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1 MATEMÁTICA - CONTEÚDOS E MÉTODOS MODO EDIÇÃO 1 Sumário NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2 PARTE 1 - A MATEMATICA: UMA CONSTRUÇÃO DA HUMANIDADE. 3 A HISTÓRIA DA MATEMÁTICA COMO ESTRATÉGIA DE APRENDIZAGEM ........................................................................................... 4 A MATEMÁTICA DO CONTEXTO E O CONTEXTO NA MATEMÁTICA 7 FIGURA 1 – Diagonal do quadrado de lado 1 ...................................... 8 O MUNDO INFANTIL: JOGOS, BRINQUEDOS E LITERATURA INFANTIL ...................................................................................................... 10 PARTE 2 A HISTÓRIA DA MATEMÁTICA ........................................ 12 A PRÓPRIA MATEMÁTICA COMO CONTEXTO .............................. 14 O CONHECIMENTO PRÉVIO NA APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA ...................................................................................................................... 16 FIGURA 4 – Propaganda de Lojas de Televisão ................................. 19 ADEQUAÇÃO E REALISMO DO CONTEXTO .................................. 21 FIGURA 6 – Segmentos não paralelos que não se encontram ............ 24 PARTE 3 FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA E MUDANÇAS CURRICULARES NA ESCOLA .................................................. 27 FORMAÇÃO DE PROFESSORES .................................................... 27 MUDANÇAS CURRICULARES.......................................................... 29 NOVOS CONTEÚDOS CURRICULARES ......................................... 30 NOVAS ABORDAGENS CURRICULARES ....................................... 34 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................... 40 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 PARTE 1 - A MATEMATICA: UMA CONSTRUÇÃO DA HUMANIDADE A Matemática e o dia-a-dia As condições de vida da humanidade se modificaram ao longo do tempo, com o desenvolvimento da agricultura, do comércio, da indústria, do conhecimento e da tecnologia. E através das consequências do avanço em todas essas áreas. Apesar de o homem não ter registrado o que fazia e pensava no início de sua história, ele precisava resolver problemas de seu dia-a-dia, ligados à sua subsistência. Ao buscar soluções para eles, o conhecimento matemático começou a ser construído. Os homens das cavernas não dispunham ainda dos registros e técnicas operatórias atuais para resolver a questão. O pescador poderia pensar assim: quero aves, mas só tenho peixes. Vou agrupar meus peixes de 3 em 3 e para cada grupo ponho 2 pedrinhas ao lado para representar as aves, até completar 22 pedrinhas. Então, conto quantos peixes preciso. São 33 peixes! O caçador poderia pensar de um modo semelhante, para resolver o problema, agrupando suas 22 aves em grupos de 2; agora, as pedrinhas seriam peixes: 3 para cada grupo de aves. Contanto as pedrinhas, ele descobre que são 33 peixes! Assim como esse, outros problemas que o homem tem resolvido em seu cotidiano deram grande impulso ao conhecimento da humanidade e, em particular, ao conhecimento matemático. 4 A HISTÓRIA DA MATEMÁTICA COMO ESTRATÉGIA DE APRENDIZAGEM . O estudo da história da matemática permite-nos compreender a origem das ideias que deram forma à nossa cultura e, também, observar os aspectos humanos do seu desenvolvimento. Através da compreensão sobre o referido contexto evolutivo da matemática, podemos entender os pensadores e suas teorias, bem como estudar as causas e o contexto histórico-social em que elas foram desenvolvidas. Assim, a história é um ótimo instrumento para o ensino/aprendizado da própria matemática, na medida em que contempla a interdisciplinaridade e estabelece conexões com várias outras manifestações da história da cultura. Tendo como ponto de partida a história da matemática, caminha-se para a contextualização da matemática que tem como benefício uma aproximação ao mundo matemático e ao universo do aluno e da realidade que o cerca. A aprendizagem contextualizada atende a principal característica do nosso tempo: o conhecimento científico de qualidade, abordando novas tecnologias na busca de um conhecimento mais dinâmico e duradouro. O ensino baseado na contextualização parte de problemas específicos para problemas gerais e, por isso, é considerado como sendo responsável por uma aprendizagem concreta. Os alunos passam a adquirir, dessa forma, conhecimentos que possam ser aplicados ou associados a situações quotidianas. A história da matemática como uma das estratégias da aprendizagem contextualizada A utilização do recurso à história da matemática vem ganhando adeptos com maior expressão a partir da década de 90 no Brasil, assumindo um papel decisivo na organização do conteúdo que se quer ensinar, esclarecendo-o e definindo o modo de raciocinar próprio do conhecimento que se quer construir. Os conhecimentos sobre história da matemática permitem compreender melhor a evolução dos conceitos chegando ao contexto contemporâneo, demonstrando sua importância no cotidiano do aluno quando explica o porquê de se ensinar este ou aquele conteúdo. 5 Segundo Farago (2003), conhecer a história da matemática permite colocar em prática situações didáticas pertinentes para efetivar a aprendizagem do aluno na busca do conhecimento que se pode ter sobre a origem da noção de ensinar. Além disso, tal fato explicita o tipo de problema a ser resolvido, as dificuldades que surgiram a partir daí e o modo como foram superados os desafios. A matemática moderna, essencialmente teórica, criou algumas tendências que deixam de lado o verdadeiro papel prático da disciplina: a grande maioria dos conceitos matemáticos foi criada para resolver problemas do cotidiano do homem, atendendo às suas necessidades no decorrer da evolução. Ao perder de vista esses problemas, a matemática perdeu, igualmente, o seu sentido. Para a formação do professor contemporâneo, bem como a do educando, é interessante desmistificar o processo matemático, mostrando que ele está inserido nessa tradição por se tratar de uma obra do espírito humana. É preciso que se desperte o interesse pela história da matemática na contemporaneidade, ao proporcionar através dessa abordagem um envolvimento gradativo por parte dos alunos e dos professores. Com isso, resgata-se, igualmente, a importância do ensino da matemática no contexto atual. No Brasil, o nosso grande desafio está justamente na falta de formação dos professores de matemática, pois a maior parte das tentativas de integração da história da matemática no ensino universitário teve vida curta. Nas tendências atuais, essa abordagem do ensino revela-se cada vezmais necessária para o campo da didática, da análise dos obstáculos didáticos ou do trabalho com erros dos nossos alunos. Para isso, faz-se necessário que se trate da análise e atualização das nossas próprias práticas pedagógicas. A utilização da história da matemática em sala de aula busca resgatar essa aprendizagem contextualizada. Atualmente, observa-se um crescimento do número de professores que percebe que a maior parte do interesse e do êxito dos alunos no estudo matemático, assim como em outras ciências do conhecimento, melhora consideravelmente quando os ajudamos a fazer as 6 conexões entre a informação nova (conhecimento) e as suas experiências ou conhecimentos anteriores. O despertar do interesse e a participação dos alunos ao desenvolverem suas atividades no espaço escolar aumentam gradativamente quando lhes ensinamos por que estão aprendendo esses conceitos e como podem usá-los fora da sala de aula, buscando uma educação por competências, sendo uma das recomendações dos (PCNs). Farago (2003) apresenta estratégias dessa aprendizagem contextual que é conhecida como REACT (Relação, Experimentação, Aplicação, Cooperação e Transferência). Tal relação consiste em aprender no contexto das experiências de vida ou conhecimento prévio. Esse é o tipo de aprendizagem contextual que ocorre com as crianças. A experimentação, por sua vez, consiste em aprender no contexto da exploração, descobrimento e invenção, e constitui-se no coração da aprendizagem contextual. Já a aplicação traduz-se na aprendizagem de como se pode utilizar o conhecimento/informação em contexto real que, com freqüência, projeta os alunos para um futuro imaginário (possível profissão) ou para um lugar que não é conhecido (um ambiente de trabalho). A cooperação é a aprendizagem com sentido de partilha, para responder e comunicar-se com os outros estudantes. Trata-se de uma estratégia educativa fundamental do ensino contextual. A transferência consiste numa aprendizagem no contexto de como usar o conhecimento em situação nova (não estudados na sala de aula). Tal enfoque é semelhante ao de relacionar, uma vez que se fundamenta no que já é familiar para nós. Com as estratégias REACT, o aprendizado contextual proporciona uma abordagem mais eficiente para o ensino da maioria dos estudantes, porque o ensino contextualizado é direcionado para a forma como os alunos aprendem. É preciso salientar que uma das grandes dificuldades do ensino da matemática contextualizada é precisamente o que seja ensinado esteja carregado de significado e tenha sentido para o aluno, talvez esse seja um dos grandes desafios do professor contextual. 7 A estratégia REACT apresentada por Farago (2003) é fundamentada em filósofos e pensadores sobre a educação, dentre os quais Rousseau, Dewey, Piaget, Vygotsky, Paulo Freire e Howard Gardner. A MATEMÁTICA DO CONTEXTO E O CONTEXTO NA MATEMÁTICA A história da Matemática é rica em exemplos que nos mostram como muitos conceitos matemáticos são transmitidos em determinado contexto. Assim, há quase dois mil anos, “professores” hindus já apresentavam problemas com enunciados do tipo: “em uma árvore há 23 macacos, mas eu só consigo ver 15 deles. Quantos estão escondidos?” A necessidade do ser humano de compreender os fenômenos que o cercam e ampliar, aprofundar e organizar, progressivamente, seu conhecimento e sua capacidade de intervenção sobre esses fenômenos sempre impulsionou – e impulsiona – a construção do conhecimento matemático. Ou seja, os conceitos e procedimentos matemáticos são construídos na evolução da sociedade, a partir de necessidades do cotidiano, de demandas de outras áreas do conhecimento e também da própria Matemática. A criação dos números naturais, racionais e irracionais é exemplo da construção das ideias matemáticas em contextos diferenciados. O surgimento dos números naturais é atribuído à necessidade social e histórica de contar. Da mesma forma, a vida em sociedade fez com que os homens precisassem realizar medições – o que deu origem ao número racional. Desde as civilizações mais antigas, as taxações das propriedades eram feitas com base em medições da terra. Heródoto, historiador grego, que viveu no século V a.C., refere-se às origens da geometria, ao escrever a história dos egípcios: Disseram-me que este rei (Sesóstris) tinha repartido todo o Egipto entre os egípcios, e que tinha dado a cada um uma porção igual e retangular de terra, com a obrigação de pagar por ano um certo tributo. Que se a porção de algum 8 fosse diminuída pelo rio (Nilo), ele fosse procurar o rei e lhe expusesse o que tinha acontecido à sua terra. Que ao mesmo tempo o rei enviava medidores ao local e fazia medir a terra, afim de saber de quanto ela estava diminuída e de só fazer pagar o tributo conforme o que tivesse ficado de terra (Livro II – Euterpe, apud Caraça, 1952, p. 32). O relato do historiador revela que os egípcios tinham a necessidade de comparar comprimentos e estabelecer quantas vezes certo comprimento cabia em outro. Assim, eles precisaram definir uma unidade que servisse como padrão de comparação, da mesma forma que hoje temos o metro e a milha, entre outros. Ao responder a pergunta “Quantas vezes a unidade cabe no comprimento a ser comparado” surgem os números, sejam os naturais sejam as frações. Estas deram, então, origem aos números racionais. O número irracional, por sua vez, surgiu em um contexto puramente matemático. Até uma certa fase, questionava-se se os números racionais davam conta de expressar as medidas de qualquer comprimento. Uma das versões históricas da criação dos irracionais é a solução do seguinte problema: Pode-se expressar a medida da diagonal, d, de um quadrado de lado 1 por um número racional? Usando o teorema de Pitágoras teremos: FIGURA 1 – Diagonal do quadrado de lado 1 Assim, resolver esse problema é o mesmo que buscar um número (racional) cujo quadrado seja igual a dois. Na Matemática, demonstra-se que isto é impossível. O problema da medida da diagonal só faz sentido no contexto da Matemática. Na prática, o ato de medir um comprimento em um objeto ou em um d 2 = 1 2 + 1 2 = 2 d 1 1 9 desenho, é sempre possível, e nos fornece, como resultado, uma medida racional. Como é possível notar, professor, as ideias matemáticas podem ser criadas em diferentes contextos e estes assumem diversos papéis no Ensino Fundamental. As práticas sociais e econômicas As contextualizações mais frequentes são as que exploram as relações da Matemática com as práticas sociais e econômicas. Juntamente com os contextos do mundo infantil, como jogos e brincadeiras, são os mais focalizados nas coleções de livros didáticos para os anos iniciais da escolaridade. São exemplos as feiras ou mercados de brincadeira, em que os alunos “compram” e “vendem”, com cédulas recortadas dos livros. Quando bem explorada, esta estratégia permite que a criança se familiarize com os vários usos (significados) das operações elementares. A compreensão do que é informado nas contas de gás, luz e telefone, além de socialmente importante, também contribui para a familiaridade com essas operações. Já um contracheque, ou um extrato de conta bancária, permite a contextualização dos números negativos (os débitos ou descontos). O conhecimento matemático também é trabalhado, com frequência, em contextos socialmente relevantes, como a reciclagem do lixo, o desperdício de água, o valor do salário mínimo, o pagamento em parcelas e os descontos. O seu uso evidencia como a Matemática pode auxiliar a formação do aluno enquanto cidadão, consciente de suas responsabilidades e atento aos problemas sociais do nosso país. As abordagens das estruturas multiplicativas, do cálculo de volume, e do cálculo com valor monetário são feitas, frequentemente, paraconscientizar o aluno sobre diversas situações, entre elas a necessidade de não desperdiçar água, evitando deixar a torneira aberta ao escovar os dentes, fechando-a bem para que ela não fi que pingando, evitando lavar calçadas com mangueiras. É muito importante explorar esses temas, que são essenciais à formação do cidadão, levando o aluno a perceber que o conhecimento matemático contribui para que ele se conscientize da situação. 10 Por exemplo, no caso do desperdício de água causado por uma torneira que pinga constantemente, o professor pode solicitar que o aluno meça quanto tempo ela levará para encher um copo de água de 250 ml. Partindo da situação de proporcionalidade, como um dos significados da multiplicação, o passo seguinte é pedir que o aluno calcule quanto tempo a torneira defeituosa precisará para desperdiçar um litro de água (equivalente a 4 copos). Ainda usando a proporcionalidade, ele poderá ser levado a entender qual será o desperdício em um dia e calcular o desperdício em um mês. O valor monetário desse desperdício também pode ser calculado a partir de uma conta de água ou da exploração do valor cobrado por metro cúbico de água em sua região. É possível, ainda, comparar o volume desperdiçado, obtido nos exemplos anteriores, com o consumo médio de água de uma pessoa em diversas regiões do Brasil. Articulam-se, nesse contexto, as estruturas multiplicativas, as grandezas tempo, volume e valor monetário. O MUNDO INFANTIL: JOGOS, BRINQUEDOS E LITERATURA INFANTIL A criança tem um mundo imaginário extremamente rico em contextos. Situações que podem parecer bobas ou sem sentido para o adulto despertam o interesse, a curiosidade e a imaginação da criança. Por isso mesmo, os jogos, os brinquedos, e a literatura infantil são extremamente importantes na contextualização dos conhecimentos matemáticos. Eles exploram o lúdico, a imaginação, o “faz de conta”. Por exemplo, é possível propor jogos de trilha relacionados com a adição e a multiplicação. Jogos tipo “banco imobiliário” podem desempenhar a mesma função, além de envolverem uso do dinheiro, o que é socialmente importante. Muitas coleções sugerem a confecção de materiais para jogos. Mobilizar os alunos na preparação do próprio jogo é uma prática bastante positiva, pois a atividade favorece o trabalho em grupo e possibilita o enfoque de vários conceitos matemáticos. Os livros paradidáticos, por sua vez, oferecem vasto campo para a introdução de conceitos matemáticos em situações imaginárias, ricas em cores e conteúdo. Além de terem função no ensino da Matemática, esses livros reforçam a prática da leitura pelas crianças, algo que todo professor deve procurar fazer ao trabalhar os diferentes componentes curriculares. Nas escolas 11 que dispõem de cozinha, livros de receitas para crianças são ótimos para: a prática de medidas de massa, de volume e de capacidade; o uso das frações mais comuns no dia a dia, como um meio, um terço, um quarto, entre outras. Ao mesmo tempo, propiciam o trabalho cooperativo e a aprendizagem de noções de higiene e de segurança. Livros sobre origami, desde que adequados à idade das crianças, contribuem para o seu desenvolvimento psicomotor e permitem o manuseio de formas geométricas em um contexto bem lúdico. Outras áreas do conhecimento A formação do aluno envolve o estudo de várias áreas do conhecimento. A importância da articulação entre essas áreas também tem sido apontada nas pesquisas sobre o ensino e aprendizagem da Matemática. A Geografia humana, ou física, oferece muitas possibilidades de contextualização. Em particular, permite trabalhar com “números grandes”, o que ajuda a criança a desenvolver o sentido numérico, extremamente importante. Um mapa do Brasil, com as distâncias entre as capitais, por exemplo, é um excelente contexto para se abordar os números de ordens mais elevadas, por envolverem distâncias de centenas ou de milhares de quilômetros. Dados de produção agrícola, ou industrial, também possibilitam o trabalho com várias unidades de medida, e com o sistema monetário. E mais, familiarizam a criança com a representação decimal de grandezas, por exemplo, ao apresentar a informação de que 1,3 t significa 1300 kg. Em estágios um pouco mais avançados da escolaridade, pode-se trabalhar com produção por hectare, densidade demográfica, regimes pluviométricos, renda per capita, entre outros assuntos. São muitas as possibilidades, como as que envolvem porcentagens, gráficos de colunas, barras ou setores, pictogramas, etc. A leitura do capítulo sobre o tratamento da informação neste livro contém muitas ideias a este respeito. As diferentes escalas de temperatura, os graus Celsius (º C, ou centígrados) e os graus Fahrenheit (º F), por exemplo, pautam-se nas convenções para definir as temperaturas da água gelada e da água fervente. A escala de temperatura Celsius foi criada com o ponto de congelamento da água correspondendo ao valor zero, e o ponto de ebulição correspondendo ao valor 100, observados a uma pressão atmosférica padrão. Já a necessidade de se 12 medirem as baixas temperaturas, verificadas nos países do norte da Europa, levou o físico e pesquisador alemão Gabriel Fahrenheit (1686–1736) a desenvolver outra escala, a escala Fahrenheit, que toma a temperatura de congelamento da água a 32º F, o que permite que, em países de clima frio, as temperaturas assumam, quase sempre, valores positivos. PARTE 2 A HISTÓRIA DA MATEMÁTICA Antes de mais nada, não podemos nos esquecer de que a noção de tempo histórico se desenvolve muito lentamente nas crianças. Assim, o emprego da história da Matemática nos primeiros anos da escolaridade deve se resumir a noções bem simples, sem tentar localizar os acontecimentos em uma linha do tempo. Se as crianças pequenas têm dificuldades para construir linhas do tempo da vida de seus familiares, como pretender que elas percebam que certos episódios da história da Matemática se deram há dois mil, mil ou quinhentos anos atrás? Os livros didáticos costumam recorrer à história da Matemática, para: • exemplificar a evolução dessa ciência, ou como ela é construída historicamente; • mostrar que diferentes grupos sociais desenvolveram conceitos e procedimentos matemáticos a fim de prover a suas necessidades; • contextualizar os conceitos, ou procedimentos, inserindo-os nas circunstâncias que acompanharam sua criação e desenvolvimento; • destacar a significação histórica e cultural da Matemática e suas relações com outras áreas de atividade e do conhecimento. Os tópicos tratados nas coleções que incluem esse conteúdo são apresentados, em geral, em pequenos quadros, vinhetas ou seções e o assunto mais abordado é, sem dúvida, a história dos números. Incluem-se aí, os antigos sistemas de numeração, egípcio, mesopotâmico, chinês, maia, romano e indo- arábico. São também abordadas as origens de várias unidades de medida de comprimento, muitas delas relacionadas a comprimentos de partes do corpo humano, como cúbito, pé, polegada. Alguns bons exemplos de uso podem ser destacados, como a história de nosso sistema monetário e do sistema métrico 13 decimal, este último tendo evoluído para o denominado Sistema Internacional de Unidades (SI), entre outras. A criação dos aparelhos para medir o tempo também é, por vezes, abordada, e permite a inclusão de ilustrações interessantes e pertinentes nos livros. Observa-se, no entanto, que na tentativa de criar situações bem contextualizadas para as crianças, algumas obras incluem informações sobre as quais não há evidências de que teriam acontecido. É o caso da história de que os pastores de antigamente faziam marcas, em grupos de dez, para contar seus carneiros. De fato, em um osso, com idade entre vinte mil e dez mil anos atrás, foram encontrados registros de traços grupados de sete em sete,possivelmente correspondentes a um quarto do ciclo lunar. Isso mostra que os primórdios da numeração antecedem de muito a atividade pastoril. Além disso, sabemos que diferentes povos adotaram grupamentos distintos, mas pouquíssimos dentre eles chegaram a sistemas de numeração posicionais: os mesopotâmios, os chineses, os maias, os hindus e os árabes, em épocas diferentes, conforme os registros históricos. Os egípcios, por sua vez, faziam grupamentos de 10 em 10, enquanto os romanos de 5 em 5, e assim por diante. Percebe-se que a singularidade do sistema de numeração decimal não está no fato de que ele grupa unidades de 10 em 10. O que o distingue é que, nele, a posição de um algarismo no número determina quanto vale o algarismo. Quando o sistema de numeração indo-arábico é abordado, umas poucas coleções de livros didáticos mostram a evolução dos algarismos ao longo do tempo, até chegarem à forma que usamos hoje, sem citar datas. Algumas coleções pedem que os alunos registrem números nos sistemas egípcio, romano, maia e chinês. Essa atividade pode ser interessante quando seu objetivo é que o aluno, por meio da comparação com o nosso sistema, entenda as características do sistema de numeração indo-arábico. No entanto, só faz sentido levar o aluno, em nossas escolas, a aprender a escrever números nos sistemas antigos que ainda são utilizados socialmente, como o sistema romano. Além da história dos sistemas de numeração, algumas coleções também abordam a evolução das medidas de grandezas, em particular, as medidas de 14 tempo, feitas com clepsidras, ampulhetas, velas e vários tipos de relógio, assim como de instrumentos de cálculo, como ábaco e calculadoras mecânicas. Trazem, ainda, a história do tangram. O número zero é mais um dos tópicos contextualizados nas obras. Em algumas delas, afirma-se que a origem deste número remonta aos mesopotâmios, ou aos fictícios pastores que já teriam criado grupamentos de dez em dez para contar suas ovelhas. Na verdade, não existe comprovação histórica de que o zero fosse conhecido antes de 600 d.C., aproximadamente. Sabe-se mesmo, pelos registros deixados, que os mesopotâmios não conheciam o zero. É certo que, mais de mil anos antes desta data, os mesopotâmios já usavam um símbolo arredondado para denotar uma casa vazia, na representação de seus números. Mas este símbolo não era um número, não se operava com ele. Tudo indica que foram os hindus, em torno de 600 d.C., que criaram o zero como um número, com qual podemos operar livremente, como fazemos com os outros. O surgimento desse número é considerado por alguns estudiosos como uma das maiores criações da humanidade. A PRÓPRIA MATEMÁTICA COMO CONTEXTO Um vasto campo para a contextualização dos conceitos e procedimentos matemáticos são os próprios campos da matemática escolar: números e operações; geometria; grandezas e medidas; e tratamento da informação. As diferentes grandezas e suas características, por exemplo, oferecem excelentes contextos para a introdução e A contabilidade bancária, no período do Renascimento (entre os séculos XIV e XVI), foi um dos primeiros contextos de uso dos números negativos, pois naquela época, as medidas de grandezas com valores negativos eram desconhecidas. Estas só se generalizaram a partir do século XIX, com a Revolução Industrial, e a necessidade de se usarem medidas mais precisas de muitas grandezas, especialmente as temperaturas. Até então, as temperaturas eram aproximadas ou dadas por comparação, como: “faz tanto frio que a água do lago congelou”; “está tão quente que a manteiga derreteu”. Isso porque, os processos industriais não necessitavam de temperaturas muito baixas, que hoje diríamos estarem abaixo de 0o C. 15 Contextualizações que articulam dois campos da Matemática já são bastante utilizadas nos livros, como a formação retangular para discutir a multiplicação e também a propriedade comutativa dessa operação. Além disso, diversas sequências numéricas são utilizadas na marcação de medidas de tempo, e mesmo em instrumentos de medida de tempo, como o relógio, que traz uma marca dos minutos de 5 em 5. Esta sequência pode também ser articulada com a divisão do ângulo de 360º, em 12 horas, tempo medido por uma volta completa do ponteiro das horas do relógio analógico. Tal divisão nos diz que extensão dos campos numéricos. O trabalho com a grandeza temperatura, por sua vez, é bem interessante para que a criança amplie os significados assumidos pelos números e entenda o zero como número corresponde à origem em um eixo e não somente como inexistência e “guardador de lugar”. Conhecimento que auxiliará, em anos posteriores, a introdução dos números negativos. O ponteiro das horas “anda” 30º a cada hora. Por seu turno, o ponteiro dos minutos leva 60 minutos para uma volta completa (360º), e por isso “anda” 6º a cada minuto. O ponteiro dos minutos percorre, então, em 5 minutos, o mesmo ângulo de 30º que o ponteiro das horas percorre em uma hora. Assim, temos uma articulação importante entre o estudo da grandeza tempo, das estruturas multiplicativas, e do ângulo e sua medida. Os materiais concretos como fonte de contexto O emprego de materiais concretos no desenvolvimento de conteúdos já é uma forma de contextualização. Assim, por exemplo, o material dourado pode ser interpretado como uma contextualização para a estrutura de nosso sistema decimal de numeração. Essa discussão é aprofundada e pode ser mais bem entendida na leitura do capítulo A metodologia de ensino e aprendizagem nos livros didáticos de Matemática, deste livro, quando se trata dos materiais concretos como recurso metodológico. O contexto como fonte de significados 16 O recurso às contextualizações pode dar oportunidade à criança para identificar, mais facilmente, diferentes significados dos conceitos matemáticos em diversas situações, como: o uso das temperaturas em que o zero assume o significado de uma convenção e que pode motivar a necessidade dos números negativos; o emprego da balança de pratos, que auxilia o início do estudo de equações do primeiro grau, no qual a igualdade assume o significado de equilíbrio. No estudo das estruturas aditivas e multiplicativas, por exemplo, utilizam- se contextos diversos para os diferentes significados da adição, da subtração, da multiplicação e da divisão. Nesse sentido, importante não são os contextos em si mesmos, mas o significado que o conceito matemático assume em cada um deles. As situações da combinatória, um dos campos da Matemática, são fonte importante para relacionar um dos significados da multiplicação, com problemas de contagem de possibilidades. A disposição retangular dos objetos, tópico da geometria, também pode ser tratada como um dos contextos essenciais na atribuição de significados da multiplicação. As comparações entre grandezas de mesma espécie, tanto as comparações aditivas quanto as multiplicativas, também definem significados fundamentais, da adição e da multiplicação. O CONHECIMENTO PRÉVIO NA APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA O conhecimento que a criança já possui, a partir das experiências de seu meio social, e do que aprende em outras áreas, ou na própria Matemática, tem servido como âncora para que ela construa o conhecimento matemático. Possibilitar que os alunos expressem os conhecimentos sobre as estratégias de cálculo que fazem mentalmente pode auxiliá-los a perceber os diferentes algoritmos, assim como as propriedades das operações que utilizam em tais procedimentos. Em várias profissões, os conhecimentos matemáticos são utilizados em muitas situações, mesmo se seus usuários não tenham consciência da dimensão matemática de sua atividade. O aluno, muitas vezes, já tem contato social com essas ações. Por exemplo: 17 Um pedreiro, em seu cotidiano de trabalho, precisa alinharas vigas de uma laje para que todas fiquem dispostas paralelamente. Mas como ele faz isso? FIGURA 3 – Alinhamento de vigas A imagem da Figura 3 mostra que, no caso, o pedreiro utilizou comprimento do bloco para garantir que, no início, meio e fim das vigas, fosse mantida a mesma distância entre elas, para que ficassem paralelas. A recuperação e a valorização desse conhecimento social podem auxiliar o aluno a entender o paralelismo como algo que conserva a distância entre as duas linhas. As ruas paralelas e transversais também têm sido uma fonte muito utilizada para se apresentar ao aluno a noção de retas paralelas ou transversais. No item que trata das Adequações e naturalidade do contexto, desenvolvido mais adiante, são discutidos alguns cuidados a serem tomados com tal contextualização. O uso de contextos variados faz com que possamos a aproximar significado de um procedimento matemático normalmente já realizado pelo aluno. Desta forma, a contextualização serve de paralelo para que o aluno compreenda a Matemática. A articulação entre os campos da Matemática tem sido muito utilizada com este fim. O conhecimento que o aluno possui de brincadeiras, como a gangorra, pode auxiliá-lo a entender a comparação entre massas. O jogo da amarelinha contribui para que ele compreenda a ordenação numérica, crescente e decrescente. A brincadeira de par ou ímpar, tão comum no cotidiano da criança, pode ser uma fonte para a discussão do zero, como é comentado no capítulo de Números e operações, deste livro, e pode ajudar na classificação do número em par ou ímpar. 18 A observação das janelas de prédios, da disposição retangular dos canteiros em uma plantação, ou das cadeiras em uma sala ou auditório, auxilia o aluno a entender a multiplicação. Do mesmo modo, pode ser utilizada para que seja discutida a propriedade comutativa da multiplicação – linha por coluna ou coluna por linha. E não é só! Os diferentes contextos podem ajudá-lo, professor, a discutir as diversas soluções possíveis de um mesmo problema matemático. Por exemplo: Indique qual é o próximo número da sequência: 6 , 12 , 18 , 24 , ... Se o aluno pensar no intervalo das horas para tomar um antibiótico, o próximo número será 6, pois como o dia tem 24 horas, a sequência recomeça. Se pensar nos múltiplos de 6, o próximo será 30. Assim, a variação do contexto facilita entender por que uma questão desta natureza não pode ter resposta única. Ao procurarmos trazer o conhecimento prévio do aluno para auxiliar a introdução de um novo conteúdo matemático, é imprescindível que o contexto seja do conhecimento deste aluno, ou ao menos, que você, professor, o tenha estimulado a investigá-lo anteriormente. Portanto, nessa função, procure adaptar os contextos à realidade e conhecimento dos seus alunos. Para recorrer à disposição retangular, não adianta referir-se às janelas de um prédio para o aluno da zona rural, que praticamente não convive com este tipo de construção. Sabemos, também, que ele tem outros contextos mais apropriados para tal disposição retangular. A Matemática auxiliando a entender conceitos do contexto Assim como o entendimento de diversos conceitos de outros contextos é importante para a compreensão da Matemática, no sentido oposto, os conceitos matemáticos auxiliam o aluno a também compreender melhor, conceitos, procedimentos e instrumentos em outras áreas da atividade humana. O conceito matemático de razão, por exemplo, é essencial no entendimento da ideia de escala utilizada em mapas geográficos, e na produção dessas representações. Na construção de um mapa, ou de uma planta-baixa (da 19 arquitetura ou engenharia), define-se uma razão entre os comprimentos no desenho e os comprimentos reais – a esta razão dá-se o nome de escala. Neste caso, a noção de semelhança entre figuras, tão importante na geometria, ajuda a entender por que as plantas e os mapas guardam a mesma forma daquilo que eles representam. A explicação vem do fato de mantermos constante a escala (razão entre os comprimentos no desenho e os comprimentos reais). A noção de razão também é muito importante na definição de diversas taxas da Física, como velocidade, densidade, e da Geografia, como a densidade demográfica, entre outras. As noções de porcentagens da Matemática e de juros da Matemática financeira são muito úteis para a vida cidadã, principalmente na tomada de decisões e conscientização a respeito das compras a vista e a prazo. Como na situação em que é preciso decidir em qual loja é mais vantajoso comprar a mesma televisão, a partir das propagandas da figura abaixo. FIGURA 4 – Propaganda de Lojas de Televisão E mais, o conhecimento matemático e sua contextualização contribuem bastante para que o aluno amplie o leque de seus conhecimentos. Nessa mesma direção, é importante utilizar o conhecimento matemático para auxiliar a criança a entender como funcionam certos artefatos, ou diminuir a distância entre os usuários e aqueles que pensam e elaboram os instrumentos. Atualmente, essa distância é cada dia maior. Muitos vendedores, em uma loja, utilizam programas fechados com planilhas e apenas podem incluir os 20 dados e não têm a menor ideia de como tais programas funcionam. Aproximar o jovem da tecnologia e do conhecimento necessário para explicar alguns elementos elaborados deve ser uma das funções da contextualização. Estreitar essa distância é essencial para a formação dos cidadãos que, muitas vezes, se enganam comprando diferentes produtos que têm a mesma aplicação. Cidadania, ética e observância dos preceitos legais Na abordagem dos conteúdos, as obras de Matemática, como as dos outros componentes curriculares, devem preocupar-se com a cidadania, não apresentar preconceitos de qualquer natureza, respeitar os preceitos decorrentes da Constituição e de vários outros estatutos legais. As contextualizações empregadas, sobretudo as que envolvem as práticas sociais, podem propiciar boas ocasiões para ressaltar a ética e o respeito às diferenças. A Matemática é uma atividade humana e, como tal, profundamente inserida no contexto social em que é produzida. A par disso, as formações matemáticas dos alunos e dos próprios professores ocorrem em instituições mergulhadas no contexto sociocultural e histórico de uma região e de um país. E mais, o livro didático, que é portador das concepções de seu autor, também sofre as influências de todo o contexto antes referido. Por tudo isso, não podemos esperar que no ensino escolar de Matemática, inclusive nas obras didáticas, não se façam presentes as marcas ideológicas, políticas, sociais e culturais de nosso contexto. E, muitas vezes, tais marcas traduzem-se em estereótipos ou preconceitos que devemos procurar desvendar e evitar, o que é uma tarefa difícil e complexa. Em Matemática, ao longo dos últimos anos, aos poucos, as coleções didáticas se preocuparam mais e mais com a diversidade dos tipos étnicos brasileiros e deixaram de considerar somente a família tradicional, em que o pai é o provedor dos recursos, a mãe se ocupa da casa e da educação dos filhos e os avós figuram como personagens benévolas, sempre a brincar com as crianças. Faz-se igualmente mais e mais presente a consideração das contribuições das etnias indígenas e dos descendentes de africanos para a formação da sociedade brasileira. O mesmo pode ser dito em relação à valorização do papel da mulher em nossa sociedade. 21 Nas coleções que se pretendem “neutras”, que não abordam ativamente estas temáticas, caberá ao professor intervir, e suscitar discussões e posicionamentos sobre as mesmas. Não faltam oportunidades para isso, principalmente nas atividades que contextualizam os conteúdos matemáticos no mundo social, físico ou econômico. As possibilidades são inúmeras. A única dificuldade para o professorserá selecioná-las, visto serem realmente muito numerosas. Por exemplo, dados sobre o número de pessoas com problemas de saúde devidos ao álcool ou ao fumo podem propiciar um bom trabalho sobre a necessidade de se evitar o fumo e o álcool, e dar origem a várias atividades com gráficos e porcentagens. Algo semelhante pode ser feito em relação aos cuidados que se deve ter com o uso do automóvel, trazendo para discussão os números de mortos e acidentados no trânsito em ruas e estradas. Já relacionado com o emprego maciço de carros e caminhões no Brasil, podem-se discutir problemas do meio ambiente, do que pode acontecer quando o petróleo não estiver mais disponível, entre outros. Lembramos que cidadania, civilidade, respeito ao outro, cuidado com os bens públicos, consciência de que a sociedade é formada por pessoas de variadas etnias, religiões, convicções políticas e ideológicas se aprende na prática e que o exemplo do professor é fundamental. Vale ressaltar a importância do trabalho em grupo para o desenvolvimento da cidadania. A sala de aula não é só um local para a aprendizagem da Matemática, e na interação entre os alunos, propiciada e mediada pelo professor, podem consolidar-se práticas sociais extremamente importantes para o exercício da cidadania. ADEQUAÇÃO E REALISMO DO CONTEXTO A importância da contextualização para o ensino e aprendizagem da Matemática está mais do que evidente. No entanto, contextualizar o conhecimento, nem sempre é tarefa fácil. A própria didatização do contexto o transforma, naturalmente, em um contexto artificial. O problema dos macacos na árvore, com o qual iniciamos este capítulo, por exemplo, claramente, não é um problema prático, pois se trata de uma situação didatizada e que não se vivencia. O que se visa com ele é mostrar que 22 a adição pode ser aplicada a problemas de estrutura idêntica e a mobilizar a habilidade de cálculo do aluno. Este problema é semelhante ao seguinte, que poderíamos encontrar, hoje, nos livros didáticos de Matemática para os dois primeiros anos do Ensino Fundamental: Eu tenho 24 bolas de gude, vejo 15 delas no chão e o restante está no meu bolso. Quantas estão no meu bolso? Além disso, por vezes, nas obras analisadas, as contextualizações limitam-se apenas a dar informações que podem ser curiosas, mas não são significativas para a aprendizagem, ou servem apenas de pretexto para a obtenção de números que serão usados nas operações matemáticas. Observe um exemplo disso, na seguinte atividade: Para saber quantos anos Pedrinho tem, some os números pares de sua bermuda com os ímpares de sua capa e divida o resultado pelo menor dos ímpares da bermuda. FIGURA 5 – Problema de contexto artificial Os problemas anteriormente citados, sobre o número de macacos ou de bolas de gude são simples, e a criança pode resolvê-los usando somente representações pictóricas para os macacos ou as bolas de gude. O último, referente aos números que decoram a roupa de Pedrinho, é de outro nível, pois 23 o fato de pendurar números nas roupas não lhes confere um significado. Nem tampouco atribui significado aos pares e ímpares. Aqui, estamos lidando, claramente, com outro grau de artificialidade. Uma dificuldade na contextualização surge quando a utilizamos com o objetivo de usar o conhecimento prévio para ajudar o aluno a entender melhor a Matemática. Nesses casos, o contexto não pode ser desconhecido da criança. Para contextualizar um dos significados da multiplicação, há várias possibilidades interessantes, como: O exame de uma planta de um teatro que mostre a localização de suas poltronas, a contagem das janelas de um prédio alto, dispostas regularmente andar por andar, ou ainda a observação dos canteiros de hortaliças desenhados organizadamente em uma plantação, ou mesmo de um pelotão de soldados desfilando. Entre estes exemplos, o do prédio alto será mais artificial, fará muito menos sentido, para uma criança da zona rural do que o exemplo dos canteiros de hortaliça. E este terá menos sentido para uma criança da grande capital do que aquele que apresenta as janelas do prédio. No entanto, se a função do contexto for expandir e aprofundar o conhecimento das crianças sobre o contexto, tudo se inverte. Para a criança da zona rural, o prédio será importante e, para a do grande centro urbano, as plantações é que o serão. Mais um cuidado ao trabalharmos com contextualizações é o de procurar sempre trazer situações em que os valores numéricos envolvidos tenham a ver com a realidade. Muitas vezes, quando a criança utiliza o senso crítico ela é considerada indisciplinada. Como ocorreu no exemplo mostrado abaixo, em que uma criança foi chamada a responder a seguinte questão: Tia Maria tinha 25 melancias, comeu 18. Com quantas melancias tia Maria ficou? A criança respondeu: “Não importa! Acudam tia Maria! Ela morreu ou está passando mal.” Muitas vezes, o descuido em fazer corresponder os valores reais do contexto e os valores tomados no problema leva o aluno a não buscar utilizar o senso crítico da realidade para dar sentido à resposta de problemas da 24 matemática escolar. Principalmente, em situações em que a resposta e a realidade são incompatíveis, como por exemplo: A idade do pai somada com o dobro da idade do filho é 160 anos e as duas somadas é 140 anos. Quais as idades do pai e do filho? Observa-se que a solução do problema anterior implicaria um homem de 120 anos ser pai de um filho de 20 anos. Isto torna a situação bem longe da realidade. Se o aluno chegar a uma resposta matematicamente correta, e buscar validá-la com a realidade, desconfiará que seu cálculo está errado. É preciso cautela, ainda, para que não sejam criadas dificuldades para a aprendizagem. Todo contexto que oferece um modelo para um conceito, procedimento ou algoritmo matemático tem seus limites de validade. Um exemplo recorrente em algumas coleções é o de se introduzir o conceito de retas paralelas, um dos mais básicos da geometria, com base na ideia de “ruas paralelas” em uma cidade. É necessário que se discutam os limites dessa correspondência e a diferença entre o significado matemático do termo “paralela” e o seu significado no contexto do cotidiano. Essa dificuldade é agravada, também, quando se opta por introduzir, primeiramente, o conceito de segmentos paralelos – novamente com base nas “ruas paralelas” – para, em seguida, definir retas paralelas. Nesse caso, o correto é adotar-se a ordem inversa: primeiro, conceito de retas paralelas e, depois, o de segmentos paralelos. Caso se defina, como se lê em alguns livros, que segmentos paralelos são aqueles que não se encontram, comete-se um erro. Por exemplo, os segmentos AB e CD, da Figura 6, não se encontram, mas eles não são paralelos. A B D C FIGURA 6 – Segmentos não paralelos que não se encontram 25 É melhor, então, definir primeiro o que são retas paralelas, como retas coplanares que não se encontram e, em seguida, dizer que segmentos paralelos são aqueles que determinam retas para-lelas. Isso porque, em geometria, procura-se passar, aos poucos, de conhecimentos intuitivos, de “lições de coisas”, como se dizia antigamente, para um conhecimento estruturado. E este último, se organiza exatamente em torno das noções de ponto, reta e plano. Assim, devemos, bem cedo, acostumar o aluno com estes conceitos básicos. Lembramos também que as ruas que, comumente, deno-minamos de paralelas, nem sempre podem ser representadas por segmentos paralelos, pois, se estes fossem prolongados eles se en-contrariam. Também acontece, em muitas cidades, duas ruas serem denominadas de paralelas na linguagem da população local e não serem representações de segmentos de reta, por conterem trechos curvos. Por exemplo, é o que acontece, noRecife, com a Rua Monse-nhor Fabrício, que é conhecida, popularmente, como paralela à Av. Caxangá. Mas, se observarmos o croquis abaixo (Fonte: http://maps. google.com.br; escala não especificada) vemos que a Rua Monsenhor Fabrício possui trechos não retilíneos: FIGURA 7 – Mapa de ruas conhecidas como paralelas Em suma, uma contextualização produz um modelo para o conceito matemático que tem suas limitações. Assim, é preciso muita atenção às situações em que o contexto se afasta das noções e procedimentos matemáticos. Outro exemplo típico disso ocorre quando se utilizam objetos que são modelizados pelas noções dos sólidos e das figuras geométricas planas como 26 contextos para essas noções. Por vezes, são cometidas impropriedades ao se tentar contextualizar o conceito de sólido geométrico utilizando-se objetos do dia a dia, como caixas, bolas, latas de óleo de cozinha. Em particular, a introdução da nomenclatura “sólidos que rolam” – aqueles que possuem superfícies curvas – e “sólidos que não rolam” – os que só possuem superfícies planas – acarreta problemas, pois tal nomenclatura é artificial e, principalmente, pode levar a noções errôneas. É comum dizer que um dado rola, por exemplo. Além disso, vários objetos, inclusive do mundo infantil, com superfícies curvas não rolam, como mostra a figura abaixo: A categoria dos “corpos redondos” é tradicional. Já é encontrada em um dos grandes clássicos do ensino da geometria, o tratado Elementos de Geometria, de Legendre, escrito nos últimos anos do século XVIII. Ele engloba na categoria dos “corpos redondos”, a esfera, o cilindro e o cone, no que foi seguido por autores posteriores. “Corpos redondos” é, simplesmente, uma FIGURA 8 – Bloco com superfície curva que não rola 27 categoria para englobar sólidos importantes, que devem ser estudados, mas que não são poliedros. Sem tentar introduzir classificações artificiais, é possível, simplesmente estudar os três “corpos redondos” e salientar que eles não são poliedros, pois não estão limitados exclusivamente por polígonos planos. PARTE 3 FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA E MUDANÇAS CURRICULARES NA ESCOLA Este artigo trata das diretrizes atuais para a formação do professor de Matemática, destacando o papel deste profissional na análise e mudança dos currículos escolares, em tempos de crise na educação. O objetivo é relacionar a figura do professor pesquisador e reflexivo com atividades de formação, desenvolvidas em nível de pós-graduação. FORMAÇÃO DE PROFESSORES A teoria dos professores reflexivos propõe uma concepção de docência como prática que, aliada à reflexão constante, conduz à criação de um conhecimento específico, ligado à ação. A reflexão do professor sobre sua própria prática, seguida pela problematização e não aceitação da realidade cotidiana da escola, é considerada o início do processo de compreensão e de melhoria do seu ensino. O professor reflexivo é um profissional inovador e criativo, que descobre problemas e saídas, inventa e experimenta novas soluções, liberando-se de formas convencionais, e em constante (re)construção. Entende-se “professor pesquisador” como aquele que explicita as inquietudes que emergem da sua prática e toma-as como problema de pesquisa, procurando soluções bem fundamentadas, com o objetivo de propor e implementar mudanças concretas na sala de aula e/ou na sua instituição. Com base nesses conceitos (SCHÖN, 1995; DEWEY, 1933; NÓVOA, 2001), entendemos que existe hoje um novo papel destinado ao professor: 28 profissional com competência para analisar sua própria prática e o currículo escolar, para propor mudanças. O professor pesquisador e reflexivo tem potencial transformador: é aquele com conhecimento para refletir sobre e analisar o que está fazendo, em relação a seus efeitos nas crianças, nas escolas e na própria sociedade. É um professor que reflete em ação e sobre sua ação, preocupado em examinar o que faz, por que o faz e como pode mudar o que faz. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica em nível superior (BRASIL, 2002) incluem especial valorização para a prática, definida como lugar, foco e fonte de pesquisa. O documento enfatiza a necessidade de se associar o preparo do professor ao aprimoramento das práticas investigativas, considerando que o conhecimento de processos de investigação vai possibilitar o aperfeiçoamento das práticas pedagógicas, que devem ser desenvolvidas com ênfase nos procedimentos de observação e reflexão, visando à atuação em situações contextualizadas. O documento indica características consideradas inerentes à atividade docente, entre as quais: desenvolver práticas investigativas; elaborar e executar projetos para desenvolver conteúdos curriculares; utilizar novas metodologias, estratégias e materiais de apoio. Também na direção da formação de professores, foi criada, em 2004, a área de Ensino de Ciências e Matemática da CAPES, que tem incentivado a organização de Mestrados Profissionalizantes, dirigidos para professores em exercício. A formação do professor pesquisador e reflexivo permeia o projeto pedagógico do Curso de Mestrado Profissionalizante em Ensino de Matemática da UFRGS, criado em 2005. Dentre os objetivos específicos do Curso, destacam-se os que enfatizam competências para desenvolver pesquisa na sala de aula e para assumir o papel de agente de transformação dentro de sua escola, questionando os programas e métodos e multiplicando a formação recebida. Nessa perspectiva, o Curso exige de seus alunos elaboração de dissertações que constituam uma pesquisa profissional, aplicada, com desenvolvimento de 29 processos ou produtos de natureza educacional, visando à melhoria do ensino na área específica. Autores da área da Educação Matemática manifestam-se nesta direção. Segundo Perez (2005, p. 252), “a chave da competência profissional é a capacidade de equacionar e resolver problemas da prática [...] É preciso estudo, trabalho, pesquisa para renovar e, sobretudo, reflexão para não ensinar apenas ‘o que’ e ‘como’ lhe foi ensinado”. Neste espírito, entende-se professor reflexivo e pesquisador como aquele que explicita as inquietudes que emergem da sua prática, e toma-as como problema de pesquisa, procurando propostas de solução bem fundamentadas, com o objetivo de propor e implementar mudanças concretas na sala de aula e/ou na instituição. Fiorentini, Souza e Melo (1998) salientam as demandas colocadas hoje ao professor. Por um lado, “espera-se dele uma atitude investigadora e crítica em relação à prática pedagógica e aos saberes historicamente produzidos; por outro lado, passa a ser responsável pela produção de seus saberes e pelo desenvolvimento curricular da escola” (p.332). O presente livro foi planejado para disponibilizar produtos da pesquisa dos professores/mestrandos da UFRGS que trazem propostas para mudanças curriculares. Este artigo analisa com mais cuidado o significado dessas mudanças. MUDANÇAS CURRICULARES Currículo escolar não é apenas uma lista de conteúdos, um programa a cumprir. Tem hoje uma acepção muito mais ampla, incluindo propósitos, conteúdos, métodos e procedimentos de avaliação. É o conjunto de todas as vivências e conhecimentos disponibilizados pela escola, na escola. Uma mudança curricular, portanto, não consiste apenas em retirar ou inserir conteúdos, mas pode constituir-se numa proposta de nova metodologia, de nova abordagem ou de novo sistema de avaliação. É consenso que a educação, no Brasil, está em crise. Em especial, a escola pública parece não estar cumprindo sua função de formar cidadãos 30 autônomos, com condições de inserção no mercado de trabalho, aptos para uma vida digna, socialmente integrados. Muitos motivosjustificam mudanças no currículo escolar. Podemos lembrar a qualidade da educação; as demandas econômicas e sociais; a universalização do ensino e a necessidade de uma educação para todos; as transformações tecnológicas que modificam o mundo do trabalho e a vida cotidiana; a globalização; a necessidade de inserir o país no comércio mundial em condições competitivas; a prática usual de um ensino “tradicional” identificado com concepções de ensino e aprendizagem obsoletas e seculares. Um primeiro passo, na direção de responder a estas demandas, foi dado com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), publicados pelo MEC, a partir de 1997. Mais recentemente, o Conselho Nacional de Educação (BRASIL. CNE, 2009) lançou um plano de mudança para o ensino Médio, propondo a articulação das dimensões trabalho, ciência, tecnologia e cultura. [...] o Ensino Médio deve ser estruturado em consonância com o avanço do conhecimento científico e tecnológico, fazendo da cultura um componente da formação geral, articulada com o trabalho produtivo. Isso pressupõe a vinculação dos conceitos científicos com a prática relacionada com a contextualização dos fenômenos físicos, químicos e biológicos, bem como a superação das dicotomias entre humanismo e tecnologia e entre formação teórica geral e técnica-instrumental. O documento sugere a ideia de diferentes formas de organização curricular e de princípios orientadores para a garantia de uma formação eficaz dos jovens brasileiros. NOVOS CONTEÚDOS CURRICULARES Como já foi dito, um currículo inclui propósitos, conteúdos, métodos e procedimentos de avaliação. Cabe, então, no contexto das mudanças curriculares, questionar conteúdos e propor sua inserção na escola, oferecendo, simultaneamente, novas abordagens. 31 Ao ensinar um certo conteúdo de matemática, em geral, perguntamos: o quê? Como? O que devo ensinar? Como ensiná-lo? Mas a pergunta, hoje, deveria ser: por quê? Quais as razões de ensiná-lo? Por que está presente no currículo escolar? Por que ele foi escolhido e não outro? Considerando as mudanças sociais aceleradas e o novo contexto em que vivemos – um mundo globalizado, na era da informação e da tecnologia – e considerando objetivos para melhoria da qualidade da educação e do compromisso social para com aluno, poderíamos questionar e mesmo afastar alguns conteúdos do currículo e incluir outros. Nesta apostila, disponibilizamos quatro propostas de conteúdos ausentes do currículo usual, podendo ser trabalhados tanto no nível fundamental, como no médio: Grafos; Transformações geométricas; Vetores; Matemática Financeira. Grafos Os Grafos constituem teoria recente na Matemática e, talvez por isso, ainda não estão presentes nos currículos escolares. Um grafo é um diagrama composto por vértices interligados por arestas, que traduz informações sobre alguma situação real. Por exemplo, um mapa é um grafo que traz informações sobre cidades (representadas por vértices), sobre as estradas que as ligam (as arestas) e que pode informar sobre as distâncias entre elas, custo de transporte rodoviário, nível de periculosidade do caminho, etc. Um fluxograma que representa um programa para um computador é um grafo; o mapa das tubulações de petróleo, que cruzam a Ásia, é um grafo; uma planta elétrica de um imóvel é um grafo; as redes de computadores são grafos, sendo cada terminal representado por um vértice e os cabos de rede pelas arestas. Estruturas que podem ser representadas por grafos estão em toda parte e muitos problemas de interesse prático podem ser formulados como questões sobre certos grafos. Além disso, este conceito se oferece como um mundo novo 32 para as aplicações de conteúdos da matemática escolar tradicional, tais como Matrizes, Combinatória e Geometria, criando pontes num currículo que se caracteriza como fragmentado. Transformações Geométricas As transformações geométricas não fazem parte do currículo mais tradicional da escola, mas já estão presentes em livros didáticos mais recentes, como a coleção de Pires e Pietropaolo (2002), que destacam movimentos das figuras e os definem, no ensino fundamental. Também os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL,1997) salientam a importância das atividades de transformação das figuras geométricas (rotação, translação, ampliação e redução), para adquirir percepção espacial. Na Geometria Euclidiana, as isometrias formam um grupo de transformações congruentes que se caracterizam por manter inalteradas as propriedades das configurações de pontos do plano. São também chamadas de movimentos rígidos, pois preservam linhas retas, retas paralelas, ângulos entre retas e congruências entre segmentos. Ou seja, um quadrado sujeito a uma isometria continua quadrado, com as mesmas medidas, embora ocupe outra posição no plano. Isometrias são as rotações, as reflexões e as translações de objetos do plano. As homotetias preservam a semelhança entre as figuras, mas não a congruência, por isso não são consideradas isometrias. Um quadrado sujeito a uma homotetia pode tornar-se maior ou menor, mas ainda é um quadrado. As transformações geométricas euclidianas têm o mérito de vincular a matemática com o mundo em que vivemos, um mundo em constante movimento. São também muito visíveis, quando ensinadas com o auxílio dos softwares educativos e da Geometria Dinâmica, que favorecem sua visualização. Além disso, tecem pontes no interior do currículo escolar, unindo geometria, funções e matrizes: uma transformação geométrica nada mais é do que uma função cujo domínio e contradomínio são o plano ou o espaço. Vetores 33 O ensino dos vetores, em geral, é desenvolvido nas aulas de Física, especificamente para se tratar de conceitos físicos. Velocidade e aceleração de um objeto e as forças que agem sobre ele são descritas por vetores. No entanto, vetor é um ente matemático, cuja definição envolve conceitos da matemática: vetor é um representante de uma classe de equivalência de segmentos orientados que têm mesmo comprimento, direção e sentido. Esses segmentos podem ser representados por setas, para indicar que são orientados, mas é preciso ter cuidado para não definir vetor como uma seta. Em particular, a ideia de vetor é fundamental no ensino dos números complexos, pois cada número da forma a + bi pode ser representado por um par ordenado (a, b) que está associado a um ponto do plano cartesiano e, ao mesmo tempo, a um vetor em duas dimensões, com origem na origem do plano e extremidade em (a, b). Associar números complexos e vetores permite dar significado e abrir o mundo das aplicações dos complexos: módulo e argumento referem-se ao comprimento e ao sentido do vetor; operações com números complexos podem ser associadas a operações com objetos da Física. Além disso, o trabalho com vetores auxilia a estabelecer relações internas entre conteúdos de Matemática, quando associamos as operações com números complexos/vetores com transformações geométricas, utilizando, hoje, o recurso dos softwares de Geometria Dinâmica, que facilitam imensamente a visualização da dinâmica das transformações. Matemática Financeira Matemática Financeira é um conteúdo matemático essencialmente aplicado, e um dos mais antigos na história da matemática. É um conjunto de ferramentas que auxiliam na compreensão do mundo, de extrema relevância, mas que apenas recentemente vem sendo incluído nos currículos escolares e nos livros didáticos. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Médio (BRASIL, 1999) enfatizam a necessidade da compreensão da Matemática e de seus temas, para a formação de um cidadão capaz de tomar decisões em sua vida profissional e pessoal, especialmente nas relações de consumo. Nesta ótica, a Matemática no Ensino Médio deve ir além de seu valor formativo – que inclui o desenvolvimento 34do pensamento e do raciocínio dedutivo – para mostrar-se, também, com valor instrumental – uma ferramenta que serve para a vida cotidiana. O documento PCN+ (BRASIL, 2002) sugere competências e habilidades que ensino de Matemática deve proporcionar ao aluno e que exigem conhecimento de Matemática Financeira: reconhecer e utilizar símbolos, códigos e nomenclaturas da linguagem matemática – por exemplo, ao ler textos de jornais ou outras comunicações, compreender o significado de dados apresentados por meio de porcentagens –; ler e interpretar diferentes tipos de textos com informações apresentadas em linguagem matemática, desde livros didáticos até artigos de conteúdo econômico, social ou cultural; compreender a responsabilidade social associada à aquisição e uso do conhecimento matemático, utilizando-o na defesa de seus direitos como consumidor; conhecer recursos, instrumentos e procedimentos econômicos e sociais para posicionar- se, argumentar e julgar sobre questões de interesse da comunidade. Além da sua natureza aplicada, o trabalho com Matemática Financeira também auxilia a estabelecer relações internas entre conteúdos de Matemática. A resolução de problemas na área, e mesmo a dedução do formulário básico formam um interessante campo de contextualização para os conceitos mais simples de progressão aritmética e geométrica. NOVAS ABORDAGENS CURRICULARES Com a sociedade da informação, o desempenho profissional vai exigir conhecimentos de matemática, de ciência e de tecnologia, em amplo leque de situações. É consenso entre diferentes autores e educadores que, na alfabetização matemática para a sociedade da informação, três aspectos devem ser colocados em evidência: habilidades, atitudes e contextos. Nas habilidades, destaca-se a habilidade intelectual para lidar com situações complexas, que exijam múltiplas estratégias, múltiplas soluções, avaliação e interpretação; o saber ler e escrever em linguagem matemática; a aptidão para resolução de problemas novos e não rotineiros que dependam de raciocínios e conhecimentos matemáticos. 35 Quanto às atitudes, referem: a valorização da matemática como ferramenta para resolução de problemas; a confiança em dispor de tal conhecimento quando necessário; práticas cooperativas de enriquecimento intelectual, advindo da confrontação de diferentes perspectivas. No que tange ao contexto, o mesmo diz respeito aos recursos tecnológicos que concorrem para a abordagem e tratamento de problemas matemáticos; diz respeito à constante exigência de adaptação a novas situações-problema. Nesta perspectiva, oferecemos, neste livro, quatro maneiras de desenvolver novas abordagens para o ensino da matemática: 1) a metodologia da resolução de problemas; 2) a metodologia da modelagem matemática; 3) o uso das tecnologias da informação e computação; 4) a transposição didática. A metodologia da resolução de problemas Os Parâmetros Curriculares Nacionais – Matemática (BRASIL, 1997, p. 43) sugerem que “no processo de ensino e aprendizagem, conceitos, ideias e métodos devem ser abordados mediante a exploração de problemas, ou seja, de situações em que os alunos precisem desenvolver algum tipo de estratégia para resolvê-las”. Diferentes autores da área de Educação de Matemática sugerem a resolução de problemas como metodologia de ensino (ONUCHIC, 1999; DANTE, 1991; CARRAHER, 1991), porém, adotar este caminho implica em mudanças nas concepções do professor. Os problemas deveriam ser propostos, na escola, para contribuir para a construção de novos conceitos e novos conteúdos, antes mesmo de sua apresentação em linguagem matemática formal. Entretanto, alguns professores têm visão restrita dos problemas, pois o hábito tradicional de desenvolver um conceito consiste em exposição oral, apresentação de exemplos e resolução de exercícios ou problemas. Mas é preciso diferenciar problema de exercício: 36 exercício é uma atividade de adestramento no uso de alguma habilidade ou conhecimento matemático já conhecido, como a aplicação de algum algoritmo ou fórmula já conhecida, e envolve mera aplicação de resultados teóricos; problema, necessariamente, envolve invenção e/ou criação significativa. A metodologia da modelagem matemática Tendências atuais da Educação Matemática no Brasil apontam para a importância de se estabelecer relações entre a Matemática, outras disciplinas e outros contextos e a modelagem aparece como um caminho de integração e contextualização do ensino da Matemática (BARBOSA, 1999, 2001a, 2001b, 2002; BASSANEZI, 2004; BIEMBENGUTT; HEIN, 2003; PONTE, 1992). A modelagem matemática, como metodologia de ensino, consiste na transformação de problemas da realidade em problemas matemáticos. Sua resolução, em linguagem matemática, é, por sua vez, transformada, para ser apresentada na linguagem adequada ao contexto. Uma modelagem exige um aluno ativo para analisar, explicar um problema e tomar decisões sobre o mesmo; coletar informações, formular hipóteses e testá-las, obter modelos e validá-los (ou não) para determinada situação. A matemática escolar torna-se mais interessante e desencadeia processos de reflexão-na-ação. Esta reflexão possibilita que o aluno compreenda a sua ação, reorganize ou aprofunde o seu conhecimento acerca do problema em estudo e, interagindo com os conhecimentos construídos, desenvolva sua competência profissional futura (FIDELIS; ALMEIDA, 2004). É uma metodologia interdisciplinar, pois pode ligar a matemática com o mundo dos problemas da Física, Química, Biologia, ou mesmo do cotidiano. Alguns autores utilizam o termo modelação (modelagem em educação) quando se referem à modelagem matemática como estratégia de ensino e aprendizagem. Neste caso, o fenômeno modelado serve mais de pano de fundo ou como motivação para o aprendizado das técnicas e conteúdos da própria Matemática, valorizando-se mais o processo utilizado do que a validação do modelo. Percebem a modelagem como um ambiente de aprendizagem que valoriza o processo de construção do conhecimento do aluno e as interações no meio em que vive. 37 O uso das tecnologias da informação e computação (TICs) Muitos autores da área de Educação Matemática sugerem o uso das tecnologias da informação e computação na sala de aula (PENTEADO; BORBA, 2003; ARAÚJO, 2002; PENTEADO, 1999; MALTEMPI, 2004). Com o advento da sociedade da informação, o sistema educativo brasileiro deve se integrar num novo contexto e, sendo a escola um micromundo que tem, dentre suas finalidades, a preparação dos indivíduos para a vida adulta de amanhã, deve ela constituir-se com as mesmas características. A presença, cada vez maior, das Tecnologias da Informação e Comunicação em todos os setores, torna-se uma ameaça de exclusão social para os indivíduos que participam de um processo educativo que se mantém à margem da formação de competências necessárias para inserção nesta sociedade. Em escolas já equipadas com laboratórios para uso de mídias digitais e com acesso à web, frequentemente observa-se uma subutilização destes recursos. Em geral, nesses espaços, o trabalho com os alunos restringe-se à formação generalista – noções gerais de informática, familiarização com editores de texto e desenho, familiarização com a navegação na web. Nas aulas de matemática, pouco se utilizam as mídias digitais e, quando isso é feito, frequentemente as práticas didáticas seguem os moldes tradicionais das aulas de giz e quadro-negro. Mudam os recursos para a educação, mas as concepções dos professores sobre o processo de ensino e aprendizagem não se modificam. É preciso destacar, junto ao professor, que a apropriação das tecnologias de informação e comunicação (TICs) no ensino da matemática contribui para facilitar o processo de ensino-aprendizagem, para a inserção do jovem na sociedade tecnológica e,também, oferece ferramentas interdisciplinares entre as diferentes áreas de conhecimento. Como sugere o MEC (BRASL,1998), a utilização das TICs traz contribuições ao processo de ensino-aprendizagem de Matemática à medida em que: a) relativiza a importância do cálculo mecânico e da simples manipulação simbólica, uma vez que, por meio de instrumentos, esses cálculos podem ser 38 realizados de modo mais rápido e eficiente; b) evidencia para os alunos a importância do papel da linguagem gráfica e de novas formas de representação, permitindo novas estratégias de abordagem de variados problemas; c) possibilita o desenvolvimento, nos alunos, de um crescente interesse pela realização de projetos e atividades de investigação e exploração como parte fundamental de sua aprendizagem; d) permite que os alunos construam uma visão mais completa da verdadeira natureza da atividade matemática e desenvolvam atitudes positivas diante de seu estudo. Em particular, nas aulas de Matemática, o uso das TICs pode ter diferentes finalidades: a) como fonte de informação, poderosa para alimentar o processo de ensino-aprendizagem; b) como auxiliar no processo de construção de conhecimento; c) como meio para desenvolver autonomia pelo uso de softwares que possibilitem pensar, refletir e criar soluções; d) como ferramenta para realizar determinadas atividades – uso de planilhas eletrônicas, processadores de texto, banco de dados etc. Aplicação da transposição didática Transposição Didática refere-se ao processo de adaptação pelo qual passa o saber científico, quando transformado no conjunto dos conteúdos que constituem os programas escolares e que pode ser chamado de “saber escolar” (PAIS, 2002). É trabalho de construção de uma passagem entre o conhecimento científico e aquele que o aluno é capaz de aprender. Perrenoud (1993) define como transposição didática a essência do ensinar, ou seja, a ação de “fabricar artesanalmente os saberes, tornando-os ensináveis, exercitáveis, e passíveis de avaliação no quadro de uma turma, de um ano, de um horário, de um sistema de comunicação e trabalho” (p. 25). Para ele, essa é uma “tradução pragmática dos saberes para atividades e situações didáticas” (p. 26), que surge como uma resposta ou reação às situações reais de sala de aula. Alguns professores baseiam suas aulas em livros didáticos, confiando na transposição didática desenvolvida pelo autor. Outros assumem sua responsabilidade sobre o currículo, refletindo sobre e analisando os conteúdos programáticos, as metodologias e as relações professor-aluno. Essa atividade 39 está sempre ao alcance do professor, sendo mobilizada quando um projeto ou plano pedagógico é construído. Depende da articulação de diferentes categorias de conhecimento: conhecimento do conteúdo específico que ele ensina; conhecimento pedagógico geral (dos princípios e estratégias de gestão e organização da classe); conhecimento do currículo, dos materiais e dos programas; conhecimento dos alunos e das suas características; conhecimento do contexto educativo (conhecimento do grupo, comunidade, cultura etc.); conhecimento dos fins, propósitos e valores educativos. Além disso, nesta tarefa, o professor vai produzir um conhecimento que é só seu e que não pode ser ensinado nas instituições de formação de professores: o “conhecimento pedagógico do conteúdo específico”, uma maneira sua de transformar o conteúdo acadêmico em conteúdo ensinável, inteligível aos alunos (SCHULMAN, 1986) 40 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAÚJO, Jussara. Cálculo, Tecnologias e Modelagem Matemática: As Discussões dos Alunos. Tese (Doutorado em Educação Matemática) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista. Rio Claro, 2002. BARBOSA, Jonei Cerqueira. O que pensam os professores sobre a Modelagem Matemática? Zetetikè, Campinas, v. 7, n.11, p. 67-85, 1999. Disponível em: <http:/ /joneicb.sites.uol.com.br/zetetike.pdf>. Acesso em: 27 ago. 2007. ______. Modelagem na Educação Matemática: contribuições para o debate teórico. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 24ª, Caxambu, 2001. Anais... Caxambu: 2001a. 1-CDROM. Disponível em: <http://joneicb.sites.uol.com.br>. Acesso em: 20 ago. 2007. docente: professor (a) – pesquisador (a). Campinas: Mercado das Letras, 1998. p. 307-335. MALTEMPI, Marcus Vinicius. Construcionismo: pano de fundo para pesquisas em informática aplicada à Educação Matemática. In: BICUDO, Maria Aparecida Viggiani; BORBA, Marcelo de Carvalho. Educação Matemática pesquisa em movimento. São Paulo: Cortez, 2004. p. 264-282. NÓVOA, Antônio. 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