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ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO

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ANTROPOLOGIA 
DA RELIGIÃO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
 > Sintetizar o desenvolvimento da antropologia no Brasil.
 > Reconhecer os principais antropólogos brasileiros e suas contribuições na 
construção da identidade brasileira.
 > Explicar como se construiu a identidade brasileira na imensa diversidade 
cultural e geográfica do País.
Introdução
O objeto de investigação da antropologia é o ser humano e, por isso, ela se cons-
titui como a área na qual investigador e objeto investigado coincidem. Por sua 
especificidade e metodologia, a antropologia possibilita a compreensão de nós 
mesmos pelo olhar do outro e que nos situemos diante dos diferentes mundos 
culturais e sociais, compreendendo-os melhor.
A antropologia surgiu com o objetivo de resolver os problemas e encontrar 
soluções para a urbanização, a industrialização e a expansão europeia. Ao contrário 
da sociologia, por exemplo, desenvolvida no séc. XVIII para compreender melhor 
as sociedades europeias, com o objetivo de um “olhar interno”, para dentro de sua 
sociedade, a antropologia foi desenvolvida com foco no “olhar externo”, visando 
a melhor compreender os povos colonizados na África, na Ásia e na Américas. 
Assim, floresceu por meio de pesquisas financiadas pelas elites europeias, pela 
Antropologia no 
Brasil: construção da 
identidade brasileira
Adriane da Silva Machado Möbbs
necessidade de conhecer para dominar. Por outro lado, a antropologia brasileira 
surgiu e se desenvolveu com o objetivo de compreender sua própria diversidade 
social e cultural, com o foco em suas múltiplas culturas.
Neste capítulo, você vai descobrir como se deu o desenvolvimento da 
antropologia no Brasil, o que permitirá a compreensão de nossa diversidade 
cultural e, consequentemente, um melhor entendimento da coletividade 
como povo.
O desenvolvimento da antropologia 
no Brasil
No Brasil, a antropologia surgiu entre as décadas 1930 e 1940. Muitos aspectos 
favoreceram seu surgimento e desenvolvimento no Brasil, e acabaram por 
caracterizar o pensamento antropológico brasileiro por um longo período.
Podemos considerar o alemão Curt Nimuendajú (1883–1945), nascido 
Curt Unckel, o “pai da Antropologia brasileira”. Tido como um expoente 
em estudos indígenas no País, o etnólogo dedicou mais de 40 anos de sua 
vida ao estudo dos povos indígenas brasileiros. Sem formação acadêmica, 
mudou-se para o Brasil aos 20 anos e, dois anos depois, juntou-se aos 
Apapokuva, povo guarani do interior de São Paulo (atualmente conhecido 
como Nhandeva). A partir dessa imersão, que deu origem à obra As len-
das da criação e destruição do mundo como fundamentos da religião dos 
Apapocúva-Guarani, publicada em 1915, começa o desenvolvimento da 
etnologia brasileira. Incialmente, a antropologia era reconhecida por sua 
prática e, assim, considerada uma etnologia.
Desde seus primórdios, a antropologia brasileira esteve presa a seus 
objetos reais de investigação, como afirma Cardoso de Oliveira (1988, p. 230):
Isso significa que o que se poderia chamar de modo de conhecimento — que 
deveria marcar a natureza do saber antropológico — ficou historicamente su-
bordinado à natureza dos objetos reais (quer seja o índio, o negro ou o branco) 
com todos os "equívocos que posições deste teor geram no desenvolvimento 
da disciplina. E, em razão dessa mesma preponderância do objeto real sobre 
objetos teoricamente construídos, surgiram duas tradições no campo da An-
tropologia Brasileira, ordenando a divisão de trabalho, seja na academia, seja 
nas atividades profissionais não universitárias. A primeira tradição que aparece 
com mais vigor é a da Etnologia Indígena, sendo a segunda a da Antropologia 
da Sociedade Nacional.
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira2
Podemos, portanto, considerar que, inicialmente, a antropologia se de-
senvolveu a partir de duas tradições: 
1. a etnologia indígena, na qual o nome de Curt Nimuendajú é, sem dú-
vida, referência;
2. a Antropologia da Sociedade Nacional, cujo expoente é Gilberto Freyre. 
Isso ocorreu entre as décadas de 1920 e 1930, quando a profissão de 
antropólogo e o campo da antropologia ainda não estavam bem definidos 
no Brasil. 
Embora, nos anos 1930 e 1940, Lévi-Strauss e Radcliffe-Brown tenham 
lecionado no Brasil, eles não são tidos como atores do desenvolvimento da 
antropologia. Sabe-se, porém, que suas obras tiveram impacto nas décadas 
seguintes, como afirma Cardoso de Oliveira (1988, p. 230–231): “[...] o certo é 
que a absorção de suas ideias se daria nas gerações seguintes pela leitura 
de seus livros. Nesse caso, destaca-se a influência de Lévi-Strauss a partir 
dos anos 1960, enquanto a de Radcliffe-Brown (salvo engano) restringiu-se 
aos anos 1940 e 1950”.
Desde os primórdios da antropologia no Brasil, vários pesquisadores 
utilizaram o termo ‘etnologia’ como parte da antropologia cultural ou 
social, o qual “[...] abrange os estudos em que o pesquisador entra em contato 
direto, face a face, com os membros da sociedade, ou segmento social estu-
dado, contrastando-a com a arqueologia, que abarca as pesquisas apoiadas em 
vestígios deixados por sociedades desaparecidas ou por períodos passados de 
sociedades que continuam a existir” (MELATTI, 1983, p. 4). Contudo, confundem-se 
os termos “etnologia” e “etnografia”; por isso é sempre importante observar a 
época em que o termo é empregado. 
Segundo Kottak (2013), antropólogo contemporâneo, há dois tipos de ati-
vidades realizadas pelos antropólogos: a etnografia (com base no trabalho 
de campo) e a etnologia (com base na comparação intercultural). De acordo 
com Kottak (2013, p. 33), “A etnografia fornece uma descrição de determinada 
comunidade, sociedade ou cultura. [...] A etnologia examina, interpreta, analisa 
e compara os resultados da etnografia — os dados coletados em diferentes 
sociedades — e os usa para comparar, contrastar e fazer generalizações sobre 
a sociedade e a cultura”.
No artigo Traficante do excêntrico: os antropólogos no Brasil dos anos 30 
aos anos 60 (1988), Mariza Corrêa (1988, p. 79) destaca um aspecto importante 
acerca do desenvolvimento da antropologia: 
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira 3
Talvez seja uma ironia adequada a esta disciplina que se quer uma ciência do outro 
que ela tenha criado, em quase toda a parte, tradições antropológicas nacionais 
fundadas por estrangeiros: Franz Boas nos Estados Unidos, Curt Nimuendajú no 
Brasil, Bronislaw Malinowiski na Inglaterra.
A pesquisadora destaca, ainda, um certo descompasso em meio ao inter-
câmbio entre os pesquisadores nacionais e estrangeiros, e, sobretudo, acerca 
de “como nos pensamos” e “como nos pensam” (1988, p. 79–80):
No caso brasileiro, se acrescenta ainda a esta ambiguidade, às vezes uma harmonia, 
às vezes um descompasso, entre “como pensamos” e “como nos pensam”. A traje-
tória brasileira da disciplina é, mais do que costumamos registrar explicitamente, 
parte tanto de seu percurso internacional, quanto do imaginário dos antropólogos 
em geral: lembrando de novo o exemplo de Geertz, é de Lévi-Strauss que ele está 
falando quando escreve “mito brasileiro” ao invés de seu nome (1983, p. 150).
Ao fazermos uma genealogia da antropologia no Brasil, deparamo-nos com 
tradições também inventadas. Esse é um fato importante a ser considerado, 
uma vez que o distanciamento do pesquisador nem sempre foi possível. 
Percebe-se, muitas vezes, considerações um tanto distantes de nossa re-
alidade. Nesse sentido, podemos citar a percepção de nossos índios como 
“selvagens”, de acordo com a interpretação de Lévi-Strauss. Acerca dessas 
tradições-invenções, afirma Corrêa (1988, p. 80):
As tradições aqui inventadas, se não o foram apenas por estrangeiros, tiveram uma 
forte participação deles nessa invenção: se olharmos atentamente o mapa etno-
lógico de Curt Nimuendaju, quase poderemos ver as sombras dos pesquisadores 
que as estudaram projetando-se sobre os contornos das comunidades indígenas 
por eles estudadas atéa década de 40, projeção que nos ajudaria mais, entretanto, 
a entender a distribuição deles, pesquisadores, num território disciplinar comum, 
do que a de seus objetos de interesse.
Como sabemos, o trabalho etnográfico do antropólogo consiste em inserir-se 
na comunidade e, com certo distanciamento, observar os hábitos e costumes 
de determinada cultura. Observar e interpretar sem adjetivar, porém, talvez 
seja bastante difícil depois de muitos anos inserido na mesma comunidade.
O início da caminhada da antropologia no Brasil
Até a década de 1930, aqueles que faziam antropologia no Brasil não eram 
formados na área e, por isso, são referidos como cronistas, pois não realizavam 
o trabalho etnográfico. Contudo, por meio de suas crônicas, forneceram-nos 
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira4
bons registros de observações, ainda que sem controle ou orientação me-
todológica, pois não havia cientistas sociais na época. Nesse período, como 
afirma Melatti (1983, p. 5): 
[...] não existe a formação acadêmica de etnólogo no Brasil. Os estudiosos brasilei-
ros que dão contribuições nessa área são médicos, juristas, engenheiros, militares 
ou de outras profissões. Mesmo os etnólogos que vêm do exterior são formados 
em centros de pesquisa de criação recente, pois a Antropologia era então ramo 
novo das ciências, mesmo na Europa. Alguns deles são também de outras áreas 
acadêmicas e que, tendo-se interessado pela Etnologia, procuraram aperfeiçoar-se 
nos centros que a cultivavam.
Como ainda não tínhamos a presença de cientistas sociais, alguns ter-
mos foram utilizados de forma diferente daquela compreendida hoje, como 
acontece com a etnologia, por exemplo, cuja definição e classificação atuais 
podem ser observadas no Quadro 1. Contudo, por um longo período no Brasil, 
chamou-se de etnólogo aquele pesquisador que estudava as tribos indígenas. 
Acerca dessa etnologia praticada na época, Melatti (1983, p. 5) afirma:
A partir de meados do século passado, alguns brasileiros se incumbem de tarefas 
de caráter etnológico. Esses pesquisadores, quase todos autodidatas em Antro-
pologia, a par de seus levantamentos a respeito de índios, negros, sertanejos, 
mostravam na maior parte dos casos um certo interesse no destino das popula-
ções que estudavam e seu lugar na formação do povo brasileiro, cujo futuro era 
objeto de suas preocupações. Boa parte desses autores vivem um conflito entre a 
simpatia que devotavam às minorias que estudavam e a situação de inferioridade 
em que as colocavam na hierarquia biológica que supunham existir. Sobre as 
idéias conflituosas a respeito da população nacional, mantidas pelos intelectuais 
brasileiros no final do Império e da Primeira República, é muito útil a leitura de 
Thomas Skidmore (1976). Por outro lado, esses autores já estavam atentos para o 
problema do contato interétnico, tratado daí por diante por todas as gerações de 
etnólogos brasileiros, naturalmente segundo os recursos teóricos de cada época.
Quadro 1. Etnografia e etnologia: duas dimensões da antropologia cultural
Etnografia Etnologia
Exige trabalho de campo para coletar 
dados
Utiliza os dados coletados por uma 
série de pesquisadores
Muitas vezes, descritiva Normalmente, sintética
Específica de um grupo ou de uma 
comunidade
Comparativa/intercultural
Fonte: Adaptado de Kottak (2013).
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira 5
A história do surgimento da antropologia no Brasil pode ser dividida em 
três momentos, compreendidos entre as décadas de 1930 e 1960, segundo 
Corrêa (1988, p. 80):
Os três momentos são, eles mesmos, exemplares: nas décadas de trinta e quaren-
ta, com a chegada do cinema falado (como lembra Almir de Castro, 1977), entrou 
também no país a modernidade da língua inglesa — belas cartas de amigos de 
Eduardo Galvão, dos Estados Unidos durante a Segunda Guerra, sugerem o impacto 
do modo de vida norte-americano sobre os brasileiros, assim como o registram 
os cronistas da época; na década de cinqüenta, o espírito de desenvolvimento 
vigente no país se expressou também na institucionalização dás ciências sociais 
e, na década seguinte, muitas das iniciativas dos anos anteriores amadureceram, 
não obstante os obstáculos políticos conhecidos.
A seguir, abordaremos esses momentos a partir da história da antro-
pologia e com foco nas contribuições de alguns antropólogos, utilizando, 
como exemplo, o trabalho de Melatti. Certamente, não poderemos abarcar 
toda a história da antropologia brasileira. Então, destacaremos a etnologia, 
pois há mais trabalhos e registros nessa área. Assim, cabe ressaltar que 
começaremos pelo período anterior ao identificado como inicial por Corrêa 
(1988), pois vamos considerar os cronistas e o período dedicado à etnologia 
(como a compreendiam àquela época). Após, abordaremos a antropologia e 
os antropólogos até os anos 1930, dos anos 1930 aos anos 1960 e, por fim, 
dos anos 1960 em diante.
Os principais antropólogos brasileiros 
e suas contribuições 
A antropologia no Brasil, como comentamos, começa com pesquisadores 
autodidatas, sem formação na área, uma vez que ainda não existia a pro-
fissão no Brasil. Contudo, mesmo sem formação acadêmica na área, esses 
pesquisadores fizeram descobertas bastante relevantes, e seus registros nos 
permitem compreender melhor os índios, os negros e os sertanejos.
Antigamente, os pesquisadores se mantinham atentos ao problema inte-
rétnico, que acabou sendo abordado por todas as gerações de antropólogos 
brasileiros, considerando os recursos disponíveis em cada época (MELATTI, 
1983). Entre esses pesquisadores, podemos citar, por exemplo, Antônio Gon-
çalves Dias.
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira6
Antônio Gonçalves Dias integrou a Comissão das Borboletas, comissão 
científica que participou de uma expedição exploradora às províncias do 
Brasil setentrional projetada pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro 
(IHGB). A expedição, que partiu em 1859, ficou mais tempo no Ceará, mas 
Gonçalves Dias foi para a Amazônia, onde se dedicou aos estudos linguísticos 
e a coleções etnográficas.
Embora tenha feito parte dessa comissão, Gonçalves Dias não possui 
registros históricos nem publicações acerca de levantamentos da expedição. 
Possui escritos que datam desse período, mas se trata de pesquisas de base 
bibliográfica, entre as quais se destacam: “Amazonas”, trabalho publicado 
na Revista do IHGB em que apresenta e discute o problema das mulheres 
guerreiras que dão nome ao Rio Amazonas, e “Brasil e Oceania”, no qual 
faz referência aos cronistas, apresenta uma descrição dos índios do litoral 
brasileiro e das populações da Oceania e discute o problema da civilização 
cristã. Sobre esse estudo, Melatti (1983, p. 6) afirma o seguinte:
“Brasil e Oceania”, longo texto em que, baseado nos cronistas, ainda que de modo 
não exaustivo, apresenta uma descrição dos índios do litoral brasileiro, seguida 
de uma descrição resumida das populações da Oceania, para finalmente discutir o 
problema de qual das duas populações estava mais apta para receber a civilização 
cristã. No fim do trabalho Gonçalves Dias propõe que, ao lado do incentivo à colo-
nização estrangeira, haja uma retomada da catequese dos índios. Gonçalves Dias 
não estava à frente das idéias de seu tempo: aceitava uma hierarquia das raças e 
admitia, como Martius, que os índios estavam em decadência, não motivada, mas 
apenas acentuada pelo contato com os brancos.
Além de Gonçalves Dias, merece destaque José Vieira Couto de Magalhães, 
militar e presidente das províncias de Goiás e de Mato Grosso. O político se 
interessou pelo estudo dos indígenas durante sua empreitada acerca da 
navegação regular a vapor do Araguaia ao Tocantins. Entre seus estudos, os 
mais conhecidos são Viagem ao Araguaia (1863) e O selvagem (1876). Sobre 
eles, Melatti (1983, p. 6) afirma, respectivamente:
O primeiro se refere a uma viagem que realizou em 1863 e contém dados sobre 
índios das vizinhançasdo Araguaia e Tocantins. No segundo apresenta esboços 
de classificação das raças, que hierarquiza, e das línguas indígenas; lendas indí-
genas, sem dizer exatamente quem narrou cada uma, mas indicando que obteve 
uma delas em Belém e que coligou outras entre soldados indígenas do Exército. 
Defende a ideia de assimilar os índios, aprendendo-lhes a língua para se poder 
ensinar-lhes o português, de modo a evitar seu extermínio futuro. Esse cuidado 
estaria relacionado à sua previsão de que a seleção natural iria eliminar os índios, 
mas aconselhava a se tomar o cuidado de misturá-los com os brancos antes que 
isso acontecesse, a fim de que estes criassem resistências ao ambiente físico 
do Brasil. O melhor mestiço seria o branco com um quinto de sangue indígena. 
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira 7
Além das figuras já mencionadas, cabe destacar João Barbosa Rodrigues, 
botânico e responsável pelas informações de diversos grupos indígenas 
da Amazônia e pelo primeiro contato amistoso com os Krixaná, no ano de 
1884. Rodrigues tinha interesse pelo curare, além de pelas lendas e cantigas 
amazônicas em língua geral (língua Tupi que fora modificada e usada pelos 
colonizadores) e pelos muiraquitãs. 
Outra figura de destaque foi o engenheiro Antônio Manoel Gonçalves 
Tocantins, que publicou, em 1877, Estudos sobre a tribo “Mundurucú”, pequena 
monografia acerca dos vários aspectos do modo de vida dos Munduruku 
(família, agricultura, guerra, conservação das cabeças dos inimigos, pintura 
de corpo, feitiçaria, mitos etc.). Gonçalves Tocantins visitou essa tribo em 
1875, o que o motivou a abordar também “[...] importantes problemas do 
contato interétnico, como relações dos índios com os missionários, destes 
com a população civilizada, o comércio com os regatões” (MELATTI, 1983, p. 6).
Destaca-se, também, o engenheiro, militar e jornalista Euclides da Cunha, 
que relatou os sertanejos de Canudos e os do Sudoeste da Amazônia, uma 
vez que os conheceu pessoalmente. Obviamente, sua obra não ficou isenta 
de comentários e críticas. Entre seus críticos, estão Gilberto Freyre, Clovis 
Moura, Dante Moreira Leite e Thomas Skidmore.
Além dos autores já mencionados, cabe acrescentar dois autores res-
ponsáveis pelos primeiros estudos sobre o negro no Brasil: o desenhista e 
arquiteto Manuel Raimundo Querino e o médico Raimundo Nina Rodrigues. 
Manuel Raimundo Querino, descendente de africanos, foi responsável por 
minuciosas descrições das tradições de origem africana, enquanto Nina 
Rodrigues deixou, em seu legado, contribuições acerca da diversidade de 
culturas trazidas pelos escravos e seus locais de origem na África. Contudo, 
aderiu às noções (comuns na época) de inferioridade e superioridade racial.
No período inicial da antropologia no Brasil, havia grande interesse de 
pesquisadores alemães na população indígena. Houve vários, mas o primeiro 
e mais famoso foi Karl von den Steinen, que deixou a psiquiatria para se 
dedicar à etnologia por influência de Bastian. Karl von den Steinen, como 
destaca Melatti (1983, p. 8): “[...] em sua expedição de 1884 descobriu os 
grupos indígenas xinguanos e foi o primeiro a descer o rio Xingu desde seus 
formadores até a foz. Numa segunda expedição, de 1887 a 1888, voltou a visitar 
os xinguanos”. Há vários outros pesquisadores alemães, mas optamos por 
mencionar apenas Steinen, por ser o primeiro e o mais famoso. 
As preocupações evolucionistas e difusionistas foram abandonadas so-
mente nas décadas de 1920 e 1930, no que se refere às pesquisas com índios. 
O número de pesquisadores alemães também vai diminuindo, mas a maioria 
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira8
dos pesquisadores continua sendo estrangeira, embora alguns acabem se 
estabelecendo no Brasil ou em países vizinhos. Entre esses pesquisadores de 
origem alemã e que se radicaram no Brasil, destaca-se Curt Nimuendajú, como 
mencionamos anteriormente, considerado o “pai da antropologia no Brasil”.
Nimuendajú se destaca no estudo das sociedades indígenas devido à 
extensão de seu trabalho e, também, pela dedicação com que o realizou. 
Sua produção vai desde obras mais extensas sobre os Guarani, os Xerênte, 
os Canelas, os Apinayé e os Tukúna, até outros trabalhos acerca da língua, 
da mitologia, da história, de diversos grupos indígenas, além de um mapa 
etno-histórico dos índios do Brasil, com uma enorme lista de referências aos 
materiais consultados.
A contribuição de Nimuendajú não ficou restrita à teoria. Quando era 
funcionário do Serviço de Proteção aos Índios (então recentemente 
criado), garantiu a fixação dos Guarani em reservas, no estado de São Paulo. Sua 
atuação como funcionário do Serviço lhe permitiu, ainda, atuar junto à atração 
dos índios Parintintin, sobre os quais elaborou um importante relatório — que, 
inclusive, foi tema do romance de Ferreira de Castro intitulado O instinto supremo.
Nimuendajú se correspondia com o antropólogo Robert Lowie, nascido 
em Viena, mas radicado nos Estados Unidos. O diálogo com Lowie preencheu, 
em parte, as lacunas de sua formação acadêmica, mas a contribuição não 
foi apenas por meio da correspondência: Lowie traduziu e providenciou tra-
duções para o inglês das principais monografias de Nimuendajú, chamando 
a atenção para a importância do estudo das sociedades Jê. Em sua autobio-
grafia, mencionou a correspondência e intitulou o capítulo 9º de “Trabalho 
de campo realizado A distância”, o que talvez demostre sua influência no 
trabalho realizado por Nimuendajú.
Além disso, é importante salientar a contribuição do trabalho etnográ-
fico dos missionários salesianos nesse período: Antônio Colbacchini, César 
Albisetti e Ângelo Jayme Venturelli. Guardadas as devidas proporções, os 
trabalhos dos salesianos se aproximam daquele realizado por Nimuendajú, 
uma vez que demostram certo cuidado na descrição, preocupam-se com a 
organização social e evitam os antigos temas evolucionistas e difusionistas, 
ainda que não tivessem orientação teórica. Contudo, diferentemente de 
Nimuendajú, eles se concentraram no estudo dos Borôro e, por conta de 
seu trabalho confessional, por meio da catequese, eram atores de mudança 
social, intervindo e alterando crenças e costumes. 
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira 9
Antropologia no Brasil: dos anos 1930 aos anos 1960
Esse período tem seu início marcado pela criação da primeira Faculdade de 
Filosofia, Ciências e Letras do Brasil, na também recém-criada Universidade 
de São Paulo (1934). Na mesma época, nasce a primeira Escola de Sociologia 
e Política. A partir da criação da Universidade, houve a necessidade de con-
tratação de professores da área, até então não existente no Brasil, motivo 
pelo qual foram contratados professores estrangeiros. Nesse sentido, Melatti 
(1983, p. 11) afirma:
Para fazer frente à necessidade de professores, foram contratados vários mestres 
estrangeiros. Desse modo, Roger Bastide, Emílio Willems, Claude Lévi-Strauss 
passaram a trabalhar na primeira, enquanto Herbert Baldus, Donald Pierson, 
na segunda, onde esteve como professor visitante, por breve período durante a 
Segunda Guerra Mundial, Radcliffe-Brown. Também no Rio de Janeiro criava-se a 
Universidade do Distrito Federal, onde Gilberto Freyre assumiu em 1935, como seu 
primeiro professor, a cátedra de Antropologia Social e Cultural; ocupou também a 
cátedra de Sociologia, enquanto Arthur Ramos ficava com a de Psicologia Social. 
Segundo Mariza Corrêa (2013, p. 43), é importante considerar que: 
Fora do eixo central do país, em regiões onde as Faculdades de Filosofia se instala-
riam mais tarde, seguindo aqueles modelos, e dependendo da região, a concentração 
daqueles que seriam depois definidos ou reconhecidos como antropólogos estava 
em torno de um museu (caso do Museu Paraense Emilio Goeldi, por exemplo, de 
tradição antiga), de um personagem (como Gilberto Freyre, já nessa época perso-
nagem nacional em Pernambuco), ou de um “movimento”(o da defesa do folclore, 
de Câmara Cascudo, em Natal, ou os Congressos Afro-Brasileiros, no Recife, em 
1934, organizado por Gilberto Freyre, e na Bahia, em 1937, organizado por Édison 
Carneiro). Que essas instituições, pessoas ou grupos eram os pontos de referência 
de uma território antropológico implicitamente reconhecido são testemunhos os 
depoimentos daqueles que vinham de fora dele, como os antropólogos estrangeiros, 
ou os antropólogos nativos em sua circulação interna: esses pontos, mencionados 
por todos, vão assim desenhando o perfil de um grupo que se reconhecia, ainda 
que não se definisse explicitamente como tal, nos anos trinta e quarenta.
A maioria dos professores de São Paulo vinha da Europa, mas a maior 
influência nas pesquisas e nos estudos era norte-americana. Nesse período, 
havia um profundo interesse norte-americano pelos países da América Latina, 
entre eles o Brasil. Tal influência se dava não apenas pelos docentes que 
aqui ministravam, mas também pela presença dos primeiros pesquisadores 
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira10
norte-americanos, cujo objeto de estudo eram as sociedades indígenas, as 
religiões afro-brasileiras ou pequenas comunidades, e por conta dos jovens 
brasileiros que iam estudar nos Estados Unidos. 
Em 1941, foi fundada a Sociedade Brasileira de Antropologia e Etno-
logia, cujo primeiro presidente foi Arthur Ramos. Em 1942, publicou um 
Manifesto contra o racismo. Em 1955, a Sociedade deu lugar à Associação 
Brasileira de Antropologia (ABA). Florestan Fernandes (1956) nos apresenta 
uma excelente avaliação acerca do desenvolvimento da etnologia durante 
este período.
Para conhecer a obra e a contribuição de Florestan Fernandes, 
sociólogo e educador brasileiro, autor de duas excelentes mono-
grafias sobre os Tupinambás, povo indígena extinto no século XVII, e de um 
relato sobre a importância social dos relatos dos cronistas, acesse o volume 
da Coleção Educadores cujo título leva seu nome e está disponível no site 
Domínio Público. 
Segundo Cardoso de Oliveira (1988), Nimuendajú (na etnologia indígena) 
e Gilberto Freyre (na Antropologia da Sociedade Nacional) desempenharam 
seus papéis como “heróis civilizadores”:
Tanto um quanto o outro se utilizaram amplamente do conceito de Cultura: Curt 
Nimuendajú pela importância que teve, em seu trabalho, Robert Lowie; Gilberto 
Freyre por seus estudos de pós-graduação na Columbia University. Embora exis-
tam, com certeza, outros nomes nesses períodos, nenhum deixou uma obra com o 
impacto das obras de Nimuendajú e Freyre. O impacto deixado pelas obras destes 
autores, nos permite dizer que "a partir delas a disciplina antropológica entre 
nós, nas duas tradições que me referi, teria se firmado de maneira irreversível 
(CARDOSO DE OLIVEIRA, 1988, p. 112).
Contudo, se o período no qual se inserem Nimuendajú e Freyre, segundo 
Cardoso de Oliveira (1988) pode ser considerado o que ele chama de “Período 
Heroico”, o período em que se insere Darcy Ribeiro é chamado de “Período 
Carismático”. É importante esclarecer que a divisão e a classificação da his-
tória da antropologia do Brasil são realizadas por Cardoso de Oliveira (1988), 
segundo as categorias de cultura e estrutura (Quadro 2).
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira 11
Quadro 2. Fases históricas da disciplina (1920–1950)
Categorias/
tradições Etnologia indígena
Antropologia da 
Sociedade Nacional
Cultura � Período Heroico: 
Nimuendajú
 � Período Carismático: 
Darcy Ribeiro
(Cultural funcionalismo)
 � Período Heroico: Gilberto 
Freyre
 � Período Carismático: 
Charles Wagley
(Cultural histórico)
Estrutura Período Carismático: 
Florestan Fernandes
(Estrutural funcionalismo)
Período Carismático: D. 
Pierson
(Sociologismo funcionalista)
Fonte: Adaptado de Cardoso de Oliveira (1988).
Foi entre os anos 1930 e 1960 que se desenvolveram os estudos acerca das 
interpretações gerais do Brasil e os estudos de mudança social, cultural e/ou 
aculturação, e quando houve a predominância do funcionalismo no estudo 
das culturas e sociedades indígenas. Durante as décadas de 1940 e 1950, 
foram realizados os chamados estudos de comunidade, nos quais se realiza 
a observação direta de pequenas cidades ou vilas, utilizando as técnicas 
desenvolvidas pela etnologia no estudo das sociedades tribais.
Houve, ainda, a abordagem funcionalista do folclore. Entre os vários 
trabalhos, destacam-se aqueles realizados por Florestan Fernandes e a pes-
quisa de Cristina Argenton Colonelli, cuja bibliografia arrolou cerca de 4.919 
trabalhos sobre o folclore brasileiro (MELATTI, 1983).
Salienta-se a importância de Gilberto Freyre, Florestan Fernandes, Sérgio 
Buarque de Holanda e Roberto DaMatta para a antropologia no Brasil, mas 
suas contribuições serão abordadas na seção seguinte, em que vamos falar 
da identidade brasileira e da antropologia a partir dos anos 1960.
A construção da identidade brasileira na 
imensa diversidade cultural e geográfica 
do País
Anteriormente, a cultura foi mencionada como uma das categorias inves-
tigadas pelos antropólogos, ou seja, como um dos objetos de estudo da 
antropologia. Antes de falarmos da identidade brasileira e de sua diversidade 
cultural, cabe aclarar o conceito de cultura. 
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira12
A cultura engloba o comportamento habitual e as crenças que são passadas 
por meio da enculturação. É baseada na capacidade humana de aprendiza-
gem cultural e inclui regras de conduta internalizadas pelos seres humanos. 
Outros animais aprendem, mas somente os seres humanos têm aprendizagem 
cultural, que depende de símbolos. Ela possui aspectos tangíveis (objetos 
e símbolos) e intangíveis (ideias e normas), e é uma das principais, se não a 
principal, característica da identidade de um povo (KOTTAK, 2013).
Pode haver diferença entre as culturas? Sim, a diferença entre culturas se 
dá pelos elementos que a constituem e compõem o conceito de identidade 
cultural.
A enculturação é o processo pelo qual uma criança aprende sua 
cultura. A enculturação informal vem da família e de amigos, en-
quanto a enculturação formal vem da escola. A cultura é apreendida por meio 
dos processos de socialização, com agentes de socialização, e os processos 
primários são realizados pelas instituições: família, escola e instituição religiosa.
Por sua vez, a endoculturação é um processo de aprendizagem no meio 
da cultura em que se vive, de modo que, consciente ou inconscientemente, 
o indivíduo (ou grupo social) apreende e incorpora os elementos culturais 
pertinentes (MARCONI, 2010).
Compreendido o conceito de cultura e sua importância, cabe definir iden-
tidade. Acerca da identidade, Barroso (2017a, p. 70–71, grifo nosso) afirma o 
seguinte:
A identidade se refere a como você é identificado em uma determinada cultura, ou 
seja, apresenta suas características em termos do seu relacionamento no mundo. 
Deste modo, você é percebido pelos outros a partir dos elementos culturais que 
manifesta ao mundo, e, por isso, você é reconhecido. Assim, não é sempre que 
temos o controle sobre como as pessoas nos rotulam. Podemos dizer que esses 
rótulos são dados a partir de características as quais os outros reconhecem em nós.
Muitos antropólogos brasileiros contribuíram para a compreensão e a 
caracterização da identidade brasileira, tanto para a forma como é compre-
endida no Brasil quanto para a forma como é vista por estrangeiros. Seus 
estudos acabam, muitas vezes, por abordar a nossa identidade. Nesse sentido, 
destaca-se o estudo de Roberto DaMatta intitulado “O que faz o brasil, Brasil?” 
(1986). Nessa obra, DaMatta nos apresenta a nós mesmos e aos outros por 
meio de nossas festas populares, nossas manifestações religiosas, nossa 
literatura e arte, enfim: tudo aquilo que nos é próprio e capaz de definir 
nossa identidade nacional, apesar da absurda diversidade cultural do Brasil. 
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira13
Vejamos um pequeno excerto de sua obra, em que menciona como sabe que é 
brasileiro, reunindo várias características de nosso povo e retratando nossa 
diversidade cultural (DAMATTA, 1986, p. 16):
Sei, então, que sou brasileiro e não norte-americano, porque gosto de comer 
feijoada e não hamburguer; porque sou menos receptivo a coisas de outros pa-
íses, sobretudo costumes e ideias; porque tenho um agudo sentido de ridículo 
para roupas, gestos e relações sociais; porque vivo no Rio de Janeiro e não em 
Nova York; porque falo português e não inglês; porque, ouvindo música popular, 
sei distinguir imediatamente um frevo de um samba; porque futebol para mim é 
um jogo que se pratica com os pés e não com as mãos; porque vou à praia para 
ver e conversar com os amigos, ver as mulheres e tomar sol, jamais para praticar 
um esporte; porque sei que no carnaval trago à tona minhas fantasias sociais e 
sexuais; porque sei que não existe jamais um “não” diante de situações formais 
e que todas admitem um “jeitinho” pela relação pessoal e pela amizade; porque 
entendo que ficar malandramente “em cima do muro” é algo honesto, necessário 
e prático no caso do meu sistema; porque acredito em santos católicos e também 
nos orixás africanos; porque sei que existe destino e, no entanto, tenho fé no 
estudo, na instrução e no futuro do Brasil; porque sou leal a meus amigos e nada 
posso negar a minha família; porque, finalmente, sei que tenho relações que não 
me deixam caminhar sozinho neste mundo, como fazem meus amigos americanos, 
que sempre se veem e existem como indivíduos! 
Quando um índio utiliza elementos linguísticos e culturais de outra 
cultura para se expressar, por qual processo cultural podemos dizer 
que ele passou? Sem dúvida, é possível afirmar que ele passou por um processo 
de mudança cultural, que ocorre a partir da difusão (empréstimo) de traços entre 
culturas. Ela pode ser direta (espontânea) ou forçada, dependendo da situação. 
Esse processo é chamado, pelos antropólogos, de aculturação, e se trata do 
intercâmbio permanente de traços culturais entre grupos em contato contínuo.
Cabe observar, porém, que os olhares dos antropólogos se voltaram para 
a sociedade brasileira muito antes de DaMatta. Uma das mais famosas obras 
de interpretação do Brasil é Casa grande e senzala, de Gilberto Freyre (embora 
tenha sido responsável por disseminar a falsa ideia de que havia democracia 
racial no Brasil). Além desse livro, outras importantes obras publicadas foram 
Sobrados e mocambos (1936) e Ordem e progresso (1959), fora uma série de 
trabalhos paralelos. Entre os temas abordados em suas obras, estão a família 
patriarcal e o Nordeste. 
Sobre Casa grande e senzala e o mito da democracia racial, cabe ressaltar 
que:
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira14
Como o povo brasileiro era composto por povos oriundos de três origens distintas 
— indígenas, europeus e africanos —, muitos estrangeiros acessavam informações 
da relação entre esses povos a partir da produção da literatura brasileira sobre 
o assunto. E um dos livros de referência foi a obra Casa Grande e senzala, do 
sociólogo Gilberto Freyre. Ali, ele apresentou o negro escravizado desfrutando de 
certo conforto material, beneficiando-se de regalias e até sendo visto como pessoa 
de confiança dos senhores e das sinhás. Portanto, esse livro deixou de lado os 
horrores do trabalho compulsório e da relação de submissão dos escravizados, 
fazendo crer que houvesse uma miscigenação generalizada, tranquila e natural 
entre os índios, brancos e negros. Assim, foi interpretado que, no Brasil, havia uma 
democracia racial. ainda que o autor não tenha dito com essas palavras, como se 
as pessoas de diferentes origens fossem tratadas e percebidas da mesma forma 
(BARROSO, 2017a, p. 82).
Segundo Melatti (1983, p. 12-13, grifo nosso), “[...] como interpretação do 
Brasil, também é de grande importância o pequeno livro de Sérgio Buarque 
de Holanda, Raízes do Brasil [...], de âmbito mais vasto e publicado original-
mente em francês em 1960”.
Ainda no que se refere à diversidade cultural do povo brasileiro, é ne-
cessário mencionar que os processos culturais são vivenciados em todos os 
âmbitos sociais, são dinâmicos, possibilitam trocas sociais e podem ocorrer 
de modo concomitante. Sobre isso:
O antropólogo Roberto Da Matta (1987) nos lembra que a sociedade brasileira é 
relacional, pois nela se concretiza a síntese de modelos advindos de diferentes 
sociedades. A tríade majoritária que compôs a base da sociedade brasileira — os 
indígenas, os europeus e os africanos — compartilhou, de forma mais tensa ou me-
nos tensa, crenças, valores, hábitos, gostos, sentidos, pensamentos que resultaram 
em novas manifestações culturais. Um deles é o candomblé. Essa é uma religião 
que foi trazida com os negros escravizados no Brasil, e, sendo o país colonizado 
por portugueses católicos, as práticas religiosas do Candomblé eram reprimidas. 
Assim, seus praticantes, em seus ritos religiosos, disfarçavam a devoção aos seus 
deuses se direcionando aos santos da religião católica. Com o tempo, essa reli-
gião foi contraindo características próprias e seus elementos rituais englobaram 
aspectos da cultura caipira e da cultura indígena (BARROSO et al., 2017b, p. 64).
 Portanto, no Brasil, a fé também ocupa um importante papel identitário. 
Assim, o processo descrito por Barroso et al. (2017b) é um processo cultural 
bastante comum em nosso País e que, em certa medida, acaba por nos definir 
como sociedade brasileira: o sincretismo, ou seja, a reunião de doutrinas 
diferentes, com a manutenção de traços perceptíveis das doutrinas origi-
nais. Esse processo cultural se dá a partir do imbricamento de diferentes 
elementos culturais no âmbito religioso e se torna característico no Brasil, 
por sua diversidade cultural.
Antropologia no Brasil: construção da identidade brasileira 15
Referências
BARROSO, P. F. Cultura e identidade brasileira. In: BARROSO, P. F.; BONETE, W. J.; QUEIROZ, 
R. Q. de M. Antropologia e cultura. Porto Alegre: Sagah, 2017a. p. 69–78. 
BARROSO, P. F.; BONETE, W. J.; QUEIROZ, R. Q. de M. Antropologia e cultura. Porto Alegre: 
Sagah, 2017b.
CARDOSO DE OLIVEIRA, R. O que é isso que chamamos de antropologia brasileira? In: 
________________. Sobre o pensamento antropológico. Rio de Janeiro/Brasília: Tempo 
Brasileiro/CNPQ, 1988. p. 109–129. (Biblioteca Tempo Universidade, 83). 
CORRÊA, M. Traficantes do excêntrico. In: ___________. Traficantes do simbólico & 
outros ensaios sobre a história da antropologia. Campinas: Unicamp, 2013. p. 15–34. 
DAMATTA, R. O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1986.
KOTTAK, C. P. Um espelho para a humanidade: uma introdução à antropologia cultural. 
8. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013.
MARCONI, M. de A.; PRESOTTO, Z. M. N. Antropologia: uma introdução. 7. ed. São Paulo: 
Atlas, 2010.
MELATTI, J. C. A antropologia no Brasil: um roteiro. Brasília: UNB, 1983. (Série 
Antropologia). 
Leitura recomendada
OLIVEIRA, M. M. de. Florestan Fernandes. Recife: Massangana, 2010. (Coleção Educadores).
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