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Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil MÓDULO: CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DO EDUCADOR DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS AUTORIA: CASTORINA DO NASCIMENTO CALENZANI Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 2 Módulo de: Construção da Identidade do Educador de Educação de Jovens e Adultos Autoria: Castorina do Nascimento Calenzani Primeira edição: 2007 Todos os direitos desta edição reservados à ESAB – ESCOLA SUPERIOR ABERTA DO BRASIL LTDA http://www.esab.edu.br Av. Santa Leopoldina, nº 840/07 Bairro Itaparica – Vila Velha, ES CEP: 29102-040 Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 3 OBJETIVO GERAL Fornecer subsídios para a reflexão sobre o educador de jovens e adultos – sua construção identitária e seu compromisso social. EMENTA As relações entre sociedade/educação/escola. A prática pedagógica escolar enquanto prática social específica. Competências e habilidades requeridas para o ato pedagógico. As relações fundamentais do processo de trabalho docente: sujeito/objeto/construção de conhecimento; teoria/prática; conteúdo/forma; ensino/aprendizagem; professor/aluno; aluno/aluno. A organização da dinâmica da prática pedagógica: o processo do planejamento e a formação continuada. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 4 SUMÁRIO UNIDADE 1 .............................................................................................................................. 7 Formação de professores ..................................................................................................... 7 UNIDADE 2 ............................................................................................................................ 13 A docência na EJA e a legislação educacional brasileira ................................................... 13 UNIDADE 3 ............................................................................................................................ 21 Reflexões teóricas ............................................................................................................... 21 UNIDADE 4 ............................................................................................................................ 26 Resultados emergentes ...................................................................................................... 26 UNIDADE 5 ............................................................................................................................ 30 Características do ensino contemporâneo .......................................................................... 30 UNIDADE 6 ............................................................................................................................ 34 Os sujeitos-professores da EJA .......................................................................................... 34 UNIDADE 7 ............................................................................................................................ 41 A Lei e as Inclusões ............................................................................................................ 41 UNIDADE 8 ............................................................................................................................ 49 Saberes necessários aos professores da EJA .................................................................... 49 UNIDADE 9 ............................................................................................................................ 56 Paradigmas do professor .................................................................................................... 56 UNIDADE 10 .......................................................................................................................... 61 Modelos e práticas pedagógicas ......................................................................................... 61 UNIDADE 11 .......................................................................................................................... 65 Os desafios da formação do docente da EJA ..................................................................... 65 UNIDADE 12 .......................................................................................................................... 80 Trabalho pedagógico .......................................................................................................... 80 UNIDADE 13 .......................................................................................................................... 85 Formação Docente .............................................................................................................. 85 UNIDADE 14 .......................................................................................................................... 91 Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 5 Compreendendo o conceito de educação popular .............................................................. 91 UNIDADE 15 .......................................................................................................................... 98 Um pouco de história .......................................................................................................... 98 UNIDADE 16 ........................................................................................................................ 103 A infantilização como regra: experiências vividas e trabalhos escolares .......................... 103 UNIDADE 17 ........................................................................................................................ 107 Fragmentando o mundo: os jovens e adultos do ensino regular e os currículos ............... 107 UNIDADE 18 ........................................................................................................................ 115 Entendendo os conteúdos como meio e para uma vida mais plena ................................. 115 UNIDADE 19 ........................................................................................................................ 120 O planejamento do (a) professor (a) ................................................................................. 120 UNIDADE 20 ........................................................................................................................ 125 A organização dos conteúdos ........................................................................................... 125 UNIDADE 21 ........................................................................................................................ 131 O planejamento do(a) professor(a) e o uso de livro didático ............................................. 131 UNIDADE 22 ........................................................................................................................ 135 Para construir o projeto pedagógico.................................................................................. 135 UNIDADE 23 ........................................................................................................................ 140 Trabalhos colaborativos na formação de professores da educação de jovens e adultos.. 140 UNIDADE 24 ........................................................................................................................ 147 A formação continuada como desenvolvimento profissional na EJA ................................ 147 UNIDADE 25 ........................................................................................................................ 153 Ruptura com antigas práticas ............................................................................................ 153 UNIDADE 26 ........................................................................................................................159 Desenvolvimento da escola .............................................................................................. 159 UNIDADE 27 ........................................................................................................................ 166 Andragogia - a educação de adultos ................................................................................. 166 UNIDADE 28 ........................................................................................................................ 173 Andragogia - a educação de adultos ................................................................................. 173 UNIDADE 29 ........................................................................................................................ 177 Andragogia - a educação de adultos ................................................................................. 177 Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 6 UNIDADE 30 ........................................................................................................................ 182 O lugar do professor: sentido próprio de sua existência ................................................... 182 GLOSSÁRIO ........................................................................................................................ 188 BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................... 190 Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 7 UNIDADE 1 Objetivo: Ampliar a compreensão sobre o papel do professor. Formação de professores O professor É inquestionável o papel primordial do professor na qualidade da educação das crianças, jovens e adultos que frequentam escolas, pois sobre ele está diretamente colocada a responsabilidade de ensinar, e é isso o que dele se espera. A nós, cabe reconhecer o fundamental papel da educação no desenvolvimento social, cultural e econômico de nosso país e garantir que com este entendimento se atue; é isso o que se espera de nós, sociedade. É neste contexto que devemos pensar a formação de professores, pois não há cursos de capacitação que resolvam nossos problemas e nos permitam superar a situação atual se não houver compromisso e envolvimento de todos com a educação. Ensinar é tarefa complexa e para exercê-la é preciso que se tenha conhecimento e habilidade para compartilhá-lo de maneira positiva, fazendo com que os alunos possam aprender. Aprender significa adquirir propriedade sobre conceitos, de maneira contextualizada, estabelecendo relações e construindo autonomia, de maneira a habilitar-se para a busca, aquisição e uso de novos conhecimentos ao longo de toda a vida. Para os professores, acessar conteúdos num mundo onde a geração e circulação do conhecimento são intensas implica um contínuo contato com conceitos e a constante possibilidade de reflexão sobre a prática, para que possam construir e utilizar dinâmicas que favoreçam o aprendizado, além de saber identificar dificuldades e promover inserções que Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 8 ajudem os alunos a superar desafios. Daí a importância de uma boa formação, não só inicial, como também continuada, que pode disponibilizar essas oportunidades aos professores. Além da habilidade em lidar com a complexa equação que envolve o processo de ensino- aprendizagem de conteúdos e a construção do conhecimento, desempenhar positivamente a função de professor pressupõe comprometimento e envolvimento com a tarefa de ensinar e com seus alunos. Essas facetas implicam lidar com aspectos que permeiam as relações entre as pessoas – empatia, simpatia, desconsideração, estima, desconfiança, confiança, autoridade, desrespeito, respeito, crenças e valores, entre outros que apenas quem vive o cotidiano da sala de aula pode com propriedade relatar. Identificar e atrair profissionais com vocação e conhecimento necessários ao bom desempenho da tarefa do professor exige comprometimento de todo o setor educacional, considerando a valorização da profissão, condições de trabalho, qualidade de vida e uma remuneração que corresponda à importância da função. Além disso, para reter e desenvolver bons profissionais, é preciso estimulá-los, dar-lhes condições de aperfeiçoamento, avaliá-los e premiá-los por desempenho. Nesse sentido, a avaliação deve ser continuada e seus resultados utilizados como apoio ao desenvolvimento profissional e não como instrumento de constrangimento. A educação A educação é instrumento fundamental para rompermos a perpetuação da injustiça social. O Brasil só poderá superar a inaceitável situação de desigualdade na distribuição de renda se romper com a desigualdade de acesso às oportunidades. Nesse sentido, o acesso à educação de qualidade é condicionante para o acesso às oportunidades. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 9 Além do impacto positivo sobre a distribuição de renda, sabemos que a melhoria da educação eleva a produtividade da economia, ampliando, consequentemente, a competitividade externa de um país, fator fundamental no atual contexto de globalização. Países reconhecidos pela sua competitividade investem pesadamente na educação, para que no futuro seu diferencial competitivo não esteja apoiado em mão-de-obra barata. Promover o desenvolvimento sustentável para o Brasil pressupõe voltar esforços para a melhoria da nossa educação. O perfil do professor e da sua atuação envolve fatores – conhecimento, habilidade, comprometimento e envolvimento – que são também fundamentais ao se pensar a educação. Há hoje bons estudos nacionais e internacionais que possibilitam a nosso acesso a conhecimentos relevantes nessa área. Por exemplo, sabe-se que para atuar de maneira efetiva na qualidade, há que se considerar muito além do conhecimento e do envolvimento do professor. Infraestrutura, ambiente da escola, recursos educacionais, perfil do diretor, gestão, participação da comunidade e inserção do poder público são alguns dos pontos que incidem sobre os resultados e que precisam ser também pensados, trabalhados e disponibilizados de maneira integrada. É direito da sociedade o acesso à educação de qualidade e dever do Estado ofertá-la. Para efetivamente exigir e garantir este direito é preciso que a sociedade tenha conhecimento e compreensão sobre o que isso significa, sobre o que pode fazer a diferença. Assim, é fundamental o acesso às informações relacionadas ao tema, com linguagens e meios acessíveis a todos. O conhecimento produzido precisa ser compartilhado, esmiuçado, experimentado, disseminado, relacionado e aprofundado. Teremos bons resultados se a sociedade entender qual o papel da cada um, o que exigir, o que cobrar e como ajudar. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 10 O retrato da situação atual comprova que ainda nos falta habilidade para atuar positivamente na educação. Conhecer outras experiências pode nos ajudar a entender o “como fazer”. Diversos países conquistam avanços significativos desenvolvendo ações na educação. Precisamos conhecer o que e como fazem, quais os resultados, como superam os desafios e verificar se há possibilidade de ajustar as suas experiências às nossas características e diversidades. Há também positivas experiências no Brasil que podem ensinar a outros de nós; é preciso organizar e disseminar o conhecimento que elas produzem e, se possível, adaptá-las para que sejam “replicadas”. Só com comprometimento será possível promover mudanças na educação. Os avanços quantitativos observados na educação nacional nos últimos dez anos refletem um certo comprometimento, porém os índices sobre a situação de escolarização e aprendizagem comprovam que é preciso muito mais. O compromisso urgente é o esforço depermanência dos alunos nas escolas por um período além dos oito anos de escolarização obrigatória do Ensino Fundamental, com a garantia da oferta de educação de qualidade. Estabelecer a Educação Básica como prioridade é uma boa maneira de demonstrar comprometimento, especialmente se for explicitado na distribuição dos recursos públicos. O Brasil gasta hoje aproximadamente 5% do PIB em educação, o que é significativo se comparado inclusive a outros países cujo desempenho educacional é superior ao nosso. Entretanto, 60% dos recursos federais para educação são gastos com o Ensino Superior, sobre o qual o investimento por aluno é dez vezes maior se comparado ao investimento por aluno na Educação Básica. Uma boa formação universitária certamente é necessária se pretendermos competir e nos destacar positivamente nos diferentes mercados. Sabemos que para tal, investimentos no Ensino Superior são fundamentais. Entretanto, é preciso superar os problemas da educação na sua base, inclusive para garantir qualidade também na formação superior. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 11 Para isso, é importante considerar inclusive o apoio das instituições do Ensino Superior na formação dos professores da Educação Básica. Com honrosas e exemplares exceções, a participação das universidades no desenvolvimento da Educação Básica ainda não reflete todo o potencial de contribuição que efetivamente podem dar sobre esse tema. Para garantir que as mudanças gerem impacto efetivo na qualidade da educação, é essencial o envolvimento da sociedade, capaz de pressionar para a atuação dos governos. A pressão social apenas acontece quando a sociedade conhece seus direitos, valoriza-os e passa a exigi-los. Assim, a sociedade precisa reconhecer a educação como instrumento de acesso e de desenvolvimento, tomando consciência do forte impacto que ela pode exercer na vida das pessoas. Promover um forte movimento que disponibilize informações, sensibilize, conscientize e possibilite o envolvimento dos diferentes setores nessa empreitada é responsabilidade que deve envolver empresários, artistas, intelectuais, ONG’s, veículos de comunicação e todos os que compreendem o valor da educação. Outros países estabeleceram a educação como prioridade, com o comprometimento e o envolvimento dos governos e da sociedade. Os resultados dos esforços se traduzem em desenvolvimento social, cultural e econômico. É verdade que há no Brasil, como que pairando no ar, o sentimento de que a educação de qualidade é fundamental; porém isso precisa ser traduzido, tornar-se compromisso e ações concretas. Senão, o que estamos promovendo é apenas a angústia do nosso povo, que já não consegue ver com clareza um sentido para estudar, além de estarmos piorando a auto- estima dos que atuam diretamente na educação pública e não conseguem melhorá-las por falta de instrumentos adequados. (...) Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 12 Agora é a sua vez. De posse do que você leu e refletiu nessa aula, elabore a sua definição para Educação. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 13 UNIDADE 2 Objetivo: Analisar a docência na Educação de Jovens e Adultos à luz da legislação educacional brasileira. A docência na EJA e a legislação educacional brasileira A Educação de Jovens e Adultos, modalidade de ensino da Educação Básica prevista na legislação educacional brasileira, vem para resgatar uma dívida social que o país tem com aqueles cidadãos que não tiveram acesso à escolarização na idade regular. Iniciativas mais esperançosas são necessárias serem planejadas, processo este que depende fundamentalmente dos atores nele envolvidos, que são os professores, os educadores da Educação de Jovens e Adultos. No entanto, nenhuma ação isolada é suficiente, sem respaldo de Políticas Públicas voltadas para este setor que abriga tantos cidadãos brasileiros, que precocemente se viram forçados a deixar a escola ou a ela nem tiveram acesso. O exercício da docência na Educação de Jovens e Adultos exige uma profissionalização cada vez mais qualificada para uma atividade que apresenta características especiais, representadas por ações diferenciadas, distanciadas de “modelos” tradicionais. Ser professor é atividade complexa e desafiadora que não pode mais ser exercida sem o adequado preparo. É um equívoco pensar que ser educador de classes de Jovens e Adultos é passar, apenas, por um Curso de Formação de Professores, voltado à qualificação do professor de classes ditas regulares. As demandas sociais e educacionais deste século são frutos da evolução de nossa sociedade, que muito mais é dirigida pelos grandes meios de comunicação do que por propostas governamentais, além da velocidade imprimida pelas novas tecnologias que nos levam a extremos para os quais devemos estar preparados, não só pela teoria, mas a teoria Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 14 associada à prática. A escola neste contexto não está isolada, ela faz parte deste conjunto e tem um papel social muito importante a cumprir. A principal tarefa da Educação de Jovens e Adultos, conforme previsto na Constituição Federal de outubro de 1988, artigo 208 inciso I, é garantir o acesso e a permanência ao ensino fundamental a todos, também aos jovens e adultos que não tiveram a oportunidade de estudar em idade própria. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei nº. 9.394/96, traz essa modalidade de ensino nos artigos 37 e 38, assegurando metodologias e currículos adequados às necessidades dos alunos, tanto em nível fundamental quanto em nível médio. O presente trabalho propõe-se a contribuir com a Educação de Jovens e Adultos, buscando identificar o nível de formação de um grupo de professores que atuam nessa área e, necessidades de formação continuada apontadas pelo grupo, conforme está previsto no Programa Brasil Alfabetizado e Brasil Escolarizado, previstos no Plano Nacional de Educação, lei n. 10.172 de 09 de janeiro de 2001. O estudo teve uma importância singular, pois permitiu, nesse primeiro momento, que se tivesse uma visão clara, além do nível de formação, das dificuldades e facilidades, metodologia de trabalho e expectativas dos alunos que frequentam classes de Jovens e Adultos. Retrospectiva histórica A legislação educacional no Brasil, como nação independente, tem seu início na Constituição Imperial de 1824, que apresenta no Título 8, artigo 179, inciso XXXII - "A instrução primária é gratuita a todos os cidadãos". Este preceito legal não foi honrado na Constituição seguinte, embora se propagasse o postulado de “sociedade de iguais”. Aos escravos recém-libertos, caboclos e índios restava o trabalho duro e a doutrina aprendida na oralidade e na obediência. Apesar de tudo, é preciso assinalar a indicação de Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 15 alguns direitos políticos a esses cidadãos, ainda que restritos. Às mulheres e aos analfabetos, considerados como “a sociedade dos desiguais”, esses direitos não foram alcançados. O indivíduo, sujeito de direitos civis, só se torna titular de direitos políticos se buscar a escola pública, até mesmo para se alfabetizar, e então usufruir o direito do voto. Já a Constituição Republicana de 1891 retira de seu texto a referência à gratuidade da instrução, ao mesmo tempo em que condiciona o exercício do voto à alfabetização. Esse condicionamento se justificava como forma de mobilizar os analfabetos a buscarem os cursos de primeiras letras oferecidos na época. A Constituição de 1934 dá ênfase à educação como direito de todos e reconhece também o acesso à escolarização ao aluno. O artigo 150 trata do Plano Nacional de Educação, que apresentava como norma um ensino primário integral e gratuito e de frequência obrigatória,extensivo aos adultos. Esse Plano, contudo, não chegou a ser votado devido ao golpe que instituiu o Estado Novo em nosso país. Com a Constituição de 1937, é deslocada na prática a noção de direito para ser de proteção e de controle, sendo dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar à infância e à juventude o ensino público em todos os graus, e uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais. A partir de 1940, a educação de adultos passa a ser tratada com o merecido destaque. De 1942 a 1947 foram criados vários organismos: Fundo Nacional de Ensino Primário, Serviço de Educação de Adultos e a Campanha de Educação de Adultos, além da Campanha de Educação Rural iniciada em 1952 e a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo em 1958 ( Di Pierro et al, 2001, p.59) Cadernos CEDES ( ano XXI, n-55, novembro/2001). A primeira lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei n. 4.024/61, artigo 27 diz: "O ensino é obrigatório a partir dos 7 anos e só será ministrado na língua nacional". A lei também previa que aos que iniciassem depois dessa idade, seriam formadas classes especiais ou cursos supletivos correspondentes ao seu nível de desenvolvimento. Determinava ainda, no artigo 99, que aos maiores de 16 anos seria permitida a obtenção de Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 16 Certificados de Conclusão do Curso Ginasial, mediante a prestação de Exames de Madureza e, aos maiores de 19 anos seria conferido o Certificado de Conclusão do Curso Colegial. O Serviço de Educação de Adultos funcionou regularmente em São Paulo, até os anos setenta, quando iniciaram as atividades do MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização). A reflexão pedagógica em torno do analfabetismo e suas implicações psicossociais, iniciaram em 1947. No entanto, somente a partir de 1960, Paulo Freire professava a necessidade de realizar uma educação de adultos crítica, voltada à transformação social e não apenas à adaptação da população a processos de modernização conduzidos por forças exógenas (2001). "Qualquer discriminação é imoral e lutar contra ela é um dever por mais que se reconheça a força dos condicionamentos a enfrentar (...). Saber que devo respeito à autonomia e à identidade do educando exige de mim uma prática em tudo coerente com este saber" (FREIRE, 1998, p. 67). O último dos programas de corte nacional desse ciclo, organizado pelo Ministério da Educação em 1964, foi o Programa Nacional de Alfabetização de Adultos, cujo planejamento incorporou largamente as orientações de Paulo Freire. Essa e outras experiências acabaram por desaparecer ou desestruturar-se sob a violenta repressão dos governos do ciclo militar, iniciado naquele ano. A partir de 1969 o governo federal organizou o MOBRAL, voltado a oferecer alfabetização a amplas parcelas dos adultos analfabetos nas mais variadas localidades do país. A presença maciça do Programa MOBRAL no país contribuiu para legitimar a nova ordem da política implantada em 1964. Além da legitimação interna, esta iniciativa governamental também objetivava responder a orientações emanadas de agências internacionais ligadas à Organização das Nações Unidas, (ONU) em especial a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), que desde o final da Segunda Guerra Mundial vinha propugnando o valor do combate ao analfabetismo e da universalização de Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 17 uma educação elementar comum, como estratégia de desenvolvimento socioeconômico e manutenção da paz. A lei nº. 5.692/71 (LDB) consagrara a extensão da educação básica obrigatória de quatro para oito anos, constituindo o ensino de primeiro grau e, concomitantemente, dispôs as regras para o provimento da educação supletiva, que corresponde ao ensino de jovens e adultos. Pela primeira vez, a educação voltada a esse segmento mereceu um capítulo específico na legislação educacional. Prevista na lei, ela se concretizou na possibilidade de organização do ensino nas modalidades: Cursos Supletivos, Centros de Estudos e Ensino a Distância. Além dessas modalidades, a lei nº. 5.692/71 manteve os Exames Supletivos como mecanismos de Certificação, atualizando os Exames de Madureza já existentes. Depois de um longo período de serviços prestados, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) foi extinto e a Fundação Educar assumiu esse espaço de trabalho. A Constituição Federal de 1988 determina a elaboração do Plano Nacional de Educação, integrando ações do Poder Público que conduzem à erradicação do analfabetismo. Os déficits do atendimento no Ensino Fundamental resultaram, ao longo dos anos, em um grande número de jovens e adultos que não tiveram acesso ou não lograram terminar esse nível de ensino obrigatório. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1996, apontou que entre os brasileiros com 15 anos ou mais, 15,3 milhões não completaram sequer um ano de escolaridade. Pelo atual Plano Nacional de Educação, aprovado pela lei n. 10.172, de janeiro de 2001, a taxa de analfabetismo no Brasil das pessoas de 15 anos ou mais, alcança a média de 14,7%. A Região Nordeste apresenta o índice de 28,7%, enquanto a Região Sudeste tem 8,7% e a Região Sul 8,9%. A média nacional de permanência do aluno na escola, na faixa obrigatória, é de 4 a 6 anos, dos 8 previstos. A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), lei nº. 9.394/96, trata da Educação de Jovens e Adultos, doravante EJA, nos artigos 37 e 38, como modalidade de Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 18 ensino a ser oferecida a todos os cidadãos que não tiveram acesso à educação em idade própria, conforme previsto na atual Constituição. No Brasil, a EJA foi vista como compensação e não como direito. Essa tradição foi alterada pela legislação, sendo vista, atualmente, como mecanismo de reparação e de equidade. Muito ainda resta a ser feito para que a EJA se efetive como um processo de educação permanente a serviço do cidadão. Os princípios que a norteiam, apresentados pela atual LDB, são: os diferentes tempos necessários ao processamento da aprendizagem dos jovens e adultos; a adequação e a sequência no tratamento dos currículos (tempo, abrangência, intensidade e relação entre diferentes componentes); avaliação apropriada e em períodos adequados. O Conselho Nacional de Educação, em função da regulamentação da LDB nº. 9.394/96, através do Parecer nº. 11, de maio de 2000, reconhece a EJA como uma “dívida social não reparada para com os que não tiveram acesso e nem domínio da escrita e leitura como bens sociais na escola ou fora dela (...), em que a ausência de escolarização não pode e nem deve justificar uma visão preconceituosa do analfabeto ou iletrado como inculto (...)” (Parecer n. 11/2000,CNE). As Diretrizes Nacionais para a EJA, que trata das funções, dos conceitos e da base legal foram instituídas pelo Parecer n. 11 de maio de 2000 e pela Resolução n. 01 de 05 de julho de 2000 do CNE/CEB. Considerando que esta é uma modalidade de ensino básico, nas etapas fundamental e média, é oferecida em cursos e exames, obedecendo a normas dos respectivos sistemas de ensino. No Rio Grande do Sul, o Conselho Estadual de Educação fixou as normas para oferta de EJA pelo Parecer n. 774/99 e Resolução n. 250, de 10 de novembro de 1999. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 19 As Diretrizes propostas pelo Plano Nacional de Educação, relativas à Educação de Jovens e Adultos, revelam que: "As profundas transformações que vêm ocorrendo em escala mundial, em virtude do acelerado avanço científico e tecnológico e do fenômeno da globalização, têm implicações diretas nos valores culturais, na organização das rotinas individuais, nas relações sociais, na participaçãopolítica, assim como, na reorganização do mundo do trabalho" (Plano Nacional de Educação, lei n. 10.172/01). Por outro lado, as taxas de analfabetismo acompanham os desequilíbrios regionais no Brasil, tanto no que se refere às regiões político-administrativas, como no que se refere ao corte urbano/rural, devendo por isso, os programas atenderem a essas necessidades específicas da população. Por essa razão, há de se considerar que o resgate a essa dívida educacional não poderá se limitar a atender, apenas, o equivalente às quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, devendo ser ofertado o ciclo completo de oito séries. Da mesma forma, deverá ser garantido aos que completarem o Ensino Fundamental o acesso ao Ensino Médio. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 20 Leitura e elaboração de resenha do livro O que é Educação Autor: Carlos Rodrigues Brandão Sinopse: Qual a finalidade do aprender? O sentido da educação e o surgimento da escola. Nem sempre houve escola e nem sempre ela foi do jeito que a conhecemos. Em vários momentos da história, tipos diversos de sociedades criaram diferentes caminhos para percorrer a estranha aventura de lidar com o saber e os poderes que ele carrega consigo. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 21 UNIDADE 3 Objetivo: (Cont.)Refletir a respeito do pensar de diferentes autores sobre a Educação de Jovens e Adultos. Reflexões teóricas O tema dessa unidade reflete a opinião de diferentes autores/educadores sobre a EJA, modalidade de ensino prevista na legislação educacional, que representa muito mais do que um simples processo de alfabetização. Essa modalidade atende a necessidades da comunidade onde a escola está inserida. Esta deve contemplar no seu Projeto Pedagógico a oferta, tanto do Ensino Fundamental, quanto do Ensino Médio para jovens e adultos, através de metodologias específicas, devendo considerar, na elaboração dos Planos de Estudos, as diferentes áreas do conhecimento e os aspectos da vida cidadã. Para Demo (1995), o Projeto Político Pedagógico necessita comprometer-se com o projeto de construção de uma escola formadora de cidadania emancipada. No Brasil, muitos foram os esforços para qualificar os processos educativos, principalmente a questão da alfabetização de adultos. Os movimentos como o MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), o MOVA (Movimento de Educação de Adultos), entre outros, sugiram para suprir necessidades emergentes. O programa de Alfabetização Solidária, que atua em parceria com Governo Federal, Empresas e Instituições de Ensino Superior desenvolve atividades nas regiões mais carentes do país, e dessa forma cumpre um importante papel social. Apresenta-se como proposta relevante no contexto sócio-político-educacional, atendendo a diferentes camadas populares. Para Paulo Freire, educador, autor de vários livros, criador de um método de alfabetização para adultos, a ideia de integrar a EJA à chamada Educação Popular dos anos 70, foi resgatada na década de 80-90. Segundo o autor, a dimensão global da Educação Popular contribui para a compreensão do ser humano como ser social mais pluralista, aberto à discussão democrática (FREIRE, 1998). Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 22 A universalização da educação básica, que está sendo conquistada nessa virada de milênio, e a dívida social para com todos aqueles que não tiveram acesso a um projeto de escolarização na idade regular, faz com que iniciativas mais esperançosas se aproximem do direito à educação. É preciso, no entanto, refletir sobre a questão do acesso/ingresso à escola, princípio garantido pela Constituição do Brasil, artigo 206, alínea I, bem como analisar a questão da permanência na escola. Os últimos dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) indicam que 96% das crianças em idade escolar são matriculadas, oficialmente. Então, qual será o problema que está enfrentando nossa escola, que ainda devolve muitos alunos à sociedade sem o devido preparo? Para GRASSI (1999, p.116), "...o problema está no percurso, entre a matrícula e a frequência do aluno". A escola não se adequou para atender às necessidades dos alunos. Ela é a responsável pelo sucesso do aluno. É preciso estar comprometido com a construção do conhecimento, que deve ser contextualizado. Perseguimos uma educação libertadora, democrática, em que todos são sujeitos autores de produção de conhecimento. Segundo Borges (2004), “A importância de saber ler e escrever não é apenas para que cada um possa ler um manual de instruções de forno micro-ondas, ou para que saiba trabalhar em um computador. A importância de que estamos falando é muito maior do que isso. Infinitamente maior. Estamos falando de cidadania” (2004, p.13). Pelo Parecer 774/99 do CEED/RS (Conselho Estadual de Educação do Estado do Rio Grande do Sul), a oferta da EJA deverá privilegiar tanto a aquisição de novos conhecimentos, quanto de habilidades traduzidas em competências, pois os jovens e adultos não escolarizados, suficientemente são trabalhadores inseridos no mercado formal ou informal de trabalho. Para MOLL (2000), eles sabem e fazem muitas coisas, independente da escola, pois eles são pais, mães, tios e vizinhos das crianças e dos jovens que estão na escola. Outra questão que também foi analisada e exige a nossa atenção é a questão do Professor/Educador de Jovens e Adultos. Inicialmente é preciso compreender que todo alfabetizador é necessariamente um educador. Na opinião de Barreto, citado por Gadotti e Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 23 Romão “... o alfabetizador é um educador que desenvolve sua atividade numa área específica, mas é um educador” (2000, p.79). O teórico entende que a alfabetização de adultos na construção da cidadania emancipatória favorece a construção de um sujeito cidadão, o qual, num processo de conscientização, exercita o agir político na comunidade (2000, p.79). Para o professor Mendonça (2001), da Revista Alfabetização Solidária, é preciso levar em conta: "A imagem que o alfabetizador faz do alfabetizado e vice-versa; A ideia que o alfabetizador tem de educação; O Projeto Político Pedagógico de fomento a uma nova cidadania". Ele entende que o professor é um educador, uma vez que estabelece relações metódicas, formais e sistemáticas com outros seres humanos, na qualidade de orientador e mediador do saber (2001). Na opinião de Romão (2000), "... não há como fugir de uma análise da inserção do Professor na sociedade concreta, (...). E não se trata de qualquer professor e de qualquer sociedade; trata- se do Educador de Jovens e Adultos, na sociedade brasileira, neste final de século cuja formação depende muito mais da inserção no social e no político do que numa boa reformulação dos currículos dos cursos ( 2000,p.64)". A legislação que instituiu o Ensino Supletivo em 1971, já recomendava a preparação dos docentes para as especificidades da educação na idade adulta. No entanto, embora haja um esforço de parte das instituições formadoras de professores, na realidade ainda não se atingiu o desejado e, enquanto isso, tentam-se encontrar respostas pedagógicas ao fracasso ainda presente no sistema escolar. Segundo Perrenoud, “... é preciso provocar rupturas com as tradições pedagógicas, que freqüentemente impedem que se concebam as coisas de maneira diferente" (2000, p.95). Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 24 As mudanças geram resistências, e essa percepção temos presente, pois ao longo de nossas atividades profissionais vivenciamos experiências ao atender classes de jovens e adultos em horários noturnos. Os alunos não só apresentam o cansaço normal, após um dia de trabalho, mas também as dificuldades de aprendizagem que trazem das distantesclasses que um dia frequentaram. Foi preciso muita arte para mantê-los acordados, além de oferecer-lhes inovadoras e diferenciadas propostas de trabalho que os motivassem a prosseguir nos estudos. Essas reflexões sobre as práticas auxiliam em um constante processo de aperfeiçoamento. São diálogos que reforçamos nos contatos com alunos atuais. Essa, sem dúvida é a grande experiência, que Paulo Freire assim traduziu: “Ensinar exige saber escutar”. E isso quer dizer que “Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala com ele. O educador que escuta aprende a difícil lição de transformar o seu discurso, às vezes necessário, ao aluno, em uma fala com ele” (1996, p. 113). (...) Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 25 Leia um fragmento escrito por Rubem Alves em Educação dos Sentidos. Caixa de ferramentas Resumindo: são duas, apenas duas, as tarefas da educação. Como acho que as explicações conceituais são difíceis de aprender e fáceis de esquecer, eu caminho sempre pelo caminho dos poetas, que é o caminho das imagens. Uma boa imagem é inesquecível. Assim, ao invés de explicar o que disse, vou mostrar o que disse por meio de uma imagem. O corpo carrega duas caixas. Na mão direita, mão da destreza e do trabalho, ele leva uma caixa de ferramentas. E na mão esquerda, mão do coração, ele leva uma caixa de brinquedos. [..] assim, diante da caixa de ferramentas, o professor tem de se perguntar: “Isso que estou ensinando é ferramenta para quê? De que forma pode ser usado? Em que aumenta a competência de meus alunos para viver a sua vida?” se não houver respostas, pode-se estar certo de uma coisa: ferramenta não é. Mas uma outra caixa, na mão esquerda, a mão do coração. Essa caixa está cheia de coisas que não servem para nada. Inúteis. Lá estão um livro de poemas de Cecília Meireles, a “Valsinha”, do Chico, um cheiro de jasmim, um quadro de Monet, um vento no rosto, uma sonata de Mozart, o riso de uma criança, um saco de bolas de gude... Coisas inúteis. E, no entanto, elas nos fazem sorrir. E não é para isso que se educa? Para que nossos filhos saibam sorrir. ALVES (2005, p.9- 12). Qual a escola que queremos? Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 26 UNIDADE 4 Objetivo: (Cont.)Conhecer as experiências vividas por professores de Educação de Jovens e Adultos. Resultados emergentes Utilizando a entrevista enfocada, segundo Olabuenaga e Ispizua (1989), que trata de um núcleo ou foco de interesse: uma experiência, uma situação ou ação vivida pelo grupo, recolheram-se junto aos participantes, professores de classes de Educação de Jovens e Adultos, informações sobre formação profissional, metodologias de trabalho, expectativas vividas pelos docentes, sentimentos percebidos, facilidades/dificuldades encontradas e estímulos empregados para a efetivação da ação. O objetivo, nesta etapa do trabalho, foi o de apreender sentimentos e efeitos resultantes da experiência vivida pelos professores da EJA e não o de reconstruir toda a caminhada realizada, mas expressar a forma de como foi percebida a experiência pelos entrevistados. A variedade de informações coletadas proporcionou um dos momentos de singular importância nesta ação investigativa, pois representou a garantia de um espaço para a manifestação da livre expressão e a reflexão sobre a própria ação. Dos vinte professores entrevistados, somente quatro não possuem curso superior completo. Verificou-se que todos já possuíam alguma experiência anterior na área educacional, mas nenhum caso específico de atendimento à classe de EJA. Segundo Gadotti (2000), as atividades na Educação de Jovens e Adultos são facilitadas quando o professor é do próprio meio. Ele passa a ser um mediador entre o aprendiz e a escrita, entre o sujeito e o objeto. É preciso contar com educadores que se disponham a trabalhar com esse tipo de aluno, respeitando suas condições culturais e o meio social no qual está inserido. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 27 Quanto ao item metodologias, observamos que não há clareza por parte dos entrevistados. A preocupação centrava-se em relatar atividades realizadas a partir de um enfoque globalizado, dando um novo significado à aprendizagem. Visa a valorizar as experiências adquiridas, partindo da realidade dos alunos. Apesar dos avanços ocorridos em relação à Educação de Jovens e Adultos, ainda é possível perceber que as práticas dos professores não condizem com os objetivos propostos para a EJA. Entre as atividades respondidas destacam-se: leituras, jogos, vídeos, seminários, trabalhos em grupo, músicas, aulas práticas e outras. Com o propósito de avançar na ação docente, o professor procura ampliar suas estratégias e, em sala de aula, desenvolver melhor suas práticas, tendo como norte o grupo social ao qual o aluno pertence. É exatamente o desafio de ser espaço público em que os alfabetizandos/educandos compartilham preocupações e expectativas comuns que desperte e conserve a motivação pessoal e criativa. Neste sentido, o educador como o educando estão no processo de enriquecimento e uma das expectativas é vencer dificuldades, conquistar um espaço de emprego e desenvolver o senso crítico, preparando-se para o exercício pleno da cidadania. Quando isso ocorre há satisfação e compreensão e o crescimento individual e coletivo acontece, gerando felicidade e ampliando a autoestima. O que engrandece professor e aluno é a bagagem de conhecimento que cada um traz consigo. Assim, haverá respeito, amizade, alegria, comprometimento, responsabilidade e valorização para a superação das dificuldades. Para os professores, essas não são apenas expectativas, mas metas a serem alcançadas pelo grupo. Para tornar o aprendizado atraente, o professor/educador utiliza diversas dinâmicas como, leitura de jornais, filmes, documentários, entre outras, no sentido de despertar o interesse dos alunos, satisfazendo suas curiosidades, relacionando os conteúdos à prática. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 28 Respeitando os sonhos, as frustrações, as dúvidas, os medos, os desejos dos jovens e adultos, os educadores populares têm neles um ponto de partida e não de chegada. É nessa modalidade de ensino que percebemos estar presente a filosofia do diálogo. Esta pesquisa nos mostrou que o aluno busca nessas classes algo mais do que o conteúdo livresco. Ele quer respostas para a sua vida, emprego, moradia, condições mais dignas, enfim, elevar seu nível cultural. O professor deve estar preparado para esse desafio e buscar o aperfeiçoamento em cursos, seminários, oficinas, visando ao constante crescimento profissional. Para Olabuenaga e Ispizua o grupo de professores busca o aperfeiçoamento constante, não ficando apenas, nos discursos. As respostas dadas projetam o desejo de mudar para melhorar, embora limitações ainda estejam presentes. Nestas unidades, buscamos fazer um resgate histórico-legal, além de caracterizar o professor, identificando o nível de formação, metodologias de trabalho e necessidades de aperfeiçoamento dos docentes que atuam em classes de jovens e adultos. Essa modalidade de ensino é oferecida aos que não tiveram a oportunidade de realizar estudos com sucesso em idade própria. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, promulgada em dezembro de 1996, adequou o Ensino Supletivo aos objetivos e formas de atendimento do ensino regular para crianças, adolescentes e jovens, mantendo os exames sob responsabilidade dos respectivos Sistemas de Ensino. A entrada precoce dos adolescentes das camadas mais pobres no mercado de trabalho, o aumento das exigências de instrução e o domínio de habilidades do setor produtivo provocaram uma acelerada corrida do jovem aos programas de educação, originalmente destinados à população adulta.Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 29 Estudos realizados nos mostram que a criança e o jovem não conseguem dar conta das exigências do mundo do trabalho, pois apresentam uma defasagem média de 3 anos de escolarização. Essa perda deverá ser recuperada através de propostas governamentais muito claras, com a colaboração da sociedade. Neste sentido, tendo por objetivo a criação de oportunidades de alfabetização a todos os jovens e adultos, o Governo atual definiu como uma das metas prioritárias o Programa “Brasil Alfabetizado” e em nível estadual, o Programa “Alfabetiza Rio Grande”. O educador brasileiro tem um importante papel a desempenhar nesse contexto, pois ele é o articulador, o organizador e o intelectual, que tem presente que a educação de adultos deve ser multicultural, uma educação que desenvolve o conhecimento e a integração na diversidade cultural e que é contrária à exclusão de qualquer cidadão GADOTTI (2000). Trabalhar com a diferença, especialmente quando falamos em educação, lembra diferentes idades, posições sociais e econômicas, lembra a criança com necessidades especiais entre outros. É preciso acreditar que todos têm condições de aprender e que o diálogo deve ser o princípio de um processo de construção coletiva. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 30 UNIDADE 5 Objetivo: Refletir sobre características do ensino contemporâneo. Características do ensino contemporâneo Para Miltom Santos, Rubem Alves, Gilberto Dimenstein, Paulo Freire, Cristovam Buarque, Darcy Ribeiro, Gilberto Freire, Sergio Buarque de Holanda e Joelmir Beting a educação, e todo o seu imenso repertório de processo extensivo, melhor se fará e com qualificado retorno, inclusive social, se: 1 - Começar o quanto antes, da melhor forma afetuosa, o mais cedo possível, a partir principalmente do lar, do meio familiar, dentro das múltiplas inteligências (inclusive imagéticas) e das naturais apreendências de raiz, de berço e de origem. 2 - For feita com o preparo das sensibilidades auferidas com carinho, referendada didática circunstancial e, algum conhecimento de habilidades inerentes a serem devidamente desenvolvidas (e até mesmo incentivadas) para deleite do longo caminho do ensino aprendizagem e suas tantas searas e transversais. 3 - Partir dos princípios fundamentais para os generalizados; do habitat do aluno para o universal, valorando sua bagagem de meio e clã (e sua cultura que vem junto) em todos os elencos e quesitos, como historicidades ancestrais, espaços geográficos, ciências naturais, somas e abstrações dinamizadas no próprio exemplo anímico-vivencial do aprendiz sequioso de Saber, de Ser e de poder. 4 - Partir das coisas relevantes e realizáveis, de realidades cotidianas rotineiras, adjacentes e praticadas, interdisciplinares inclusive, para o operacional, o científico, o embasamento empírico, as experiências sazonais, as trocas saudáveis, as convivências com o diferente, Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 31 mais o salutar espírito de grupo, de equipe, e de solidariedade plural-comunitária, visando sempre um contexto futurologístico de um humanismo de resultados. 5 - Se não houver sobrecarga de metas maçantes, nem de metodologias acirradas, ensinos exacerbados, lições sósias e repetidas a exaustão, mas, o fito primordial da educação propriamente dita ser gracioso como comer, dormir, brincar, respirar – curtir a vida! – sentindo-se o aluno - enquanto criança, jovem, sonhador, rebelde, ente criativo, sensível; humanizado no contexto espacial - parte integrante de uma comunidade que é elo de equilíbrio da natureza cósmica, sendo o ensino em si, uma ligação sequencial dessa evolutiva conduta paulatina e básica, necessário e útil, pois, afinal, a melhor pedagogia é o exemplo, e, estudar é uma viagem (inclusive lúdica) para o reino encantado do saber, da abstração, da fantasia, do reconhecimento da própria identidade. 6 - Se forem as aulas reflexivas, exemplares, exercitadas e instrumentalizados numa boa (e por multimídias) em todas as etapas, passo a passo, ombro a ombro; do ler para o compreender e exercitar a linguagem; do saber para o proceder e pensar a ação na paisagem: do pesquisar e conjeturar para conferir e referendar na história oral-testemunhal; do instruir-se para o Inspirar-se, inclusive enquanto Ser, enquanto humanus, enquanto alma em busca de outra alma gêmea, ou de realizações pessoais. 7 - Se o aluno-aprendiz-filho-cidadão não for constrangido nunca a fazer alguma coisa chata, desestimulante, desproposital ou mesmo acima de seu limite-estágio, nem ter situações- problemas de conflitos escolares que venham a bloquear ou confundir a sua sensibilidade exercitada, mas, ser-lhe-á permitida a troca benéfica, a partir da experiência própria de relações, equiparações de resultantes, de referenciais de percursos, pautas de minorias inclusive, principalmente ao fluído de correntezas da sua idade dinâmica, seu meio e ainda do seu estágio natural, no processo do ensino-aprendizagem como um todo, a aula como ferramenta instruídora de desenvolvimento, avaliação e prestígio. 8 - Se todas as coisas forem ensinadas com prazer (e conteúdos sábios em todos os níveis de grades democráticas) metodologias hábeis; teoria e práxis, tudo esteja racionalmente sob Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 32 o enfoque pleno dos sentidos, de inteligências emocionais e culturas históricas estimuladas, além da descoberta do alvo a ser claramente objetivado, e do aluno com o consciente senso de busca e de dever a cumprir, da devida evolução para o ser enquanto social, a alma cidadã, o espírito altivo, crítico e ético até. 9 - Se o aluno puder ver (e for-lhe facilitada essa abrangência) a utilização prática de sua matéria/conteúdo curricular, do que resultará seu projeto de aprendizagem cíclica com o cotidianizado vivencial dos diversos conhecimentos adquiridos (a partir do habitat do saber que é a escola) para um futuro melhor e mais feliz para si, para seu grupo familiar, e, ainda, para proveito da própria espécie humana socializadora e, também, costumeiramente racional, algo materialista e muito cobradora. 10 - Se tudo for usado a favor do aluno, com muita diversificação de estratégias e metodologias funcionais, sob óticas diversas e avaliações contínuas (problematizadas com inteligência em matizes das mais heterogêneas possíveis) para que o aluno mesmo possa se autoavaliar (saber se sabe) e para que, na verdade, livro aberto ao diálogo (e página de rosto a ser preenchida por sabedorias críveis) sob algum enfoque psicossomático pertinente qualquer, bem dinamizado em sala de aula, possa assim adaptar a sua consciência receptora, a sua idéia inteira, o seu canal analítico, na resultante reafirmadora de inclusões e estímulos essenciais, dentro do seu próprio processo particular de letramento, já que, a Escola, a Família e a Sociedade devem ser sempre a escada peregrina para o alto, para cima, para o sucesso, inclusive moral e de sapiência em núcleos de direitos e deveres, nos quias também prevalece o espírito humano elevado de querer participar do bolo econômico e sonhar conquistas justas. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 33 Descobrindo-me professora de jovens e adultos na experiência de alfabetização de idosos Maria de Jesus Ferreira César de Albuquerque O que significa ser professor de EJA Sermos educadores é sermos mediadores do processo de construção de cidadania dos nossos estudantes, facilitando-lhes sua humanização. Nessa perspectiva, ser professor é cooperar com o processo de humanização dos educandos. É “[...] tornar os indivíduos participantes do processo civilizatório e responsáveis por levá-lo adiante” (PIMENTA, 1999, p.23). Ser professor de EJA significa contribuircom nossos alunos para o exercício da sua cidadania. Se hoje há estudantes na referida modalidade de ensino, é porque esses não tiveram oportunidade de estudar na idade “propícia” e, consequentemente, não exerceram sua cidadania. No interior das reflexões sobre a problemática de EJA, vamos compreendendo que ser professor de adultos é ser mediatizador dos “processos e experiências de ressocialização (recognição e reinvenção)” (SOUZA, 1999, p.104), na contribuição da transformação da “realidade social e pessoal” (SOUZA, 1999, p.104). Portanto, compreendi que ressocializar significa mudar nossa forma de pensar o mundo por meio da interação social, por meio da situação pela qual estava vivenciando. Em Souza (2003, p.12), encontramos que professor é aquele que observa, reflete criticamente e reorganiza suas ações e as ações dos seus estudantes. Nesse sentido, o professor de jovens e adultos há de compreender que esta atividade [...] engloba todo o processo de aprendizagem, formal ou informal, onde as pessoas consideradas ‘adultas’ pela sociedade desenvolvem suas habilidades, enriquecem seu conhecimento e aperfeiçoam suas qualificações técnicas e profissionais, direcionando-as para a satisfação de suas necessidades e da sociedade (ibid). O professor de jovens e adultos precisa fundamentar a sua ação numa concepção de educação, cujas bases históricas cabem-lhe entender. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 34 UNIDADE 6 Objetivo: Identificar os sujeitos-professores da Educação de Jovens e Adultos. "(...) para ser educador de jovens e adultos é preciso ter coragem”. (Mariléia). Os sujeitos-professores da EJA Talvez uma das características que conforme a Educação de Jovens e Adultos como modalidade diferente do ensino regular seja a diversidade de contextos em que ela se desenvolve e a pluralidade de seus sujeitos. Com suas histórias de vida, que reúnem marcas identitárias semelhantes e ao mesmo tempo singulares, é como se esses sujeitos educandos e educadores compartilhassem, na relação pedagógica, o encontro de diversas experiências: o encontro da desigualdade de oportunidades; da negação do direito à educação e à formação; o encontro das jornadas duplas ou triplas de trabalho; o encontro do desemprego ou do subemprego; das lutas na cidade e no campo por uma educação de qualidade; e, consequentemente, o encontro da luta pela afirmação do direito na busca de construção de um projeto apropriado aos diferentes segmentos marginalizados a quem a EJA se destina. Nessa leitura aparentemente comum, feita a partir da pluralidade de cenários de atuação como escolas, empresas, associações, penitenciárias, igrejas, canteiros de obra, acampamentos e assentamentos rurais, vamos encontrando elementos que nos ajudam a compreender como os sujeitos educadores da EJA se veem e como veem seus alunos, quais as suas perspectivas sobre a assunção da profissão professor e da importância de se reconhecerem juntamente com outras e outros, que atuam na área, como educadores- educandos de pessoas jovens e adultas. Na projeção desses cenários, deparamo-nos com as múltiplas imagens ainda muito pouco conhecidas dos sujeitos-educadores de EJA, principalmente, com a ação daqueles que se constituem no contexto do campo produzindo assim, no seu "que fazer" cotidiano, um modo Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 35 de ser professor-educador de jovens e adultos. Mas, quem são esses educadores e educadoras? Em que condições atuam? Como se mobilizam e o que mobilizam para manter a motivação dos educandos para estudar? O que os leva a se envolverem com a EJA? Que práticas desenvolvem e como as exercitam? De que forma os programas de formação continuada contemplam a diversidade de ações dos diferentes atores, que jogam um papel decisivo na forma como a EJA vem se incluindo na pauta das políticas públicas? Que lugar os sujeitos-professores da EJA ocupam nas definições dessas políticas? Focalizemos algumas dessas questões tomando como referência, pela mediação da pesquisa, alguns contextos em que a EJA vem sendo produzida no campo e na cidade, por sujeitos professores-educadores que se vão constituindo na prática, por meio dos saberes que produzem e exercitam, na relação com os seus alunos e a partir dos desafios a que são levados a responder. Alguns olhares sobre os sujeitos da EJA Sem desconsiderar as referências já bastante difundidas em relação aos educadores da EJA, marcadas por aspectos como a precariedade de sua formação (Machado, 2001), pela improvisação de que quase sempre se valem, tida como uma prática desqualificada, buscamos avançar em outras análises. Deslocamos o nosso olhar para compreender os sujeitos da EJA, a partir do reconhecimento da centralidade de seus sujeitos professores-educadores, ou seja, de suas subjetividades. O sujeito é aqui entendido como aquele que se constrói na história, como um devir em interação constante com os outros contextos. É "uma organização complexa capaz também de objetivar, quer dizer de se compor, de estabelecer acordos no seio da comunidade, de produzir um imaginário comum e, portanto, de construir sua realidade" (Najmanovich, 2001, p. 94). Tomamos a referência de algumas pesquisas sobre formação que enfatizam a subjetividade, apontando o seu caráter complexo, voltado tanto para as histórias de vida Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 36 pessoal e profissional dos professores, para suas próprias experiências, seus valores, suas emoções, bem como para as experiências relativas ao seu trabalho que evidenciam tensões, dilemas do cotidiano e a forma como articulam essas experiências nas suas relações com a sociedade (Tardif, 2002). Nesse sentido, segundo Linhares (2001), temos estudado muito pouco sobre como esses sujeitos e as subjetividades desses professores vão sendo fabricados e, por sua vez, vão fabricando escolas e contribuindo para conservar ou modificar seus entornos e, no entrelaçamento de diversas relações sociais, ir intervindo nas sociedades e na história. Na tentativa de compreender a conformação desses sujeitos, consideramos um princípio básico: o da impossibilidade da formação específica desse educador, desvencilhada de uma prática educativa concreta. Ou seja, considera-se a prática como ponto de partida e de chegada de todo programa de formação. Resultados parciais de uma pesquisa exploratória e comparativa na América Latina vêm reafirmando esse princípio. "A maioria dos sujeitos educadores de EJA se formam na prática, com a enorme criatividade que nos caracteriza" (Goerne, 2000, p. 9). Ao que podemos acrescentar a ênfase de pesquisas no Brasil que afirmam a necessidade de compreensão de que a formação de professoras, segundo Alves (2002), se dá em múltiplos "espaços tempos", sendo a docência apenas uma das esferas da intrincada rede de relações em que a formação se dá, no âmbito da prática social mais ampla. Reconhecer a centralidade dos sujeitos educadores da EJA, no "que fazer" da escola da cidade e do campo, significa reafirmar algumas idéias que parecem óbvias, mas que não são tão óbvias assim, como nos advertia Paulo Freire; e que por sua vez nos impactam, dada a contundência com que nos tocam. Se voltamos o nosso olhar para os sujeitos-educadores da EJA numa escola da rede pública da região metropolitana, encontraremos ali imagens que caracterizam os sujeitos- professores da EJA que vêm se constituindo nas práticas da cidade. São trabalhadores, trabalhadoras, estudantes em situação funcional precária. Na sua grande maioria, os Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 37 sujeitos-educadores da EJA, nas redes, são mulheres, educadoras que encontram, no dia-a- dia do ser professora, evidências da desigualdade com que são tratadas. As marcas de uma inferioridade produzidasocialmente, pelo estigma da área, parece impregnar o imaginário da sociedade. É como se os sujeitos da educação de jovens e adultos, as professoras e os professores acabessem, também, por compor o contingente dos socialmente excluídos pela nossa sociedade capitalista, cujo peso na agenda política neoliberal é ínfimo. As condições precárias em que se movem para realizar o seu trabalho e a segregação a que são submetidos "fazem com que os personagens da escola noturna se vejam e sejam vistos como subsujeitos" (Neves, 1992, p. 70). No entanto, ignoramos talvez as verdadeiras razões que os levam a assumir a EJA como uma opção de trabalho, ou como um "bico", como vem sendo comumente caracterizada a atuação do professor no ensino noturno. Encontramos, no cotidiano dos professores da EJA, numa escola estadual do Rio de Janeiro, expressões dessas práticas. "(...) professores que se recusavam a se desqualificar junto com os seus salários e condições de trabalho. Recusas rebeldes expressas na indignação diante do sucateamento da escola pública e que, apesar de todos os impedimentos, inventavam novas formas de trabalhar e estar com seus alunos. Aprendiam com eles, valorizavam suas histórias de vida e se associavam aos mesmos em seus atos de rebeldia" (Neves, 1992, p. 106). Exercendo a docência na EJA, no contexto dos assentamentos do MST, no Espírito Santo, encontramos, antes de tudo, agricultores, militantes que se fazem, também, na prática, educadores. Estes reagem de forma criativa e radical contra a negação do direito à formação e à desqualificação de suas práticas. Em visita a uma das classes de alfabetização do PRONERA, no Espírito Santo, surpreendeu-nos o potencial de produção de uma professora que, em condições adversas de trabalho, foi capaz de, junto com os seus alunos, sobrepor obstáculos, mobilizar o saber da improvisação no sentido de tornar possível, de criar condições, de construir, inclusive, estrutura física para o funcionamento da sala de aula, ameaçada de interrupção. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 38 Essa educadora, ao perceber a importância e "o valor que [seus alunos] atribuíam à escola, bem como a tamanha necessidade e o desejo deles de aprender", foi capaz de mobilizar e manter a motivação dos educandos. Por meio do registro, como dispositivo pedagógico, fornece-nos pistas da leitura que faz de sua prática e da imagem que faz de si: "(...) a cada dia, eu fazia o planejamento pesquisando livros, jornais, revistas e panfletos, sempre procurando ser dinâmica e criativa, para evitar que as aulas [se] tornassem cansativas e monótonas. Para isto utilizava: música, piada, brincadeiras, dinâmicas e cartazes, tudo dentro do assunto estudado, exigindo sempre a participação dos alunos e valorizando seus conhecimentos e criatividades." Nesse contexto, além da reflexão de sua prática pedagógica, a professora exercita a metacognição (Magalhães, 2001), lançando o olhar sobre si mesma e sobre os saberes que mobiliza junto com os seus alunos, no sentido de construírem juntos uma proposta pedagógica apropriada aos anseios do grupo. Nesse exercício, fecundam-se idéias, compartilhadas com os pares-professores de outros assentamentos, que se tornam ferramentas de trabalho na fabricação de projetos que revitalizam o ânimo do grupo. "Para a minha turma o projeto ‘causos’ foi uma ótima idéia. Uma oportunidade de fazerem uma viagem ao passado. A cada dia alguém contava ‘causos’ reais, imaginários, ou histórias da vida de várias formas: escrita, oral ou dramatizada. Destas histórias produzíamos textos dentro dos quais era possível trabalhar os conteúdos. Os alunos demonstraram um grande interesse pela escola." A ação dessa professora, mais uma vez, aponta a importância do reconhecimento da centralidade dos sujeitos educadores da EJA, no seu processo de formação. O que requer de fato incorporar a compreensão de que esses professores, como os demais profissionais da educação, são sujeitos do conhecimento e possuem saberes específicos, um saber-fazer que, no cotidiano de suas práticas, vão sendo desafiados a construir, no contato com os diferentes grupos com que atuam. A multiplicidade de contextos em que se assumem demanda também que suas necessidades de formação sejam consideradas na sua Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 39 especificidade, o que requer novos saberes para lidar com a complexidade das questões com que se deparam e das temáticas que as envolvem. São sujeitos capazes de participar na construção dos programas de formação que lhes são destinados, opinando a respeito do seu conteúdo e forma. Os sujeitos-professores da EJA e os desafios da formação Podemos ainda inferir das pesquisas o que também observamos no nosso contexto: até agora, as políticas de formação orientadas por demandas conjunturais e concepções prescritivas, não têm levado em conta a escuta, as necessidades e expectativas reais dos professores, embora a retórica incite a que "estes levem em conta as necessidades e expectativas de seus alunos" (De Peretti apud Rodrigues e Esteves, 1987, p. 54). Comumente, esse olhar acaba por tratar a experiência de formação dentro de tempos e espaços limitados pelas políticas conjunturais, deixando de lado a consideração do sujeito da experiência, e da experiência de formação na percepção desses sujeitos (Larosa, 2002). Se voltarmos a ênfase para outros contextos alternativos, encontramos uma diversidade de imagens produzidas por esses sujeitos, nas práticas de educação popular, que problematizam a nossa compreensão de formação. De que forma garantir a formação inicial? Que concepção de formação pode dar conta da diversidade e complexidade do campo da EJA, em face dos múltiplos vetores que ampliam a diversidade dos sujeitos destinatários dos programas educativos (como idade, gênero, escolaridade, ocupação, as condições de vida e os interesses específicos das comunidades e dos sujeitos)? A Declaração de Hamburgo, ao ampliar a concepção de EJA, nos impõe a necessidade de considerar os sujeitos educadores e educandos da EJA na multiplicidade de contextos em que atuam, demandando por parte das políticas públicas o reconhecimento de suas heterogeneidades e a necessidade de avançar em direção a propostas que recuperem a diversidade de suas ações. Por outro lado, as exigências da crescente complexidade do mundo contemporâneo colocam novos desafios Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 40 para a formação desses educadores. Atentar para as especificidades de aprendizagem da juventude dos adultos trabalhadores e de pessoas idosas é voltar o olhar para a complexidade dos processos educativos com esses sujeitos. Para Moita (1992, p. 117), "o conhecimento dos processos de formação pertence antes de mais nada àqueles que se formam". Na especificidade da EJA, o olhar da pesquisa não pode dispensar o saber e a percepção de seus interlocutores, o voltar-se sobre si mesmos. Isso demanda daqueles que atuam na investigação-formação, fazer emergir os sentidos que cada sujeito professor-educador pode encontrar nas relações que produz nas diferentes dimensões da vida em que se forma se deforma e se transforma. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 41 UNIDADE 7 Objetivo: Acompanhar o percurso da formação dos educadores da EJA na legislação educacional. A Lei e as Inclusões A alfabetização de adultos sempre fez parte da história da educação brasileira, desde os tempos da colonização, tendo os padres jesuítas como os primeiros professores da massa popular nativa do Brasil, com o propósito de uma ação educativa missionária, junto aos povos indígenas e aos bandeirantes e, logo em seguida, aos filhos de colonos, aos negros e às mulheres. Porém, esses propósitos, além de serem catequizadores, pouco avançaramnas ações educativas, pois a concepção de cidadania como direito e dever de todos, era privilégio apenas da elite econômica. Com a expulsão dos Jesuítas, do Brasil, em 1759, acarretando, em seguida, a desorganização do sistema educacional, somente no Regime Imperial é que se encontram algumas propostas na área de educação de Jovens e Adultos. Constata-se que, em 1824, com a constituição brasileira sob fortes influências européias, formaliza-se a garantia de uma “instrução primária e gratuita para todos os cidadãos”. Mas, pouco ou quase nada foi realizado em termos de educação para todos, durante o período Imperial. Essa institucionalização só vem realmente a se firmar, como conceito de obrigatoriedade nacional, na Constituição de 1834, ficando a função de promover e regulamentar o ensino superior sob a responsabilidade da Coroa e o ensino elementar e o secundário, sob a responsabilidade das províncias. Dessa maneira, a educação da elite ficava a cargo do poder central, e a educação do povo, a cargo das províncias. Como não havia exigência de certificação de conclusão do ensino primário, para o acesso a outros níveis de escolaridade, a elite educava seus filhos em casa, com seus preceptores. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 42 Quanto ao povo, restavam algumas escolas que se restringiam à instrução elementar: ler, escrever e contar. Assim, em 1867, apenas 10% da população em idade escolar, encontravam-se matriculados (Aranha, 1996). E nesse contingente, segundo Haddad (1991), em 1890, o Brasil contava com 82% da população acima de 5 anos, analfabeta. Nas primeiras décadas do século XX, surgem os primeiros movimentos isolados de alfabetização de adultos no Brasil, mas a formação dos alfabetizadores não é inserida nas leis educacionais, ficando apenas a cargo das pessoas que, tomadas de sonhos, esperanças e utopias, acreditam que, com a sua parcela de contribuição, podem mudar um cenário renegado pelas poucas políticas educacionais existentes. Nesse panorama, cheio de precedentes e descasos, valia-se do que se tinha naquele momento para se ensinar a leitura e a escrita às pessoas analfabetas: aos chamados “professores leigos”, ou como denomina-se atualmente: os alfabetizadores, pessoas munidas de boa vontade e/ou de necessidades econômicas para sobrevivência, na grande maioria, sem a formação prevista nas leis educacionais, possuidoras de alguns saberes adquiridos na sua pouca formação escolar, seja esta nos cursos primários ou secundários. Hoje em dia, com a formação do ensino fundamental e médio e com poucas estratégias didáticas, para o exercício da docência, essas pessoas são inseridas nos afazeres educacionais, tendo como referência modelos convencionais de suas escolaridades ou abstraídos de suas antigas professoras. Paralelamente aos avanços e movimentos sociais em prol da alfabetização de adultos, aconteceu a regulamentação da EJA – Educação de Jovens e Adultos, que começou a fazer parte da legislação educacional brasileira, a partir da LDB – Lei de Diretrizes e Bases 5.692/71, de 11 de agosto de 1971, no capítulo IV, passando a mesma a ser chamada de ensino supletivo e tendo como objetivo: “Art.24 Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 43 (a) suprir a escolarização regular para os adolescentes e adultos que não a tenham seguido ou concluído na idade própria; (b) proporcionar, mediante repetida volta à escola, estudos de aperfeiçoamento ou atualização para os que tenham seguido o ensino regular no todo ou em parte”. Estabelecia a Lei: o acesso aos cursos supletivos, às pessoas de 14 anos para o 1º Grau e às pessoas de 18 a 21 anos para o 2º Grau. Sendo assim, a alfabetização de adultos ganhou uma consistência maior de dedicação, além de ser incorporada a programas mais extensivos de educação básica, de jovens e adultos, destacando-se o artigo 25: “Art. 25 – O ensino supletivo abrangerá conforme as necessidades a atender, desde a iniciação no ensino de ler, escrever e contar e a formação profissional definida em lei específica, até o estudo intensivo de disciplinas do ensino regular e a atualização de conhecimentos;” Ao reconhecer a necessidade de legalizar a Educação de Jovens e Adultos no Brasil, por meio da tal Lei vigente, ainda se deixou um vácuo no capítulo V, art. 32 da 5692/71, no que se refere à formação específica do professor: “Art. 32: O pessoal docente do ensino supletivo terá preparo adequado às características especiais desse tipo de ensino, de acordo com as normas estabelecidas pelo Conselho de Educação”. Ao deixar sob a responsabilidade dos Conselhos Educacionais a formação adequada para a modalidade do ensino da EJA, cabe ressaltar que a referência desta determinação legal ficou evidenciada nas dificuldades de encontrar o profissional adequado, ou nos descasos da grande impotência dos estados de legitimar o que era determinado. Para isso, era visível a lacuna que se abria para acoplar uma categoria de educadores denominados “professores leigos”, no capítulo VIII, art. 77, que trata das Disposições Transitórias: Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 44 “Art. 77: Quando a oferta de professores, legalmente habilitados, não bastar para atender às necessidades do ensino, permitir-se-á que lecionem, em caráter suplementar a título precário”. A título precário subentende-se, sem habilitação, sem a formação específica, sem conhecimentos metodológicos direcionados à profissão docente. O que estabelecia a Lei 5692/71 no Art. 32, com relação ao preparo dos educadores de jovens e adultos, parecia não ser cumprido pelos Conselhos Educacionais e Instituições de Ensino e, isso era reconhecido pelos pesquisadores e estudiosos em educação: a necessidade de reforma da LDB e, segundo Di Pierro, vários projetos foram enviados ao Congresso, principalmente o Projeto-Lei 1258/88, apresentado pelo Deputado Octacílio Eliseo (PSDB/MG), baseado nas sugestões de uma comunidade acadêmica, com relação à educação de jovens e adultos, para a nova LDB, cujas contribuições encontram-se nas resoluções do Grupo de Educação Popular da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, aprovadas em sua XI Reunião Anual, na qual relatava: “Considerando a tradição de voluntariado e desprofissionalização do educador de adultos e a necessidade de formação adequada deste educador, recomenda-se: que os cursos de magistério, das faculdades de Pedagogia e os programas de pós- graduação contemplem este aspecto em seus currículos; que o Sistema público de ensino garanta a profissionalização do educador de adultos, inserindo-o na carreira do magistério através de mecanismos de recrutamento e contratação semelhantes aos da educação infantil” (Reunião, 1988, p. 24 apud Di Pierro, 2000, p.110). No entanto, os descasos com a educação de jovens e adultos eram cada vez mais visíveis e partiam de alguns Ministros e Senadores, que tinham interferência direta no processo de legislação da nova LDB, que já transitava na Câmara. Então, a nova LDB, 9394/96 foi aprovada sem levar em consideração o que solicitava a categoria de educadores sobre a legislação do professor em EJA. Copyright © 2007, ESAB – Escola Superior Aberta do Brasil 45 Assim, a nova Lei de Diretrizes e Bases – LDB 9394/96, na seção V do capítulo II, artigo 37, que se refere à educação de jovens e adultos, permanece destinada “àqueles que não tiveram acesso à continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria”. No parágrafo seguinte, assegura a gratuidade, oportunidades educacionais apropriadas às características do aluno, além de estimular o acesso e a permanência do aluno-trabalhador na escola, “mediante ações integradas e complementares entre si” (§ 2º art. 3 7, seção V). Percebe-se que não houve grandes mudanças em relação à 5692/71,