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Aula 1

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Ética na Saúde
Aula 1: Conceito e modelos de ética
Iniciaremos nossos estudos estabelecendo a diferença entre os conceitos de ética e moral. Veremos como, apesar de estarem intimamente relacionados, estes conceitos possuem diferenças bem definidas. 
Em seguida, faremos um breve histórico do desenvolvimento histórico da Ética nas sociedades ocidentais. Veremos suas origens na Grécia antiga, a evolução para a ética cristã e em seguida para a chamada ética moderna que perdurou dos séculos XVI ao século XIX. 
Por fim, analisaremos a ética contemporânea, profundamente influenciada pela globalização e pelos sistemas econômicos e o relativismo ético, produzido pelo novo modelo de ciência e algumas de suas características.
Conceitos de ética e moral
O termo ética deriva de éthos, que significa modo de ser, e, por isto, define-se com frequência a ética como a doutrina dos costumes ou hábitos adquiridos pelo homem. Aristóteles tornou a ética uma disciplina autônoma no domínio da filosofia moral. Para ele, o campo ético deveria investigar as características do bem, da perfeição e da felicidade que são atribuídas ao homem, com o fim de ajustá-los à orientação prática da conduta humana. Ele considerava que toda “ação humana está orientada para a realização de algum bem, ao qual estão unidos o prazer e a felicidade”.
A conceituação de moral, por sua vez, abrange os costumes, ou seja, representa o conjunto das regras de conduta admitidas numa época ou por um grupo de homens. Ela distingue-se do que é investigado no campo ético, na medida em que “este último domínio se ocupa de uma moral ligada aos fatos, incorporando valores aceitos pelos homens ao se inter-relacionarem socialmente” (SKLAR: 2008). Seguindo este sentido, a ética pode ser compreendida, como propõe Sánchez Vázquez (2002, 23), de “teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade”.
O ato moral, portanto, provocado por um ser humano real e contextualizado historicamente, deve ser avaliado sob o código moral que vigora na sociedade daquele que promoveu a ação.
Ética Grega
Antes de Aristóteles, encontramos precedentes para a constituição de uma ética filosófica. Entre os pré-socráticos, por exemplo, Heráclito utiliza o vocábulo éthos para situar a condição do homem “como aquela que necessita de um lugar” ou “morada”, definindo um “modo de estar” no mundo (KIRK, RAVEN, SCHOFIELD:1994). Demócrito mostra a virtude sob a busca de um equilíbrio interno diante do movimento das paixões. O saber e a prudência seriam, assim, essenciais, pois ensinariam ao homem de que modo ele deveria viver, conseguindo a felicidade.
A reflexão ética autônoma no mundo grego aparece apenas com Sócrates que, combatendo os sofistas, acreditou na estabilidade das leis, dos princípios verdadeiros e universais das normas, conferindo a elas um valor intrínseco. A partir dele, o termo ética se afasta tanto do sentido originário de morada quanto de equilíbrio das paixões, tal como Heráclito e Demócrito respectivamente entendiam. Este avanço foi possível sob a elaboração de um método, denominado maiêutica, que levasse os diversos cidadãos a uma vida virtuosa.
Com Aristóteles, a ética torna-se uma disciplina filosófica. Sua filosofia critica o dualismo ontológico de Platão, isto é, a separação dos mundos sensível e inteligível. Para Aristóteles, existe uma correlação entre ser e bem. O bem se relaciona com a essência de cada coisa.  O objeto da ética consiste em investigar as características do bem, da perfeição e da felicidade que são atribuídas ao homem, com o fim de ajustá-los à orientação prática da conduta humana.
 Segundo Aristóteles, o homem deve contentar-se com o ser e o bem que possui, pois está limitado, essencial e temporalmente, pela sua substância mortal e corruptível. O conceito de realidade, assim, condiciona a formulação da ética aristotélica, dominada por um relativismo radical. Ele considera que toda ação humana está orientada para a realização de algum bem, ao qual estão unidos o prazer e a felicidade.
Aprofundando a busca de conhecimentos universais, Platão atribui à formação de conceitos socráticos não só um valor mental, lógico e abstrato, mas um valor também ontológico (parte da Filosofia que estuda o ser em si), considerando-os objetos de pensamento e situados numa dimensão superior ao universo físico percebido pelos sentidos. Desta maneira, a realidade fica dividida, para ele, em dois mundos distintos e contrapostos: um, superior, invisível, eterno e imutável das ideias subsistentes, outro, físico, visível, material, sujeito à transformação. A ética platônica gira em torno da aspiração dos homens à felicidade.
Ética Cristã e Moderna
A transformação do cristianismo na religião oficial de Roma no século IV trouxe novos sentidos para as doutrinas éticas gregas. O período medieval caracteriza-se por uma profunda fragmentação econômica e política, devido ao surgimento de duas classes que marcam o regime feudal: os senhores feudais, donos absolutos de terras ou feudos, e os camponeses e servos, os quais eram vendidos e comprados com as terras às quais pertenciam e que não podiam abandonar. Nesse quadro, a religião garante certa unidade social, pois a política depende da Igreja exercendo um forte poder espiritual e centralizando integralmente a vida intelectual. Sob essas circunstâncias, “a moral concreta, efetiva, e a ética – como doutrina moral – estão impregnadas (...) de um conteúdo religioso que encontramos em todas as manifestações da vida medieval” (SÁNCHEZ VÁZQUEZ: 2002,275-276).
Nesse período, os pensadores cristãos conceberam uma nova ética que encontra em Deus os princípios da vida moral.
A esta nova ética denomina-se teonomia (théos, em grego, significa Deus). Estes pensadores aproveitaram as doutrinas gregas das virtudes e da correspondência do bom ao verdadeiro, agregando-as ao corpo de uma ética cristã, negando, por outro lado, fundamentos éticos naturalistas e hedonistas, incompatíveis com as ideias morais cristãs. Considerando, ainda, que o homem é um peregrino que se prepara para uma vida futura ultraterrena, rejeitaram a busca da felicidade (eudemonia) que caracterizou grande parte do pensamento grego. Ironicamente, no entanto, a ética cristã de igualdade é lançada no momento histórico em que os homens conhecem as maiores desigualdades: a divisão entre escravos e homens livres, ou entre servos e senhores feudais.
Vázquez (1972, 277), no entanto, ressalta que a ética cristã medieval “não condena esta desigualdade social e chega, inclusive, a justificá-la. 
A igualdade e a justiça são transferidas para um mundo ideal, enquanto aqui se mantém e sanciona a desigualdade social”. Podemos afirmar que a formulação conceitual da ética cristã herda conceitos platônicos e aristotélicos, submetendo-os a um processo de cristianização, que transparece nas éticas de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino. Para o primeiro, a ascensão da alma que em Platão se eleva do mundo sensível ao inteligível, transforma-se na elevação até Deus, cujo fim é o êxtase místico ou felicidade. Para o segundo, retomando Aristóteles, destacam-se a contemplação e o conhecimento que dela decorre; São Tomás de Aquino se afasta, no entanto, da divisão das virtudes e da ética como doutrina dos costumes quando afirma que o fim supremo do conhecimento é Deus, entendido como o maior bem objetivo, cuja posse gera felicidade, um bem subjetivo.
A história da ética ganha um novo rumo, entre os séculos XIV e XVI (Renascimento) a partir da valorização do homem nas ciências e nas artes. Retomam-se algumas tendências éticas antigas no início da Renascença, demarcando-se o início do que se conhece como ética moderna (séculos XVI-XIX). Este período é marcado pela criação de uma nova sociedade que substitui a ordem feudal da Idade Média, sob uma série de mudanças. No plano econômico, há o incremento de forças produtivas em função do desenvolvimento científico, mediante uma perspectiva científica mais prática (Francis Bacon). 
No plano social, temos o aparecimento de uma nova classe
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