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5 1 Fármacos antibacterianos Considerações gerais Neste capítulo, continuaremos a desenvolver as ideias apresentadas no capítulo anterior. Uma discussão detalhada sobre a bacteriologia ultrapassa o âmbito deste livro, mas, para contextualizar, são fornecidas informações sobre alguns agentes patogênicos clinicamente significativos (Tabela 51.1). São descritas as principais categorias de fármacos antibacterianos1 (Tabela 51.2), bem como seu mecanismo de ação, propriedades farmacocinéticas e efeitos secundários. Concluímos com um resumo das novas pesquisas nessa área vital. Tabela 51.1 Algumas bactérias patogênicas clinicamente significativas Gênero Morfologia Espécie Doença Gram-negativo Bordetella Cocos B. pertussis Coqueluche Brucella Coco-bacilos B. abortus Brucelose (bovinos e humanos) Campylobacter Espirilos C. jejuni Intoxicação alimentar Escherichia Bacilos E. coli Septicemia, infecções de feridas, ITU Haemophilus Bacilos H. influenzae Infecção aguda do trato respiratório, meningite Helicobacter Bacilo móvel H. pylori Úlcera péptica, câncer gástrico Klebsiella Bacilos encapsulados K. pneumoniae Pneumonia, septicemia Legionella Bacilos flagelados L. pneumophila Doença do Legionário Neisseria Diplococos N. gonorrhea Gonorreia Pseudomonas Bacilos flagelados P. aeruginosa Septicemia, infecções respiratórias, ITU Rickettsiae Coco filamentoso Várias espécies Infecções provocadas por carrapatos e insetos Salmonella Bacilos móveis S. typhimurium Intoxicação alimentar Shigella Bacilos S. dysenteriae Disenteria bacilar Yersinia Bacilos Y. pestis Peste bubônica Vibrio Bacilos flagelados V. cholerae Cólera Gram-positivo Bacillus Bacilos em cadeia B. anthrax Antraz Clostridium Bacilo C. tetani Tétano Corynebacterium Bacilo C. diphtheriae Difteria Mycobacterium Bacilos M. tuberculosis Tuberculose M. leprae Lepra Staphylococcus Cocos em cacho S. aureus Infecções de feridas, furúnculos, septicemia Streptococcus Diplococos S. pneumoniae Pneumonia, meningite Cocos em cadeia S. pyogenes Escarlatina, febre reumática, celulite Outros Chlamydia Gram “não definido” C. trachomatis Doenças oftalmológicas, infertilidade Treponema Bacilo espiralado flagelado T. pallidum Sífilis ITU, infecção do trato urinário. Tabela 51.2 Resumo de antibacterianos e seus mecanismos de ação Famíl ia Exemplos Microrganismos-alvo típicos Mecanismo de ação Sulfo na mi da s Sulfadiazina, sulfametoxazol (trimetoprima) T. gondii, P. jirovecii Síntese ou ação do folato bacteriano β- lac tâ mi co s PENICILINAS Benzilpenicilina, fenoximetilpenicilina Generalizado, principalmente várias espécies Gram- positivas; algumas espécies Gram-negativas Síntese da parede celular bacteriana do peptidoglicano Penicilinas resistentes às penicilinases Flucloxacilina, temocilina Utilizado nas infecções por estafilococos Penicilinas de amplo espectro Amoxicilina, ampicilina Uma grande variedade de espécies Gram-positivas e Gram-negativas Penicilinas antipseudomonas Piperacilina, ticarcilina Espécies Gram-negativas selecionadas, especialmente P. aeruginosa MECILINAM Pivmecilinam Majoritariamente espécies Gram-negativas CEFALOSPORINAS Cefalcor, cefadroxila, cefalexina, cefixima, cefotaxima, cefpodoxima, cefradina, ceftarolina, ceftazidima, ceftriaxona, cefuroxima Amplo espectro de atividades contra espécies Gram- negativas e positivas CARBAPENEMOS Ertapenem, impenem, meropenem, doripenem. Muitas espécies Gram-negativas e positivas MONOBACTÂMICOS Aztreonam Bacilos Gram-negativos Glico pe ptí de os Vancomicina, teicoplanina, daptomicina Espécies Gram-positivas Polim ixi na s Colistina, polimixina B Espécies Gram-negativas Estrutura da membrana celular externa bacteriana Tetrac icl in as Demeclociclina, doxiciclina, limeciclina, minociclina, oxitetraciclina, tetraciclina tigeciclina Muitas espécies Gram-negativas e positivas Síntese proteica bacteriana (inibição de muitos mecanismos, incluindo iniciação, transpeptidação e translocação; ver texto) Amin og lic osí de os Amicacina, gentamicina, neomicina, tobramicina Muitas espécies Gram-negativas e algumas Gram-positivas Macr Azitromicina, claritromicina, eritromicina, Semelhante à penicilina olí de os espiramicina, telitromicina Oxaz oli di no na s Linezolida Espécies Gram-positivas Linco sa mi da s Clindamicina Espécies Gram-positivas Anfen icó is Cloranfenicol Espécies Gram-negativas e Gram-positivas Estre pt og ra mi na s Quinupristina, dalfopristina Espécies Gram-positivas Anti mi co ba cte ria no s Capreomicina, clofazimina, cicloserina, dapsona, etambutol, isoniazida, pirazinamida, rifabutina, rifampicina A maioria utilizada apenas em infecções micobacterianas Diferentes mecanismos não relacionados (ver texto) Quino lo na s Ciprofloxacina, levofloxacina, moxifloxacina, ácido nalidíxico, norfloxacina, ofloxacina Espécies Gram-negativas e Gram-positivas Síntese do DNA bacteriano Vário s Ácido fusídico Espécies Gram-positivas Síntese proteica bacteriana Nitrofurantoína ITUs Gram-negativas Danifica o DNA bacteriano Metenamina ITUs Gram-negativas Pró-fármaco do formaldeído As combinações de fármacos (p. ex., cofluampicil – flucloxacilina com ampicilina) não são apresentadas. 1Estritamente falando, o termo “antibiótico” aplica-se apenas a antibacterianos que são produzidos por um organismo para matar outros (p. ex., penicilina) por oposição a compostos sintéticos como as sulfonamidas. No entanto, na prática, essa distinção é praticamente ignorada, dado que muitos fármacos antibacterianos são “semissintéticos” (p. ex., flucloxacilina). Introdução Em 1928, Alexander Fleming, enquanto trabalhava no Hospital de St. Mary, em Londres, descobriu que uma placa de colônias bacterianas havia sido contaminada por um fungo do gênero Penicillium. Sua observação de que o crescimento bacteriano nas proximidades do fungo havia cessado revelou-se crucial. Posteriormente, Fleming isolou o fungo em cultura pura e demonstrou que produzia uma substância antibacteriana a que chamou de penicilina. Essa substância foi depois preparada a granel, extraída, e seus efeitos antibacterianos foram analisados por Florey, Chain e colegas em Oxford, em 1940. Esses pesquisadores demonstraram que não era tóxica para o hospedeiro, mas que matava os patógenos em ratos infectados, dando início, dessa forma, à “era do antibiótico”. Setenta anos mais tarde, o número de tipos diferentes de antibióticos aumentou dez vezes, e a prática da medicina seria impensável sem eles. A técnica de Gram e a estrutura da parede celular bacteriana A maioria das bactérias pode ser classificada como Gram-positivas ou Gram-negativas, dependendo de mudarem ou não de coloração quando sujeitas à técnica de Gram. Essa coloração reflete as diferenças fundamentais na estrutura da parede celular das bactérias e tem implicações importantes para a ação dos antibióticos. A parede celular dos organismos Gram-positivos é uma estrutura relativamente simples, com cerca de 15-50 nm de espessura, englobando aproximadamente 50% de peptidoglicano (Cap. 50), 40-45% de polímero acídico (o que resulta numa parede celular com carga negativa), bem como 5- 10% de proteínas e polissacarídeos. Essa camada fortemente polarizada influencia a penetração de moléculas ionizadas e favorece a penetração, na célula, de compostos com carga positiva como a estreptomicina. A parede celular de organismos Gram-negativos é muito mais complexa e consiste no seguinte (a partir da membrana plasmática): • Um espaço periplásmico que contém enzimas e outros compostos. • Uma camada de peptidoglicano com 2 nm de espessura, que representa 5% da massa da parede celular e que, com frequência, está ligada por lipoproteínas à camada externa. • Uma membrana externa constituída por uma camada dupla lipídica, em alguns aspectos semelhante à membrana plasmática, que contém proteínas e (no interior) lipoproteínas ligadas ao peptidoglicano. Outras proteínas formam canais aquosos transmembranares, denominados porinas, atravésdos quais os antibióticos hidrofílicos podem movimentar-se livremente. • Polissacarídeos complexos que formam compostos importantes da membrana externa. Diferem entre espécies de bactérias e são os principais determinantes de seu potencial antigênico. Também são fonte de endotoxinas, que, quando aplicadas in vivo, incitam vários aspectos da resposta inflamatória ao ativar o complemento e as citocinas, causando febre, entre outros sintomas (Cap. 6). A dificuldade em penetrar essa membrana exterior complexa explica o porquê de alguns antibióticos serem menos ativos contra bactérias Gram-negativas do que em bactérias Gram-positivas. É também uma razão para a extraordinária resistência aos antibióticos, demonstrada pela Pseudomonas aeruginosa, um patógeno que pode causar infecções fatais em pacientes neutropênicos e também naqueles com queimaduras e feridas. Os lipopolissacarídeos da membrana externa constituem uma barreira importante para alguns antibióticos, incluindo benzilpenicilina, meticilina, macrolídeos, rifampicina, ácido fusídico e vancomicina. Na discussão da farmacologia dos fármacos antibacterianos, é importante dividi-los em grupos diferentes de acordo com seu mecanismo de ação. Agentes antibacterianos que interferem na síntese ou na ação do ácido fólico Sulfonamidas Nos anos 1930, numa descoberta histórica, antes da invenção da penicilina, Dogmak demonstrou que era possível um fármaco suprimir a infecção bacteriana. O agente era o prontosil,2 um corante que demonstrou ser um pró-fármaco inativo que era metabolizado in vivo num produto ativo, a sulfanilamida (Fig. 51.1). Desde então, muitas sulfonamidas foram desenvolvidas, mas sua importância foi diminuindo em função da crescente resistência. Os únicos fármacos sulfonamidas ainda correntemente utilizados como antibacterianos sistêmicos são o sulfametoxazol (em geral, combinado com trimetoprima, como cotrimoxazol), sulfassalazina (mal absorvida no trato gastrointestinal, utilizada para tratar a colite ulcerosa e a doença de Crohn; Caps. 26 e 30). A sulfadiazina de prata é aplicada de forma tópica para, por exemplo, tratar queimaduras infectadas. Alguns fármacos com usos clínicos diferentes (p. ex., o prasugrel, inibidor da ativação das plaquetas – Cap. 24 –, e a acetazolamida, um inibidor da anidrase carbônica – Cap. 29) são sulfonamidas e partilham alguns dos efeitos adversos comuns a essa classe. U tilizações clínicas das sulfonamidas • Em combinação com trimetoprima (cotrimoxazol) no caso de Pneumocystis carinii (agora conhecida por P. jirovecii) para tratamento de toxoplasmose e nocardiose. • Em combinação com pirimetamina para tratamento da malária resistente aos fármacos (Tabela 54.1) e da toxoplasmose. • Nas doenças inflamatórias do intestino: é utilizada a sulfassalazina (combinação sulfapiridina-ácido aminossalicílico) (Cap. 30). • Em feridas infectadas (sulfadiazina de prata aplicada topicamente). FIG. 51.1 Estruturas de duas sulfonamidas representativas e da trimetoprima. As estruturas ilustram a relação entre as sulfonamidas e a molécula de ácido p-aminobenzoico no ácido fólico (retângulo laranja), bem como a possível relação entre os fármacos antifolato e a molécula de pteridina (laranja). O cotrimoxazol é uma combinação de sulfametoxazol e trimetoprima. Mecanismo de ação A sulfanilamida é um análogo do ácido p-aminobenzoico (PABA; Fig. 51.1), que é um precursor essencial na síntese do ácido fólico, necessário para a síntese de DNA e RNA nas bactérias (Cap. 50). As sulfonamidas são inibidores competitivos da enzima di- hidropteroato sintetase, e os efeitos da sulfonamida podem ser sobrepostos acrescentando PABA suplementar. Por essa razão, alguns anestésicos locais, e que são ésteres PABA (tal como a procaína; Cap. 43), podem antagonizar o efeito antibacteriano desses agentes. Embora não tenha necessariamente relevância clínica, a regra geral estabelece que os antibióticos que interferem na síntese da parede celular das bactérias (p. ex., penicilinas; Tabela 51.2) ou que inibem enzimas importantes (como as quinolonas) normalmente matam as bactérias (isto é, são bactericidas). Os que inibem a síntese das proteínas, como, por exemplo, as tetraciclinas, tendem a ser bacteriostáticos, ou seja, previnem o crescimento e a replicação. As sulfonamidas pertencem ao segundo grupo. A ação das sulfonamidas é inibida pela presença de pus e de produtos de destruição tecidual porque esses contêm timidina e purinas, que são utilizados diretamente pelas bactérias, não sintetizando, assim, o ácido fólico. A resistência, que é comum, é mediada por plasmídeos (Cap. 50) e resulta da síntese de uma enzima bacteriana insensível aos fármacos. Aspectos farmacocinéticos A maioria das sulfonamidas é administrada oralmente e, exceto a sulfassalazina, são bem absorvidas e distribuídas pelo corpo. Há risco de sensibilização ou de reações alérgicas quando são aplicadas topicamente. Os fármacos passam para exsudados inflamatórios e atravessam tanto a barreira placentária como a barreira hematoencefálica. São essencialmente metabolizados no fígado, e o principal produto é um derivado acetilado sem ação antibacteriana. Efeitos adversos Os efeitos adversos graves que implicam a descontinuação do tratamento incluem hepatite, reações de hipersensibilidade (eritemas, abrangendo síndrome de Stevens- Johnson e necrólise epidérmica tóxica, febre, reações anafiláticas; Cap. 57), insuficiência da medula óssea e insuficiência renal aguda decorrente de nefrite tubulointersticial ou cristalúria. Essa última é provocada pela presença de metabólitos acetilados na urina (Cap. 29). Também pode ocorrer cianose provocada por metemoglobinemia, mas essa é uma reação menos preocupante do que aparenta ser. Os efeitos adversos menos graves incluem náuseas e vômitos, dores de cabeça e depressão. Trimetoprima Mecanismo de ação A trimetoprima está quimicamente relacionada com o fármaco antimalária pirimetamina (Cap. 54), sendo ambos antagonistas do ácido fólico. Estruturalmente (Fig. 51.1), assemelha-se à porção pteridina do ácido fólico, de tal forma que consegue “enganar” a di-hidrofolato redutase bacteriana, a qual é muito mais sensível à trimetoprima do que à enzima equivalente nos humanos. A trimetoprima, também um bacteriostático, atua contra as bactérias mais comuns e os protozoários, sendo utilizada no tratamento de infecções urinárias, pulmonares e outras. Por vezes, é administrada em combinação com sulfametoxazol, o cotrimoxazol (Fig. 51.1). Pelo fato de as sulfonamidas inibirem diferentes etapas no mesmo metabolismo bacteriano, são capazes de potencializar a ação da trimetoprima (Fig. 51.2). No Reino Unido, o uso do cotrimoxazol está geralmente restrito ao tratamento da pneumonia Pneumocystis carinii (agora conhecida como P. jirovecii, uma infecção fúngica), toxoplasmose (uma infecção por protozoários) ou nocardiose (uma infecção bacteriana). FIG. 51.2 A ação das sulfonamidas e da trimetoprima na síntese do folato bacteriano. Ver Capítulo 25 para mais detalhes sobre a síntese de tetra-hidrofolato e Tabela 50.1 para comparações entre fármacos antifolato. PABA, Ácido p-aminobenzoico. Aspectos farmacocinéticos A trimetoprima é bem absorvida oralmente e distribuída através dos tecidos e fluidos corporais. Atinge altas concentrações nos pulmões e rins, além de concentrações consideravelmente elevadas no líquido cefalorraquidiano (LCR). Quando administrada em conjunto com sulfametoxazol, cerca de metade da dose de cada um é excretada em 24 horas. Como a trimetoprima é uma base fraca, sua eliminação pelos rins aumenta na proporção inversa do pH da urina. Efeitos adversos A deficiência de ácido fólico – e consequente anemia megaloblástica (Cap. 25) – é um dos riscos da administração em longo prazo de trimetoprima. Outros efeitos adversos incluem naúseas, vômitos, alterações hematológicas e eritemas. A gentes antimicrobianos que interferem na síntese ou na ação do folato • As sulfonamidas são bacteriostáticas; interferem na síntese do folato e,em consequência, também na síntese dos nucleotídeos. Os efeitos adversos incluem cristalúria e hipersensibilidade. • A trimetoprima é bacteriostática. Atua por meio da inibição do folato. • O cotrimoxazol é uma combinação de trimetoprima e sulfametoxazol, que altera a síntese dos nucleótidos bacterianos em duas fases de sua síntese. • A pirimetamina e o proguanil também são agentes antimalária (Cap. 54). Antibióticos betalactâmicos Penicilinas Os notáveis efeitos antibacterianos da penicilina sistêmica nos humanos ficaram claramente demonstrados em 1941.3 Uma pequena quantidade de penicilina, extraída com bastante dificuldade de culturas naturais nos laboratórios da Dunn School of Pathology em Oxford, foi administrada a um policial muito doente, que sofria de septicemia com múltiplos abcessos. Embora as sulfonamidas estivessem disponíveis, não teriam surtido efeito na presença de pus. Foram administradas injeções a cada três horas. Toda a urina do paciente foi guardada e, diariamente, a quantidade de penicilina excretada era extraída e reutilizada. Após cinco dias, o paciente se recuperou e assistiu-se a uma nítida melhora dos abcessos. Para além disso, aparentemente sem efeitos tóxicos. Infelizmente, quando o fornecimento de penicilina terminou, a condição do paciente foi- se degradando e ele morreu um mês depois. As penicilinas, frequentemente combinadas com outros antibióticos, mantêm importância crucial na quimioterapia antibacteriana, mas podem ser destruídas por enzimas amidases e β-lactamases (penicilinase; Fig. 51.3). Isso representa a base de um dos principais tipos de resistência aos antibióticos. FIG. 51.3 Estruturas básicas de quatro grupos de antibióticos β-lactâmicos e do ácido clavulânico. As estruturas ilustram o anel β-lactâmico (referenciado como B) e os locais de ação das enzimas bacterianas que inativam esses antibióticos (A, anel de tiazolidina). São adicionados vários substituintes em R1, R2 e R3 para produzir agentes com diferentes propriedades. Nos carbapenemos, a configuração estereoquímica da parte do anel β-lactâmico, aqui apresentado na cor laranja, é diferente da parte correspondente das moléculas de penicilina e cefalosporina; isso, provavelmente, é o que explica a resistência às β-lactamases dos carbapenemos. Supõe-se que o anel β-lactâmico do ácido clavulânico se ligue fortemente à β-lactamase, ao mesmo tempo que o protege de outras β-lactamases da enzima. Mecanismo de ação Todos os antibióticos beta-lactâmicos interferem na síntese do peptidoglicano (Cap. 50; Fig. 50.3). Depois de se fixarem às proteínas de ligação à penicilina nas bactérias (podem existir sete ou mais tipos em diferentes organismos), inibem as transpeptidases que cruzam as cadeias peptídicas ligadas à estrutura do peptidoglicano. U sos clínicos das penicilinas • As penicilinas são administradas pela boca ou, no caso de infecções mais graves, por via intravenosa e, com frequência, combinadas com outros antibióticos. • Estão reservadas a microrganismos sensíveis e podem (às vezes, é apropriado realizar um teste individual de sensibilidade, dependendo das condições locais) incluir: – meningite bacteriana (p. ex., causada por Neisseria meningitidis, Streptococcus pneumoniae): benzilpenicilina, doses altas por via intravenosa; – infecções ósseas e articulares (p. ex., por Staphylococcus aureus): flucloxacilina; – infecções da pele e dos tecidos moles (p. ex., por Streptococcus pyogenes ou S. aureus): benzilpenicilina, flucloxacilina; mordidas de animais: coamoxiclav; – faringite (por S. pyogenes): fenoxilmetilpenicilina; – otite média (os microrganismos normalmente incluem S. pyogenes, Haemophilus influenzae): amoxicilina; – bronquite (infecções variadas comuns): amoxicilina; – pneumonia : amoxicilina; – infecções do trato urinário (p. ex., por Escherichia coli): amoxicilina; – gonorreia : amoxicillina (combinada com probenecida); – sífilis: benzilpenicilina procaína; – endocardite (p. ex., por Streptococcus viridans ou Enterococcus faecalis): doses altas por via intravenosa de benzilpenicilina combinada, por vezes, com um aminoglicosídeo; – infecções por Pseudomonas aeruginosa : ticarcilina, piperacilina. Essa lista não é exaustiva. Por vezes, o tratamento com penicilinas inicia-se de forma empírica, caso se acredite que o microrganismo potencialmente causador é suscetível à penicilina, enquanto se aguardam os resultados dos testes para identificar os microrganismos e determinar sua suscetibilidade aos antibióticos. A ação bactericida final é a inativação de um inibidor de enzimas autolíticas na parede celular, provocando a lise da bactéria. Alguns organismos, referenciados como “tolerantes”, possuem enzimas autolíticas deficientes, razão pela qual não ocorre a lise em resposta ao fármaco. A resistência à penicilina pode derivar de inúmeras causas e é discutida em detalhes no Capítulo 50. Tipos de penicilina e atividade antimicrobiana As primeiras penicilinas foram a benzilpenicilina (penicilina G) e congêneres, incluindo a fenoximetilpenicilina (penicilina V). A benzilpenicilina é ativa em uma grande variedade de organismos, representando o fármaco de eleição em muitas infecções (ver quadro clínico, acima). As principais desvantagens são a má absorção através do trato gastrointestinal (o que significa que tem de ser injetada) e sua suscetibilidade às β- lactamases. As penicilinas semissintéticas, com diferentes cadeias laterais ligadas ao núcleo de penicilina (em R1, na Fig. 51.3), incluem penicilinas resistentes às β-lactamases (p. ex., meticilina,4 flucloxacilina, temocilina) e penicilinas de largo espectro (p. ex., ampicilina, amoxicilina). As penicilinas de largo espectro (p. ex., ticarcilina, piperacilina) e antipseudomonas conseguiram superar o problema causado por infecções graves decorrentes de P. aeruginosa. A amoxicilina e a ticarcilina são, por vezes, combinadas com o ácido clavulânico, um inibidor das β-lactamases (p. ex., co-amoxiclav). Pivmecilinam é um pró-fármaco do mecilinam, que também apresenta amplo espectro de ação. Aspectos farmacocinéticos A absorção oral das penicilinas varia, dependendo de sua estabilidade em meio ácido e de sua adsorção às partículas alimentares no intestino. As penicilinas também podem ser administradas através de injeção intravenosa. Também existem compostos para injeções intramusculares, incluindo compostos de ação prolongada como a benzilpenicilina benzatínica, que se revela útil no tratamento de sífilis, uma vez que a Treponema pallidum é um organismo de desenvolvimento muito lento. Não se administra mais benzilpenicilina por injeção via intratecal (historicamente usada para tratar meningite), uma vez que pode causar convulsões.5 As penicilinas são amplamente distribuídas pelo corpo, penetrando nas articulações; nas cavidades pleural e pericárdica; na bílis, saliva e leite; e através da placenta. Pelo fato de serem lipoinsolúveis, não penetram nas células dos mamíferos e apenas atravessam a barreira hematoencefálica se as meninges estiverem inflamadas; nesse caso, podem atingir concentrações terapeuticamente efetivas no líquído cefalorraquidiano. A eliminação da maior parte das penicilinas ocorre rápida e majoritariamente nos rins, sendo 90% através de secreção tubular. A meia-vida plasmática relativamente curta é um problema no uso clínico da benzilpenicilina, mas, como a penicilina funciona ao impedir a síntese da parede celular em organismos, a exposição intermitente e não contínua pode ser uma vantagem. Efeitos adversos As penicilinas estão relativamente isentas de efeitos tóxicos diretos (exceto as convulsões quando administradas por via intratecal). Os efeitos adversos principais são hipersensibilidade causada pelos compostos degradáveis da penicilina, que se combinam com as proteínas do hospedeiro e se tornam antigênicos. Erupções cutâneas e febre são comuns; um tipo tardio de doença do soro ocorre raramente. Muito mais grave é o choque anafilático agudo, que pode, embora raro, ser fatal. Quando as penicilinassão administradas oralmente, em especial as de amplo espectro, alteram a flora bacteriana do intestino. Isso pode estar associado a distúrbios gastrointestinais e, em alguns casos, a suprainfecções através de outros microrganismos resistentes à penicilina, provocando problemas como a colite pseudomembranosa (causada por Clostridium difficile, ver a seguir). Cefalosporinas e cefamicinas As cefalosporinas e as cefamicinas são antibióticos β-lactâmicos, inicialmente isoladas a partir de fungos. Apresentam o mesmo mecanismo de ação das penicilinas. As cefalosporinas semissintéticas de amplo espectro foram produzidas por meio da adição de diferentes cadeias laterais em R1 e/ou R2 ao núcleo da cefalosporina (Fig. 51.3). Esses agentes são hidrossolúveis e relativamente estáveis em meio ácido; variam em sua suscetibilidade às β-lactamases. Muitas cefalosporinas e cefamicinas estão agora disponíveis para uso clínico (Tabela 51.2). A resistência a esse grupo de fármacos tem aumentado devido às β-lactamases codificadas por plasmídeos ou cromossomos. Esse último está presente em quase todas as bactérias Gram-negativas e é muito mais ativo nas cefalosporinas hidrolisadas do que nas penicilinas. Em vários organismos, uma simples mutação pode resultar em elevada produção dessa enzima. A resistência também ocorre quando há baixa penetração do fármaco como resultado de alterações nas proteínas da membrana exterior ou de mutações nas proteínas de ligação. U sos clínicos das cefalosporinas As cefalosporinas são empregadas no tratamento de infecções causadas por microrganismos sensíveis a elas. Tal como ocorre com outros antibióticos, os padrões de sensibilidade variam geograficamente, e o tratamento é, muitas vezes, iniciado de forma empírica. Podem ser tratados muitos tipos de infecções, incluindo: • septicemia (p. ex., cefuroxima, cefotaxima); • pneumonia causada por microrganismos suscetíveis; • meningite (p. ex., ceftriaxona, cefotaxima); • infecções do trato biliar; • infecções do trato urinário (especialmente na gravidez ou nos pacientes que não respondem a outros fármacos); • sinusite (p. ex., cefadroxila). Aspectos farmacocinéticos Algumas cefalosporinas podem ser administradas oralmente, porém a maioria é administrada por via parenteral, intramuscular (o que pode ser doloroso) ou intravenosa. Após absorção, são amplamente distribuídas no corpo e algumas, como cefotaxima, cefuroxima e ceftriaxona, atravessam o líquido cefalorraquidiano. A excreção é feita majoritariamente pelos rins, principalmente por secreção tubular, mas 40% da ceftriaxona é eliminada na bílis. Efeitos adversos Podem ocorrer reações de hipersensibilidade muito semelhantes às que ocorrem com as penicilinas, e pode haver alguma sensibilidade cruzada; cerca de 10% dos indivíduos sensíveis à penicilina apresentarão reação alérgica às cefalosporinas. Foi reportada nefrotoxicidade (especialmente com cefadrina), uma vez que existe intolerância ao álcool induzida pelo fármaco. A diarreia também é comum e pode ser causada pela C. difficile. Outros antibióticos β-lactâmicos Os carbapenemos e os monobactamos (Fig. 51.3) foram desenvolvidos para lidar com os organismos Gram-negativos produtores de β-lactamases resistentes à penicilina. Carbapanemos O imipenem, um carbapanemo, atua da mesma forma que outros β-lactâmicos (Fig. 51.3). Tem um espectro muito amplo de atividade antimicrobiana e é ativo em muitos organismos Gram-positivos e Gram-negativos aeróbios e anaeróbios. No entanto, muitos dos estafilococos “resistentes à meticilina” mostram-se menos suscetíveis, com o surgimento de espécies resistentes de P. aeruginosa durante o tratamento. A resistência ao imipenem era baixa, mas tem aumentado devido a certos organismos que agora possuem genes cromossômicos que codificam as β-lactamases, as quais hidrolisam o imipenem. É administrado em conjunto com a cilastatina, que inibe sua inativação pelas enzimas renais. O meropenem é semelhante mas não é metabolizado pelos rins. O ertapenem tem amplo espectro de ações antibacterianas, mas está autorizado a um número limitado de indicações. A maioria dos carbapenemos não é oralmente ativa, sendo utilizada apenas em situações específicas. Os efeitos adversos são normalmente semelhantes aos de outros β-lactâmicos, e os mais frequentes são náuseas e vômitos. Pode ocorrer neurotoxicidade com concentrações plasmáticas elevadas. Monobactâmicos O monobactâmico principal é o aztreonam (Fig. 51.3), que é resistente à maioria das β- lactamases. É administrado através de injeção e tem uma meia-vida plasmática de duas horas. O aztreonam tem um espectro de atividade incomum e é efetivo apenas contra bacilos Gram-negativos aeróbios, como as espécies de pseudonomas Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae. Não tem ação contra organismos Gram-positivos ou anaeróbios. Os efeitos adversos são, de forma geral, semelhantes aos de outros antibióticos β- lactâmicos, porém esse agente não apresenta necessariamente reação imunológica cruzada com a penicilina e seus subprodutos e, assim, não provoca, normalmente, reação alérgica em indivíduos sensíveis à penicilina. Glicopeptídeos A vancomicina é um antibiótico glicopeptídeo, e a teicoplanina é semelhante, embora com maior duração de ação. A vancomicina inibe a síntese da parede celular (Cap. 50; Fig. 50.3). É principalmente efetiva contra as bactérias Gram-positivas. A vancomicina não é absorvida no intestino e é administrada apenas por via oral no tratamento de infecções gastrointestinais por C. difficile. No caso de uso sistêmico, é administrada por via intravenosa e tem uma meia-vida plasmática de cerca de oito horas. O principal uso clínico da vancomicina é no tratamento de MRSA (com frequência, nesse caso, é o fármaco de último recurso) e em outras infecções graves. Também é indicada no tratamento de infecções graves por estafilococos em pacientes alérgicos, tanto às penicilinas quanto às cefalosporinas. Os efeitos adversos incluem febre, erupções cutâneas e flebite no local da injeção. Também pode ocorrer ototoxicidade e nefrotoxicidade e, por vezes, reações de hipersensibilidade. A daptomicina é um novo antibacteriano lipopeptídeo com um espectro de ação semelhante ao da vancomicina. É normalmente utilizada, em combinação com outros fármacos, no tratamento de MRSA. Agentes antimicrobianos que afetam a síntese das proteínas bacterianas Tetraciclinas As tetraciclinas são antibióticos de largo espectro. Esse grupo inclui tetraciclina, oxitetraciclina, demeclociclina, limeciclina, doxiciclina, minociclina e tigeciclina. A ntibióticos β-lactâmicos São bactericidas porque inibem a síntese do peptidoglicano. Penicilinas • A primeira escolha em muitas infecções. • Benzilpenicilina: – administrada em injeções, meia-vida curta e é destruída pelas β-lactamases; – espectro: cocos Gram-positivos e Gram-negativos e algumas bactérias Gram-negativas; – atualmente, muitos estafilococos são resistentes. • Penicilinas resistentes às β-lactamases (p. ex., flucloxacilina): – administradas por via oral; – espectro: o mesmo da benzilpenicilina; – atualmente, muitos estafilococos são resistentes. • Penicilinas de amplo espectro (p. ex., amoxicilina): – administradas por via oral; são destruídas pelas β-lactamases; – espectro: o mesmo da benzilpenicilina (embora menos potente); também são ativas nas bactérias Gram-negativas. • Penicilinas de espectro ampliado (p. ex., ticarcilina): – administradas por via oral; são suscetíveis às β-lactamases; – espectro: tal como ocorre nas penicilinas de espectro amplo; também são ativas nas pseudomonas. • Efeitos adversos das penicilinas: majoritariamente, hipersensibilidade. • Uma combinação de ácido clavulânico e amoxicilina ou ticarcilina é efetiva em muitos microrganismos produtores de β-lactamases. Cefalosporinas e cefamicinas • Segunda escolha para muitas infecções. • Os fármacos orais (p. ex., cefaclor) são usados nas infecções urinárias. • Fármacos parentéricos (p. ex., cefuroxima, que é ativa em S. aureus, H.influenzae, Enterobacteriaceae). • Efeitos adversos: majoritariamente, hipersensibilidade. Carbapenemos • Imipenem é um antibiótico de amplo espectro. • O imipenem é combinado com a cilastina, que previne sua decomposição nos rins. Monobactâmicos • Aztreonam: É ativo apenas nas bactérias aeróbias Gram-negativas e resistente à maioria das β-lactamases. V ários agentes antibacterianos que impedem a síntese da parede ou da membrana celular • Os antibióticos glicopeptídicos (p. ex., vancomicina). A vancomicina é bactericida e atua por meio da inibição da síntese da parede celular. É utilizada por via intravenosa no caso de infecções por estafilococos multirresistentes ou por via oral no caso de colite pseudomembranosa. Os efeitos adversos incluem ototoxicidade e nefrotoxicidade. • Polimixinas (p. ex., colistimetato). São bactericidas e danificam as membranas celulares bacterianas. São altamente neurotóxicas e nefrotóxicas, e apenas são utilizadas topicamente. Mecanismo de ação Depois de serem absorvidas por organismos suscetíveis através de transporte ativo, as tetraciclinas atuam inibindo a síntese proteica (Cap. 50; Fig. 50.4). As tetraciclinas são consideradas bacteriostáticas e não bactericidas. Espectro antibacteriano O espectro de ação antimicrobiana das tetraciclinas é muito amplo e inclui bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, Mycoplasma, Rickettsia, Chlamydia spp., espiroquetas e alguns protozoários (p. ex., ameba). A minociclina também é efetiva contra N. meningitidis e tem sido utilizada para eliminar esse microrganimo da nasofaringe de indivíduos portadores. No entanto, a resistência generalizada a esses agentes tem diminuído sua utilidade. A resistência é transmitida principalmente por plasmídeos e, como os genes que controlam a resistência às tetraciclinas estão intimamente relacionados com os genes de resistência a outros antibióticos, os microrganismos podem desenvolver simultaneamente resistência a muitos fármacos. U sos clínicos das tetraciclinas • A utilização das tetraciclinas diminuiu devido à resistência generalizada ao fármaco, mas tem voltado a ser empregada, p. ex., nas infecções respiratórias, uma vez que a resistência tem retrocedido em virtude de sua utilização reduzida. Boa parte dessa classe é microbiologicamente semelhante; a doxiciclina é administrada uma vez por dia e pode ser utilizada em muitos pacientes com deficiência renal. Sua aplicação (por vezes combinada com outros antibióticos) inclui: – infecções por Rickettsia e Chlamydia , brucelose, antraz e doença de Lyme; – como uma segunda escolha útil, por exemplo em pacientes com alergias, em várias infecções (Tabela 51.1), incluindo Mycoplasma e Leptospira ; – infecções do trato respiratório (exacerbações da bronquite crônica, pneumonia adquirida na comunidade); – acne; – secreção inapropriada do hormônio antidiurético (p. ex., devido a alguns tumores malignos dos pulmões), causando hiponatremia: a demeclociclina inibe a ação desse hormônio de forma completamente distinta de seu efeito antibacteriano (Cap. 33). Aspectos farmacocinéticos Em geral, as tetraciclinas são administradas oralmente, mas também é possível usar a via parentérica. A minociclina e a doxiciclina são bem absorvidas oralmente. A absorção da maior parte das outras tetraciclinas é irregular e incompleta, mas é melhorada na ausência de alimentos. Como as tetraciclinas são quelantes de íons metálicos (cálcio, magnésio, ferro e alumínio) que formam compostos não absorvíveis, a absorção é diminuída na presença de leite, alguns antiácidos e preparações com ferro. Efeitos adversos Os efeitos adversos mais comuns são distúrbios gastrointestinais causados inicialmente pela irritação direta e, após, pela modificação da flora intestinal. Podem ocorrer deficiência de vitaminas do complexo B e superinfecção. Como as tetraciclinas absorvem Ca2+, são depositadas nos ossos e dentes em crescimento, provocando manchas e, por vezes, hipoplasia dentária e deformidades ósseas. Por esse motivo, não devem ser administradas em crianças, mulheres grávidas ou em período de amamentação. Outro efeito nas mulheres grávidas é a hepatotoxicidade. Também pode ocorrer fototoxicidade (sensibilidade à luz solar) principalmente com a demeclociclina. A minociclina pode produzir distúrbios vestibulares (tonturas e náuseas). Doses elevadas de teatraciclinas podem reduzir a síntese proteica nas células do hospedeiro, um efeito antianabólico que, eventualmente, resulta em lesão renal. O tratamento prolongado pode provocar distúrbios da medula óssea. Cloranfenicol O cloranfenicol foi originalmente isolado de culturas de Streptomyces. O cloranfenicol inibe a síntese das proteínas bacterianas ao se ligar à subunidade 50S do ribossomo bacteriano (Cap. 50; Fig. 50.4). Espectro antibacteriano O cloranfenicol tem largo espectro de ação antimicrobiana e é ativo contra microrganismos Gram-negativos, Gram-positivos e rickettsiae. É um bacteriostático para a maioria dos microrganismos, mas elimina H. influenzae. A forma de resistência, provocada por uma acetiltransferase, é mediada por plasmídeos. U sos clínicos do cloranfenicol • O uso sistêmico deve ser reservado a infecções graves, em que o benefício do fármaco se sobrepõe à sua toxicidade hematológica incomum, mas grave. Tais usos podem incluir: – infecções causadas por Haemophilus influenzae resistente a outros fármacos – meningite em pacientes nos quais a penicilina não pode ser utilizada – febre tifoide, embora ciprofloxacina ou amoxicilina e cotrimoxazol sejam igualmente eficazes e menos tóxicos. • A utilização tópica é igualmente segura e eficaz nas conjuntivites bacterianas. Aspectos farmacocinéticos Administrado oralmente, o cloranfenicol é absorvido rápida e completamente, atingindo concentração máxima no plasma após duas horas. Também pode ser administrado por via parenteral. O fármaco é largamente distribuído pelos tecidos e fluidos corporais, incluindo o LCR; a meia-vida é de aproximadamente duas horas. Cerca de 10% do cloranfenicol é excretado, inalterado, pela urina, e o restante é inativado no fígado. Efeitos adversos O principal efeito adverso do cloranfenicol é a depressão medular grave idiossincrática, que resulta em pancitopenia (diminuição global dos elementos celulares do sangue) – um efeito que, embora raro, pode ocorrer mesmo com dosagens baixas em alguns pacientes. O cloranfenicol deve ser utilizado com muito cuidado em recém-nascidos, com a monitoração das concentrações no plasma, uma vez que a inativação ou excreção inadequadas do fármaco podem resultar na “síndrome cinzenta” – vômitos, diarreia, flacidez, baixa temperatura e cor acinzentada –, resultando em uma taxa de 40% de mortalidade. Podem surgir reações de hipersensibilidade, bem como distúrbios gastrointestinais, na sequência da alteração da flora microbiana intestinal. Aminoglicosídeos Os aminoglicosídeos são um grupo de antibióicos com uma estrutura química complexa; são semelhantes entre si na atividade antimicrobiana, nas características farmacocinéticas e na toxicidade. Os agentes principais são gentamicina, estreptomicina, amicacina, tobramicina e neomicina. Mecanismo de ação Os aminoglicosídeos inibem a síntese das proteínas bacterianas (Cap. 50). Existem vários locais de ação. A penetração através da membrana celular da bactéria depende parcialmente do transporte ativo, dependente de oxigênio, por um sistema transportador de poliaminas (que, por acaso, é bloqueado pelo cloranfenicol), e tem ação mínima contra microrganismos anaeróbios. O efeito dos aminoglicosídeos é bactericida, sendo realçado por agentes que interferem na síntese da parede celular (p. ex., penicilinas). Resistência A resistência aos aminoglicosídeos vem-se tornando um problema. A resistência ocorre através de vários mecanismos diferentes, e o mais importante é a inativação por enzimas microbianas, das quais se conhecem nove ou mais. A amicacina foi considerada um substrato fraco para essas enzimas, mas alguns microrganismos também podem inativaresse agente. A resistência como resultado da falta de penetração pode ser largamente ultrapassada pelo uso concomitante de penicilina e/ou vancomicina, a custo do risco de aumento de efeitos adversos graves. Espectro antibacteriano Os aminoglicosídeos mostram-se efetivos contra muitos microrganismos Gram-negativos e alguns Gram-positivos. São amplamente utilizados contra microrganismos entéricos Gram-negativos e septicemia. Podem ser combinados com uma penicilina nas infecções causadas por estreptococos, por Listeria spp. e P. aeruginosa (Tabela 51.1). A gentamicina é o aminoglicosídeo mais utilizado, embora a tobramicina seja a eleita em caso de infecções por P. aeruginosa. A amicacina tem um espectro antimicrobiano mais amplo e pode ser eficaz em infecções por microrganismos resistentes à gentamicina e à tobramicina. Aspectos farmacocinéticos Devido à sua carga positiva, os aminoglicosídeos são altamente polarizados. Não são absorvidos pelo trato gastrointestinal e, em geral, são administrados via intramuscular ou via intravenosa. Os aminoglicosídeos atravessam a placenta, mas não a barreira hematoencefálica, embora seja possível atingir elevadas concentrações nos fluidos articulares e pleurais. A meia-vida plasmática é de duas a três horas. A eliminação ocorre totalmente através de filtração glomerular nos rins, sendo que 50 a 60% da dose é excretada inalterada após 24 horas. Se a função renal estiver comprometida, a acumulação ocorre rapidamente, resultando em aumento desses efeitos tóxicos (p. ex., ototoxicidade e nefrotoxicidade), os quais estão relacionados com a dosagem. Efeitos adversos Podem ocorrer efeitos tóxicos graves e relacionados com a dosagem, à medida que o tratamento for avançando. Os maiores riscos são ototoxicidade e nefrotoxicidade. A ototoxicidade envolve lesões progressivas, e até mesmo destruição, das células sensoriais na cóclea e no órgão vestibular do ouvido. Os resultados, normalmente irreversíveis, podem incluir vertigens, ataxia e perda de equilíbrio no caso de lesões vestibulares, e distúrbios auditivos ou surdez no caso de lesões na cóclea. Qualquer aminoglicosídeo pode produzir ambos os tipos de efeitos, porém é mais provável que a estreptomicina e a gentamicina interfiram na função vestibular e que a neomicina e a amicacina afetem majoritariamente a audição. A ototoxicidade é potencializada pelo uso concomitante de outros fármacos ototóxicos (p. ex., diuréticos de ansa; Cap. 29), e a suscetibilidade é geneticamente determinada através do DNA mitocondrial (Cap. 11). A nefrotoxicidade consiste em lesões nos túbulos renais e pode ser necessária a realização de diálise, embora a função renal seja recuperada depois de cessar a administração. É mais provável que a nefroxicidade ocorra em pacientes com doenças renais preexistentes ou em condições em que o volume de urina esteja diminuído e o uso concomitante de outros agentes nefrotóxicos aumente o risco (p. ex., cefalosporinas de primeira geração, vancomicina). Uma vez que a eliminação se dá praticamente por via renal, essa ação nefrotóxica pode comprometer a própria excreção e, assim, desenvolver- se um ciclo vicioso. As concentrações no plasma devem ser regularmente monitoradas e a dose ajustada em conformidade. Uma reação rara, porém grave e tóxica, é a paralisia causada por bloqueio neuromuscular. Em geral, essa reação só ocorre se os agentes forem administrados simultaneamente com agentes bloqueadores neuromusculares. Resulta da inibição da recaptação do Ca2+ necessário para a liberação de acetilcolina (Cap. 13). Macrolídeos O termo macrolídeo está relacionado com a estrutura – um anel de lactona ao qual se ligam um ou mais açúcares aminados. Os macrolídeos principais e os antibióticos relacionados são eritromicina, claritromicina e azitromicina. A espiramicina e a telitromicina têm pouca utilidade. Mecanismo de ação Os macrolídeos inibem a síntese das proteínas bacterianas através do efeito na translocação ribossômica (Cap. 50; Fig. 50.4). Os fármacos ligam-se à subunidade 50S do ribossomo bacteriano tal como o cloranfenicol e a clindamicina; qualquer um desses fármacos pode competir se administrados ao mesmo tempo. Espectro antimicrobiano O espectro antimicrobiano da eritromicina é muito semelhante ao da penicilina e é uma alternativa segura e eficiente para pacientes sensíveis à penicilina. A eritromicina é efetiva contra bactérias e espiroquetas Gram-positivas, mas não contra microrganismos Gram-negativos, exceto no caso de N. gonorrhoeae e, em menor escala, H. influenzae. São também suscetíveis Mycoplasma pneumoniae, Legionella spp. e alguns microrganismos clamidiais (Tabela 51.1). Pode ocorrer resistência, resultante da alteração controlada por plasmídeos do local de ligação da eritromicina no ribossomo bacteriano (Cap. 50; Fig. 50.4). A azitromicina é menos ativa que a eritromicina contra bactérias Gram-positivas, porém é consideravelmente mais eficaz contra H. Influenzae, e pode ser mais ativa contra Legionella. Pode ser utilizada para tratar Toxoplasma gondii, uma vez que elimina os quistos. A claritromicina é tão ativa quanto a eritromicina contra H. influenzae, e seu metabólito é duas vezes mais ativo. Também é eficaz contra Mycobacterium avium- intracellulare (que pode infectar pacientes imunologicamente comprometidos e pacientes idosos com doenças crônicas dos pulmões) e útil no tratamento de lepra e contra Helicobacter pylori (Cap. 30). Esses macrolídeos são ambos eficazes na doença de Lyme. Aspectos farmacocinéticos Os macrolídeos são administrados oralmente ou por via parenteral, embora as injeções intravenosas possam provocar tromboflebites locais. Difundem-se rapidamente na maioria dos tecidos, mas não atravessam a barreira hematoencefálica, havendo fraca penetração no líquido sinovial. A meia-vida plasmática da eritromicina é de cerca de noventa minutos; a da claritromicina é três vezes mais longa; e a da azitromicina é oito a 16 vezes maior. Os macrolídeos entram e, de fato, estão concentrados nos fagócitos – as concentrações de azitromicina nos lisossomos dos fagócitos podem ser superiores em quarenta vezes às apresentadas no sangue – e podem aumentar a eliminação intracelular das bactérias pelos fagócitos. A eritromicina é parcialmente inativada no fígado; a azitromicina é mais resistente à inativação, enquanto a claritromicina é convertida num metabólito ativo. A inibição do sistema do citocromo P450 por esses agentes pode afetar a biodisponibilidade de outros fármacos, conduzindo a interações clinicamente importantes, como, por exemplo, com a teofilina. A principal via de eliminação é através da bílis. Efeitos adversos Os distúrbios gastrointestinais são comuns e desagradáveis, mas não são graves. Também foram relatados os seguintes, com o uso da eritromicina: reações de hipersensibilidade como erupções cutâneas e febre, distúrbios temporários de audição e raramente, em tratamentos superiores a duas semanas, icterícia colestática. Podem ocorrer infecções esporádicas do trato gastrointestinal ou da vagina. Agentes antimicrobianos que afetam a topoisomerase Quinolonas As quinolonas incluem agentes de largo espectro, como ciprofloxacina, levofloxacina, ofloxacina, norfloxacina e moxifloxacina, bem como ácido nalidíxico, um fármaco de pequeno espectro utilizado nas infecções do trato urinário. A maioria é fluorada (fluoroquinolonas). Esses agentes inibem a topoisomerase II (uma DNA girase bacteriana), a enzima que produz a super-helicoidização negativa do DNA e que permite, desse modo, a transcrição ou replicação (Fig. 51.4). FIG. 51.4 Diagrama simplificado do mecanismo de ação das fluoroquinolonas. [A] Exemplo de uma quinolona (a molécula de quinolona é apresentada em laranja). [B] Diagrama esquemático (à esquerda) da dupla hélice e (à direita) da superespiral (Fig. 50.6). Em linhas gerais, DNA girase separa o superespiralamento positivo provocado pelo RNA (não apresentado) e introduz uma superespiral negativa. Espectro antibacteriano e uso clínico Desse grupo, aciprofloxacina é a mais utilizada. Tem largo espectro antibiótico efetivo, tanto contra microrganismos Gram-positivos quanto contra os Gram-negativos, incluindo Enterobacteriaceae (bacilos Gram-negativos entéricos), muitos microrganismos resistentes à penicilina, cefalosporinas e aminoglicosídeos e também contra H. influenzae, N. gonorrhoeae produtoras de penicilinases, Campylobacter spp. e pseudomonas. No caso dos microrganismos Gram-positivos, os estreptococos e os pneumococos são apenas inibidos de forma fraca, havendo grande incidência de resistência aos estafilococos. A ciprofloxacina deve ser evitada nas infecções por MRSA. Clinicamente, as fluoroquinolonas são mais aconselhadas no caso de infecções por bacilos e cocos Gram- negativos aeróbios.6 Surgiram espécies resistentes de Staphylococcus aureus e P. aeruginosa. A gentes microbianos que alteram a síntese proteica bacteriana • Tetraciclinas (p. ex., minociclina). Estes são antibióticos de largo espectro, ativos por via oral, bacteriostáticos. A resistência tem aumentado. Os distúrbios gastrointestinais são comuns. Também alteram o cálcio e depositam-se nos ossos em crescimento. Estão contraindicados em crianças e mulheres grávidas. • Cloranfenicol. Trata-se de um antibiótico de largo espectro ativo por via oral e bacteriostático. São possíveis os efeitos adversos graves, incluindo insuficiência da medula óssea e “síndrome cinzenta”. Deve ser reservado a infecções fatais. • Aminoglicosídeos (p. ex., gentamicina). Estes são administrados por injeção. São antibióticos de largo espectro e bactericidas (embora pouco ativos nos anaeróbios, estreptococos e pneumococos). A resistência tem aumentado. Os principais efeitos adversos estão relacionados com a nefrotoxicidade e ototoxicidade dependente da dosagem. Também devem ser vigiados os níveis séricos. (A estreptomicina é um antituberculoso aminoglicosídeo.) • Macrólidos (p. ex., eritromicina). Podem ser administrados por via oral e parenteral. São bactericidas/bacteriostáticos. O espectro antibacteriano é o mesmo da penicilina. A eritromicina pode causar icterícia. Os novos agentes são claritromicina e azitromicina. • Lincosamidas (p. ex., clindamicina). Podem ser administradas por via oral e parenteral. Podem causar colite pseudomembranosa. • Estreptograminas (p. ex., quinupristin/dalfopristin). Podem ser administradas em combinação, através de injeção. São consideravelmente menos ativas quando administradas em separado. São ativas em várias espécies de bactérias resistentes aos fármacos. • Ácido fusídico. Trata-se de um antibiótico de pequeno espectro que atua através da inibição da síntese proteica. Penetra nos ossos. Os efeitos adversos incluem distúrbios gastrointestinais. • Linezolida. Administrado por via oral ou injeção intravenosa. É ativo em várias espécies de bactérias resistentes a fármacos. U sos clínicos das fluoroquinolonas • Infecções do trato urinário complicadas (norfloxacina, ofloxacina). • Infecções respiratórias por Pseudomonas aeruginosa nos pacientes com fibrose cística. • Otite externa invasiva (“otite maligna”) provocada por P. aeruginosa. • Osteomilite crônica por bacilos Gram-negativos. • Erradicação da Salmonella typhi nos portadores. • Gonorreia (norfloxacina, ofloxacina). • Prostatite bacteriana (norfloxacina). • Cervicite (ofloxacina). • Antraz. Aspectos farmacocinéticos As fluoroquinolonas são bem absorvidas por via oral. Os fármacos acumulam-se em vários tecidos, principalmente nos rins, próstata e pulmões. Todas as quinolonas estão concentradas em fagócitos; a maioria não atravessa a barreira hematoencefálica, mas a ofloxacina sim. Os antiácidos de alumínio e magnésio interferem na absorção das quinolonas. A eliminação da ciprofloxacina e da norfloxacina é parcialmente feita através do metabolismo hepático pelas enzimas P450 (as quais podem inibir e, assim, provocar interações com outros fármacos) e parcialmente através de excreção renal. A ofoxacina é excretada na urina. Efeitos adversos Nos hospitais, podem surgir infecções por C. difficile, mas, para além disso, os efeitos adversos são pouco frequentes, normalmente ligeiros e reversíveis. As manifestações mais frequentes são distúrbios gastrointestinais e erupções cutâneas. Além de artropatia em pacientes jovens, também foram observados sintomas do sistema nervoso central – dor de cabeça e tonturas – e, com menos frequência, convulsões associadas a patologias do sistema nervoso central ou ao uso prolongado de teofilina ou fármacos anti- inflamatórios não esteroidais (AINEs) (Cap. 26). Existe uma interação clinicamente importante entre ciprofloxacina e teofilina (através da inibição das enzimas P450), que pode provocar toxicidade devido à teofilina em pacientes asmáticos tratados com fluoroquinolonas. Esse tópico é abordado em mais detalhes no Capítulo 28. A moxifloxacina prolonga o intervalo QT do eletrocardiograma e é amplamente utilizada de acordo com as indicações da FDA (Food and Drug Administration), como forma de controle positivo nos estudos realizados em voluntários saudáveis que avaliam os possíveis efeitos dos novos fármacos sobre a repolarização cardíaca. A gentes antimicrobianos que alteram a D N A topoisomerase I I • As quinolonas interferem com o superespiralamento do DNA. • A ciprofloxacina tem um espectro antibacteriano alargado, sendo especialmente ativa em microrganismos coliformes entéricos Gram-negativos, incluindo muitos microrganismos resistentes a penicilinas, cefalosporinas e aminoglicosídeos; também é efetiva contra H. influenzae, N. gonorrhoeae produtora de penicilinases, várias espécies de Campylobacter e pseudomonas. Há uma grande incidência de resistência aos estafilococos. • Os efeitos adversos incluem alterações do trato gastrointestinal. Reações de hipersensibilidade e, raramente, distúrbios do sistema nervoso central. Outros agentes antibacterianos menos comuns Metronidazol O metronidazol foi apresentado como um agente antiprotozoário (Cap. 54), mas também é ativo nas bactérias anaeróbias como Bacteroides, Clostridia spp e alguns estreptococos. É eficaz na terapia da Pseudomembranous colitis e importante no tratamento de infecções anaeróbias graves (p. ex., septicemia provocada por doenças intestinais). Tem ação semelhante à do dissulfiram (Cap. 49), razão pela qual os pacientes devem evitar bebidas alcoólicas enquanto estiverem sendo tratados com metronidazol. Estreptograminas A quinupristina e a dalfopristina são peptídeos cíclicos que inibem a síntese proteica das bactérias ao se ligarem à subunidade 50S do ribossomo bacteriano. A dalfopristina modifica a estrutura do ribossomo, de modo a promover a ligação de quinupristina. Individualmente, apresentam atividade bacteriana muito modesta, mas, quando combinadas entre si, sob a forma de injeção intravenosa, são ativas em muitas bactérias Gram-positivas. Essa combinação é utilizada para tratar infecções graves, geralmente quando não são aconselhados outros antibacterianos. Por exemplo, a combinação se mostra efetiva nos casos de MRSA e Enterococcus faecium resistente à vancomicina. Na atualidade, não são utilizados no Reino Unido. Ambos os fármacos são sujeitos inicialmente a metabolismo hepático e, por isso, devem ser administrados sob a forma de injeção intravenosa. A meia-vida de cada composto é de 1-2 horas. Os efeitos adversos incluem inflamação e dor no local da infusão, artralgia, mialgia e náuseas, vômitos e diarreia. Até o momento, a resistência à quinupristina e à dalfopristina não apresentou grandes problemas. Clindamicina A clindamicina é ativa em cocos Gram-positivos, incluindo muitos estafilococos resistentes à penicilina e muitas bactérias anaeróbias como Bacteroides spp. Atua da mesma forma que os macrolídeos e o cloranfenicol (Cap. 50; Fig. 50.4). Para além da utilização nas infecções causadas por organismos Bacteroides, é empregada no tratamento de infecções dos ossos e articulações por estafilococos. Também é administrada topicamente, sob a forma de gotas oculares, nasconjuntivites por estafilococos e como fármaco antiprotozoário (Cap. 54). Os efeitos adversos consistem majoritariamente em distúrbios gastrointestinais, de diarreia a colite pseudomembranosa, causada por uma C. difficile produtora de toxinas.7 7Também pode ocorrer com penicilinas de amplo espectro e cefalosporinas. Oxazolidinonas De início denominadas de “verdadeiramente a primeira classe de agentes antibacterianos a chegar ao mercado em várias décadas” (Zurenko et al., 2001), as oxazolidinonas inibem a síntese proteica das bactérias por meio de um mecanismo inovador: a inibição da ligação de N-formil-metionina-RNAt ao ribossomo 70S. A linezolida foi o primeiro fármaco desse grupo a ser apresentado. É ativa em uma grande variedade de bactérias Gram-positivas, como MRSA, Streptococcus pneumoniae resistente à penicilina e enterococos resistentes à vancomicina. A linezolida também é efetiva em alguns anaeróbios como o C. difficile. Os microrganismos Gram-negativos mais comuns não são suscetíveis a esse fármaco. A linezolida pode ser utilizada no tratamento da pneumonia, septicemia e infecções da pele e dos tecidos moles. Seu emprego tem sido restrito a infecções bacterianas graves em que outros antibióticos tenham falhado e, até o momento, são poucos os casos de resistência. Os efeitos adversos incluem trombocitopenia, diarreia, náuseas e, raramente, erupções cutâneas e tonturas. A linezolida é um inibidor não seletivo da monoamino-oxidase e é preciso tomar as devidas precauções (Cap. 47). Ácido fusídico O ácido fusídico é um antibiótico esteroide de espectro limitado, majoritariamente ativo nas bactérias Gram-positivas. Atua inibindo a síntese proteica bacteriana (Cap. 50; Fig. 50.4). Tal como ocorre com o sal de sódio, o fármaco é bem absorvido no intestino e amplamente distribuído nos tecidos. Uma parte é excretada na bílis, enquanto a outra é metabolizada. É utilizado em conjunto com outros agentes antiestafilococos na septicemia por estafilococos e largamente empregado em sua forma tópica nas infecções por estafilococos (p. ex., em gotas ou creme oftalmológico). Os efeitos adversos, como os distúrbios gastrointestinais, são bastante comuns. Podem ocorrer erupções cutâneas e icterícia. A resistência ocorre se utilizado de forma sistêmica como agente único, razão pela qual sempre é combinado com outros fármacos antibacterianos, quando usado continuamente. Nitrofurantoína A nitrofurantoína é um composto ativo numa variedade de microrganismos Gram- positivos e Gram-negativos. O desenvolvimento da resistência em organismos suscetíveis é rara e não existe resistência cruzada. É provável que seu mecanismo de ação esteja relacionado à sua capacidade de danificar o DNA bacteriano. É administrada oralmente e rapidamente absorvida no trato gastrointestinal e também rapidamente excretada pelos rins. Está limitada ao tratamento das infecções do trato urinário. Os efeitos adversos, como, por exemplo, os distúrbios gastrointestinais, são relativamente comuns e podem ocorrer reações de hipersensibilidade da pele e da medula óssea (p. ex., leucopenia). Também foram relatadas hepatotoxicidade e neuropatia periférica. A metenamina tem aplicação clínica semelhante à da nitrofurantoína e apresenta alguns efeitos adversos similares. Converte-se em formaldeído na presença de urina ácida. Polimixinas As polimixinas atualmente utilizadas são a polimixina B e o colistimetato. Apresentam propriedades detergentes catiônicas e alteram a membrana da parede celular bacteriana (Cap. 50). Têm ação bactericida seletiva e rápida nos bacilos Gram- negativos, principalmente nas pseudomonas e nos microrganismos coliformes. Não são absorvidas no trato gastrointestinal. O uso clínico desses fármacos é limitado por sua toxicidade e está majoritariamente reservado à esterilização do intestino e ao tratamento tópico dos ouvidos, olhos ou infecções de pele causadas por microrganismos suscetíveis. Os efeitos adversos podem ser graves e incluem neurotoxicidade e nefrotoxicidade. Agentes antimicobacterianos As principais infecções micobacterianas nos seres humanos são tuberculose e lepra, infecções crônicas causadas por Mycobacterium tuberculosis e M. leprae, respectivamente. Outras infecções micobacterianas de menor importância neste livro são causadas por M. avium-intracellulare (na verdade, dois organismos), que podem atingir alguns pacientes com AIDS. Um problema específico com as micobactérias é que podem sobreviver nos macrófagos após a fagocitose, a não ser que essas células sejam “ativadas” por citocinas produzidas pelos linfócitos Th1 (Caps. 6 e 18). Fármacos utilizados para tratar tuberculose Durante séculos, a tuberculose foi uma doença fatal, mas a introdução da estreptomicina nos finais dos anos 1940, seguida da isoniazida e, nos anos 1960, da rifampicina e do etambutol revolucionou o tratamento. A tuberculose chegou a ser vista como uma doença de tratamento fácil, mas, infelizmente, já não o é, e as espécies com maior virulência ou com resistência a vários fármacos são agora comuns (Bloom & Small, 1998). Atualmente, provoca mais mortes do que qualquer outro agente isolado, embora as taxas de infecção estejam decaindo lentamente. Em 2012, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou que 8,6 milhões de pessoas tenham contraído a doença e que cerca de 1,3 milhão tenha morrido em decorrência da infecção. Um terço da população mundial (2 bilhões de pessoas) tem o bacilo; desse número, 10% irão desenvolver a doença a certa altura de sua vida. Os países mais pobres da África e da Ásia carregam o fardo da doença, em parte devido a uma sinergia sinistra entre as micobactérias (p. ex., M. tuberculosis, M. avium-intercellulare) e o HIV. Cerca de um quarto das mortes associadas ao HIV são causadas por tuberculose. Os tratamentos são liderados pelos fármacos de primeira linha: isoniazida, rifampicina, rifabutina, etambutol e pirazinamida. Os fármacos de segunda linha incluem capreomicina, cicloserina, estreptomicina (raramente usada no Reino Unido), claritromicina e ciprofloxacina. Esses são utilizados para tratar infecções provavelmente resistentes aos fármacos de primeira linha ou quando os agentes de primeira linha não podem ser usados devido a reações adversas. Para diminuir a probabilidade de surgimento de microrganismos resistentes, com frequência recorre-se ao tratamento combinado de fármacos, o qual, em geral, envolve: • fase inicial (cerca de dois meses) com uma combinação de isoniazida, rifampicina e pirazinamida (mais etambutol, no caso de suspeita de se tratar de um microrganismo resistente); • segunda fase (cerca de quatro meses) de tratamento com isoniazida e rifampicina; são necessários tratamentos mais prolongados em pacientes com meningite, problemas nas articulações, ósseos ou infecção resistente. Isoniazida A atividade antibacteriana da isoniazida está limitada às micobactérias. Ela interrompe o crescimento dos microrganismos em repouso (ou seja, bacteriostáticos), mas pode eliminar as bactérias que se dividem. A isoniazida penetra livremente nas células dos mamíferos e, por isso, revela-se eficaz contra microrganismos intracelulares. A isoniazida é um pró-fármaco que deve ser ativado pelas enzimas bacterianas antes de poder exercer sua atividade inibitória na síntese dos ácidos micólicos, constituintes importantes da parede celular específica das micobactérias. Pode ocorrer resistência ao fármaco, pela penetração reduzida na micobactéria, mas não se verifica resistência cruzada com outros fármacos tuberculostáticos. A isoniazida é rapidamente absorvida no trato gastrointestinal e largamente distribuída através dos tecidos e fluidos corporais, incluindo o LCR. Um ponto importante é a boa penetração nas lesões tuberculosas “caseosas” (ou seja, nas lesões necróticas com uma consistência tipo queijo). O metabolismo, que envolve acetilação, depende de fatores genéticos que determinam se uma pessoa é um acetilador lento ou rápido do fármaco (Cap. 11); os inativadores lentos apresentam umaresposta terapêutica melhor. A meia-vida nos inativadores lentos é de três horas, e de uma hora nos inativadores rápidos. A isoniazida é excretada na urina – uma parte inalterada e outra sob a forma acetilada ou outra forma inativa. Os efeitos adversos dependem da dosagem e ocorrem em cerca de 5% dos pacientes, sendo o mais comum as reações alérgicas cutâneas. Foram reportados outros efeitos adversos, incluindo febre, hepatoxicidade, alterações hematológicas, artroses e vasculite. Efeitos adversos que envolvem o sistema nervoso central ou periférico resultam, majoritariamente, da deficiência em piridoxina e são comuns em pacientes subnutridos, exceto se essa substância for administrada como forma de prevenção. A isoniazida pode causar anemia hemolítica em pacientes com deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase e diminui o metabolismo de agentes antiepilépticos como fenitoína, etosuximida e carbamazepina, resultando em aumento da concentração no plasma e toxicidade desses fármacos. Rifampicina A rifampicina (também denominada rifampina) atua através da ligação e da inibição de RNA polimerase DNA-dependente nas células procarióticas, mas não nas eucaróticas (Cap. 50). Trata-se de um dos antituberculosos conhecidos mais ativos e também é ativo na lepra e em grande parte das bactérias Gram-positivas, bem como em muitas espécies Gram-negativas. Penetra nas células fagocitárias e pode, desse modo, eliminar microrganismos intracelulares, incluindo o bacilo da tuberculose. A resistência pode desenvolver-se rapidamente num processo único em que uma mutação cromossômica modifica o alvo na RNA polimerase DNA-dependente (Cap. 50). A rifampicina é administrada oralmente e largamente distribuída nos tecidos e fluidos corporais (incluindo o LCR), conferindo uma tonalidade laranja à saliva, expectoração, lágrimas e suor. É parcialmente excretada na urina e parcialmente na bílis, uma parte da qual entra no ciclo êntero-hepático. O metabólito retém a atividade antibacteriana, mas é mal absorvido pelo trato gastrointestinal. A meia-vida é de 1-5 horas, e torna-se inferior durante o tratamento devido à indução de enzimas microssômicas hepáticas. Os efeitos adversos são relativamente pouco frequentes. Os mais comuns são erupções cutâneas, febre e distúrbios gastrointestinais. Foram reportados danos no fígado acompanhados por icterícia, que, numa proporção muito pequena de pacientes, revelaram-se fatais; a função hepática deve ser avaliada antes de iniciar o tratamento. A rifampicina pode acelerar o metabolismo das células hepáticas (Cap. 10), resultando em aumento da degradação de varfarina, glicocorticoides, analgésicos narcóticos, fármacos orais antidiabéticos, dapsona e estrógenos (razão pela qual se desaconselha o uso de contraceptivos orais). Etambutol O etambutol afeta apenas as micobactérias. É captado por estas e exerce efeito bacteriostático 24 horas após, provavelmente pela inibição da síntese micobacteriana da parede celular. A resistência surge rapidamente se for utilizado de forma isolada. O etambutol é administrado por via oral e é bem absorvido; pode atingir concentrações terapêuticas no LCR, no caso da meningite tuberculosa. No sangue, é captado pelos eritrócitos e libertado lentamente. O etambutol é parcialmente metabolizado e excretado na urina. Os efeitos adversos são pouco comuns, e o mais significativo é a neurite ótica, relacionada com a dosagem; há maior probabilidade no caso de função hepática diminuída. Isso resulta em distúrbios visuais que se manifestam inicialmente por alteração das cores, em particular do vermelho e do verde, ocorrendo decréscimo progressivo da acuidade visual. Aconselha-se a vigilância da visão das cores antes e durante os tratamentos prolongados. Pirazinamida A pirazinamida é inativa em pH neutro, mas turbeculostática em pH ácido. É eficaz contra os microrganismos intracelulares nos macrófagos porque, após a fagocitose, os microrganismos ficam contidos em fagolisossomos, onde o pH é baixo. O fármaco provavelmente inibe a síntese de ácidos graxos. A resistência desenvolve-se rapidamente, mas a resistência cruzada não ocorre com isoniazida. O fármaco é bem absorvido após administração oral e largamente distribuído, penetrando nas meninges. É excretado através dos rins, principalmente por filtração glomerular. Os efeitos adversos incluem gota, associada às altas concentrações de uratos no plasma. Também foram reportados transtornos gastrointestinais, mal-estar e febre. Os danos graves, em nível hepático, decorrentes das elevadas dosagens, constituíram outrora um problema, mas são menos prováveis devido aos tratamentos com baixas dosagens/períodos curtos que agora são utilizados; no entanto, a função hepática deve ser avaliada antes do tratamento. Capreomicina A capreomicina é um antibiótico peptídico administrado através de injeção intramuscular. Os efeitos adversos incluem lesões nos rins e no nervo auditivo, com consequentes surdez e ataxia. O fármaco não deve ser administrado em combinação com estreptomicina ou outros fármacos que possam causar surdez. Cicloserina A cicloserina é um antibiótico de largo espectro que inibe o crescimento de muitas bactérias, incluindo coliformes e micobactérias. É hidrossolúvel e destruída em pH ácido. Atua através da inibição competitiva da síntese da parede celular bacteriana; isso acontece ao prevenir a formação da D-alanina e do dipeptídeo D-Ala-D-Ala, o qual é adicionado à cadeia lateral inicial do tripeptídeo no ácido N-acetilmurâmico, ou seja, impede a finalização da construção do bloco principal de peptidoglicano (Cap. 50; Fig. 50.3). A cicloserina é absorvida oralmente e distribuída através dos tecidos e fluidos corporais, incluindo LCR. A maior parte do fármaco é eliminada sob a forma ativa na urina, mas cerca de 35% dela é metabolizada. A cicloserina tem efeitos adversos majoritariamente no sistema nervoso central. Podem ocorrer vários distúrbios, de dores de cabeça e irritabilidade a depressão, convulsões e estados psicóticos. Seu uso é limitado à tuberculose resistente a outros fármacos. F ármacos antituberculosos Para evitar o surgimento de microrganismos resistentes, empregam-se tratamentos combinados (p. ex., três fármacos inicialmente e, em seguida, um regime de dois fármacos). Fármacos de primeira linha • A isoniazida elimina as micobactérias que se reproduzem ativamente nas células do hospedeiro. Administrada por via oral, penetra nas lesões necróticas e também no líquido cefalorraquidiano (LCR). Os “acetiladores lentos” apresentam boa resposta. Baixa toxicidade. A deficiência de piridoxina acentua o risco de neurotoxicidade. Não existe resistência cruzada com outros agentes. • A rifampicina é um fármaco potente, administrado por via oral, que inibe a RNA polimerase bacteriana. Penetra no LCR. Os efeitos adversos são pouco frequentes (mas podem ocorrer lesões graves no fígado). Induz as enzimas hepáticas metabolizadoras dos fármacos. A resistência pode desenvolver-se rapidamente. • Etambutol inibe o crescimento das micobactérias. É administrado por via oral e penetra no LCR. Os efeitos adversos não são comuns, mas pode ocorrer neurite oftalmológica. A resistência pode desenvolver-se rapidamente. • A pirazinamida é tuberculostática nas micobactérias intracelulares. Administrada oralmente, penetra no LCR. A resistência pode desenvolver-se rapidamente. Os efeitos adversos incluem aumento dos uratos plasmáticos e toxicidade hepática em dosagens elevadas. Fármacos de segunda linha • A capreomicina é administrada por via intramuscular. Os efeitos adversos incluem danos nos rins e no nervo auditivo. • A cicloserina é um agente de largo espectro. Inibe a síntese do peptidoglicano numa fase inicial. Administrada oralmente, penetra no LCR. Os efeitos adversos alteram principalmente o sistema nervoso central. • A estreptomicina, um antibiótico aminoglicosídeo, atua através da inibição da síntese proteica bacteriana. É administrada por via intramuscular. Os efeitos adversos são ototoxicidade(principalmente vestibular) e nefrotoxicidade. Fármacos utilizados para tratar a lepra A lepra é uma das doenças mais antigas conhecidas pelo homem, com suas primeiras menções em textos anteriores a 600 a.C. O organismo causador é M. Leprae. Trata-se de uma doença crônica desfigurativa com longa latência. Historicamente, os leprosos foram colocados no ostracismo e forçados a viver isolados, embora a doença não seja, na verdade, particularmente contagiosa. Outrora tida como incurável, o aparecimento, nos anos 1940, da dapsona e, posteriormente, da rifampicina e da clofazimina, nos anos 1960, mudou completamente a perspectiva sobre a lepra. Atualmente, via de regra, é curável, e os números globais mostram que as taxas de prevalência da doença baixaram 90% nos últimos 20 anos, resultado de medidas de saúde pública e de esquemas de múltiplos fármacos (para impedir eventual ocorrência de resistência aos fármacos) implementados pela OMS e apoiados por algumas empresas farmacêuticas. A doença foi eliminada em 119 dos 122 países onde era considerada um problema sério de saúde. Em 2012, cerca de 180 mil novos casos foram reportados principalmente na Ásia e na África. A lepra paucibacilar, caracterizada por uma a cinco lesões cutâneas, é majoritariamente do tipo tuberculoide,8 sendo tratada durante seis meses com dapsona e rifampicina. A lepra multibacilar, caracterizada por mais de cinco lesões cutâneas, é majoritariamente do tipo lepromatoso, sendo tratada durante dois anos no mínimo, com rifampicina, dapsona e clofazimina. Dapsona A dapsona está quimicamente relacionada com as sulfonamidas e, como sua ação é antagonizada pelo PABA, atua provavelmente através da inibição da síntese do folato bacteriano. A resistência ao fármaco tem aumentado de forma consistente desde a sua introdução e, atualmente, recomenda-se o tratamento combinado com outros fármacos. A dapsona é administrada por via oral; é bem absorvida e amplamente distribuída através da água corporal por todos os tecidos. A meia-vida plasmática é de 24-48 horas, mas parte do fármaco permanece no fígado, nos rins (e, de certo modo, na pele e nos músculos) por períodos mais longos. Existe uma circulação êntero-hepática do fármaco, mas parte é acetilada e excretada na urina. A dapsona também é empregada no tratamento da dermatite herpetiforme, uma dermatose crônica pruriginosa associada à doença celíaca. Os efeitos adversos ocorrem com bastante frequência e incluem hemólise dos glóbulos vermelhos (em geral, sem gravidade suficiente para levar a uma anemia grave), metemoglobinemia, anorexia, náuseas e vômitos, febre, dermatite alérgica e neuropatia. Podem ocorrer reações lepromatosas (exacerbação das lesões lepromatosas) e, vez ou outra, uma síndrome potencialmente fatal semelhante à mononucleose infecciosa. Clofazimina A clofazimina é um corante com estrutura complexa. Seu mecanismo de ação contra o bacilo da lepra pode envolver alterações no DNA. Também tem ação anti-inflamatória e é útil em pacientes em que a dapsona causa efeitos secundários inflamatórios. A clofazimina é administrada por via oral e acumula-se no corpo, sendo capturada pelo sistema mononuclear fagocitário. A meia-vida plasmática pode prolongar-se até oito semanas. O efeito antileprótico é lento e só se torna evidente a partir de seis a sete semanas. Os efeitos adversos podem estar relacionados com o fato de a clofazimina ser um corante. A pele e a urina podem desenvolver uma coloração avermelhada, e as lesões, uma descoloração negro-azulada. Também podem ocorrer distúrbios relacionados com a dosagem, como náuseas, tonturas, cefaleias e de natureza gastrointestinal. F ármacos antileprosos • Lepra tuberculoide: dapsona e rifampicina (rifampina). – A dapsona é semelhante à sulfonamida e pode inibir a síntese do folato. É administrada por via oral. Os efeitos adversos são bastante frequentes e alguns até mesmo graves. A resistência está aumentando. – Rifampicina (quadro Fármacos antituberculosos). • Lepra lepromatosa: dapsona, rifampicina e clofazimina. – A clofazimina é um corante administrado por via oral e pode acumular-se nos macrófagos através de sequestradores. Sua ação é retardada por seis a sete semanas e a meia-vida é de oito semanas. Os efeitos adversos incluem pele e urina avermelhadas e, por vezes, distúrbios gastrointestinais. Novos fármacos antibacterianos possíveis Em contraste com as rápidas descobertas e os desenvolvimentos que caracterizaram os anos “heroicos” da pesquisa sobre os antibióticos, que englobou aproximadamente o período de 1950-1980 e que produziu praticamente todos os fármacos existentes, esse fluxo diminuiu desde então; apenas dois antibióticos totalmente novos foram apresentados nesse período (Jagusztyn-Krynicka & Wysznska, 2008). Ao mesmo tempo, a resistência tem aumentado, e cerca de metade das mortes por infecções na Europa é atribuída à resistência aos fármacos (Watson, 2008).9 Em geral, a resistência surge cerca de dois anos após a introdução de um novo agente (Bax et al., 2000). Numa meta-análise inquietante, Costelloe et al. (2010) concluíram que a maior parte dos pacientes a quem foram prescritos antibióticos para tratamento de infecções dos tratos urinário ou respiratório desenvolveu resistência individual ao fármaco poucas semanas depois, e que essa resistência poderia persistir até um ano após o tratamento. Cerca de metade do uso de antibióticos é para fins veterinários; não é apenas a medicina humana que está implicada nesse fenômeno. A razão do fracasso no desenvolvimento de novos fármacos é complexa e tem sido analisada em detalhes por Coates et al. (2011), que também avaliaram muitos outros fatos emergentes de pesquisas acadêmicas e industriais. A mensagem geral é bem deprimente: destaca-se que será necessário descobrir mais de 20 novas classes de antibióticos nos próximos 50 anos para combater os desafios causados pelo aumento de resistência aos fármacos. Numa nota mais otimista, novos candidatos a antibióticos continuam a ser descobertos em plantas (Limsuwan et al., 2009) e bactérias (Sit & Vederas, 2008), bem como através de abordagens químicas da medicina tradicional. Em suma, atualmente os investigadores na linha de frente desse importante campo recorrem a todas as tecnologias mais recentes para travar esse combate: a bioinformática, que utiliza a informação derivada do sequenciamento do genoma, é uma dessas abordagens (Bansal, 2008). A procura por fatores de virulência bacterianos é promissora (Escaich, 2008). Foram desenvolvidos novos processos de rastreamento (Falconer & Brown, 2009) que poderão revelar novos alvos, e uma farmacodinâmica sofisticada veio a ajudar na resolução desse problema (Lister, 2006). O mundo aguarda, com expectativa, pelos novos avanços. Referências e leitura complementar Fármacos antibacterianos Allington, D. R., Rivey, M. P. Quinupristine/dalfoprist: a therapeutic review. Clin. Ther. 2001; 23:24–44. Ball, P. Future of the quinolones. Semin. Resp. Infect. 2001; 16:215–224. (Uma boa visão geral sobre essa classe de fármacos) Blondeau, J. M. Expanded activity and utility of the new fluoroquinolones: a review. Clin. Ther. 1999; 21:3–15. (Boa visão geral) Bryskier, A. Ketolides – telithromycin, an example of a new class of antibacterial agents. Clin. Microbiol. Infect. 2000; 6:661–669. Duran, J. M., Amsden, G. W. Azithromycin: indications for the future? Expert Opin. Pharmacother. 2000; 1:489–505. Greenwood D., ed. Antimicrobial Chemotherapy, third ed, Oxford: Oxford University Press, 1995. (Um bom manual) Lowy, F. D. Staphylococcus aureus infections. N. Engl. J. Med. 1998; 339:520–541. (Base da patogênese da infecção por S. aureus, resistência; referências ampliadas) Perry, C. M., Jarvis, B. Linezolid: a review of its use in the management of serious gram-positive infections. Drugs. 2001; 61:525–551. Sato, K., Hoshino, K., Mitsuhashi, S. Mode of action of the new quinolones: the inhibitory action on DNA gyrase. Prog. Drug Res. 1992; 38:121–132. Shimada, J., Hori, S. Adverse