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Ética e Epidemias: Direitos Coletivos x Direitos Pessoais

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Aula 7: Ética e epidemias
Introdução
A alocação de recursos de saúde escassos em situações epidêmicas jamais será uma tarefa fácil ou isenta de pressões e conflitos. Apesar disso, precisamos estar preparados tecnicamente para aplicar critérios éticos nestas difíceis condições.
Inicialmente, veremos como e porque, nestas circunstâncias, os direitos coletivos precisam suplantar os direitos pessoais. Analisaremos também, a importância de uma comunicação objetiva e clara pelos profissionais de saúde em seus comunicados.
Conheceremos o Princípio da Precaução, originalmente concebido como base ética do Direito Ambiental, mas que pode muito facilmente se aplicar ao campo da saúde e como ele se integra perfeitamente a atuação preventiva em condições de risco à saúde pública.
Finalmente, analisaremos os critérios de categorização dos recursos quanto à sua tipologia e identificaremos os principais critérios utilizados na priorização de recursos escassos na área da saúde.
Sistemas éticos
Os sistemas éticos devem considerar um delicado equilíbrio entre os direitos pessoais e a justiça social. Marx dizia que privilegiar as condições situacionais sem considerar os sujeitos e suas manifestações de vontade pessoal no entendimento ou análise dos processos históricos era um equívoco tão grande quanto entender determinadas tomadas de decisões pessoais sem levar em conta as condições históricas e temporais inerentes aos sujeitos.
Ou seja, do mesmo modo como não podemos analisar os eventos sem compreendermos as pessoas que os produziram, também não podemos compreender as ações pessoais sem entendermos os contextos históricos e temporais nas quais estas pessoas estão inseridas. Precisamos considerar que as possibilidades de atuação são sempre dependentes das condições do momento da ação. 
Esta correlação entre condições situacionais e condutas, valores e direitos, também se reflete em termos éticos. Diversos documentos internacionais como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (adotada na Assembleia Geral das Nações Unidas – ONU – em 1948) e nossa própria Constituição de 1988, estão fundamentados nas garantias individuais, coletivas e transpessoais.
Os direitos individuais incluem a vida, a privacidade, a liberdade e a não-discriminação, entre outros. Todos estes direitos devem ser preservados. Contudo, em situações excepcionais como de uma epidemia (doença disseminada em larga escala local) ou pandemia (doença disseminada em escala mundial), estes direitos individuais podem ser suplantados pelos direitos coletivos.
Em condições normais, os atendimentos de saúde, por exemplo, devem refletir direitos pessoais e posturas que podem não ser consideradas viáveis e oportunas em condições especiais. Neste tipo de situação a alteridade precisa se sobrepor à neutralidade e a ética impõe a consciência de que toda a sociedade é corresponsável, todos devem estar engajados em um mesmo esforço solidário, não por dever ou obrigação legal, mas por reconhecer que é este conjunto de ações que nos torna humanos. Em função disto, alguns direitos pessoais, como a liberdade de ir e vir, por exemplo, podem ser suprimidos se a pessoa doente precisar ser posta em regime de quarentena ou isolamento para não contaminar outras pessoas.
Entende-se que a saúde da população em larga escala é um bem maior do que a manutenção da liberdade de locomoção individual se esta implicar em risco aos demais. 
Da mesma forma, também não podemos considerar como quebra da privacidade individual, a comunicação compulsória das informações de pacientes acometidos por doença contagiosa às autoridades sanitárias, pois seu objetivo exclusivo é o controle epidemiológico. 
Ou seja, a regra básica em situações epidêmicas, é a de que a manutenção dos direitos individuais fica sempre condicionada à preservação dos direitos coletivos.
Pânico
Um dos primeiros e mais imediatos efeitos sociais em situações epidêmicas é o pânico que acomete a população em geral. O desconhecimento sempre nos faz superdimensionar os riscos de uma situação. 
Este é um mecanismo de defesa psicológico normal e o profissional de saúde, principal agente de informação nestas situações, precisa compreender esta ansiedade coletiva e atuar de modo a contribuir para a restauração da calma e da ordem pública.
A melhor forma de lidar com estas situações e tranquilizar as pessoas é através do esclarecimento das dúvidas mais frequentes e divulgação de informações claras*, objetivas e em linguagem acessível ao público leigo. 
Se os riscos não forem corretamente dimensionados, certamente as ações de prevenção também não o serão.
* Os próprios governantes e agentes responsáveis pelos serviços públicos, nestas ocasiões, irão pautar suas decisões políticas e técnicas nos comunicados emitidos pelos profissionais de saúde. Se esta comunicação for ambígua ou mal-formulada, pode facilmente promover estimativas sub ou superdimensionadas e influenciar decisões equivocadas, visto que estas são sempre formuladas em função das análises dos riscos envolvidos.
Princípios éticos
Hans Jonas, filósofo alemão contemporâneo (falecido em 1993), fez importantes contribuições à Bioética em suas obras. Um de seus livros mais importantes foi “O Princípio da Responsabilidade” de 1979, onde expõe a necessidade de que os efeitos de nossas ações precisam ser sempre compatíveis com a permanência da vida humana.
Este princípio moral básico influenciou uma série de outros aspectos relativos à ética envolvida em pesquisas, em normas do direito ambiental e, naturalmente na saúde pública também. Um dos conceitos mais atuais e fortemente influenciados pelas ideias de Jonas é o Princípio da Precaução.
Em 1992, ocorreu na cidade do Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que ficou conhecida pelo nome de ECO 92. Nesta conferencia, foi formulado um importante documento, denominado de Agenda 21, no qual em seu anexo, consta o PRINCÍPIO 15:
“Com o fim de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades. Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de medidas eficazes em função dos custos para impedir a degradação do meio ambiente”.
Se considerarmos o sentido geral deste princípio (e não o analisarmos apenas pela perspectiva do direito ambiental), veremos que ele trata essencialmente da relação entre o risco existente em uma ação e as medidas necessárias para prevenir os efeitos negativos advindos desta ação. Ou seja, na ausência de absoluta certeza científica sobre os riscos ou danos envolvidos em uma ação, é necessário que tomemos medidas eficazes preventivas de evitação de todas as possibilidades possíveis de danos. Assim, nenhuma medida preventiva em situações epidêmicas pode ser descartada sem que esteja absolutamente comprovada a ausência de sua necessidade.
Outro importante aspecto ético a ser considerado é o da alocação de recursos de saúde, que sempre se tornam escassos em relação à demanda em condições epidêmicas. Instalações sanitárias, equipamentos, medicamentos, recursos humanos especializados, precisam ter seus critérios de distribuição e priorização claramente definidos.
Torna-se indispensável a conjugação citada no início da aula, entre critérios individuais e coletivos, pois se o critério individual considera o benefício que o tratamento resultará no sujeito doente, o critério coletivo implica na prevenção ou imunização de sujeitos ainda não contaminados, para que estes não venham a desenvolver a doença.
Os profissionais de saúde acostumados a tomar decisões em suas rotinas, sabem que os aspectos éticos são fundamentais no processo decisório. A ética, no entanto, não se baseia em regras estanques, mas na busca pelo bem, pelo correto, pelo que é adequado em uma dada circunstância.
Estes aspectos se tornam evidentes em situações de alocação de recursos escassos e não se pode decidir exclusivamente em função de fatosobjetivos. Valores são componentes determinantes destas decisões. 
Ainda assim, ou apesar disso, não podemos também abrir mão de critérios de justiça neste processo decisório. E critérios de justiça tendem a ser mais objetivos e imparciais.
Critérios
Dentre estes critérios, José R. Goldim indica a utilização de duas características básicas na classificação da tipologia dos recursos a serem utilizados.
A primeira destas características se refere ao fato de os recursos serem divisíveis ou não.
A segunda se refere ao fato de serem homogêneos ou heterogêneos em relação à clientela que deles necessita.
Estas categorias são normalmente analisadas em conjunto. Por exemplo: Medicamentos a serem distribuídos para um grupo de pacientes com a mesma patologia é um recurso homogêneo e divisível, na medida em que todos irão dividir o estoque do mesmo remédio. Já o estoque de sangue, é um exemplo de recurso que, apesar de ser divisível, pois muitos utilizarão o mesmo estoque, é heterogêneo, na medida em que nem todos terão necessidade dos mesmos componentes. 
Os leitos hospitalares são recursos indivisíveis homogêneos, pois apenas um paciente pode usufruir do mesmo recurso que todos necessitam por igual e um órgão a ser implantado em um paciente é um recurso indivisível e heterogêneo, na medida em que cada órgão atenderá a apenas um paciente e nem todos os pacientes podem se beneficiar do mesmo órgão.
Critérios de priorização
Quanto aos critérios de priorização para utilização destes recursos, em geral, os mais comumente utilizados são:
Igualdade de Acesso: Este critério, na forma como é proposto por Edmond Cahn, defende que do ponto de vista ético se um recurso não pode ser acessível a todos que dele necessitam, então não pode ser ofertado a ninguém. Esta perspectiva segue a lógica de que não seria ético salvar a vida de uns em detrimento das vidas de outras pessoas. Este critério é denominado como sendo a igualdade de acesso real. Já James Childress, em uma perspectiva diferente do mesmo critério, denominada de igualdade de acesso provável, considerar que a igualdade não estaria necessariamente na possibilidade de acesso do recurso a todos, mas na forma como as pessoas seriam escolhidas para se beneficiar destes recursos. Assim, defende a escolha através de sorteios, filas de espera e outras formas aleatórias de definição de beneficiados. (in J.R. Goldim - http://www.ufrgs.br/bioetica/acessoig.htm)
Benefício Provável: Fundamentado em dados estatísticos este critério considera a probabilidade que cada indivíduo em particular (microalocação) ou um grupo de indivíduos (macroalocação) tem em se beneficiar do recurso que está sendo disputado.
Efetividade: O critério orientado para o futuro, a efetividade prega que os recursos escassos devem ser alocados para aqueles pacientes que possam fazer o melhor uso para si (efetividade local) ou para os outros, especialmente a sociedade, como, por exemplo, a priorização a agentes de saúde e demais profissionais de serviços essenciais (efetividade global).
Merecimento: O critério do merecimento é voltado para o passado, para a vida pregressa de cada pessoa que necessita o recurso. Segundo este critério, os recursos devem ser alocados prioritariamente para pessoas que já demonstraram efetiva contribuição para a sociedade, como uma forma de agradecimento ou demonstração de sua importância ao grupo social.
Necessidade: O critério da necessidade vincula a disponibilização de recursos escassos àqueles que deles mais necessitam em uma condição presente. Ou seja, estabelece a prioridade aos que estão em estado de saúde mais grave, independente de qualquer análise referente ao custo desta intervenção ou mesmo à efetividade da terapêutica.
Conclusão
Estes e outros critérios visam dar alguma objetividade a um processo decisório de alocação de recursos de saúde em situações de escassez. Naturalmente que, apesar disso, esta jamais será uma tarefa fácil ou isenta de conflitos internos ou mesmo livre de pressões políticas ou econômicas.
O objetivo principal destes procedimentos é evidenciar justamente a complexidade destas ações, na medida em que tentativas de simplificação deste processo decisório, invariavelmente, implicarão em injustiças ou favorecimentos ilícitos e antiéticos.
Atividade Proposta:
Tropas do Nepal foram fonte de surto de cólera no Haiti, diz ONU.
Uma investigação das Nações Unidas sobre o surto de cólera que atingiu o Haiti no ano passado apontou que um acampamento de tropas do Nepal que integram as forças de paz da ONU no país, conhecidas pela sigla Minustah, foi a provável fonte da epidemia. 
As conclusões dos peritos contradizem declarações anteriores da ONU, que havia afirmado que as condições sanitárias no acampamento eram adequadas. 
Mais de 4,5 mil pessoas morreram em consequência do surto de cólera, que ocorreu pouco após o terremoto devastador que matou mais de 300 mil pessoas no país em janeiro de 2010. 
Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,tropas-do-nepal-foram-fonte-de-surto-de-colera-no-haiti-diz-onu,715330,0.htm 
Analisando a notícia acima, selecione quais princípios éticos básicos não foram seguidos nesta situação.
1.Marx dizia que privilegiar as condições situacionais sem considerar os sujeitos e suas manifestações de vontade pessoal no entendimento ou análise dos processos históricos era um equívoco tão grande quanto entender determinadas tomadas de decisões pessoais sem levar em conta as condições históricas e temporais inerentes aos sujeitos. Seguindo esta mesma lógica, podemos afirmar que, em termos éticos:
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1) A manutenção dos direitos individuais fica sempre condicionada à preservação dos direitos coletivos. 
2) A manutenção dos direitos individuais é inviolável sobre quaisquer condições ou circunstâncias. 
3) A preservação dos direitos individuais deve estar condicionada às necessidades do momento histórico de uma sociedade. 
4) As decisões pessoais sempre levam em consideração a preservação dos direitos coletivos. 
5) A preservação dos direitos coletivos deve ser compreendida pelas manifestações de vontade pessoal dos sujeitos.
2.O chamado Princípio da Prevenção tem como fundamentação básica, a lógica pela qual:
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1) Nenhuma medida preventiva em situações epidêmicas pode ser descartada sem que esteja absolutamente comprovada a ausência de sua necessidade. 
2) Na possibilidade de risco grave ou eminente todas as medidas preventivas devem estar pautadas em convicções cientificamente comprovadas. 
3) Na falta de certeza científica absoluta a respeito da existência de riscos graves ou eminentes não há necessidade de estabelecimento de medidas preventivas em excesso. 
4) Nenhuma medida preventiva deve ser tomada antes da certeza científica absoluta de sua eficácia em situações epidêmicas. 
5) Em condições epidêmicas todas as medidas preventivas existentes devem ser tomadas, independente da certeza científica absoluta da ausência de sua necessidade. 
3.Um recurso é classificado como homogêneo e indivisível quando:
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1) Todos os pacientes necessitam do mesmo recurso e podem compartilhar dele. 
2) Todos os pacientes necessitam do mesmo recurso, mas não podem se beneficiar dele ao mesmo tempo. 
3) O recurso é o mesmo para todos os pacientes, mas cada um se utiliza de uma especificidade deste. 
4) O recurso não pode beneficiar a todos os pacientes ao mesmo tempo e nem todos os pacientes necessitam daquele recurso em particular. 
5) O recurso é o mesmo para todos os pacientes, mas a distribuição dele não é feita em condições éticas igualitárias. 
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