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IFEMELU Letícia Guedes Morais Gonzaga de Souza (Inspirado em “Americanah” – Chimamanda Ngozi Adichie) Ifemelu, 20 anos, negra, tipo sanguíneo O+, solteira, estudante chega ao hospital relatando vômitos e diarreia intensa. Durante triagem, enfermeira nota pele pálida, fria e com sudorese. Ao médico, Ifemelu informa que é nigeriana, do estado Borno, e que chegou há dois dias no Brasil após passar as férias com a família. Nega possuir problemas de saúde crônicos não transmissíveis e Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs). Em relação às fezes, Ifemelu cita que eram como “um caldo de arroz”. Ao exame físico, médico observa: Pressão Arterial (PA) 110/70 Frequência Cardíaca (FC) 76 Pele Palidez cutânea, pegajosa, fria com sudorese Temperatura 37ºC Altura 1,71 m Peso 65 kg Considerando o quadro clínico e o histórico apresentado, o profissional de saúde suspeita que a paciente adquiriu cólera, uma vez que Borno é tido como um local de surto desta doença na Nigéria. Assim, solicita exame de fezes para identificação do agente etiológico (Vibrio cholerae), ainda, recomenda a paciente que permaneça em repousa e beba bastante líquido para reposição de nutrientes e água enquanto aguarda o resultado laboratorial. Posteriormente, farmacêutica explica a Ifemelu a finalidade dos exames laboratoriais e esclarece dúvidas quanto a coleta. Com a autorização, a profissional colhe aproximadamente 2 gramas de fezes diarreicas. Para tal coleta, farmacêutica busca colher a área com muco e a amostra é conservada e homogeneizada em meio Cary Blair em temperatura ambiente (20 a 25ºC). No laboratório, profissional observa o aspecto macroscópico das fezes. Neste sentido, visualiza material com aspecto de água de arroz, caracteristica indicativa da diarreia secretória provocada pela exotoxina (toxina colérica) do V. cholerae. Nesta infecção, o aspecto de água de arroz é devido a caracteristica aquosa das fezes contendo muco e células epiteliais. Figura 1: Fezes com aspecto de água de arroz de um paciente acometido por cólera. Similar ao que farmacêutica observa na amostra de Ifemelu. Fonte: UpToDate, 2020. Para cultura, farmacêutica considera que a V. cholerae é uma bactéria, bastonete de aparência levemente curva, gram negativo e anaeróbio facultativo. Deste modo, prepara culturas da amostra em meio ágar sangue (não seletivo) com pH próximo de 9,0 e ágar MacConkey (seletivo). Ainda, adota caldo de enriquecimento NaCl 1%. Após 48 horas, observa a formação de colônias nas duas culturas em temperatura ambiente (20 a 25ºC), sendo que no meio MacConkey, visualiza-se colônias semelhantes às de bastonetes não fermentadores. As colônias de V. cholerae são convexas, lisas e redondas, opacas e granulosas à luz transmitida. Figura 2: Colônia de V. cholerae em ágar sangue. Fonte: Bacteria In Photos. Figura 3: Colônia de V. cholerae em ágar MacConkey. Fonte: Bacteria In Photos. Para além, são realizados testes bioquímicos para diferenciação da espécie. Assim observa-se: teste indol positivo, lisina positivo, teste ornitina descarboxilase positivo, lactose positivo, sacarose positivo, manitol positivo, maltose positivo, redução de nitrato em dióxido de nitrogênio positivo e oxidase positivo. A amostra demonstra teste arginina di-hidrolase negativo, arabinose negativo, salicina negativo, celobiose negativo. Ademais, profissional realiza teste de aglutinação de látex na amostra e confirma que colônia é produtora de toxina colérica. Figura 4: Exemplo de teste de aglutinação de látex para v. cholerae. Resultado positivo indica produção de toxina colérica. Similar ao observado pela farmacêutica. Fonte: Ristori et al., 2006. Farmacêutica emite laudo com resultado positivo para V. cholerae e encaminha as cepas do agente etiológico para Laboratório de Referência, a fim de haver o registro epidemiológico. Após acessar os exames laboratoriais, o médico informa a Ifemelu que a jovem apresenta um quadro de cólera causado pela bactéria V. cholerae. O profissional explica que seu quadro diarreico intenso pode ser, em parte, justificado pelo seu tipo sanguíneo O, uma vez que este torna o indivíduo mais suscetível a incidência e gravidade em quadros coléricos. Como tratamento, o médico opta pela adoção do antibacteriano Doxiciclina, bem como reposição intravenosa de fluidos e eletrólitos (mistura de glicose, cloreto de sódio, bicabornato de sódio e cloreto de potássio). “Eu acho que você viaja para buscar algo e regressa a casa para se encontrar lá”. Adichie, Chimamanda Ngozi. REFERÊNCIAS BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. Microbiologia clínica para o controle de infecção relacionada à assistência à saude. Módulo 6: detecção e identificação de bactérias de importância médica. Brasília: ANVISA, 2013. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. Microbiologia clínica para o controle de infecção relacionada à assistência à saude. Módulo 3: Principais Síndromes Infecciosas. Brasília: ANVISA, 2013. BROOKS, Geo F. et al. Microbiologia Médica de Jawetz, Melnick e Adelberg. 26ª ed. Artmed: Porto Alegre, 2014. MADIGAN, Michael T. et al. Microbiologia de Brock. 14ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2016. McPHERSON, Richard A.; PINCUS, Matthew R. Diagnósticos Clínicos e Tratamento por Métodos Laboratoriais de Henry. 21ª ed. Barueri: Manole, 2012. PORTO & PORTO. Semiologia Médica. 8ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2019. RISTORI, Christiane Asturiano et al. Detecção de Vibrio cholerae O1 em ostras utilizando anticorpo monoclonal em ensaio de aglutinação. Rev Inst Adolfo Lutz, 65 (2): 127-132, 2006. TORTORA; FUNKE; CASE. Microbiologia. 12ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.
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