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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Graduação em Psicologia Laura Quick Bahia TDAH NA VIDA ADULTA: Como o sintoma afeta o comportamento e algumas possibilidades de tratamento psicológico na abordagem Cognitivo-Comportamental Belo Horizonte 2016 Laura Quick Bahia TDAH NA VIDA ADULTA: Como o sintoma afeta no comportamento e algumas possibilidades de tratamento psicológico na abordagem Cognitivo-Comportamental Monografia apresentada ao curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Psicologia. Orientadora: Profª. Rosa Maria Corrêa Belo Horizonte 2016 Laura Quick Bahia TDAH NA VIDA ADULTA: Como o sintoma afeta no comportamento e algumas possibilidades de tratamento psicológico na abordagem Cognitivo Comportamental Monografia apresentada ao curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Psicologia. AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço a todos que de alguma forma, ou de todas elas, contribuíram e me apoiaram para que se tornasse possível a construção desta monografia. Agradeço principalmente a professora Rosa Maria Corrêa por ter aceitado ser minha orientadora neste trabalho e a professora Sandra Maria de Castro Bernardes que me auxiliou com a abordagem escolhida, Terapia Cognitiva Comportamental (TCC) e fez com que esta monografia se tornasse algo encantador para mim. Agradeço também em especial minha irmã Marina que sempre está ao meu lado, me ajudando quando preciso. A minha família por todo o apoio, incentivo, por sempre acreditar em mim. E especialmente meu pai Cláudio Bahia, professor e diretor de graduação da PUC Minas São Gabriel que sempre me ensina e me mostra a importância da PUC Minas e da minha trajetória acadêmica dentro dela. RESUMO Esta monografia consiste-se em uma pesquisa bibliográfica sobre o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) especificamente em adultos, a fim de compreender a maneira que o sintoma afeta o comportamento e quais são algumas das possibilidades de tratamento psicológico que a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) oferece, além da dificuldade do indivíduo enfrentar o transtorno no dia a dia. Trata também do fato de o TDAH ainda ser visto como um tabu perante a sociedade, como uma mera construção da indústria farmacêutica, apesar de ser comprovado que trata-se de um transtorno neuropsiquiátrico frequente e também genético. Justifica-se então a pesquisa a partir da observação do diagnóstico, que é um importante e indispensável recurso para o processo e a eficácia do tratamento psicológico através da TCC, juntamente do medicamento quando necessário. Para realização dessa monografia, foi feito um resgate histórico e epidemiológico do TDAH, o compreendendo desde a infância até a idade adulta, além do uso de casos clínicos como exemplo para comprovar a eficácia do tratamento através da TCC. Por fim, as considerações finais mostraram que o sintoma afeta sim, e de forma negativa o comportamento do indivíduo diagnosticado. A pesquisa comprovou que mesmo com um diagnóstico elaborado, de uma orientação multiprofissional (envolvendo, por exemplo, psicólogo clínico, neurologista e psiquiatra) e do uso correto e contínuo da medicação, o indivíduo e sua família enfrentam dificuldades, inclusive de aceitar o diagnóstico. E comprovou também que a rejeição tanto do medicamento quanto do tratamento é comum e dificulta a melhora do indivíduo, pois sem esses recursos há um aumento diário do sofrimento vivido. Palavras chave: TDAH, diagnóstico, possibilidade de tratamento, TCC, eficácia. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO...........................................................................................................8 2. O TDAH......................................................................................................................10 2.1. Como o sintoma afeta o comportamento..............................................................14 2.2. O diagnóstico...........................................................................................................18 3. TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL: TCC......................................24 3.1. Terapia Cognitivo-Comportamental: Avaliação..................................................29 3.2. Algumas possibilidades de tratamento psicológico pela TCC............................34 3.3. A eficácia do tratamento através da TCC: Casos clínicos...................................37 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................44 REFERÊNCIAS.............................................................................................................46 1. INTRODUÇÃO A presente monografia trata do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e quais são algumas das possibilidades de tratamento psicológico, eficazes, através da abordagem Cognitivo Comportamental. Considerando que na atualidade é um tema pouco discutido, comumente apenas entre profissionais da área médica e que possui pouco material bibliográfico a respeito do transtorno na vida adulta. Estes foram alguns fatores que se tornaram cruciais para a escolha do tema e além disso há também o fato de eu ter o transtorno, predominantemente desatenta. Esse outro fator se tornou mais uma motivação para que fosse a temática da minha monografia. Além de poder compreendê-lo melhor, o fato de o transtorno em adultos apresentar poucas estatísticas brasileiras também auxiliou, pois as estatísticas encontradas tratam-se de crianças cujos sintomas permaneceram até a vida adulta. As demais estatísticas encontradas são de outros países. Portanto este estudo pretende contribuir para que se torne um tema mais discutido e investigado entre outros profissionais, além da área médica, como os profissionais da Psicologia e também entre população em geral, principalmente quem tem o transtorno. De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID-10) e o Manual de Diagnósticos e Estatísticas de Transtornos Mentais (DSM-IV), o TDAH é classificado como um transtorno neuropsiquiátrico frequente, genético, que surge na infância e acomete também adolescentes e adultos. Independe de classe social, econômica, crença ou país de origem e seu diagnóstico pode ser feito em qualquer etapa do desenvolvimento, até a fase adulta (NOVARTIS, 2015a). Para realizar o diagnóstico corretamente são necessárias várias avaliações, muitas vezes multidisciplinares (podendo contar com neurologista, psicólogo e psiquiatra). Quando a avaliação clínica e o diagnóstico são realizados por apenas um profissional (da área médica comumente), necessita-se de informações adicionais além daquelas observadas na consulta. Estas informações, que são importantes, contam com coleta de dados feitas com os pais, cuidadores e com a escola no caso de ser uma criança ou um adolescente, e com o cônjuge (e também a família quando necessário), no caso do portador ser adulto. As informações devem apresentar dados sobre comportamento, aprendizado e socialização, além de o profissional recorrer a escalas que medem o nível e a gravidade dos sintomas. Usualmente, e o mais correto, é o 8 diagnóstico conter a nomenclatura TDAH mais a especificação. São elas: predominantemente desatento, predominantemente hiperativo-impulsivo e predominantemente desatento/hiperativo-impulsivo. Pretende-se compreender então como os sintomas afetam o comportamento no adulto e quais são algumas das possibilidades de tratamento que o profissional da Psicologia pode oferecer dentroda Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) a partir de uma revisão bibliográfica. A abordagem escolhida para tratar do processo terapêutico, a TCC concentra-se nos problemas apresentados pelo paciente naquele determinado momento, quando ele procura ou é indicado à terapia. O objetivo é ajudá-lo e orientá-lo a encontrar maneiras de promover mudanças necessárias e sua metodologia é estabelecer uma cooperação entre terapeuta e paciente, onde as estratégias de mudança e de superação são elaboradas em conjunto. Para isto deve-se definir claramente quais são os objetivos, além de sempre manter o foco (BAHLS E NAVOLAR, 2004). A partir dessa definição, aponto o motivo de escolher a TCC para responder a questão do problema de pesquisa. Entendo que esta abordagem pode esclarecer de que maneira auxiliará no controle dos sintomas. Metodologicamente entendemos por pesquisa a atividade básica da ciência na sua indagação e construção da realidade. É a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e a atualiza frente a realidade do mundo (MINAYO, p. 16, 2010). Esta monografia foi elaborada a partir de procedimentos metodológicos de pesquisa qualitativa. A metodologia foi uma pesquisa bibliográfica, através de um estudo do TDAH no geral para que fosse possível o compreender especificamente no adulto, além de saber quais são as possibilidades de tratamento através da Teoria Cognitivo-Comportamental, apresentando produções de aproximadamente dos últimos quinze anos de fontes como Scielo, PePSIC, artigos e livros. Para esta compreensão, pesquisei por fontes que me apresentassem comprovações (científicas e estatísticas) de que o transtorno existe, de suas incidências, de como é possível tratar e como é possível enfrentar o diagnóstico e as dificuldades do dia a dia. No decorrer dessa monografia conceituarei o que é o TDAH, sua etiologia, as consequências dos sintomas, identificar as possibilidades de tratamento para controle dos mesmos na abordagem Cognitivo Comportamental, além de especificar as comorbidades na criança, no adolescente, e no adulto. 9 2. O TDAH Dados da Associação Americana de Psicologia (APA) apontam que o TDAH atinge de 3% a 7% da população. Seu tratamento surgiu e é aplicado há quase um século, apesar de só há poucas décadas receber a atenção necessária para com o fato desta patologia persistir até a vida adulta. A partir desses dados, sabe-se que com bases estatísticas, aproximadamente 67% das crianças diagnosticadas permanecem com os sintomas até a vida adulta, tornando-se então um fator que interfere em diversos aspectos da vida, como por exemplo, profissional, afetivo, social e econômico (LOPES, BANDEIRA E NASCIMENTO, 2005). De acordo com Louzã Neto (2010), existem as chamadas comorbidades, que são ocorrências simultâneas de dois ou mais transtornos mentais apresentados pela mesma pessoa. Porém, o importante nisso não é a quantidade, mas sim a frequência e a maneira com que essas comorbidades afetam a vida do indivíduo com TDAH. No caso do transtorno em adultos, as comorbidades mais frequentes são transtorno de ansiedade, transtorno do humor, transtorno da personalidade, transtorno desafiador de oposição, que caracteriza-se por um padrão negativo, desafiador e hostil do comportamento, além do uso abusivo de substâncias (como álcool e cigarro). Além disso, Sena e Souza (2008) apontam que o necessário não é apenas uma pesquisa e um diagnóstico, é importante estabelecer um diálogo com a sociedade. O pesquisador pode e deve contribuir orientando e proporcionando treinamento para aqueles que interferem e acompanham diretamente a vida daquela pessoa com TDAH, como, por exemplo, pais, professores e/ou cônjuges. Sempre considerando que estes não possuem conhecimento necessário (profissional) e nem são apropriados para dominar um diagnóstico, mas que participam como importante ferramenta no auxílio do diagnóstico. A pesquisa psicológica também pode contribuir em alto grau para a abordagem do transtorno, é importante que o profissional refine suas habilidades tanto metodológicas como a da validação dos instrumentos. Tendo as habilidades bem dominadas as chances de resultados mais corretos são maiores. As primeiras descrições médicas detalhadas a respeito do TDAH surgiram a partir dos estudos do pediatra inglês George Frederick Still (1868-1941). Sua descrição foi realizada a partir de condições psíquicas anormais observadas em crianças e publicadas no jornal inglês Lancet em 1902. Foram realizadas três conferências onde Still expôs suas observações acerca das crianças que apresentavam “defeito permanente 10 ou temporário do controle moral” e associava esse “defeito” a distúrbios cerebrais. De acordo com Louzã Neto (2010), dentre as crianças pesquisadas, parte delas apresentavam transtornos mentais leves (inclusive deficiência mental), porém a outra parte apresentava apenas um prejuízo na inteligência. À medida que o tempo foi passando e para que se tornasse possível acompanhar os resultados das pesquisas o TDAH recebeu diferentes denominações como lesão cerebral mínima, síndrome hipercinética e disfunção cerebral mínima. Porém foi observado que tais denominações não eram válidas, pois não era o suficiente para ser detectada em exames radiológicos e não eram tão graves quanto os problemas neurológicos, como por exemplo, tumores cerebrais (NOVARTIS, 2015a). Acerca do primeiro tratamento do TDAH, o mesmo surgiu com o médico Charles Bradley (1902-1979) em 1937, quando descreveu o uso de anfetaminas e seu efeito terapêutico no controle de distúrbios de comportamento em crianças. Já na década de 1950 surgiu o Metilfenidato, conhecido como Ritalina, com o químico Leandro Panizzon (1907-2003), que inicialmente já fora sintetizado em 1944 e utilizado de maneira sistemática em crianças. Somente na década de 1970 que o Metilfenidato começou a ser usado em adultos (LOUZÃ NETO, 2010). O TDAH, de acordo com a Novartis (2015a) compromete principalmente a região frontal do cérebro e de seu funcionamento, responsável pelas funções executivas (FEs). Estas funções executivas são conhecidas como a elaboração do raciocínio abstrato e dos objetivos, planejamento de tarefas, resolução de problemas, fluência e memória operacional, inibição de comportamentos, autocontrole, automonitoramento, flexibilidade mental, iniciativa, criatividade, antecipação, formação de conceitos, controle da atenção, regulação de comportamentos e manutenção de esforço sustentado. Das várias áreas do cérebro entrelaçadas com o transtorno, uma das principais é o córtex pré-frontal, cuja função é de concentração e atenção. Por exemplo, para alguém com TDAH, prestar atenção em um só estímulo, é algo que requer constantemente um filtro para os estímulos ao redor, ou seja, se essa região está comprometida, esse adulto tende a se tornar mais desatento e impulsivo, e no caso de uma criança ou de um adolescente, tende a se tornar mais hiperativa (NOVARTIS, 2015a). Destaca-se também que as FEs são de extrema importância para a aprendizagem, por permitir o processamento e a integração de informações selecionadas e os processos relativos à memória, como por exemplo, estratégias de memorização na programação de respostas comportamentais e motoras. Além dessas dificuldades encontradas no campo 11 da aprendizagem, uma criança diagnosticada pode também apresentar dificuldades de entender o que lhe é falado/pedido, ou apresentar dificuldade de se expressar de forma clara. Nesse caso, a criança que não consegue compreender de maneira adequada o que foi dito/pedido, ou ter dificuldade de se expressar pode ter seu meio social, comportamental e de aprendizagem afetados. Há evidências também de quecrianças que apresentam tais dificuldades têm maior índice de apresentar fala desorganizada e/ou má articulação da mesma (NOVARTIS, 2015a). Dados da Novartis (2015a) apontam que o TDAH tratando-se de um transtorno multifatorial e com total interação entre fatores como, genéticos, neuroquímicos e ambientais, determinam o conjunto de características responsáveis por identificar uma pessoa. Ou seja, o fator genético denominado como fenótipo é de grande influência no surgimento do TDAH, pois estudos apontam que a relação da genética com o transtorno é tão alta quanto a de pais altos terem filhos altos, dessa maneira, pode se dizer que é concreto que o TDAH é genético. Porém, ainda não se sabe qual o gene responsável por essa vulnerabilidade. Até agora os genes mais estudados foram os dos sistemas da noradrenalina e da dopamina, neurotransmissores responsáveis pela transmissão das informações entre os neurônios. E a respeito dos fatores ambientais, o que tem sido mais associado ao aumento do risco de a criança desenvolver o TDAH é o abuso de nicotina e álcool durante a gestação. Sabe-se que além do transtorno atingir de 3% a 7% da população e em média 67% das crianças diagnosticadas continuarem apresentando os sintomas até a vida adulta, a incidência do transtorno é maior em homens. Aproximadamente nove casos em homens para um caso em mulher, que na maioria das vezes apresentam o tipo predominantemente desatento. Mas ainda não há uma explicação definitiva para tal estatística (LOPES, NASCIMENTO E BANDEIRA, 2005). A respeito de um aspecto epidemiológico, Louzã Neto (2010) destaca que especificamente no Brasil, parece que não há diferenças significativas nas taxas de prevalência do TDAH. Por exemplo, em Porto Alegre (RS) avaliaram-se um grupo de 484 crianças da 1ª série do Ensino Fundamental, onde duas taxas de prevalência foram obtidas: 18% a partir de critérios adotados do DSM-III-R e 3,5% a partir de fatores globais, como avaliações comportamentais, psicométricas, e exame neurológico evolutivo. Foram realizadas também em Porto Alegre outras avaliações com 1013 adolescentes de 12 a 14 anos, onde obtiveram taxa de prevalência de 5,8% dentro de 18 critérios do DSM-IV relativo ao TDAH, e avaliação psiquiátrica para os adolescentes 12 que obtiveram triagem positiva para o transtorno. Em uma amostra mais recente realizada no Rio de Janeiro com estudantes de uma escola, foi identificada uma taxa de prevalência de 8,6%. Em decorrência da metodologia utilizada e também dos instrumentos específicos, as possibilidades de variações nas taxas são pequenas, como por exemplo, a partir dos critérios do DSM-IV, ou das opções de incluir avaliações neuropsicológicas e neuroevolutivas no diagnóstico (LOUZÃ NETO, 2010). Para Louzã Neto (2010) sobre a diferença nas taxas de prevalência do TDAH entre crianças, adolescentes e adultos, o que a justificaria seria a evidência dos sintomas, pois nas crianças e nos adolescentes o sintoma mais comum, a hiperatividade no caso, são mais perceptíveis e mais notados pelos pais, professores, familiares, as pessoas que lidam diretamente com aquela pessoa com TDAH. Além disso, sabe-se que apesar de existirem semelhanças entre as características de comportamento entre crianças, adolescentes e adultos, também existem inúmeras distinções. Como por exemplo, a diminuição em índices globais da hiperatividade em adultos. A respeito dessas distinções Lopes, Nascimento e Bandeira (2005), dizem que em decorrência disso deve haver uma adaptação dos critérios (segundo o DSM-IV) para a avaliação do transtorno em adultos considerando que os mais importantes são a história da infância do indivíduo. Pois quando estes critérios são consistentes com o transtorno, com o fato de ser um adulto, e também com o fato do nível de hiperatividade e concentração diminuírem, trazem também estes outros critérios: labilidade afetiva, temperamento quente, inabilidade para completar tarefas e desorganização, acentuada intolerância e impulsividade. O TDAH ainda nos dias de hoje é considerado um tabu por parte da sociedade (tanto por leigos quanto por profissionais de diversas áreas). Colocando os desafios encontrados em termos para falar de pesquisa sobre o assunto, é relevante apontar alguns fatores que influenciam diretamente nos esforços investigativos e científicos. De oito pesquisas nacionais que foram detectadas, somente duas realizaram avaliações com crianças de escolas particular. Neste caso é importante firmar que as escolas públicas costumam ser mais acessíveis e disponíveis para coleta de dados (SENA E SOUZA, 2008). Além das dificuldades para encontrar estatísticas, há também o problema de diagnósticos não feitos. De acordo com Sena e Souza (2008) muitos desses diagnósticos não feitos são em decorrência de influências do nível socioeconômico que dificultam o 13 processo como um todo. Portanto torna-se indispensável o papel da família tanto para identificar o desencadeamento dos sintomas, quanto para acompanhamento e aumento dos sintomas (quando houver), a fim de proporcionar melhor qualidade de vida para o indivíduo com TDAH. Outros aspectos relevantes e indispensáveis, apontados por Sena e Souza (2008) é quanto aos instrumentos utilizados, pois sabe-se que não há apenas um que seja capaz de diagnosticar o transtorno sozinho. Torna-se importante utilizar medidas corretas acerca das propriedades psicométricas disponíveis (tanto as propriedades que ainda estão somente em pesquisa quanto as que já são comercializadas), o tamanho e a origem das amostras, os itens escolhidos, a fidedignidade e a concorrência. Tais cuidados e esclarecimentos não são apenas do âmbito da ética, são também contribuições e uma garantia quanto ao progresso do diagnóstico e do tratamento, atendendo melhor a demanda exigida. 2.1. Como o sintoma afeta o comportamento A Organização Mundial da Saúde (OMS) compreende de que maneira o sintoma pode afetar o comportamento usando a definição de Qualidade de Vida (QOL). Grupo criado pela própria OMS. Explica que a maneira com que o indivíduo compreende sua posição na vida em relação ao meio que vive, a cultura em que está inserido e seus valores relaciona-se com suas expectativas de vida, preocupações e padrões. Portanto este conceito está amplamente envolvido com diversas dimensões, como autonomia, estado psicológico, relações sociais e profissionais, crenças pessoais, sociais e pensamentos automáticos. Dessa maneira, entende-se que ter prejuízos na sua qualidade de vida pode interferir e até mudar um diagnóstico mais preciso. A qualidade de vida no adulto com TDAH sofre quedas em muitas áreas de sua vida, como por exemplo: 1. Ambiente social: muitas diversidades afetam não só esta área em específico, afeta a vida como um todo. 2. Físico: A presença do TDAH aumenta a possibilidade de acidentes e também descuidos com a saúde. 3. Formação acadêmica: há um aumento na probabilidade de o indivíduo trocar várias vezes de curso, e por isso não concluir sua formação. 4. Relacionamentos: costumam durar menos e a troca de parceiro também tende a ser maior/frequente. 14 5. Socialização: tende a ser atribuído como irresponsável pelos outros e a afastar amigos e conhecidos. Isso se dá devido à fluidez desses relacionamentos. Como auxílio para identificar a QOL em um indivíduo com TDAH e para a compreender mais a fundo existem questionários que são bastante utilizados. Como por exemplo, o Instrumento de Avaliação de Qualidade de Vida (WHOQOL) que visa fazer um mapeamento multidimensional, envolvendo os domínios abaixo para avaliá-los: 1. Físico, como por exemplo, dor, energia do indivíduo, fadiga, sono 2. Aspecto psicológico 3. Independência (qual o nível que o indivíduo tem)4. Relações: sociais, pessoais, profissionais, que englobam suporte/apoio social e atividades sexuais 5. Ambiente em que está inserido 6. Espiritualidade, crenças ou religião a que o indivíduo acredita. Além do WHOQOL há também o Questionário de Qualidade de Vida em Adultos (Adult Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder Quality-of-life Scale – AAQOL). Sua escala é dividida em subescalas (quatro no total) que referem-se à produtividade, perspectivas de vida, relacionamentos e saúde psicológica que são apresentadas pelo indivíduo (LOUZÃ NETO, 2010). A definição do WHOQOL de qualidade de vida descrita anteriormente mostra que há uma variedade de aspectos a serem satisfeitos para que o indivíduo apresente QOL. É a amplitude das diversas manifestações da síndrome disexecutiva do TDAH que permite que muitas áreas sejam prejudicadas simultaneamente, fazendo com que o transtorno seja um poderoso redutor da QOL (LOUZÃ NETO, 2010, p. 268). De acordo com a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA), mais precisamente com Ghigiarelli (2016), devido ao TDAH ter sido considerado como um transtorno que acometia só crianças e apenas na década de 1990 ser possível identificar que ele persiste até a vida adulta, a desatenção se tornou o principal sintoma no adulto. Além disso, comprovou-se que estes sintomas ocasionam prejuízos e estudos realizados recentemente apontam que a desregulação emocional também se tornou um sintoma muito presente, além de comum. As emoções englobam comportamento motor, expressão interpessoal, sensação física, processos de avaliação. Ou seja, a desregulação emocional é a dificuldade e/ou a inabilidade do indivíduo de lidar com diversas situações e experiências. Dessa maneira o indivíduo pode manifestar alta intensidade das emoções ou a desativação das mesmas (GHIGIARELLI, 2016). 15 Para que o indivíduo consiga controlar as emoções é necessário que ele utilize estratégias de enfrentamento quando encare situações que reaja de maneira muito intensa e/ou indesejada. “Autorregulação das emoções seria como um termostato de homeostático que regula e mantém as emoções em níveis controláveis” (ABDA, 2016). As emoções são vistas como reguladoras do comportamento e de suas interpretações, ou seja, é a importância da alteração patológica, e pode ocorrer, como por exemplo, em sensação de medo, pânico, terror e traumas, que para o indivíduo com TDAH pode impedir o processamento adequado das emoções e criar a esquiva (GHIGIARELLI, 2016). Dessa maneira para Ghigiarelli (2016), adultos com TDAH tendem a ter reações emocionais impulsivas nas situações vividas e isso ocorre exatamente por apresentarem dificuldades de autocontrole de suas reações e também dificuldades de conseguirem manejar ações direcionadas e autodirigidas que auxiliariam para os acalmar. Assim, a autorregulação é um mecanismo essencial, indispensável e ele age como um guia, um moderador da emoção e da organização da ação. Ou seja, o indivíduo apresentando dificuldade para inibir as emoções teria baixa tolerância à frustração, seria mais impaciente e teria também baixo controle cognitivo. Outro fator que contribui para a desregulação emocional é que adultos com TDAH, tendem a perder o interesse pelas coisas mais facilmente, e com isso precisam constantemente de novas atividades para gerarem novos estímulos. Então essa perda de interesse os leva a uma sensação de incapacidade em manter energia suficiente para manter algo por um tempo maior, que se associa também com a inquietação que já é proveniente do transtorno. Dessa maneira, têm o costume de alterar e mudar os planos frequentemente e se estes envolvem terceiros, costumam não consultá-los antes de realizar a mudança, o que acaba trazendo conflitos. Por apresentarem esse comportamento constantemente, muitas vezes deixam para avaliar suas ações após realizá-las (GHIGIARELLI, 2016). O fluxograma abaixo, representa bem a maneira com que o TDAH afeta no comportamento do indivíduo. 16 Fluxograma 1 – Modelo cognitivo-comportamental do TDAH Fonte: LOUZÃ NETO, 2010, p. 312 O prejuízo funcional provém da dificuldade da pessoa de manejar estratégias compensatórias e assim, de dar conta daquilo que o transtorno o limita, que seriam os sentimentos, as crenças, pensamentos, alterações neuropsiquiátricas, vivências gerais. Já as dificuldades ligadas a organização e planejamento lidam com a capacidade de lógica, o que deixa de lado a imaginação para conseguir finalizar atividades que parecem impossíveis. Isso é o que geralmente leva o indivíduo com TDAH a procrastinar, se distrair e evitar aquela atividade, pensando ser incapaz de realizá-la, tornando-se ansioso (LOUZÃ NETO, 2010). Ou seja, estes sentimentos gerados por ansiedade, sensação de incapacidade e de eficácia afetam a qualidade de vida do indivíduo com TDAH. E como mostrado a qualidade de vida está totalmente ligada ao processo de desenvolvimento do ser humano e com a saúde pública. Não adianta ter saúde mental e física se o indivíduo não estiver em sintonia com ele próprio e com tudo ao seu redor. Se ele não consegue ter controle dessas áreas de sua vida, não poderá controlar como reage diante das situações que ocorrem nelas. 2.2. O diagnóstico Atualmente os manuais de classificação mais usados são o Manual do Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (DSM) quarta edição da Associação 17 Prejuízos centrais Atenção Inibição Impulsividade História de Falhas Tarefas incompletas Problemas de relacionamento Falhas em utilizar estratégias compensatórias Organização Planejamento Manejo da procrastinação, evitação e distração Pensamentos e crenças negativas Auto avaliação negativa Baixa autoestima Alterações de humor Depressão Raiva Ansiedade Culpa Prejuízo funcional Psiquiátrica Americana e a Classificação Internacional de Doenças (CID) décima edição da Organização Mundial da Saúde (OMS). Para Novartis (2015a), a respeito dos manuais é importante frisar que o diagnóstico não se trata do fim do tratamento e sim de seu início, além de que isso é muitas vezes levantado a respeito do questionamento dos professores quanto aos manuais de classificação criarem estigmas e rotulações aos pacientes. A lista de sintomas para o diagnóstico do TDAH de acordo com DSM-IV e segundo Novartis (2015a) se consiste em identificar: Ou a presença de seis (ou mais) sintomas de desatenção persistiram pelo período mínimo de seis meses, em grau mal adaptativo e inconsistente com nível de desenvolvimento, ou a presença de seis (ou mais) dos seguintes sintomas de hiperatividade-impulsividade, por, no mínimo, seis meses, em um grau mal adaptativo e inconsistente com o desenvolvimento; Alguns dos sintomas de desatenção ou hiperatividade-impulsividade já estavam presentes antes dos 7 anos de idade; Algum comprometimento causado pelos sintomas está presente em dois ou mais contextos (p. ex., na escola (ou trabalho e em casa); Deve haver claras evidências do comprometimento clinicamente importante no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional; Os sintomas não ocorrem exclusivamente durante o curso de um transtorno global do desenvolvimento, esquizofrenia ou outro transtorno psicótico, nem são mais bem explicados por outro transtorno mental (p. ex., transtorno do humor, transtorno de ansiedade, transtorno dissociativo ou transtorno de personalidade) (NOVARTIS, 2015a, p.13). Como auxílio desse processo há algumas ações do professor que são de extrema importância, como apresentar interesse em estudar o TDAH, prestar maior atenção e descrever as atividades e comportamentos da criança dando exemplos práticos sobre esses comportamentos, tanto para os pais quanto para os profissionais de saúde. Esse conhecimentoquanto às patologias, necessidades pedagógicas e o manejo do comportamento das crianças é fundamental na identificação precoce de sintomas e no encaminhamento para avaliação clínica. Além disso é importante também que o professor observe outras características da criança, por exemplo (NOVARTIS, 2015a): Como é o relacionamento da criança com adultos, se é receptiva ao contato, se é afetuosa, se compreende a hierarquia, se obedece às regras, se procura ajuda quando necessário; Como é o relacionamento da criança com outras crianças, se consegue brincar em grupo e obedecer às regras, se tem amigos e se os mesmos gostam dela, se briga fácil; Se suas atividades em sala são precisas, se o nível de acerto é correspondente ao dos demais colegas; Se a criança finaliza suas atividades individuais em sala de aula, se consegue 18 finalizá-las dentro do prazo determinado e/ou quando lhe é dado um tempo extra; Como é a finalização e a precisão das atividades realizadas em casa; Como é a habilidade organizacional da criança em relação aos seus materiais escolares, anotações e registros de atividades e de aula, de trabalhos e ambiente de trabalho; Quais situações costumam piorar seu desempenho e quais costumam melhorá-lo. Além disso é importante que sejam observadas outras características, como por exemplo, uma pessoa qualquer que assista a uma aula e não domine o assunto é normal que fique desatenta, mas no caso de um portador, é comum que até mesmo em assuntos que domine/goste ela não consiga focar a atenção (NOVARTIS, 2015a). O diagnóstico é único e a pessoa irá se enquadrar em uma das três formas já citadas anteriormente de acordo com os sintomas predominantes, ou seja, a nomenclatura TDAH mais a especificação: predominantemente desatento, predominantemente hiperativo-impulsivo, e predominantemente desatento/hiperativo- impulsivo) (NOVARTIS, 2015a). De acordo com essas determinações a Novartis (2015a) aponta que quando um indivíduo preenche os critérios de desatenção do DSM-IV, por exemplo, mesmo que apresente um comportamento tranquilo, o correto a dizer é que a pessoa tem TDAH mais sua predominância. Portanto é incorreto dizer apenas que a pessoa tem Distúrbio de Déficit de Atenção (DDA) ou Transtorno de Déficit de Atenção (TDA). O DSM-IV e o CID-10 não possuem diferenças nos critérios diagnósticos, ou seja, independentemente da idade ou sexo, os critérios são os mesmos. No caso de os sintomas prevalecerem até a idade adulta, estes geralmente se modificam ao longo do tempo. Por exemplo, na adolescência há o risco aumentado de pacientes se envolverem em situações de risco, como dirigir em alta velocidade, de maneira imprudente e quando os sintomas não são tratados os riscos têm aumentado para o abuso e dependência química de drogas e álcool, além de dificuldades em alcançar, cumprir objetivos e compromissos. No caso específico de adultos com TDAH, quando não se tratam há relatos de apresentar sensação de inquietude, dificuldade na organização de atividades diárias e de se lembrarem de compromissos dentro do prazo (NOVARTIS, 2015a). É importante frisar que apesar de o transtorno se iniciar na infância algumas 19 pessoas só são diagnosticadas na vida adulta ou na adolescência e quando entrevistadas na avaliação revelam que os sintomas existem desde a infância/adolescência. Muitas vezes quem tem TDAH passa a infância e a adolescência enfrentando dificuldades, e contornando-as com esforço, mas à medida que foram crescendo a necessidade de haver maior planejamento e organização inerentes à idade adulta fizeram com que as dificuldades antes enfrentadas reaparecessem (NOVARTIS, 2015a). Para a Novartis (2015b), em muitos casos a pessoa com o transtorno julga que os sintomas sofrem um aumento, quando na verdade os mesmos, que apareceram na infância, agora causam maiores dificuldades devido ao aumento das demandas do cotidiano. Dessa maneira, o surgimento de casos de depressão ou ansiedade podem causar a impressão de que “o TDAH agravou”, pois esses quadros sintomáticos prejudicam a atenção.1 Sobre o diagnóstico específico para adultos, de acordo com o DSM-IV e o DSM- IV-TR, diferencia-se os critérios de desatenção, hiperatividade, impulsividade e os critérios gerais baseados principalmente em manifestações infantis do TDAH e que devem ocorrer com frequência, como citados abaixo (LOPES, NASCIMENTO E BANDEIRA, 2005). Critérios de desatenção a) Frequentemente não presta atenção em detalhes e comete erros por omissão em atividades escolares, de trabalho ou outras; b) Com frequência mostra dificuldade para sustentar a atenção em tarefas; c) Com frequência parece não escutar quando lhe dirigem a palavra; d) Frequentemente não segue instruções e não termina seus deveres escolares, tarefas domésticas ou deveres profissionais (não por causa de um comportamento de oposição ou por uma incapacidade de compreender as instruções); e) Com frequência tem dificuldade para organizar tarefas e atividades; f) Frequentemente evita, ojeriza ou reluta se envolver em tarefas que exijam um esforço mental constante (deveres de casa, escolares); g) Frequentemente perde coisas necessárias para suas tarefas e atividades (brinquedos tarefas escolares, lápis, livros e outros materiais); h) Facilmente é distraído por estímulos alheios à sua tarefa; i) Com frequência mostra esquecimento nas atividades diárias. Critérios de Hiperatividade a) Frequentemente agita as mãos e os pés e fica se remexendo na cadeira; b) Frequentemente abandona sua cadeira em sala de aula ou em outras situações em que se espera que permaneça sentado; c) Frequentemente escala em demasia, em situações impróprias (em adolescentes e adultos, pode se limitar a sensações subjetivas de inquietação); d) Com frequência tem dificuldade de brincar ou se envolver silenciosamente em atividades de lazer; 1 Novartis Biociências S.A. Material destinado a pacientes que receberam prescrição do medicamento (Ritalina): Da infância à fase adulta. São Paulo, 2015. Este material utilizado como referência para a presente monografia não está disponível na internet ou em livros, trata-se de um material entregue por profissionais médicos apenas a pacientes diagnosticados com o TDAH. 20 e) Está frequentemente “a mil”, ou como se estivesse “a todo vapor”; f) Frequentemente fala em demasia. Critérios de Impulsividade a) Frequentemente dá respostas precipitadas antes que tenham sido reformuladas completamente as perguntas; b) Com frequência tem dificuldade de aguardar sua vez; c) Frequentemente interrompe ou se intromete em assuntos alheios (por exemplo, em conversas ou brincadeiras). Critérios gerais a) Alguns dos sintomas de desatenção ou hiperatividade-impulsividade estavam presentes antes dos sete anos de idade; b) Presença de seis (ou mais) sintomas de desatenção e/ou seis (ou mais) sintomas de hiperatividade-impulsividade, que persistiram por pelo menos seis meses, em grau mal adaptativo, e inconsistente com seu nível de desenvolvimento; c) Algum comprometimento causado pelos sintomas está presente em dois ou mais contextos (por exemplo, na escola, no trabalho e em casa); d) Deve haver clara evidencia de prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional; e) Os sintomas não ocorrem exclusivamente durante o transcurso de outros transtornos: Transtorno Global do Desenvolvimento; Esquizofrenia ou outro Transtorno Psicótico, Transtorno do Humor, Transtorno Dissociativo, Transtorno de Ansiedade, nem são mais bem explicados por esses outros transtornos mentais. (LOPES, NASCIMENTO E BANDEIRA, 2015a, p. 66-67). Lopes, Nascimento e Bandeira (2005) apontam que existem muitas críticas sobre essas escalas, pois possuemdados que podem ser considerados insuficientes por não haver distinção entre as fases do desenvolvimento do adulto. Além dos critérios gerais, de desatenção e de hiperatividade-impulsividade de acordo com o DSM-IV e o DSM- IV-TR, há também outros oito domínios operacionalizados por Marks (2004), citado por Lopes, Nascimento e Bandeira (2005) para identificar os prejuízos com mais precisão em adultos: a) hiperatividade motora (por exemplo, inquietude e uma inabilidade para persistir em atividades sedentárias); b) déficits de atenção (por exemplo, distrabilidade e esquecimento); c) labilidade afetiva (oscilações espontâneas em humor); d) temperamento quente (episódios de irritabilidade e excitabilidade); e) reação emocional excessiva (crises interferem em resolver os problemas apropriadamente); e) desorganização (aproximação fortuita para atividades); f) impulsividade (por exemplo, interrompem os outros e mostram decisão apressada que fazem); f) características associadas (por exemplo, história de TDAH no histórico familiar) (LOPES, NASCIMENTO E BANDEIRA, 2005, p. 67). Os sintomas em adultos, apresentam-se como dificuldades em relações afetivas (por exemplo, separações/divórcios), instabilidade em diversas áreas da vida, como por exemplo, profissional e que tem alta chance de persistir ao longo da vida, apresentar baixo rendimento no trabalho e na profissão em geral, incapacidade de manter a atenção 21 concentrada por períodos longos em atividades, desorganização (falta de disciplina), incapacidade de realizar por completo o que lhe é exigido e de estabelecer rotinas. Apresentam também alto grau de esquecimento, perdas ou descuidos de tarefas e/ou objetos importantes e necessários e podem apresentar quadros de baixa autoestima, depressão, dificuldades de expressar-se com clareza, tendência a agir por impulso e de interromper os outros, dificuldades de escutar e esperar por sua vez de falar/fazer algo (LOPES, NASCIMENTO E BANDEIRA, 2005). De acordo com o modelo cognitivo-comportamental, apesar de o TDAH ter embasamento biológico, há também a presença de embasamentos cognitivos e comportamentais que afetam os sintomas. Então essa sintomatologia cognitivamente e a nível comportamental apresenta: Prejuízos centrais (neuropsiquiátricos) – indivíduos com TDAH que apresentam sintomas específicos como distração, impulsividade, desorganização, e dificuldade de acompanhar pensamentos e conversas podem ter impedidos o aprendizado ou o uso efetivo de habilidades de enfrentamento. Esses sintomas trazem um sofrimento crônico desde a infância, que os impede de desenvolver estratégias de enfrentamento efetivas. Capacidade de enfrentamento – Estratégias de enfrentamento pouco efetivas ou ausentes podem levar a falhas ou à realização parcial de tarefas. Os pacientes com TDAH tendem a manter esse padrão disfuncional nas situações que enfrentam diariamente. Pensamentos automáticos e crenças negativas e disfuncionais – devido a um histórico de falhas crônicas, os pacientes desenvolvem crenças negativas acerca de si próprios, daí surgindo pensamentos automáticos mal-adaptados, disfuncionais ou negativos. De forma retroalimentadora, as próprias crenças e pensamentos disfuncionais podem causar evitação ou distração. Evitação – Pensamentos e crenças negativos podem provocar problemas de humor e exacerbar a evitação. Os pacientes com TDAH, quando confrontados com problemas, podem ter piora da atenção e da expressão do comportamento, evitando enfrentar as tarefas ou desafios cognitivos até o final. Muitos apresentam alterações de humor (ansiedade, raiva, tristeza, melancolia, culpa) decorrentes da sensação de frustração por tarefas inacabadas ou mal-acabadas e da sensação de ser fraudulento (LOUZÃ NETO, 2010, p, 311). Usualmente, após o diagnóstico, são feitos tratamentos farmacológicos, apesar de que para crianças e adolescentes essa forma de tratamento ainda seja nova, assim como a presença da psiquiatria da infância e da adolescência. Há também escassez de ensaios clínicos feitos com placebo e boa parte das informações obtidas sobre esse tipo de tratamento é derivada de estudos feitos com adultos. Apenas o uso sobre o que se conhece do uso de estimulantes se torna uma exceção. De acordo com Louzã Neto (2010) são esses estimulantes as principais escolhas para tratamento do TDAH. É importante destacar que dentre os estimulantes, o metilfenidato é o único aprovado no 22 Brasil. Ele já mostrou ser eficaz e seguro em mais de 200 ensaios clínicos realizados com rigorosa metodologia. Os principais efeitos adversos que o metilfenidato pode causar é a falta de apetite, irritabilidade, insônia, dor de cabeça e dor abdominal. No caso do paciente não se adaptar bem ao metilfenidato, há também outras opções farmacológicas, como por exemplo, antidepressivos tricíclicos, clonidina, bupropiona, atomoxetina e modafinil, no entanto esses farmacológicos não são aprovados no Brasil (NOVARTIS, 2015a). Além do uso de medicamentos farmacológicos, Novartis (2015a), frisa que é importante também, além de garantir mais eficácia, envolver múltiplas abordagens, como intervenções psicoeducacionais (junto a família, o paciente e a escola), intervenções psicoterapêuticas, psicofarmacológicas, psicopedagógicas e reabilitação neuropsicológica. 23 3. TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL: TCC A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) apareceu no final da década de 1960, porém, apenas na década de 1970 foi reconhecida e obteve seus primeiros escritos sobre a modificação a nível cognitivo-comportamental. E veio em decorrência de diversos fatores, que são: a) insatisfação em relação ao modelo interventivo, que era rigorosamente comportamental e com embasamento em paradigmas como o de estímulo-resposta (E- R). Uma prática terapêutica tendo como base apenas modelos de condicionamento não era suficiente para maior entendimento acerca dos problemas ligados à emoção que despertavam nos indivíduos a vontade de buscar tratamento. Além de que estudos mostravam outros métodos para mudança de comportamento que não fossem embasados apenas nas contingências de reforçamento manifesto. Bandura (1969, 2008) empregou o conceito de autoeficácia para mostrar que a expectativa da própria capacidade para realizar uma tarefa e obter resultados positivos é mais determinante da ocorrência do comportamento do que apenas a consequência deste (reforçamento) (FALCONE, OLIVEIRA, 2012, p. 18). b) rejeição quanto aos modelos psicodinâmicos a respeito de questionamentos sobre sua eficácia. Pois, os primeiros registros de pesquisas para avaliar a eficácia dos modelos psicodinâmicos foram realizados por Hans Eysenck, psicólogo alemão, em 1952 no trabalho The effects of psychotherapy: an evaluation (Os efeitos da psicoterapia: uma avaliação). Neste trabalho, Eysenck não obteve sucesso sobre a psicoterapia psicanalítica ser mais efetiva que a remissão espontânea, que se trata de uma melhora produzida sem um tratamento específico. Além disso, outros autores, como Aaron Beck e Albert Ellis que traziam uma bagagem psicodinâmica mostraram que há discordâncias filosóficas em muitos princípios básicos que compõe este modelo. Então, a partir disso, em 1956 quando Beck procurava validar o modelo psicanalítico da depressão, ele passou a ter dúvidas quanto a validação desse modelo. Notou que a proposição da raiva retrorefletida nas abordagens psicodinâmicas não se sustentava, e identificou também outros dados que o influenciou a desconfiar mais do modelo psicanalítico. Então passou a usar as teorias cognitivas para compreender e tratar melhor a depressão. Além de Beck, Ellis também se mostrou insatisfeito com os modelos psicodinâmicos, e esta rejeição deveu-sea falta de evidências para validar sua eficácia como uma abordagem 24 para tratamento (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). c) desenvolvimento das ciências acerca da cognição. Para maior compreensão da ansiedade e da depressão, a psicologia no geral auxiliou muito e contou também com resultados positivos de pesquisas e da criação de conceitos da psicologia cognitiva experimental. Por exemplo, o modelo de processamento da informação passou a ser utilizado na mediação cognitiva da ansiedade e pesquisas mostraram que o processo da ansiedade tinha componentes cognitivos presentes (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). De acordo com Falcone e Oliveira (2012), a TCC foi a abordagem que mais cresceu nos últimos vinte anos e isso aumentou sua popularidade. Contou e conta com a participação de diversos autores, e de diferentes teorias entre si. Por exemplo, Beck e Ellis contribuíram com um modelo psicanalítico, Goldfried, Meichenbaum e Mahoney com a abordagem comportamental, ou seja, nota-se que naturalmente esta abordagem compartilha de diferentes princípios teóricos e fundamentais. E essas diferenças estão principalmente na atuação das emoções e das cognições. Na terapia cognitiva trazida por Beck, por exemplo, e na racional emotivo-comportamental de Ellis, ambos dão ênfases às cognições como àquelas que conduzem o comportamento e as emoções, apesar de que as últimas também influenciem as primeiras. Porém, outros autores que trabalham com a terapia cognitiva, embasada no construtivismo, por exemplo, apoiam que as emoções são mais importantes no comportamento. A premissa básica da TCC está relacionada à afirmação de que um processo interno e oculto de cognição influencia as emoções e comportamentos de uma pessoa. Um mesmo evento pode ser interpretado por diferentes indivíduos como agradável, ameaçador ou hostil. A depender dessa interpretação, um indivíduo poderá se sentir satisfeito, amedrontado, enraivecido ou deprimido, e consequentemente, se comportar de forma espontânea, retraída ou agressiva (FALCONE E OLIVEIRA, 2012, p. 22). Devido à existência de vários modelos dentro da abordagem cognitivo- comportamental, alguns autores preferiram classificá-los de acordo com suas origens, princípios teóricos, filosóficos e suas práticas clínicas. Esta classificação serviu de embasamento para um estudo brasileiro realizado por Caro Gabalda, que identificou estes três modelos: reestruturação cognitiva, cognitivos-comportamentais e cognitivo- construtivistas (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). Especificamente sobre cada modelo, para Falcone e Oliveira (2012) o primeiro modelo, trazido por Beck, trata da reestruturação cognitiva, que está centrada na crença (concepção que o indivíduo tem de si mesmo, do mundo e do futuro), na avaliação dessa racionalidade. Propõe então que a maneira com que indivíduo interpreta os 25 acontecimentos externos influencia na sua reação emocional, e o indivíduo deve passar a encarar os acontecimentos positivamente, de forma realista e prática. Sua terapia foca em estabelecer estratégias para modificar atividades negativas no processamento da informação que estão presentes nos transtornos psicológicos. Já os modelos cognitivo- comportamentais surgiram através das terapias comportamentais que focavam nas estratégias para solução de problemas e que são sustentados por pressupostos teóricos com treinamento comportamental. E o último modelo, cognitivo-construtivistas, trazidos por Guidano e Liotti, Mahonhey e Neimeyer, colocam que o ser humano é proativo em suas experiências e que seus conhecimentos interpessoais são evolutivos e também proativos. Essa visão construtivista conceitua a cognição como algo que vai além da interpretação interna que o indivíduo tem do mundo externo. Além disso, os modelos citados possuem diversos aspectos em comum, como: (a) atribuição dos transtornos emocionais a disfunções no processamento cognitivo; (b) foco nos problemas específicos e na mudança da cognição para que ocorra a mudança do afeto; (c) a terapia é de tempo limitado ou mais reduzido que as outras modalidades de psicoterapia; (d) o tratamento possui um estilo educativo (FALCONE E OLIVEIRA, 2012, p. 24). Para Falcone e Oliveira (2012), devido ao crescimento da TCC, recentemente surgiu outra abordagem que foi criada por Jeffrey Young e é conhecida como terapia do esquema. Esta abordagem também compartilha dos modelos acima citados, e usa um modelo conceitual em que a relação terapêutica é ativa e proativa na mudança, além de focar a emoção e as experiências desenvolvimentais de vinculação no entendimento da formação e da manutenção desses esquemas. Para Falcone e Oliveira (2012), autores como Gazzaniga e Heatherton aproximadamente no ano de 2005, apontaram a TCC como a abordagem mais eficaz para tratamentos de transtorno da personalidade, transtorno da ansiedade (no caso, desta ser uma comorbidade mais presente em adultos com TDAH) e também para transtorno do humor. Além disso, seguem abaixo alguns atributos fundamentais para a prática da TCC e que também influenciam na sua eficácia. a) Caráter diretivo: a TCC foca na mudança, assim o terapeuta tem o papel de ori- entar o processo terapêutico a partir de proposição de hipóteses, possibilitando que o cliente tenha coragem de realizar autodescobertas e também de enfrentar situações complicadas. Porém, a escolha do terapeuta por essa demanda pode gerar resistência da parte do cliente, e exigir habilidades clínicas interpessoais 26 durante o processo para que evite a desistência do cliente, apesar de a resistência também servir como oportunidade de tanto o terapeuta quanto o cliente conse- guirem informações importantes, e também informações sobre os conflitos. b) Estilo colaborativo: O cliente deve ter participação ativa no processo terapêuti- co, pois assim obtém efeitos mais positivos no tratamento. O terapeuta através dos comportamentos, crenças, emoções, história de vida atual e história pessoal do cliente, além de seus conhecimentos teóricos conceituará unicamente aquele caso, enquanto o cliente participará ativamente dessa criação, oferecendo novas informações, e podendo concordar ou discordar das hipóteses dadas pelo tera- peuta. Este trabalho em conjunto contribui muito na integração de crenças que o cliente tem acerca de suas emoções e padrões comportamentais (características) que se originam e às vezes mantém os problemas. c) Psicoeducação: Este atributo é um dos mais importantes, atua a partir do desen- volvimento de habilidades do cliente acerca de seu enfrentamento. Então, o cli- ente deve desenvolver capacidades de reconhecer seus padrões cognitivos, com- portamentais, emocionais que mantêm os problemas e modificá-los. Ou seja, ele deve aprender a lidar com situações difíceis, demandas (sejam do presente ou do futuro), a ser seu próprio terapeuta. Porém isso só se torna possível se o terapeu- ta passar adequadamente as orientações necessárias para o cliente sobre isso e sobre seus problemas. Com o tempo o cliente se torna experiente, aprimora seu processo de identificar os comportamentos, as crenças, as emoções, as conse- quências de suas ações, de encontrar solução para os problemas e conhecer ma- neiras diferentes de entender situações que são desafiadoras. Além de que este estilo se torna um recurso psicoeducacional a cada reflexão, insight ou conflito que o cliente leve para a sessão. d) Natureza breve da terapia: Na TCC existem protocolos que são usados para avaliar sua eficácia e este processo utiliza um período curto de tratamento, que varia entre doze e vinte sessões e testa se os resultados obtidos têm relação com a intervenção utilizada e não com fatores que são externos ao tratamento. Mas, devido ao aumento da demanda por essa abordagem, a clínica da cognitivo-com- portamental está presente em diversos lugares, como emclínicas privadas, am- bulatoriais, terciarias e de cuidados especiais e de programas comunitários, fa- zendo então com que a duração do processo terapêutico, sua frequência e o tem- po das sessões possam ser diminuídos ou aumentados. Além disso, o tempo da 27 sessão também pode variar pois dependem do problema apresentado pelo clien- te, das habilidades tanto do terapeuta quanto do cliente, do tempo que o cliente tem disponível para o tratamento e de sua situação financeira (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). A Terapia Cognitiva (TC), termo genérico para Terapia Cognitivo-Comporta- mental (TCC), a partir dos atributos fundamentais citados anteriormente, conta com princípios básicos, que como listados abaixo, torna mais fácil o seu entendimento: Princípio 1: Se baseia em formular de maneira continuada o desenvolvimento do cliente e também de seus problemas cognitivos. Princípio 2: Para um bom processo terapêutico, necessita de uma transferência e de uma contratransferência segura. Princípio 3: Enfatiza e necessita de uma participação e de uma colaboração ativa do cliente. Princípio 4: É focada em metas e em problemas. Princípio 5: Focaliza inicialmente o presente. Princípio 6: É também voltada para a educação, pois tem o intuito de ensinar o cliente e ser seu próprio terapeuta e também o ensina para prevenção de recaídas. Princípio 7: É um processo terapêutico com um número de sessões delimitadas. Porém, quando há a necessidade, este número pode ser reorganizado. Princípio 8: As sessões são estruturadas. Princípio 9: Ensina o cliente a identificar seus pensamentos e crenças (disfuncionais e negativos) e também a avaliá-los. Princípio 10: Possui grande variedade de técnicas para auxiliar na mudança de sentimentos, comportamentos e humores. A TCC, usa o conceito de “biopsicossocial” para determinar e compreender os fenômenos relativos a psicologia humana, e também se constitui com uma abordagem que trata dos fatores cognitivos da psicopatologia e cada indivíduo atribui significados a acontecimentos, pessoas, sentimentos e demais aspectos, e baseado nisso se comportam de determinada maneira construindo hipóteses sobre o futuro e sobre sua identidade. Então, adota como objeto de estudo a natureza e a função de questões cognitivas e o processamento de informações na qual atribuímos significados às coisas (BAHLS E NAVOLAR, 2004). Para Bahls e Navolar (2004) durante o processo terapêutico, busca-se explorar os níveis de desorganização a partir dos pensamentos automáticos, que são aqueles que 28 surgem momentos específicos e são ligados a mudanças negativas no humor, até que se alcance o sistema de crenças do paciente. Tais crenças, de acordo com Wenzel, Brown e Beck (2010), são divididas entre central, que é aquela concepção que a pessoa tem de si, do futuro e /ou do mundo e também são responsáveis por direcionar os pensamentos automáticos. A outra, é a crença intermediária, que são classificadas assim por ser mais fácil de identificar, de articular e também são mais fáceis de mudar. Diferente da central, que se constitui como algo mais enraizado. A partir disso então, essas crenças são avaliadas e também testadas partindo de argumentos e propostas de exercícios (podendo ser tarefas de casa) realizadas pelo paciente. Um outro objetivo da abordagem é de proporcionar correção das distorções cognitivas que geram problemas na vida do indivíduo, e assim desenvolver maneiras eficazes de lidar com eles. Em diversas situações a resposta habitual tende a ser uma característica geral de acordo com a cultura em que aquele indivíduo está inserido, porém, em outras situações esta resposta tende a ser incomuns e varia de acordo com experiências particulares do indivíduo, ou seja, em qualquer situação estas respostas são estruturas (ou organização cognitiva) (BALHS E NAVOLAR 2004). De acordo com Louzã Neto (2010), torna-se importante então que se modifique a concepção desses esquemas, e assim auxiliar o indivíduo a entender e perceber que se ela não tivesse o transtorno essas crenças seriam outras, seriam diferentes. E compreender também que os pensamentos automáticos, as crenças, as condutas e os atos podem piorar os sintomas do TDAH, agindo como reforçadores negativos. 3.1. Terapia Cognitivo-Comportamental: Avaliação O objetivo da avaliação para Falcone e Oliveira (2012) é de fazer um exame sobre como e por que a pessoa apresenta certos comportamentos que são determinados por experiências específicas e a partir das interpretações feitas. A formulação para construção do tratamento precisa seguir etapas, onde o terapeuta pode utilizar de diversos instrumentos para avaliar o que o paciente necessita. E conceituar o caso em parceria com o paciente pode ser positivo para o modelo cognitivo e na psicoeducação quanto ao diagnóstico e ao tratamento. Neste item citarei algumas das avaliações eficazes que podem ser feitas no caso do TDAH em adultos de acordo com Falcone e Oliveira (2012). A avaliação deve ser sempre revisada, pois essa permanência reavaliativa contribui para o entendimento do caso, sobre as dificuldades e conflitos do paciente, 29 além de fornecer meios para estabelecer um plano de tratamento mais concreto e eficaz. Além disso, propicia possibilidades de mudança, classifica os problemas em categorias de resposta, que são: fisiológica, emocional, comportamental e cognitiva para melhor organização (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). De acordo com as autoras Falcone e Oliveira (2012), para se obter uma avaliação bem feita, a mesma deve conter várias etapas, e entre elas há a entrevista inicial que pode ser estruturada ou livre, o que dependerá dos objetivos a serem propostos e do que o paciente trouxer para a entrevista. E além disso, é importante também que outras informações sejam levantadas, usualmente a partir de questionários e escalas. São eles(as): a) O que levou o paciente a procurar terapia. b) Gatilhos, consequências e situações dos problemas. c) Reações apresentadas pelo paciente ao apresentar os sintomas. d) Padrões (atuais) de enfrentamento e o que faz com o que paciente evite tais situações. e) Déficits nas suas habilidades ou falta de conhecimento para saber lidar com situações. f) Preocupações que o cliente tem com a família, suporte social e problemas interpessoais. g) Problemas pessoais diversos que o cliente considera ser relevante. h) Históricos anteriores (de outros tratamentos, se houver) (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). Além do questionamento levantado dessa maneira pelo terapeuta, há também outras formas de avaliação como: Questionário SCL-90-R (Symptom Check-List): Muito utilizado em processos terapêuticos. Constituído por noventa afirmativas, em que o paciente possui cinco alternativas de resposta; nunca, um pouco, moderadamente, frequentemente e extremamente. E essas respostas são divididas em escalas, nove especificamente: somatização, obsessão-compulsão, sensibilidade interpessoal, depressão, ansiedade, hostilidade, ansiedade fóbica, ideação paranoide e distúrbio afetivo, além de três índices globais, que são: severidade global, sintomas positivos estressantes e sintomas positivos (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). Escalas de Beck (Medidas de autorrelato): Possui quatro escalas mais importantes; Inventário de Depressão de Beck (BDI), Inventário de Ansiedade de Beck (BAI), 30 Escala de desesperança de Beck (BHS) e Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI) que serão especificadas mais pra frente. Esta escala foi desenvolvida entre as décadas de 1960 e 70 e foi validada no Brasil em 2001. A escala BDI ressalta os aspectos mais graves de acordo com uma avaliação dos sintomas depressivos e devido a isso necessita de intervenção imediata. E a partir disso é possívelnotar pensamentos negativos, desejos suicidas, entre outros. O inventário BAI avalia o nível de intensidade de sintomas da ansiedade, e assim se torna mais ativa a participação do paciente, pois ele também ajuda a identificar seus problemas e a criar meios de solucioná-los. Já a escala BHS, avalia o nível de pessimismo do paciente, ou seja, dimensiona as expectativas negativas futuras. E no caso de pacientes já depressivos, esta escala se torna indispensável, pois contém informações importantes acerca das crenças disfuncionais que podem causar impacto quanto ao tratamento. E a escala BSI se referencia a diversos itens sobre desejos e razões de viver e morrer, de suicídio, de quanto tempo essa ideia permanece e qual a probabilidade de isso se tornar uma tentativa real. Deve- se deixar claro que esta escala não substitui a avaliação clínica do risco do paciente cometer suicídio, BSI pode auxiliar e dar mais informações acerca do quadro clínico (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). YSQ (Young Schema Questionnaire): Medidas de crenças disfuncionais, ótimo auxílio para medir o quão eficaz podem ser intervenções específicas que proporcionarão as mudanças desejadas. Pode ser utilizado no começo ou no fim do processo terapêutico. Porém se o objetivo do terapeuta é encontrar padrões específicos sobre as crenças do cliente, o uso de uma escala é mais eficiente, pois elas detalham mais o problema, são mais confiáveis, apesar de necessitarem de mais tempo para aplicação e pontuação (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). […] Na medida em que o terapeuta consegue identificar determinadas crenças, deve ficar alerta para a ativação destas durante a sessão. Ao investigar os esquemas iniciais desadaptativos (EIDs), é importante também focar em esquemas centrais para trabalhar o processo de mudança (FALCONE E OLIVEIRA, 2012, p. 48). IECPA (Inventário de Expectativas e Crenças Pessoais acerca do Álcool): É de fácil aplicação, usado como autorrelato e que pode ser utilizado para cinco finalidades clínico assistenciais e também para a área de pesquisa. Para a pesquisa, é importante, pois mostra o quanto é necessária a avaliação de expectativas pessoais acerca do uso de álcool para construção de intervenções terapêuticas, prevenções de recaídas e não só para compreender o consumo e sua dependência (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). 31 IHS (Inventário de Habilidades Sociais): Através de situações interpessoais do dia a dia, este inventário colhe amostras desse repertório para identificar as habilidades sociais do paciente e também seus déficits. Os resultados obtidos podem ser utilizados para intervenções preventivas e treinamento de habilidades. Realizando uma avaliação completa, com o uso do IHS o terapeuta tem a oportunidade de selecionar técnicas que se encaixem melhor às necessidades demandadas pelo paciente a fim de direcionar o tratamento de maneira mais correta (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). Automonitoramento: Esta avaliação mede a capacidade do paciente perceber suas ações, seus efeitos, e maneiras de melhorar pensamentos e comportamentos. Refere-se também ao reconhecimento do paciente quanto a tendências cognitivas, reações emocionais, erros técnicos para que se torne possível autocorrigir e desenvolver a relação com o terapeuta. A motivação, atenção, curiosidade, dentre outros, são fatores importantes para o automonitoramento, além do aspecto colaborativo do paciente e pode ser utilizado em qualquer momento do processo terapêutico. Outro fator que deve-se destacar, é a importância de avaliar o humor, pois assim avalia-se a progressão do paciente além de o terapeuta perceber problemas que o paciente relatou de forma não verbal (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). […] Nas primeiras sessões é importante que o paciente possa distinguir entre situações, pensamentos, emoções e comportamentos. No automonitoramento o registro das emoções é necessário, no qual devem constar especificamente as situações, as emoções e intensidade destas, para facilitar as relações entre sentimentos e pensamentos apresentados (FALCONE E OLIVEIRA, 2012, p. 52). Avaliação neuropsicológica: Antes de iniciar uma técnica, ou questionário no processo terapêutico, o terapeuta deve garantir que o paciente está ciente dos instrumentos que serão utilizados. Funções cognitivas como, por exemplo, atenção, capacidade de abstração, concentração, seletividade de estímulos, flexibilidade de controle mental, planejamento, memória operacional e autocontrole podem ser avaliadas de diversas maneiras. Esta avaliação analisa a relação entre cérebro e comportamento, principalmente disfunções cognitivas que estão associadas ao Sistema Nervoso Central (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). Medidas fisiológicas: É uma avaliação importante, pois medem possíveis fatores fisiológicos em relação a sintomas psicológicos. Os sintomas fisiológicos interferem diretamente nos sintomas psicológicos. Por exemplo, um terapeuta cujo paciente queixa de insônia, torna-se importante identificar se aquele sintoma é uma causa ou uma 32 consequência associada a outros sintomas (FALCONE E OLIVEIRA, 2012). Além das escalas e avaliações acima citadas, há também testes projetivos psicológicos que também se mostraram eficazes para o diagnóstico do TDAH em adultos, seguem alguns deles. Teste projetivo Rorschach: Conhecido como a prova de Rorschach, foi desenvolvido por Hermann Rorschach em 1921. Consiste-se em 10 lâminas com borrões de tinta que seguem determinadas características como proporção, angularidade, luminosidade, equilíbrio espacial, cores e pregnância formal. Estas características, mentais, compõem um complexo de representações envolvendo ideias ou afetos que mobilizam a memória de trabalho. Sua aplicação é feita individualmente e as lâminas são apresentadas uma por vez, solicitando que o examinando diga o que acredita enxergar nos borrões. A partir das hipóteses levantadas pelo examinando através de suas respostas, suas funções psíquicas de percepção, atenção, julgamento crítico, simbolização e linguagem são colocadas à prova. Ao mesmo tempo que essas funções psíquicas são executadas para a avaliação das hipóteses, os processos psíquicos afetivo-emocionais, motores-conativos e os cognitivos participam da formulação da resposta final. Ou seja, as respostas do Rorschach revelam o status da representação da realidade que cada indivíduo tem, trazem dados a respeito de desenvolvimento psíquico, funções e sistemas cerebrais, recursos intelectuais envolvidos na construção das diferentes imagens, articulações intrapsíquicas e natureza das relações interpessoais (SOCIEDADE RORSCHACH DE SÃO PAULO). Teste de Apercepção Temática (TAT): Trata-se de uma técnica projetiva, desenvolvida por Morgan e Murray em 1935 para avaliar a dinâmica das relações interpessoais. A sua forma mais utilizada atualmente, publicada em 1943, consiste-se em uma série de 31 quadros que retratam situações sociais e relações interpessoais. Na sua aplicação, o examinador seleciona de 10 a 12 quadros que tenham maior chance de fornecer informações sobre o examinando. Os quadros escolhidos são apresentados ao examinando, e ele deve contar uma história sobre o que está acontecendo em cada um deles. Essas histórias são interpretadas em função das relações do examinando com figuras como de autoridade, suas necessidades das instâncias do Id, Ego e Superego e também em relação às pessoas conhecidas do examinando (ambos os sexos). Para esse teste existem diversos métodos de interpretação dos resultados, Murray defende o de necessidade e pressão, teoria que diz respeito à abordagem que inclui forças conscientes e inconscientes, a influência do passado, presentee futuro e o impacto dos fatores 33 fisiológicos e sociológicos. Além desse método, há também o defendido por Bellak, que recomenda a interpretação em função das catorze seguintes categorias: tema principal, herói principal, atitudes com as figuras parentais, figuras introduzidas, objetos introduzidos, objetos omitidos, atribuição de culpa, conflitos significativos, punição por crime, atitude com o herói, sinais de inibição (agressão, sexo, entre outros), desfecho padrão, padrão de satisfação de necessidade e enredo (TRIPICCHIO, 2008). Matrizes Progressivas de Raven (Escala geral): Este teste desenvolvido por Raven em 1936, trata-se da avaliação da capacidade imediata para observar e pensar com clareza, aferir o desenvolvimento intelectual, a capacidade de aprendizagem e também a deficiência mental. Questões de múltipla escolha são apresentadas ao examinando através de uma matriz de figuras que seguem um padrão lógico. Parte da sequência é deixada em branco para que o indivíduo seja estimulado a completar com a figura correta (CAMPOS, 2010). Teste de Brown (W50): Trata-se de uma modificação do Teste de Levene (1960), conhecido como teste de W50, procedimento utilizado como técnica de comparação de variâncias e médias, quando estas suposições não são satisfeitas (BANGA, FOX, 2013). 3.2. Algumas possibilidades de tratamento psicológico pela TCC O indivíduo deve ser motivado a mudar. Pacientes com TDAH apresentam dificuldade para compreender que a medicação funciona como um estimulante para que haja mudança. No tratamento, o uso do medicamento geralmente é a primeira escolha, porém existem pacientes que não apresentam resposta à medicação, ou não a aceitam ou que não apresentam diminuição dos sintomas. É então nessas situações que se associa a TCC. O medicamento tem a ação facilitadora do acesso à cognição, mas, não oferece estratégias e habilidades ao paciente para enfrentamento. Já a TCC ajuda na mudança, oferece melhor manejo cognitivo, que dará a oportunidade de modificar tais esquemas pessoais (LOUZÃ NETO, 2010). A TCC, no caso do TDAH em adultos, oferece uma estrutura para o compreender e para isso elabora questões, que tornam possível iniciar a formulação de um caso. Algumas dessas questões são: qual o diagnóstico, quais são seus problemas atuais, como se desenvolveram e se mantiveram, quais pensamentos (automáticos, negativos), crenças e reações (fisiológicas, emocionais e comportamentais) se associam e interferem na maneira do adulto enfrentar situações complicadas, enfrentar sua vida no geral (social, pessoal, profissional) (BECK, 1997). 34 De acordo com Beck (1997), o terapeuta levanta hipóteses sobre como o paciente desenvolveu aquela desordem psicológica, contando com alguns aspectos como: as aprendizagens e experiências mais antigas que contribuíram para aqueles problemas apresentados, as crenças (subjacentes, como atitudes, regras, etc.) e os pensamentos apresentados pelo paciente, como ele lidou com tais crenças, com os mecanismos cognitivos, comportamentais e afetivos e quais foram os fatores estressantes que contribuíram para aquele(s) problema(s) psicológicos e que o atrapalharam a tentar resolvê-los. O instrumento utilizado baseia-se na maneira com que as emoções e os comportamentos influenciam nas percepções e na vida do indivíduo. Não é apenas uma situação que determinará o que as pessoas sentem, mas sim a maneira como elas interpretam as mesmas. “O terapeuta cognitivo está particularmente interessado no nível de pensamento que opera simultaneamente com o nível mais óbvio e superficial de pensamento” (BECK, 1997, p, 29). Em síntese, a relação terapêutica promove oportunidades de crescimento pessoal, tanto para o cliente quanto para o terapeuta. Entretanto, para que isso ocorra, é necessário que o segundo seja capaz de reconhecer (e trabalhar com) a contratransferência na terapia (FALCONE E OLIVEIRA, 2012, p. 32- 33). O processo como um todo se divide em quatro momentos, sendo eles: Agenda da sessão, pois é importante que se mantenha um foco estruturado no tratamento, lembrando que na maioria das vezes a pessoa se distrai facilmente. Monitoramento do progresso, semanalmente a evolução do tratamento e também dos sintomas devem ser revisados. Além de atentar-se para o sucesso obtido em cima de um pensamento ou crença negativa. Revisão da tarefa de casa, que é um importante recurso onde o terapeuta deve incentivar o paciente a realizar, pois dessa maneira complementará de maneira positiva o tratamento. É bastante comum os pacientes apresentarem dificuldades em realizá-las, então se torna importante este incentivo (LOUZÃ NETO, 2010). Término do processo, em que as duas últimas sessões serão para falar sobre este encerramento, ou seja, os pensamentos automáticos em relação à alta deverão ser avaliados e este momento também é recompensador para o cliente, pois ele é parabenizado por todo o trabalho feito, pela conclusão do mesmo, por ter conseguido mudar e será também orientado a continuar com o que aprendeu e 35 praticou durante todo esse tempo. Além disso, de acordo com a necessidade demandada, o terapeuta pode combinar com o cliente, sessões de reforço e de manutenção, ou em caso de crises. Analisando de maneira breve o início do processo terapêutico de acordo com a TCC, vê se a importância deste acompanhamento para o portador do TDAH. A partir disso, cada um interpretará os eventos de maneiras diferentes, e além disso, existem também as diferenças entre os modelos teóricos da Cognitivo-Comportamental. O tratamento proporciona melhor qualidade de vida, aumento da autoestima, aumento do autocontrole, além de proporcionar meios de lidar com suas crenças, pensamentos negativos, dificuldades e problemas enfrentados no dia a dia (LOUZÃ NETO, 2010). O modelo cognitivo-comportamental do TDAH de acordo com a TCC, mostra que qualquer acontecimento gera pensamentos automáticos, e esses pensamentos desencadeiam sentimentos, comportamentos, reações fisiológicas. A pessoa com TDAH, assim como qualquer outro indivíduo, também apresenta crenças, que são suas ideias, autoconceitos modelados e adquiridos ao longo da vida, e de seu desenvolvimento. Estas são entendidas como algo que a constitui, como seu caráter, mas que essas crenças apareceram devido ao transtorno. A TCC no tratamento do TDAH, utiliza, por exemplo a psicoeducação, solução de problemas, treinamento de habilidades e reestruturação cognitiva. Suas metas possibilitam e têm como objetivo que a pessoa compreenda o transtorno, seus sintomas, o que caracteriza o desenvolvimento desde a infância até a vida adulta. Conseguindo entender o porquê de esses sintomas estarem presente na idade adulta (LOUZÃ NETO, 2010). De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), tem-se uma demanda alta dos profissionais quanto à prática de tratamentos que sejam realmente eficazes e que sejam de curto prazo em relação a problemas de saúde mental. Dessa maneira então, a TCC já se destacou muito e vem se destacando mais como abordagem que atende melhor a essa demanda, e principalmente por dar mais atenção aos resultados dos procedimentos clínicos realizados empiricamente, o que torna tal tratamento psicológico o preferido para problemas como depressão, ansiedade, transtornos da personalidade, dores crônicas, sofrimento em relacionamentos, entre outros. 3.3. A eficácia do tratamento através da TCC: Casos clínicos Caso clínico 1: Como já citado anteriormente nessa monografia, tenho o TDAH 36 (predominantemente desatenta) e devido a esse fator, decidi contribuir com o meu caso clínico para esse estudo. A cliente L no início da TCC tinha a idade de 22 anos, solteira e cursava Psicologia.