo objetivo principal era garantir a liberdade, a segurança individual e a propriedade. Isso, por si só, já era considerado um grande avanço. A Constituição de 1891, promulgada no período republicano, promovia os princípios da liberdade, da igualdade e da justiça. Essa Carta garantiu o direito de sufrágio direto nas eleições para deputados, senadores, presidente e vice-presidente. Contudo, o sufrágio não era universal, tendo em vista que mulheres, mendigos e analfabetos não poderiam votar. Além disso, dentre outras medidas, a Carta de 1891 também previu o direito à liberdade religiosa, direito à ampla defesa, direito à livre associação e de reunião, bem como inseriu pela primeira vez o habeas corpus como mecanismo de defesa contra a violência, ilegalidades ou abuso de poder. Na Constituição de 1934, foram inseridas algumas perspectivas de proteção e segurança dos indivíduos, tais como a garantia do direito adquirido, a proibição de ser preso por dívidas. Para tanto, foi criada a assistência judiciária como mecanismo de promover a justiça, além de ter sido determinada a obrigatoriedade de imediatamente comunicar ao juiz competente acerca da prisão ou detenção de qualquer pessoa. Essa Constituição também trouxe diversos direitos trabalhistas, como a proibição de se estabelecer diferença salarial entre trabalhos equivalentes, ou mesmo em razão da idade, gênero, nacionalidade ou estado civil. Além disso, o trabalho do menor foi proibido, sobretudo para menores de catorze anos, o trabalho noturno foi proibido para menores de dezesseis anos e o trabalho insalubre foi proibido para menores de dezoito anos e para as mulheres. Ficou, também, definido um salário mínimo aos trabalhadores, o direito ao repouso semanal remunerado e a limitação da jornada diária ao máximo de oito horas. No entanto, é importante observar que esta tendência social durou por apenas três anos, quando foi instaurado o Estado Novo, de Getúlio Vargas, em 1937. Este período, que durou até 1945, foi marcado pela violação dos direitos humanos, por diversos obstáculos à sua concretização. Durante o Estado Novo, o Congresso Nacional foi fechado, a grande maioria dos partidos políticos foi proibida de funcionar, o que evidencia a violação dos direitos democráticos das pessoas. Além disso, o próprio Poder Judiciário foi tomado pelos interventores para garantir o amplo domínio do Estado. Neste período também foi criado o Tribunal de Segurança Nacional para julgar crimes contra a segurança do Estado. É evidente que toda a ideologia de se proteger o homem contra o poder estatal foi vilipendiada neste momento histórico. 23WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Não bastasse, para manter essa estrutura opressora, foi criada a Polícia Especial e o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) que censurava as comunicações orais e escritas, alcançando inclusive correspondências pessoais. São incontáveis os direitos humanos que foram violados da população brasileira. Em 1946, com o fim do Estado Novo, diversas garantias fundamentais foram restauradas e foram ampliados os direitos garantidos pela Constituição. Dentre os direitos sociais, foi criada a assistência aos desempregados, o direito de greve, a liberdade de associação patronal e sindical e o direito do trabalhador de participação nos lucros da empresa. Embora essa Constituição tenha trazido várias alterações benéficas às pessoas, da perspectiva dos direitos humanos, ela vigorou, formalmente, até 1967. Na prática, a Revolução de 1964 suprimiu e suspendeu muitos direitos, com o advento dos Atos Institucionais n. 1 e n. 2. A ditadura militar, que teve início em 1964, foi catastrófica, sob o ponto de vista dos direitos humanos. Esse período foi marcado pelo autoritarismo, que suprimiu e violou diversos direitos fundamentais. Inicialmente, foram cassados os direitos políticos dos opositores do governo, diversos partidos políticos foram extintos, foi fechado o Congresso Nacional, e foi criada uma espécie de polícia da política, o Serviço Nacional de Informações (SNI). A repressão policial aumentou exponencialmente, além de que os direitos fundamentais de apresentação imediata ao juiz competente, habeas corpus, e o próprio direito de defesa foram suprimidos, fazendo com que opositores fossem presos sem qualquer garantia de defesa, nem mesmo o direito a um julgamento justo, já que a própria política governamental desobrigava as autoridades à necessidade de acusar formalmente ou registrar a acusação daquele que foi preso ou detido. Além disso, a ditadura militar foi marcada por torturas, sequestros, desaparecimento de pessoas que se opunham ao regime, assassinatos, dentre outros crimes inexplicáveis cometidos pelo próprio Estado, que teria o dever de proteger as pessoas. O DOI-Codi (Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna) era um órgão de inteligência do Estado, que tinha a função de identificar os opositores do regime e puni-los, às vezes com a própria vida. Por certo que tamanha violação de direitos humanos precisaria ter um fim. Este fim é coroado com a inserção de diversos direitos e garantias na Constituição Federal de 1988. É importante evidenciar que diversos “direitos e garantias fundamentais” foram inseridos na Constituição Federal de 1988 e foram divididos em cinco categorias: a) direitos e deveres individuais e coletivos; b) direitos sociais; c) direitos de nacionalidade; d) direitos políticos; e e) partidos políticos. Com essa redação dada pela Constituição, há quem intente distanciar os direitos das garantias. No entanto, Gilmar Mendes (2014, p. 248) explica que: As garantias fundamentais asseguram ao indivíduo a possibilidade de exigir dos Poderes Públicos o respeito ao direito que instrumentalizam. Vários direitos previstos nos incisos do art. 5º da Constituição se ajustam a esse conceito. Vejam -se, por exemplo, as normas ali consignadas de direito processual penal. Nem sempre, contudo, a fronteira entre uma e outra categoria se mostra límpida – o que, na realidade, não apresenta maior importância prática, uma vez que a nossa ordem constitucional confere tratamento unívoco aos direitos e garantias fundamentais. 24WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA É importante acrescentar que esse rol não é exaustivo, ou seja, foi adotado um sistema aberto de direitos fundamentais (MENDES, 2014, p. 249). Em outras palavras, isso significa que os direitos humanos que não estiverem inseridos nessas categorias não estão excluídos do âmbito de proteção. A isto dá-se o nome de princípio da não exaustividade dos direitos fundamentais, previsto no art. 5º, §2º, da vigente Constituição Federal. Além de diversos direitos estarem inseridos na Constituição Federal, é importante salientar o fato de que devem ser garantidos os direitos não apenas aos indivíduos, mas também aos grupos. A Carta prevê também ações de garantia para quando se estiver presente uma ameaça ou uma efetiva violação de direitos humanos com o fim de encerrá-la. Dentre estes mecanismos, estão o habeas corpus, o mandado de segurança, o mandado de segurança coletivo, o mandado de injunção,o habeas data e a ação popular. Outro fato importante que vale a menção é o do art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, cuja redação foi incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004, e determina que: § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). Em outras palavras, caso um tratado internacional de direitos humanos seja aprovado com o mesmo rito das emendas constitucionais, serão equivalentes, ou seja, um direito previsto num tratado de direitos humanos será considerado constitucional e, portanto, um direito fundamental. Figura 5 - Constituinte do Brasil. Fonte: DGABC (2017). Para saber mais sobre como estão divididos os direitos humanos, a leitura do Relatório sobre a situação dos direitos humanos no Brasil é recomendada. Disponível em: https://cidh.oas.org/countryrep/brazil-port/Cap%201.htm Acesso em 10 nov. 2017. 25WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Observa-se, na Constituição Federal de 1988, uma tendência de ampla proteção dos direitos humanos, primeiro em razão do rol estruturado de direitos inseridos no texto, segundo em razão das cláusulas pétreas, art. 60º, §4º, IV, da Carta, autorizando, inclusive, intervenção federal em caso de violação desses direitos. O Brasil, com isso, opta por essa interpretação em favor dos direitos humanos em sua norma interna, de acordo com a Constituição de 1988. TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS E O DIREITO BRASILEIRO Atualmente, existem diversos tratados de direitos humanos no mundo. Eles se proliferaram principalmente, com esta denominação, após a Segunda Guerra Mundial, em resposta à barbárie nazista. Essa época do pós-guerra também é marcada pelo surgimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos. O que se pode verificar é que os muitos tratados de proteção dos direitos humanos possuem uma característica fundamental em comum. Segundo Valério Mazzuoli (2015, p. 895): “a proteção dos direitos da pessoa humana independentemente de qualquer condição. Em outros termos, basta a condição de ser pessoa humana para que todos possam vindicar seus direitos violados”, sendo que isso pode ser feito na esfera interna ou internacional. Essa resposta aos horrores do nazismo evidenciou a necessidade de reconstrução do valor dos direitos humanos. Para tornar eficaz essa proteção, ficou claro que era necessário criar um sistema de proteção dos direitos humanos no âmbito internacional. Ficou comprovado que a proteção dos direitos humanos não deveria ser reservada apenas ao âmbito interno do Estado. Essa estrutura deveria ser maior que a soberania dos próprios Estados, pois eles deveriam estar a ela submetidos. Com isso, cria-se um novo paradigma, e a noção tradicional de soberania passou por um processo de relativização, na medida em que os Estados podem, a partir de então, sofrer intervenções externas em prol da proteção dos direitos humanos. Essa consequência é revelada pela atuação da Organização das Nações Unidas, que tem autorização de cada Estado para intervir em casos de evidente violação dos direitos humanos. Houve, também, uma mudança acerca da concepção do indivíduo no cenário internacional, que a partir de então passou a ser sujeito de direitos e a ter seus próprios direitos protegidos, demandando esforços dos Estados para concretizarem esta nova concepção. Um dado interessante, é que os primeiros tratados de direitos hu- manos assinados pelo Brasil foram para abolição do tráfico de es- cravos em 1825 e 1826. 26WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA No entanto, foi mesmo a partir do fim da Segunda Guerra que os países, então, incluindo o Brasil, passaram a assinar alguns tratados internacionais para a proteção dos direitos humanos. Esses tratados englobam os Pactos, as Convenções, as Cartas, Acordos. Em 1945 foi criada uma das Organizações Internacionais mais relevantes para a proteção dos direitos humanos, que é a Organização das Nações Unidas, criada pela Carta de São Francisco, cujo objetivo principal é a manutenção da paz e da segurança internacionais. O Brasil é um dos membros fundadores. Em 1948 foi assinada a Declaração Universal de Direitos Humanos, na Assembleia Geral da ONU, também pelo Brasil, o que fez com que o tema dos direitos humanos fosse pensado a partir da proteção na perspectiva internacional e nacional. Pode-se considerar que o Brasil é um país que tem ratificado diversos tratados internacionais para a proteção dos direitos humanos. Dentre eles, pode-se destacar os mais importantes ratificados pelo Estado brasileiro: Quadro 1 - Tratados do sistemaglobal. Fonte: A autora. 27WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Quadro 2 - Tratados do sistema regional interamericano. Fonte: A autora. Para que um tratado entre em vigor no direito brasileiro, é necessário a assinatura do tratado pelo representante chefe do Poder Executivo e a aprovação do Poder Legislativo. Novamente, o chefe do Executivo é chamado à atuação para ratificar o tratado. Como já estudado, há a possibilidade desse tratado ser aprovado como lei ordinária, ou como emenda constitucional, caso cumpra o que determina o art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, cuja redação estabelece que: § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais (BRASIL, 1988). Há que se observar, também, que o Brasil se compromete a cumprir, nas suas relações internacionais, o princípio da prevalência dos direitos humanos, como previsto no art. 4º, II, da Constituição Federal de 1988. Em 1998, o Brasil reconheceu a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos e em 2002 a jurisdição do Tribunal Penal Internacional. Com isso, fica ultrapassada a fronteira das regras nacionais versus as regras internacionais para atribuir uma interpretação de proteção aos direitos humanos no âmbito interno. Nesse sentido, André Ramos de Carvalho explica que: Com o reconhecimento da jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Brasil deu o passo decisivo para aceitar o universalismo na área dos direitos humanos. Não é mais possível uma interpretação “nacionalista” dos direitos humanos no Brasil, pois essa interpretação pode ser questionada perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos ou outros órgãos internacionais, devendo o Brasil cumprir a interpretação internacionalista porventura fixada. Além do universalismo, o Brasil, após a Constituição de 1988, acatou a indivisibilidade e interdependência de todos os direitos humanos, ao ratificar indistintamente os tratados voltados a direitos civis e políticos e direitos sociais, econômicos e culturais (RAMOS, 2014, p. 349). Além do mais, o Brasil tem se mostrado bastante cooperativo no que tange aos tratados de direitos humanos, por comungar da ideia de que é necessário promover e assegurar mecanismos de proteção dos direitos humanos. 28WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA INSTITUIÇÕES DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS - PARTE I Como parte do programa de garantia dos direitos humanos, compromisso assumido pelo Brasil perante Organizações Internacionais, o Brasil criou diversos órgãos especializados para auxiliar a promover a garantia e a proteção dos direitos humanos no âmbito interno e que serão vistos a seguir. Até 1997, o tema dos direitos humanos era de atribuição do Ministério da Justiça. Como foi ganhando força, tanto no cenário nacional, quanto internacional,em 1997, o então presidente Fernando Henrique Cardoso instituiu a Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República. O prestígio ora recebido se deu em razão da necessidade de que o novo órgão coordenasse a implantação e execução do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-1) da ONU. Em outros governos, foi também denominada de Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH). Embora fosse uma Secretaria, tinha status de Ministério. No governo do então presidente Lula, a sua denominação passou a ser simplesmente Secretaria dos Direitos Humanos. A Lei n. 12.314 de 2010 estabeleceu que a Secretaria de Direitos Humanos é órgão da Presidência da República e será competente para tratar dos seguintes assuntos: - Formular políticas e diretrizes voltadas à promoção dos direitos da cidadania, da criança, do adolescente, do idoso e das minorias; - Formular políticas e diretrizes voltadas à defesa dos direitos das pessoas com deficiência e promoção da sua integração à vida comunitária; - Coordenar a política nacional de direitos humanos, em conformidade com as diretrizes do Programa Nacional de Direitos Humanos - PNDH; - Articular iniciativas e apoiar projetos voltados para a proteção e promoção dos direitos humanos em âmbito nacional, tanto por organismos governamentais, incluindo os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, quanto por organizações da sociedade; - Exercer as funções de ouvidoria nacional de direitos humanos, da criança, do adolescente, do idoso e das minorias. - Atuar em favor da ressocialização e da proteção dos dependentes químico, sem prejuízo das atribuições dos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD. 29WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA A Secretaria de Direitos Humanos é composta por: 1) Gabinete; 2) Ouvidoria de Direitos Humanos; 3) Órgãos específicos singulares: a) Secretaria de Gestão da Política de Direitos Humanos; b) Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos; c) Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência; 4) Órgãos colegiados: a) Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana; b) Conselho Nacional de Combate à Discriminação; c) Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; d) Conselho Nacional de dos Direitos da Pessoa com Deficiência; e) Conselho Nacional dos Direitos do Idoso; f) Conselho Nacional de Promoção do Direito Humano à Alimentação. De acordo com André de Carvalho Ramos, a Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos é, dos órgãos singulares internos da Secretaria de Direitos Humanos, o órgão de maior abrangência, pois tem a competência de: I - implementar o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, em articulação com os demais órgãos da administração pública federal, o Ministério Público, os Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, dos entes federados, as organizações da sociedade civil e organismos internacionais, desenvolvendo ações que contribuam para a construção de uma cultura voltada para o respeito dos direitos fundamentais; II - coordenar as ações de Mobilização Nacional para o Registro Civil de Nascimento e Documentação Básica, em articulação com os demais órgãos da administração pública federal, o Ministério Público, os Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, dos entes federados, as organizações da sociedade civil e organismos internacionais; III - promover iniciativas de parceria e articulação institucional que visem à garantia dos direitos da população idosa; IV - promover iniciativas de parceria e articulação institucional que visem à garantia dos direitos da população de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais - LGBT; V - coordenar as ações de implementação, monitoramento e aperfeiçoamento dos Centros de Referência em Direitos Humanos, LGBT, idosos e centros de atendimento às vítimas; VI - coordenar a atuação da Secretaria em temas relacionados ao sistema de segurança pública e justiça criminal, principalmente no que diz respeito à violação de direitos humanos por profissionais do sistema; VII - coordenar ações de direitos humanos para o fortalecimento das ouvidorias de polícia nos Estados, bem como promover os direitos humanos de agentes de segurança pública; VIII - coordenar ações de prevenção e combate à tortura, bem como todas as formas de tratamento cruel, desumano e degradante, visando à sua erradicação e punição, em articulação com órgãos públicos, entidades da sociedade civil e organismos internacionais; IX - apoiar, monitorar e supervisionar a implementação dos programas estaduais de proteção a vítimas e testemunhas, bem como coordenar e supervisionar, no âmbito da Secretaria, a execução das atividades relacionadas com o Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas; X - implementar e executar a política nacional de proteção e promoção dos defensores dos direitos humanos, por meio de parcerias com órgãos da administração pública federal, estadual, distrital e organizações da sociedade civil; XI - coordenar a produção, a sistematização e a difusão das informações relativas ao registro civil de nascimento, a centros de referência, a idosos e a LGBT, dentre outros grupos socialmente vulneráveis; XII - coordenar o Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para a População em Situação de Rua e auxiliar a implementação da Política Nacional para a População em Situação de Rua (RAMOS, 2014, p. 414). Evidencia-se, com isso, a ampla atuação da Secretaria, que é de fundamental importância. 30WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Figura 6 - Campanha em defesa dos direitos das pessoas em situação de rua. Fonte: CNMP (2017). As Ouvidorias são órgãos de controle interno da Administração Pública, tendo, dentre outras funções, a de receber notícias acerca da má prestação dos serviços públicos, exigir providências acerca das denúncias e fiscalizar os resultados das sindicâncias. A Ouvidoria-Geral da Cidadania exerce sua função nas áreas da cidadania, LGBT, criança, adolescente, pessoa com deficiência, idoso e outros grupos sociais vulneráveis. Já as Secretarias de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e a de Políticas para Mulheres também são de especial importância para a promoção dos direitos humanos. A primeira tem a função de coordenar e articular políticas e diretrizes para promover a igualdade racial, com foco na população negra, mais afetada pela discriminação racial e outras formas de intolerância. Essa Secretaria também promove o cumprimento dos compromissos assumidos na comunidade internacional de promoção dos direitos humanos, especialmente no que tange à promoção da igualdade e do combate à discriminação racial ou étnica. A segunda tem a função de promover políticas para mulheres, bem como campanhas educativas, antidiscriminatórias, e de garantia da igualdade em todas as esferas governamentais. Esta secretaria também tem a função de planejar e executar os planos de ações assumidos nos compromissos internacionais (RAMOS, 2014). Já o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana tem a função de promover inquéritos, investigações e estudos acerca da eficácia das normas que tratam da proteção dos direitos humanos, tanto inseridas na Constituição Federal, quanto nas Declarações Americana e Universal dos Direitos Humanos. Além disso, o Conselho também deve conscientizar a população sobre o conteúdo e o significado dos direitos humanos, promover campanhas de medidas contra a violação desses direitos, investigar as causas dessas violações, promover campanhas de esclarecimento, promover cursos para aperfeiçoamento das pessoas, cooperar com entes da federação nos casos em que forem necessário, estudar propostas de aprimoramento da legislação, de modo a proteger mais efetivamenteos direitos humanos, receber denúncias de violações e tomar medidas cabíveis para assegurar a garantia dos direitos humanos às pessoas (RAMOS, 2014). 31WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Outro órgão bastante atuante é o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e Adolescentes que tem como principais atribuições elaborar normas para promover os direitos humanos das crianças e dos adolescentes, consoante Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069 de 1990), zelar pela política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, apoiar os Conselhos Estaduais e Municipais e outros órgãos, promover campanhas educativas acerca do tema. O Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência é outro órgão importante no cenário brasileiro que tem a finalidade de promover a política nacional de inclusão da pessoa com deficiência, bem como avaliar as políticas setoriais de inclusão, como na escola, no desporto, no turismo, no lazer, no trabalho, dentre outras áreas, cooperar com as políticas governamentais dos estados e municípios, bem como promover pesquisas que objetivem a conscientização e melhorias na qualidade de vida da pessoa com deficiência. O Conselho Nacional dos Direitos do Idoso é o órgão que atua para elaborar diretrizes, instrumentos, leis para promover a política nacional do idoso, para colaborar com outros órgãos da esfera municipal e estadual, avaliar e apresentar orientações e recomendações para promover os direitos humanos dos idosos. O Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais é um órgão que promove o combate a todas as formas de discriminação. Sua luta tem relação com o combate à discriminação racial e sua função é propor programas e ações governamentais, em todas as esferas, de combater a violação dos direitos humanos das pessoas LGBT e promover a garantia dos mesmos, especialmente, medidas que assegurem a igualdade a estas pessoas. Esse órgão conta com membros representantes governamentais e representantes da sociedade civil que promovem pesquisas, estudos, formas de integrar essas pessoas à sociedade. Além dos já mencionados, existe a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos é o órgão que visa reconhecer como mortas as pessoas desaparecidas vítimas da ditadura militar, a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo que tem o objetivo de exigir o cumprimento do plano nacional de erradicação do trabalho escravo, que também é tipificado como crime (art. 149, do Código Penal), o Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos é um órgão consultivo da Secretaria de Direitos Humanos para implementar o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, promover a educação, práticas individuais e sociais para garantia dos direitos humanos, produção de material didático e informativo a ser distribuído em todas as esferas educacionais. Em 2015, a então presidente Dilma Rousseff unificou as secretarias de Políticas e Promoção da Igualdade Racial e de Políticas para as Mulheres, dando origem ao Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos. Em 2016, o então presidente Michel Temer extinguiu o Ministério, mas o recriou no ano seguinte com o nome de Ministério dos Direitos Humanos, sem a ênfase na igualdade racial ou nas políticas para mulheres. 32WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA INSTITUIÇÕES DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS - PARTE II Ainda dentro do compromisso assumido pelo Brasil perante Organizações Internacionais, de promover a garantia dos direitos humanos, o país continua criando mecanismos para a defesa desses direitos, seja por meio da conscientização da população ou de instituições a quem recorrer em casos de violação. Dentro do Poder Legislativo Federal, existe a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, que é uma comissão permanente, com a função de discutir e votar propostas legislativas referentes ao tema dos direitos humanos, fiscalizar a atuação governamental, receber notícias de violações e colaborar com outras entidades na confecção dos “relatórios sombra” para encaminha-los aos órgãos internacionais. Os indivíduos também contam com a atuação do Ministério Público Federal que, conforme determina o art. 127, da Constituição Federal, tem a função de defender a ordem jurídica, o regime democrático, os interesses sociais e individuais indisponíveis, contemplando, portanto, os direitos humanos. O Estatuto do Ministério Público também determina que compete a esta instituição a defesa dos direitos constitucionais do cidadão, para garantir-lhes o respeito pelos Poderes Públicos, pela Administração Pública direita e indireta, e a defesa dos interesses difusos e coletivos, especialmente das comunidades indígenas, da família, das crianças e adolescentes e do idoso. Para cumprimento dessa função, foi criada a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal, pela Lei Complementar n. 75 de 1993, e que cada estado designaria um Procurador Regional dos Direitos do Cidadão para zelar pela defesa dos direitos humanos dos cidadãos. Figura 7 - Atendimento na Procuradoria. Fonte: DHnet (2017). 33WWW.UNINGA.BR DI RE IT OS H UM AN OS E D IV ER SI DA DE | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Os membros do Ministério Público e os Procuradores podem receber notícias, requisitar informações, instaurar inquéritos e tomar as providências necessárias para o cumprimento da lei no que tange ao respeito aos direitos humanos, além de requisitar da autoridade competente estatal o cumprimento da lei, sob pena de responsabilidade pessoal. A Defensoria Pública da União é o órgão responsável por prestar assistência jurídica gratuita àqueles que comprovarem insuficiência de recursos, ou que não puder pagar sem prejuízo do próprio sustento. A institucionalização da Defensoria Pública já é, em si, promover o direito de acesso à justiça e à igualdade. Além disso, a função da Defensoria é: [...] como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados (RAMOS, 2014, p. 441). Importante salientar que os objetivos da Defensoria estão em lutar pela garantia da dignidade da pessoa humana, pelo fim das desigualdades sociais e pela promoção dos direitos humanos. O maior desafio, no entanto, é a falta de recursos humanos e materiais. No que tange à esfera estadual, pode-se mencionar os Ministérios Públicos estaduais, as Defensorias Públicas dos estados e os Conselhos Estaduais de Direitos Humanos que atuam em conjunto para a promoção e proteção dos direitos humanos. O Ministério Público de cada estado também atua de forma a promover o respeito aos direitos humanos, seja para evitar violações, seja para efetivamente garantir o gozo de algum direito. Eles atuam para promover a saúde, a educação, evitar a tortura, a violência doméstica contra a mulher, os idosos, crianças e adolescentes, conflitos agrários, acessibilidade a pessoas com deficiência, dentre outros temas. Assim como o Ministério Público Federal, o membro da instituição poderá instaurar procedimentos administrativos, inquérito civil e criminal para apurar a violação de direitos humanos, notificar autoridades requisitando informações, documentos e o cumprir as medidas cabíveis, expedir recomendações, fiscalizar o cumprimento da lei, celebrar Termos de Ajustamento de Conduta, realizar audiências públicas acerca de temas de interesse da sociedade, representar às autoridades competentes para ajuizar ações, receber queixas, denúncias e representações de qualquer pessoa, órgão ou entidade sobre questões relativas