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1 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde Departamento de Ciências Fisiológicas Fisiologia Vegetal – IB 315 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese Leonardo Medici Nidia Majerowicz Silvia Martim Junior Borella Sumário 1. Introdução 2 2. Conceito de Fotossíntese Líquida 3 3. Fatores ambientais que afetam a fotossíntese 5 3.1. Concentração de CO2 5 3.2. Água e eficiência no uso da água 11 3.3. Luz 13 3.3.1. Respostas fotossintéticas à luz em plantas adaptadas ao sol e à sombra 16 3.3.2. Respostas fotossintéticas à luz em plantas C3 e C4 17 3.3.3. Fotoinibição da fotossíntese 19 3.4. Temperatura 20 3.5. Nitrogênio e eficiência no uso do nitrogênio 21 4. Referências 22 1. Introdução A ecofisiologia vegetal é uma ciência de caráter multidisciplinar cujo principal foco de pesquisa se concentra na interação planta-ambiente. Neste contexto, há uma constante demanda por conhecimentos que correlacionem o desenvolvimento das plantas, seja como um todo, ou nos níveis moleculares, fisiológicos e bioquímicos com características ambientais climáticas, geofísicas e geoquímicas. Nesta perspectiva, os estudos de ecofisiologia consideram, tanto as respostas que ocorrem a nível micro (celular) e podem influenciar o desenvolvimento de um único indivíduo, quanto as respostas que ocorrem a nível macro (processos fisiológicos), podendo interferir no desenvolvimento de uma 2 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese população ou comunidade vegetal. Qual é a aplicabilidade dos conhecimentos de ecofisiologia? A aplicabilidade é ampla e de vital relevância, seja em estudos agronômicos com foco na produção vegetal, seja em estudos biológicos e ecológicos com foco na compreensão dos processos evolutivos e da organização de ecossistemas. A redução fotossintética do carbono é essencial para os vegetais sendo, portanto, um dos processos mais estudados em diferentes condições de luminosidade, de disponibilidade de água, temperatura e concentração de CO2. Os mecanismos diferenciados das plantas denominadas C3, C4 e MAC (Metabolismo Ácido das Crassuláceas ou CAM - Crassulacean Acid Metabolism em inglês) possuem particularidades que refletem diretamente na eficiência e no desempenho fotossintético das plantas sob distintas condições ambientais. Cada um destes mecanismos é resultante de processos evolutivos, os quais conferem as especificidades adaptativas às plantas C3, C4 e MAC. A distribuição dos metabolismos fotossintéticos em diferentes condições ambientais pode ser generalizada com o seguinte panorama: - As plantas com metabolismo C3 predominam em ambientes temperados e em comunidades vegetais com auto-sombreamento (florestas). - As plantas C4 predominam em ambientes quentes, secos e bem iluminados (tropicais e subtropicais), o que lhes confere a característica de plantas pioneiras em uma sucessão ecológica e comunidades vegetais abertas como savanas e pradarias, em locais com verões muito quentes. - As plantas MAC predominam em ambientes de desertos costeiros com noites frias, florestas tropicais quentes e úmidas (epífitas e árvores do gênero Clusia) e regiões áridas como a caatinga (cactos). As plantas MAC também podem habitar ambientes aquáticos onde é comum uma maior disponibilidade de CO2 durante a noite e menor disponibilidade durante o dia. As respostas diferenciadas que as plantas C3, C4 e MAC apresentam às variações que ocorrem na intensidade luminosa, na concentração de CO2 intrafoliar, na temperatura, na disponibilidade de água e de nitrogênio, permitem compreender, parcialmente, o sucesso de plantas com cada um destes metabolismos fotossintéticos nas diferentes condições ambientais (Lawlor, 1987). Portanto, quando se pretende estudar o efeito que os fatores ambientais exercem no processo fotossintético das plantas, é fundamental se atentar para o fato de que as taxas fotossintéticas são altamente dependentes de: 1. Suprimento de CO2 no sítio ativo da rubisco. 2. Síntese de NADPH e de ATP (disponibilidade de luz). 3 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese 3. Carboxilação da RuBP (Ribulose 1,5-bifosfato), a qual está diretamente ligada às taxas relativas entre a atividade carboxilase e a atividade oxigenase da rubisco. 4. Síntese de RuBP, controlada pelo ciclo C3 (etapa de regeneração do substrato inicial do ciclo C3). Diante do exposto, nesta aula iremos abordar as variações quantitativas que ocorrem no processo fotossintético das plantas C3, C4 e MAC em função de algumas variáveis ambientais, e analisar as características fisiológicas importantes bem como o seu significado ecofisiológico. 2. Conceito de Fotossíntese Líquida Medidas do consumo do gás carbônico em folhas, plantas ou comunidades vegetais expressam as taxas fotossintéticas de assimilação de CO2, as quais são denominadas de fotossíntese líquida (FL). As taxas de FL são determinadas com o uso de um aparelho denominado IRGA (do inglês, Infra Red Gas Analyser ou analisador de infravermelho em fase gasosa), o qual possui uma câmara transparente de circulação de ar por fluxo forçado (Figura 1). Assim, a fotossíntese líquida é medida pelas mudanças na concentração de CO2 que ocorre no ar que circula dentro da câmara do IRGA. A determinação quantitativa de CO2 pela análise da absorção do infravermelho é um método contemporâneo, muito utilizado para determinar as taxas fotossintéticas e respiratórias de plantas. O termo fotossíntese líquida (FL) expressa o resultado obtido pelo balanço entre os ganhos de carbono promovidos pela fotossíntese bruta (FBr) e as perdas de carbono decorrentes dos processos de respiração (R) e fotorrespiração (FR), de acordo com a fórmula: FL = FBr – (R+FR) A fotossíntese bruta (FBr) é a capacidade carboxilativa total que uma folha apresenta em uma determinada condição, sendo responsável pela conversão do carbono inorgânico (CO2) em carbono orgânico (carboidratos), consumindo CO2 e liberando O2. A respiração e a fotorrespiração são processos celulares que consomem O2 e liberam CO2. Estes três processos, ou seja, FBr, R e FR, ocorrem concomitantemente durante o dia nos tecidos fotossintetizantes. A fotossíntese líquida indica o status da taxa fotossintética de uma folha ou de uma planta (se foi medida pontualmente nas folhas ou na planta toda), em uma determinada condição ambiental, e pode apresentar valores positivos, negativos ou nulo, de acordo com as taxas relativas dos três processos que determinam a fotossíntese líquida: 4 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese FL > 0 (valor positivo) – significa que a taxa de carboxilação (FBr) é maior que as taxas de liberação de CO2 pelos processos de respiração (R) e fotorrespiração (FR); FL = 0 (valor nulo) – significa que a taxa de carboxilação (FBr) é igual às taxas de liberação de CO2 pelos processos de respiração (R) e fotorrespiração (FR). Quando a FL possui valor igual a zero denomina-se ponto de compensação da fotossíntese. FL < 0 (valor negativo): significa que a taxa de carboxilação (FBr) é menor que as taxas de liberação de CO2 pelos processos de respiração (R) e fotorrespiração (FR). O ponto de compensação da fotossíntese é um parâmetro fisiológico de grande importância para o entendimento do comportamento fotossintético dos diferentes tipos de plantas em distintas condições ambientais. Figura 1. Esquema de dispositivo para a medida das trocas de CO2 realizadas por folhas iluminadas. O fluxo de ar pela câmara transparente é controlado e monitorado. O IRGA compreende um equipamento que permite quantificar a concentração de CO2. A variação da concentração do CO2 do ar que entra e deixa a câmara onde a folha realiza suas atividades metabólicas possibilita estimar a taxa de fotossíntese líquida. Majerowicz,2019 (adaptada de Nobel, 1991). 3. Fatores ambientais que afetam a fotossíntese A compreensão de como os fatores ambientais, concentração de CO2, disponibilidade de água, radiação solar, temperatura e disponibilidade de nitrogênio, afetam a fotossíntese é de grande importância para profissionais das áreas fisiológicas, ecológicas e agronômicas. Do ponto de vista dos estudos agronômicos, o conhecimento do comportamento fotossintético em respostas às variações ambientais, podem ser utilizados para a aplicação de técnicas e manejo que proporcionem melhorias no desempenho e na produtividade das plantas cultivadas. Do ponto de vista dos ecólogos e dos biólogos, o conhecimento do comportamento 5 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese fotossintético em respostas às variações ambientais, é essencial para os estudos da adaptação e evolução das plantas nos diversos ecossistemas. 3.1. Concentração de CO2 O dióxido de carbono (CO2) é um gás traço na atmosfera, compondo na atualidade, aproximadamente 0,041% ou 405 ppm do ar (Figura 2A), sendo quase o dobro da concentração que prevaleceu durante os últimos 400 mil anos (dados obtidos de medições em bolhas de ar apreendidas na Antártida). Com exceção dos últimos 200 anos, a concentração de CO2 durante o passado geológico recente, tem sido baixa e flutuante entre 180 a 260 ppm. Essas baixas concentrações foram típicas de tempos posteriores ao Cretáceo, quando a terra era muito quente e as concentrações de CO2 variavam em torno de 1200 a 2800 ppm. Atualmente, a concentração de CO2 vem aumentando em uma proporção que varia de 1 a 3% ao ano, principalmente ocasionado pela mudança no uso da terra, em especial pelos desmatamentos realizados para fins de exploração da agricultura e da pecuária, e pela queima de combustíveis fósseis e emissões de gases nas atividades agropecuárias (Figura 1B). 6 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese Figura 2. As concentrações atuais de CO2 atmosférico, medidas em Mauna Loa, Havai, continuam a aumentar (A). A natureza ondulada do traço é causada pela alteração nas concentrações de CO2 atmosférico, associada a mudanças sazonais no balanço relativo entre taxas de fotossíntese e respiração. A cada ano, a concentração mais elevada de CO2 é observada em maio, exatamente antes da estação de crescimento no hemisfério norte, e a concentração é mais baixa é observada em outubro (De Barnola et al., 1994; Keeling e Whorf, 1994; Neftel et al., 1994 e Keeling et al., 1995, atualizada usando dados de http://www.esrl.noaa.gov/gmd/ccgg/trends/), através deste link retirado de Taiz et al, 2017, o gráfico de (A) foi retirado. Em (B) observa-se um panorama Brasileiro das principais fontes de emissão dos gases com efeito estufa medido pela concentração de CO2 atmosférico. Retirado de http://educaclima.mma.gov.br/2018/04/panorama-das-emissoes-de- gases-de-efeito-estufa-e- acoes-de-mitigacao-no-brasil/ A fixação do carbono atmosférico (CO2) na molécula de ribulose 1,5-bisfosfato é o ponto de partida da assimilação fotossintética do carbono. Mas para que essa reação aconteça, o CO2 que está no ambiente tem que difundir para o interior da folha (absorção de CO2 atmosférico), e posteriormente difundir para o sítio de carboxilação da enzima Rubisco. A abertura estomática é o principal acesso do CO2 atmosférico para o interior da folha, sendo, portanto, o grau de abertura dos ostíolos um dos principais pontos de controle da 7 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese concentração intrafoliar de CO2. Logo após sua entrada pelo estômato, o CO2 difunde-se em direção à câmara substomática e para os espaços de ar existentes entre as células do mesofilo (difusão em fase gasosa). Após sua saída dos espaços aéreos CO2 difunde-se em direção ao cloroplasto (difusão em fase líquida), mais especificamente para o estroma, compartimento em que se localiza a Rubisco (Figura 3). Figura 3. Pontos de resistência à difusão do CO2 do exterior das folhas até os cloroplastos (retirado de Taiz et al., 2017). Ao observar a figura acima, torna-se evidente os diferentes pontos de resistência para a difusão do CO2 no decorrer do trajeto entre o meio externo da folha e os cloroplastos. O primeiro ponto de resistência que o CO2 encontra é denominado de resistência da camada limítrofe, decorrente da presença da camada composta por ar relativamente parado junto à superfície foliar (camada limítrofe). Após transpor a barreira da camada limítrofe, o segundo ponto de resistência que o CO2 encontra é imposto pelo próprio estômato, sendo denominada de resistência estomática. A resistência estomática é inversamente proporcional ao grau de abertura dos estômatos, ou seja, quanto maior a abertura estomática, menor será a resistência à difusão do CO2, e 8 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese quanto menor a abertura estomática maior será a resistência à difusão. Notem que, a resistência imposta pela camada limítrofe é bem menor que a resistência imposta pelo estômato. Portanto, pode-se afirmar que a resistência estomática é a principal barreira para a passagem do CO2 do meio externo para o meio interno da folha. O próximo ponto de resistência à difusão do CO2 para o estroma do cloroplasto é a resistência mesofilica, a qual é imposta pelo meio líquido que compõe o mesofilo. Como no trajeto do mesofilo até o estroma, o CO2 se difunde em meio líquido, a resistência imposta pelo mesofilo é 1,4 vezes mais acentuada que a soma da resistência imposta pela camada limítrofe e da resistência imposta pelo estômato na abertura máxima. De que maneira são obtidas as informações sobre essas resistências? Quando se utiliza o IRGA para as medições das taxas fotossintéticas, uma série de medidas são realizadas concomitantemente, tais como: condutância estomática, condutância mesofilica, déficit de pressão de vapor, temperatura foliar, temperatura da câmara, entre outras. Os valores de condutância estomática e condutância mesofilica refletem diretamente o grau de abertura dos estômatos e a fluidez do CO2 pelo mesofilo, e são inversamente proporcionais às resistências impostas por estas estruturas. Isto significa que: - Quanto maior a condutância estomática, menor a resistência estomática à difusão do CO2 do meio externo para o interno da folha; e - Quanto maior a condutância mesofilica, menor a resistência imposta pelo mesofilo à difusão do CO2 até o estroma do cloroplasto. Os estudos que analisam a taxa fotossintética em função de diferentes concentrações de CO2 dentro das folhas (Ci), evidenciam que, quando a Ci é baixa a fotossíntese é fortemente limitada. Outra particularidade importante destes estudos é a detecção do ponto de compensação de CO2 da fotossíntese, que é determinado pela CONCENTRAÇÃO de Ci na qual a FBr (consumo de CO2) se iguala à respiração + fotorrespiração (liberação de CO2) (Figura 4). Variações nas concentrações de CO2 intrafoliar produzem respostas fotossintéticas substancialmente distintas em plantas com metabolismo C3 e C4. As plantas com metabolismo C3 apresentam um aumento da FL quando submetidas a concentrações de CO2 maiores que da atmosfera, desde que as condições de temperatura, nutrientes e água sejam as adequadas. O ponto de compensação de CO2 em plantas C3 é fortemente influenciado pelos fatores que alteram a fotorrespiração e é alcançado em valores que variam de 40 a 100 µL L-1 de CO2. Após alcançado o ponto de compensação, as plantas C3 apresentam um aumento da FL em uma extensa faixa do aumento da concentração de Ci (observe 9 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese atentamente a Figura 4). Porém, conforme as concentrações de Ci ficam muito elevadas, a taxa de assimilação líquida começa a saturar, e a CONCENTRAÇÃO DE CARBONO INTERNA na qual se inicia a saturação é denominado PONTO DE SATURAÇÃO de CO2.Quando as concentrações de Ci são muito baixas, diz-se que a fotossíntese é limitada pela capacidade carboxilativa da RUBISCO, e quando as concentrações de Ci são muito altas, a limitação da fotossíntese fica a cargo da capacidade de produção de NADPH e ATP que será empregado na regeneração da RuBP. Figura 4. Mudanças na fotossíntese líquida em função das concentrações intercelulares de CO2 em plantas C3 e C4. A concentração de CO2 intercelular na qual a assimilação líquida de CO2 é zero define o ponto de compensação desse gás (De Berry e Downton, 1982 in: Taiz et al. 2017). Em contrapartida, nas plantas com metabolismo C4, o PONTO DE COMPENSAÇÃO de CO2 é alcançado em valores inferiores a 5 µL L-1 de CO2, e o PONTO DE SATURAÇÃO em valores entre 100 e 200 µL L-1 de CO2. O fato das plantas C4 apresentarem saturação da fotossíntese em valores bem mais baixos que o das plantas C3 se deve à elevada eficiência carboxilativa da enzima PEPcase e à eficiência do MECANISMO CONCENTRADOR DE CO2 no sítio ativo da Rubisco, tendo como consequência A INIBIÇÃO DA FOTORRESPIRAÇÃO. Fazendo uma análise geral das respostas fotossintéticas das plantas C3 e das plantas C4, é possível inferir que as C3 apresentam maior probabilidade de se beneficiarem do atual incremento das concentrações do CO2 atmosférico, uma vez que as C4 apresentam saturação 10 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese da fotossíntese em baixas concentrações de carbono. No caso das plantas com metabolismo MAC, em função de seu mecanismo de abertura estomática no período noturno e fechamento no período diurno, a principal limitação das taxas fotossintéticas é imposta pela capacidade de armazenamento do ácido málico. Isto significa que, a quantidade total de assimilação de CO2 nestas plantas não é limitada pelo grau de abertura estomática, ou pela quantidade de gás carbônico dentro da folha, e sim, pela quantidade de ácido málico que ela consegue armazenar nos vacúolos durante o período noturno. O PONTO DE COMPENSAÇÃO de CO2 nas plantas MAC, varia de valores muito baixos, os quais são observados no decorrer da fixação de CO2 no período noturno, a valores mais elevados, em torno de 50 µL L-1 no final do dia. Esse aumento do ponto de compensação ocorre quando a concentração de CO2 interno é decresce devido à redução na disponibilidade de malato no final do dia, favorecendo a ocorrência da fotorrespiração. 3.2. Água e eficiência no uso da água É importante ressaltar que, quando as plantas abrem seus estômatos para captar o CO2 do ambiente, elas perdem água na forma de vapor. Sendo assim, a abertura dos estômatos promove a entrada do gás carbônico e a saída da água, o que, em determinadas situações pode ser um sério problema para as plantas. Quando a umidade relativa do ar é elevada, o gradiente de difusão que impulsiona a perda de água é 50 vezes maior que o que impulsiona a absorção de CO2 e, em condições de baixa umidade relativa do ar, esse gradiente é muito maior. A abertura estomática, extremamente importante para a captação de CO2, é acompanhada por uma intensa perda de vapor de água pelas plantas, residindo aí um grande paradoxo que condiciona a produtividade primária e a distribuição das plantas na superfície da terra. As plantas terrestres vivem um dilema permanente entre conciliar os ganhos de carbono com o seu balanço hídrico. A disponibilidade quantitativa e a regularidade no suprimento de água são os principais fatores que limitam a produtividade vegetal. A deficiência hídrica pode ocasionar uma série de distúrbios metabólicos. Em situações de baixa disponibilidade hídrica nos solos, ou elevada demanda de vapor da atmosfera, as plantas tendem a reduzir a abertura dos estômatos como uma estratégia para minimizar as perdas de água. Com isso, também limitam a absorção de CO2 da atmosfera e as taxas fotossintéticas. A eficiência no uso da água (EUA), definida como a razão entre a quantidade de 11 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese CO2 assimilado e a quantidade de água transpirada, é um parâmetro muito utilizado em estudos de ecofisiologia vegetal, uma vez que a fotossíntese é frequentemente limitada pela disponibilidade de CO2, associada à redução do grau de abertura estomática, como forma de preservar o balanço hídrico das plantas. As taxas de fotossíntese líquida e de transpiração medidas com o uso do IRGA, são convencionalmente e respectivamente, representadas pelas letras A e E, nas publicações científicas da área de Fisiologia Vegetal. EUA = A (µmol CO2 fixado m-2 s-1) / E (µmol H2O transpirada m-2 s-1), onde: A = taxa de fotossíntese líquida e E = taxa de transpiração Tabela 1. A eficiência no uso da água varia de acordo com o metabolismo fotossintético das plantas. Metabolismo Fotossintético EUA (g de CO2 / kg de H2O) C3 1 a 3 C4 2 a 5 MAC 6 a 30 g Os diferentes valores de EUA entre os tipos de metabolismo fotossintéticos observado na Tabela 1 são devidos à existência do mecanismo concentrador de CO2 em torno do sítio ativo da Rubisco, nas plantas C4 e MAC e à elevada afinidade da PEP carboxilase com o seu substrato (HCO3-). Analisando comparativamente as plantas C4 e as plantas C3, as primeiras apresentam maior eficiência no uso da água, pois com menor abertura estomática e uma redução na concentração interna de CO2, elas mantêm a fotossíntese positiva e menor perda de água. A fotossíntese positiva é explicada pelo fato de que a sua enzima de fixação do CO2, a PEPcase, ter elevada afinidade por seu substrato. Portanto, mesmo que a concentração intrafoliar de CO2 atinja concentrações internas muito baixas, a fixação de CO2 se mantém, formando compostos de 4 carbonos e a continuidade do mecanismo concentrador do CO2 no sítio ativo da Rubisco na bainha perivascular onde funciona o ciclo C3. Em contrapartida as plantas C3 demandam uma maior abertura dos estômatos para a manutenção de fotossíntese positiva. Este fato é justificado pela sua enzima de fixação do CO2, a Rubisco, possuir menor afinidade pelo CO2 (em comparação à PEPcase) e duplicidade de substratos, o CO2 e o O2 que competem pelo sítio ativo da enzima. Dessa forma, a Rubisco 12 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese necessita de maiores quantidades de CO2 para a manutenção de taxas fotossintéticas positivas, o que é diretamente relacionado com uma maior abertura estomática e, consequentemente, maior perda de água. Observem que as plantas MAC apresentam os maiores valores de EUA, fato este, explicado pelo mecanismo diferenciado de abertura estomática no período noturno, onde a umidade relativa do ar (UR) é mais elevada e consequentemente a perda de água é muito menor. Adicionalmente, essas plantas assimilam o CO2 (pelo ciclo C3) durante o dia, período em que os estômatos estão fechados não havendo perda de água na forma de vapor. 3.3. Luz O processo fotossintético é totalmente dependente de luz. Para detectar o quanto de luz chega até as plantas, convencionalmente se utiliza medidas de energia ou de fótons, contabilizados por unidade de área e de tempo. Nos estudos que correlacionam a fotossíntese e a luz, convencionalmente, adota-se a medida de densidade de fluxo fotônico fotossintético (PPFD – photosynthetic photon flux density) que é expresso em μmoles m-2 s-1 (micromoles por metro quadrado por segundo). Da energia solar que alcança a terra, somente uma pequena parte é utilizada pela fotossíntese para fazer a conversão do CO2 em carboidratos. Na Figura 5, pode-se observar que apenas 5% da energia luminosa é efetivamente convertida em carboidratos pela fotossíntese, e que 95% é perdida ao longo do processo. Note que metade da energia é perdida em função dos comprimentos de onda que não são absorvidos pelos pigmentos fotossintéticos. Do restante da energialuminosa que não é utilizada pela fotossíntese, 15% é perdida pela luz que é transmitida e refletida (em especial na faixa do verde); 10% é perdida na dissipação pelo calor e 20% é perdida em função do metabolismo. A luz é um fator ambiental de extrema relevância para o processo fotossintético, porém, em algumas situações, as plantas podem ser expostas a um excesso de luminosidade, e ao contrário do que se imagina, pode ocasionar reduções e não incrementos nas taxas fotossintéticas. À semelhança do que ocorre com o CO2, os efeitos da luz na fotossíntese das plantas são estudados com a construção de curvas de resposta à luz. Uma curva de resposta à luz pode contribuir significativamente para o entendimento do comportamento diferenciado que é observado entre plantas C3 e C4, assim como entre as plantas de sol e sombra. 13 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese Figura 5. Conversão da energia solar em uma folha. Observe que de 100% da energia solar que incide sobre a folha somente 5% é convertido em carboidrato (retirado de Taiz et al. 2017). Primeiramente, para entender a influência da luz no processo fotossintético, observe a Figura 6. Note que, quando a incidência luminosa está em níveis muito próximos do escuro, a assimilação do CO2 ainda é incipiente, e o processo que sobressai é a respiração, ocasionando assim liberação de CO2. Portanto, nesta faixa da curva, as medidas de assimilação de carbono são negativas. Conforme a incidência luminosa vai aumentando, a taxa de assimilação de CO2 também aumenta. Quando o valor da taxa de fluxo fotônico permite que a fotossíntese líquida seja igual a zero (FL = 0) tem-se o PONTO DE COMPENSAÇÃO DE LUZ da fotossíntese. Este parâmetro corresponde a um valor de intensidade luminosa no qual a Fotossíntese Bruta se iguala as perdas por respiração e fotorrespiração. Em valores de intensidade luminosa superiores ao do ponto de compensação, observa-se que há uma relação linear entre a taxa fotossintética e a intensidade luminosa, ou seja, conforme aumenta a intensidade luminosa a fotossíntese líquida alcança valores positivos cada vez maiores. Nesta faixa da curva, onde a fotossíntese líquida aumenta progressivamente em resposta às maiores intensidades luminosas, corresponde à faixa em que fotossíntese líquida é limitada pela luz. Isso significa que, nesta faixa da curva somente serão observados valores reduzidos de fotossíntese se a intensidade luminosa for baixa. Nas intensidades mais elevadas, observa-se que a taxa fotossintética começa a estabilizar até alcançar o PONTO DE SATURAÇÃO DE LUZ da fotossíntese. Isso significa que, após o 14 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese ponto de saturação não ocorrem mais incrementos nas taxas fotossintéticas com o aumento das intensidades luminosa. Acima do ponto de saturação de luz, a limitação da fotossíntese líquida se dá por limitações da enzima Rubisco ou nos níveis de triose fosfato. Ou seja, em fatores que limitam a velocidade do Ciclo de Calvin. Figura 6. Taxa fotossintética em uma planta com metabolismo C3 medida em diferentes intensidades luminosas. Na faixa de 0 a 300 PPFD, as limitações na fotossíntese são causadas pela luz, e na faixa de 300 a 1000 PPFD, as limitações da fotossíntese são causadas por fatores ligados à etapa de carboxilação. Observe atentamente o ponto de inclinação inicial da curva, onde é determinada a produtividade quântica da fotossíntese. *PPFD (Densidade de fluxo fotônico fotossintético). (Taiz et al. 2017). Nos estudos que objetivam investigar o comportamento fotossintético das plantas em diferentes intensidades luminosas, a produtividade quântica é um parâmetro bastante utilizado para determinação da eficiência do processo. Produtividade quântica é calculada, e resultante da razão entre um produto proveniente da luz e o número de fótons que é absorvido. Sendo claro que a fotossíntese é um processo que consome CO2 e libera O2 em presença de luz, a sua produtividade quântica pode ser calculada com base nos dois gases, conforme disposição abaixo: 15 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese - Produtividade quântica da fotossíntese = nº de CO2 consumido/nº de fótons absorvido; ou - Produtividade quântica da fotossíntese = nº de O2 liberado/ nº de fótons absorvido Lembre-se que a fotossíntese possui duas etapas, a fotoquímica e a bioquímica, porém, quando se utiliza o CO2 como base do cálculo para produtividade quântica significa que uma referência direta com a etapa bioquímica, e quando se utiliza O2 na base do cálculo, significa uma referência direta com a etapa fotoquímica. Como a fotossíntese é um processo energético, a produtividade quântica é um bom indicativo da eficiência energética do processo, ou seja, quanto da energia solar absorvida pode ser convertida em energia química e o quanto de energia foi perdida no decorrer do processo. 3.3.1. Respostas fotossintéticas à luz em plantas adaptadas ao sol e à sombra As taxas de assimilação de CO2 em plantas C3 adaptadas ao sol e a condições de sombra, respondem de modo diferenciado ao aumento progressivo da intensidade luminosa em função de adaptações morfofisiológicas específicas. Os pontos de compensação de luz nas plantas de sol são alcançados em intensidades luminosas que variam de 10 a 20 µmol m-2 s-1, e nas plantas de sombra os valores variam entre 1 a 5 µmol m-2 s-1. Percebam que as plantas adaptadas ao sol alcançam o PCL em valores que podem ser até 10 vezes mais elevados que os valores de uma planta de sombra. Um dos principais fatores que contribui significativamente para o menor PCL das plantas de sombra é a menor taxa respiratória, observada nessas plantas. Além disso, os reduzidos valores da taxa fotossintética e do ponto de saturação luminoso observados em plantas de sombra refletem estratégias de sobrevivência desenvolvida por estas plantas à limitação imposta pela baixa disponibilidade de luz encontrada em seus habitats naturais. Dentre estas, plantas de sombra apresentam, tipicamente, elevada eficiência da captação e utilização da luz e reduzidas taxas de crescimento (Figura 7). 16 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese Figura 7. Curvas de resposta à luz da fixação fotossintética de carbono em espécies de sol e sombra. Armole triangular (Atriplex triangularis) é uma espécie de sol, e o gengibre-selvagem (Asarium caudatum) é uma espécie de sombra. Observe na imagem que o PCL e a fotossíntese máxima da planta de sombra são alcançados em intensidades luminosas mais baixas quando comparada com a planta de sol. A linha vermelha tracejada foi extrapolada da parte medida da curva (de Harvey, 1979, retirada de Taiz et al,. 2017). 3.3.2. Respostas fotossintéticas à luz em plantas C3 e C4 Ainda que as plantas C3 e C4 apresentem similaridades na fase linear da curva de resposta à luz, as taxas de fotossíntese de plantas C3 superam as das plantas C4 em baixas intensidades luminosas e em temperaturas abaixo de 30ºC. Observem que com o aumento da intensidade luminosa, faixa de 500 a 1000 μmoles de fótons m-2 s-1 (1/4 a ½ da radiação máxima), as plantas C3 não apresentam incremento proporcional na fotossíntese. Contrariamente às plantas C3, a fotossíntese das plantas C4 continua respondendo positivamente ao aumento da intensidade luminosa até 2000 µmols de fótons m-2 s-1, não sendo possível a detecção do ponto de saturação luminosa (Figura 8). Entretanto, em condições experimentais e sob elevadas intensidades luminosas, plantas C3 podem atingir valores de fotossíntese similares aos das plantas C4 se houver uma diminuição da concentração de O2 (2%) ou um incremento da concentração de CO2 (700 ppm), indicando que a fotorrespiração é a responsável pela limitação da fotossíntese em altas intensidades luminosas. 17 Aspectos ecofisiológicos da fotossínteseFigura 8. Gráfico da fotossíntese líquida em plantas C3 e C4 evidenciando o ponto de saturação da fotossíntese pela luz (retirada de Larcher, 2000). Fazendo uma abordagem sobre a eficiência da fotossíntese em plantas C3 e C4, e considerando a complexidade do processo fotossintético, a produtividade quântica efetivamente calculada (real) será sempre menor que a produtividade teórica (esperada). Por exemplo: em uma planta C3, a produtividade quântica esperada é de 0,125, valor proveniente da razão entre 1 mol de CO2 fixado/8 fótons absorvidos, a produtividade quântica efetivamente medida é de 0,05 mol de CO2 fixado/mol de fótons absorvido (Taiz et al. 2017). Percebam que a produtividade quântica real foi 40% da produtividade teórica, redução esta explicada pelas perdas energéticas relacionadas ao processo de fotorrespiração. Nas plantas com metabolismo C4, pode-se inferir que a produtividade quântica real é igual a produtividade teórica, devido à existência do mecanismo concentrador de CO2 e consequente supressão da fotorrespiração? NÃO! É preciso se atentar para o fato de que, o funcionamento do mecanismo concentrador de CO2 exige um investimento a mais de energia para que seja regenerado o aceptor incial do CO2, que é o fosfoenolpiruvato. Portanto, essas plantas também apresentam uma redução na produtividade quântica da fotossíntese. Contudo, a temperatura ambiente é outro fator abiótico que interfere diretamente na produtividade quântica da fotossíntese, e mais esclarecimentos sobre o comportamento fotossintético das plantas com metabolismo C3 e C4 em distintas temperaturas será abordado no item 3.4. 18 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese 3.3.3. Fotoinibição da fotossíntese A absorção de luz em excesso pode ser um sério problema para as plantas, em especial as que operam com metabolismo C3. Como já foi evidenciado nas curvas de resposta a luz, o processo fotossintético das plantas responde positivamente ao incremento da intensidade luminosa até determinado valor, que varia de acordo com o metabolismo fotossintético (C3 ou C4) e com o habitat natural (sol e sombra). Entretanto, o que acontece com o processo fotossintético quando as plantas são expostas a intensidades luminosas acima do valor que ela consegue absorver e utilizar? O excesso de luminosidade pode ser um sério problema para as plantas, pois quando a planta absorve mais luz do que consegue utilizar podem surgir danos no aparelho fotossintético, mais especificamente no centro de reação do PSII, que é inativado e danificado ocasionando assim a fotoinibição. A fotoinibição pode ser de dois tipos: - Fotoinibição dinâmica: é um tipo de fotoinibição que acontece em condições de moderada intensidade luminosa, reduz a produtividade quântica da fotossíntese, mas não modifica a taxa fotossintética máxima. Neste tipo de fotoinibição, a energia luminosa que é absorvida é desviada das reações redox para a dissipação por calor, por isso, afeta a produtividade quântica. O fato de ser denominada dinâmica significa exatamente que a produtividade quântica da fotossíntese será restabelecida quando a intensidade luminosa retornar aos valores adequados para a planta. Ao longo de um dia de verão, nos horários onde a emissão da radiação luminosa é mais elevada, é comum as plantas apresentarem o fenômeno da fotoinibição dinâmica. - Fotoinibição crônica: é um tipo de fotoinibição que ocorre em condição de elevadas intensidades luminosas, causam redução da produtividade quântica e da taxa fotossintética máxima. A fotoinibição crônica é muito mais prejudicial para as plantas, pois, provoca danos na proteína D1 localizada no centro de reação do PSII, e por isso afeta a fotossíntese máxima. O fato de ser denominada crônica significa exatamente que pode persistir por dias ou até semanas, e os danos causados ao aparelho fotossintético podem ser irreversíveis. Em folhas intactas, as características da fotoinibição são dependentes do quantitativo de luz ao qual a planta está exposta e é decorrência da formação de espécies ativas de oxigênio (EROs). Lembre-se que o valor da intensidade luminosa que ocasionará fotoinibição, dinâmica ou crônica, varia de acordo com o metabolismo fotossintético (C3 ou C4) e principalmente com a adaptação ao habitat natural (sol e sombra). 19 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese 3.4. Temperatura Em condições atmosféricas normais, a fotossíntese de plantas C3 e C4 apresenta diferenças marcantes em virtude da temperatura (Figura 9). Importante se atentar para o fato de que normalmente, as temperaturas ambiente elevadas possuem uma correlação direta com elevados níveis de irradiância (PPFD). Em um contexto geral, os diferentes metabolismos fotossintéticos são mais eficientes em distintas faixas de temperaturas, sendo as mais elevadas consideradas mais adequadas para as plantas C4 e as mais amenas mais adequadas para as plantas C3. Analisando a fotossíntese em folhas de plantas C3, a assimilação de CO2 atinge valores máximos na faixa de 20 a 30°C, enquanto que nas folhas de plantas C4 a assimilação de CO2 atinge valores máximos na faixa de 30 a 40°C. Analisando o desempenho fotossintético em resposta a diferentes temperaturas ambientes, é possível traçar o seguinte panorama: - Temperaturas abaixo de 30°C: C3 mais eficiente que C4; - Temperaturas acima de 30 a 35°C: C4 mais eficiente que C3, sendo que as C4 podem suportar temperaturas na faixa de 45 a 50°C sem apresentar danos na fotossíntese; - Temperaturas abaixo de 20°C: C4 muito inferior a C3. Mas quais são as explicações fisiológicas para estes comportamentos fotossintéticos das plantas C3 e C4 nestas diferentes faixas de temperatura? Novamente, a abordagem da produtividade quântica da fotossíntese é um parâmetro essencial para a compreensão destes comportamentos. Em torno de 30°C, a eficiência quântica das plantas C3 e C4 é semelhante, indicando que os custos energéticos dos ciclos C3/C2 e do ciclo C4 se equiparam nesse ponto. Em ambos os casos, esse comportamento da fotossíntese, em função da temperatura, está relacionado com os níveis de fotorrespiração em cada um dos tipos fotossintéticos. A fotorrespiração é praticamente inexistente nas plantas C4. Porém, nas plantas C3, as taxas de fotorrespiração aumentam com a temperatura em virtude do aumento da atividade oxigenase da rubisco. Convém destacar, ainda, que os custos energéticos da fixação de CO2 pelas plantas C3 se elevam à medida que aumentam as taxas do ciclo C2 (ver tópico Papel da fotorrespiração). Em uma atmosfera com 2% de O2 ou enriquecida com CO2, a fotorrespiração é suprimida nas plantas C3. Nessas condições, a eficiência quântica das plantas C3 atinge níveis superiores aos das plantas C4. Isso se deve ao custo adicional permanente da fixação de CO2 pela via C4 (5 ATP e 2 NADPH) em comparação com o ciclo C3 (3 ATP e 2 NADPH). Em resumo, a fotossíntese das plantas C4 é substancialmente mais eficiente que a das 20 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese plantas C3 em ambientes quentes e intensamente iluminados. As bases fisiológicas centrais dessa adaptação são: o mecanismo concentrador de CO2 presente na fotossíntese C4, inibidor da fotorrespiração e as temperaturas ótimas mais elevadas de suas principais enzimas envolvidas na carboxilação primária. Quando as temperaturas ambientes são inferiores a 20ºC, o quadro se modifica consideravelmente, devido à maior sensibilidade das plantas com metabolismo C4. A sensibilidade das plantas C4 a baixas temperaturas é um fato bem conhecido. A espécie Zea mays (milho), por exemplo, não cresce em temperaturas inferiores 12-15°C. Um dos fatores limitantes ao crescimento parece ser a enzima piruvato fosfato dicinase (PFdC), a qual perde substancialmente a sua atividade abaixo de 12°C. Adicionalmente, a temperatura ótima da PEPcase é de30 a 35°C. Figura 9. Comportamento fotossintético de espécies C3 e C4. Em (A) observa-se a fotossíntese em diferentes temperaturas de uma planta C3 crescendo em seu habitat natural frio e uma planta C4 crescendo em seu habitat natural quente (De Berry and Björkman, 1980). Em (B) observa-se a produtividade quântica da fotossíntese em resposta a diferentes temperaturas em plantas C3 e C4. Note que em temperaturas mais elevadas, a produtividade quântica da C3 diminui, o que é decorrência do aumento o gasto energético promovido pelo incremento da fotorrespiração. Por outro lado, em baixas temperaturas a C3 possui uma maior produtividade quântica do que a C4, o que é explicado pelo fato de que a fotorrespiração é menor, e nas plantas C4 há um gasto energético maior para regenerar o fosfoenolpiruvato (De Ehleringer et al. 1997). Ambas figuras foram retiradas de Taiz et al. (2017). 3.5. Nitrogênio e eficiência no uso do nitrogênio De um modo geral, a fotossíntese das plantas está atrelada à disponibilidade de nitrogênio, uma vez que esse elemento participa da composição de proteínas estruturais, enzimas e da clorofila. A eficiência no uso do nitrogênio – EUN – é uma característica que considera a quantidade de matéria seca produzida por unidade de nitrogênio presente nos 21 Aspectos ecofisiológicos da fotossíntese tecidos vegetais. EUN = mg N nos tecidos/g massa seca da planta Considerando-se o fato de que a Rubisco corresponde a 50% e 25% da proteína foliar solúvel em plantas C3, C4 e CAM, respectivamente, as plantas com mecanismo concentrador de CO2 apresentam uma demanda menor de N para a fotossíntese. Em paralelo, a PEPcase corresponde a 10% da proteína foliar solúvel nas plantas C4 e CAM, o que faz com que essas plantas apresentem uma demanda de N menor para as suas enzimas de carboxilação. Consequentemente, as plantas C4 e CAM possuem uma maior EUN quando comparadas às plantas C3. Na prática, isso significa que as plantas C4 possuem capacidade de produzir maior quantidade de carboidratos com menor quantidade de nitrogênio, proporcionando competição vantajosa em relação às plantas C3 em solos com baixa disponibilidade de nitrogênio. Referências • MAJEROWICZ, N. 2019. In Fisiologia Vegetal (Kerbauy, G.B. ed.) Fotossíntese. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 2ª ed., Cap. 05, p. 82-103. • TAIZ, L. ZEIGER, E. 2012. Plant Physiology. Photosynthesis: Physiological and Ecological Considerations. Sunderland, Massachusetts, USA, 5ª ed., Cap. 9, p. 171-192. • TAIZ, L. ZEIGER, E., MOLLER, I.M. MURPHY, A. 2017. Fisiologia e Desenvolvimento Vegetal. Fotossíntese: Considerações Fisiológicas e Ecológicas. Artmed editora LTDA, Porto Alegre, RS, 6ª ed. Cap. 9, p. 245-265. • WALTER, L. Ecofisiologia Vegetal. 2000. Rima editora, Brasil, 2ª ed. 530 pp.