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Eduarda Miot Panazzolo 8 PANCREATITES Pancreatite aguda · Doença clínica e cirúrgica. · Doença inflamatória aguda que acomete o pâncreas, tecidos peri-pancreáticos, causando resposta inflamatória sistêmica, na maioria dos casos autolimitada. · Gravidade se dá pela SIRS: envolvimento de outros órgãos, principalmente rins e pulmões. · Colédoco e ducto pancreático desembocam juntos na papila duodenal maior. · Obstrução por cálculo biliar → aumento da pressão ductal → extravasamento das enzimas pancreáticas com autodigestão do pâncreas. · Álcool é pancreatotóxico: sua metabolização se dá, em parte, no pâncreas. Funções do pâncreas · Ácinos → produção de enzimas digestivas: a) Amilase pancreática: digestão de carboidratos. b) Proteolíticas: principais responsáveis pela PA. · Armazenadas na forma de pró-enzimas, ativam-se ao chegar no duodeno. Ex: tripsinogênio, quimiotripsinogênio, pró-carboxipolipeptidases, próelastase e pró-nuclease. · Ressecção extensa do pâncreas prejudica digestão e absorção proteica, enquanto gastrectomia não (apenas 1 enzima proteolítica). c) Lipase pancreática: gorduras. · Colesterol esterase e fosfolipase. · Ilhotas de Langerhans → produção de insulina. · Ductos pancreáticos → secreção de bicarbonato (neutralização quimo/acidez gástrica). Ps: suco pancreático e bile são ricos em bicarbonato. Proteção contra corrosão/autodigestão do órgão · Enzima proteolíticas são armazenadas como pró-enzimas. · São armazenadas como grânulos, na superfície apical da célula acinar. · Grânulos contêm inibidor do tripsinogênio. · Ativação precoce e inapropriada das enzimas dentro do parênquima pancreático é o mecanismo básico da PA: muitas vezes, por aumento da pressão intraductal. Epidemiologia da pancreatite aguda · Comum e aumento da prevalência: aumento da obesidade e dos cálculos biliares (female, fat, forty, fair and fertile = fatores de risco para cálculos biliares). Ps: “f” for family history. · 20% das pancreatites são graves, sendo que 10 a 30% dessas vão à óbito. · Óbito segue padrão bimodal: 1. 50% fase precoce (primeiros 14 dias): · SIRS precisa de 2 dos seguintes: a) TA > 38°C ou < 36°C. b) FR > 20 mpm ou PaCO2 < 32,3. c) FC > 90 bpm. d) Leucócitos > 12.000, < 4.000 ou > 10% bastões. · IRA. · Infecção: cisto pancreático pode se infectar. · SDMO. 2. Fase tardia. Etiologia · Litíase biliar, microlitíase, etilismo: 85%. · Causas metabólicas (hipertrigliceridemia e hipercalcemia): rolhas que TG ou Ca que obstrui drenagem de ductos. · Drogas (azatioprina, tiazídicos, estatinas, TARV, estrógenos, anticonvulsivantes, salicilatos, metildopa, amiodarona, fibratos, enalapril, tamoxifeno, acetominofeno): efeito tóxico direto, reações de hipersensibilidade ou mediado por hiperTG. · Trauma ou cirurgia abdominal. · Neoplásicas (tumores pancreáticos ou periampolares). · Estruturais: a) Pâncreas divisum. b) Disfunção do esfíncter de Oddi. c) Divertículos periampolares. d) Cistos de duplicação duodenal. e) Coledococele. f) Anomalias da junção bíliopancreática. g) Doença de Crohn. · Pós CPRE: 10 a 15% cursam com pancreatites leves. · Infecções (Ascaris, rubéola, CMV, toxoplasmose, TB, MAC). · Hereditária (mutações CFTR, PRSS1, SPINK1): pacientes jovens, antes dos 20 anos, história familiar de pancreatite não explicada = menos inibidor do tripsinogênio, indicação de pesquisa genética. · Vasculares (isquemias, vasculites). · Idiopática (30% dos casos nos adultos). Patogênese · Ativação precoce do tripsinogênio ainda no interior das células acinares. · Ativação subsequente dos demais zimogênios e autodigestão das células acinares. Ps: zimogênios = pró-enzimas. · Falha da eliminação da tripsina ativada ao redor do pâncreas. · Ativação de células inflamatórias e de citocinas. · Pancreatite hereditária: mutação nos genes do tripsinogênio PRSS1 e SPINK1, com desbalanço entre as proteases e seus inibidores. · Pancreatite alcóolica: via não oxidativa do metabolismo do álcool ocorre no pâncreas, levando ao acúmulo de ésteres de ácido graxo. Quadro clínico Dor abdominal · Em faixa, súbita. Ps: pródromos = dor de cólica biliar que evolui para PA. · Andar superior do abdome/epigástrica, irradiada para o dorso. · Em fisgada ou “em facada”. · Posição de prece maometana: flexão do tórax sob o abdome. · Associada a náuseas e vômitos. Aumento do nível sérico das enzimas pancreáticas (> 3x LSN) · Amilase: menos específica, aumento precoce após o início dos sintomas, meia-vida curta. Ps: caxumba aumenta amilase. · Lipase: mais sensível e específica, aumento mais tardio após o início dos sintomas, meia vida mais longa. Exame físico · Diminuição dos RHA: íleo paralítico. · Diminuição do MV em bases: derrame pleural. · Equimoses (indicam gravidade): a) Periumbilical → Cullen. b) Flancos → Grey-Turner. · Ascite pancreática: amilase no líquido ascítico 3 a 5x o valor sérico obtido simultaneamente, muitas vezes > 2000. Diagnóstico · Presença se 2/3 critérios: 1. Dor abdominal sugestiva. 2. Aumento de amilase ou lipase (> 3x LSN): limite superior da normalidade. 3. Alteração na TC ou RM ou colangioRM. Tratamento inicial em nível hospitalar Identificar etiologia · História clínica detalhada. · US de abdome. · Aumento de transaminases e bilirrubinas sugerem causa biliar (ALT > 3x, primeiras 24h sugere etiologia biliar – VPP 95%). · Perfil lipídico. · Cálcio sérico. Avaliação laboratorial · Hemograma, amilase e lipase, eletrólitos (inclusive cálcio), LDH, ureia, creatinina, proteínas total e frações, gasometria arterial. Avaliar gravidade · Critérios de Ranson: mais utilizado, necessita apenas de dados laboratoriais e clínicos. Ps: ALT = alanine aminotransferase level. · Amilase e lipase: níveis séricos NÃO indicam gravidade. Ex: amilase em 1500 não quer dizer que é mais grave. · APACHE II. · Critérios de Atlanta. APACHE II · Acute Physiology and Chronic Health Evaluation (APACHE II). · 12 variáveis clínicas, fisiológicas e laboratoriais, pontuadas de 0 a 4, conforme o grau de desvio da normalidade apresentado, como também pontos são atribuídos à idade, presença de doença crônica e variáveis fisiológicas. · Soma fornece pontuação final. · Não muito utilizado: difícil, muitas variáveis. Critérios de gravidade na PA · Critérios de Ranson ≥ 3. · APACHE II ≥ 8. · Critérios de Atlanta: qualquer item positivo: insuficiência renal, insuficiência respiratória e hemorragia digestiva. · Proteína C reativa > 150 mg/dL (24 a 48h após o início dos sintomas). Critérios de Balthazar · Tomográficos. · Fazer após 2 dias: TC precoce subestima lesões. · Fazer de 48-72h após entrada. Tratamento · Não existe tratamento específico, uma vez que não existe fármaco que iniba as enzimas proteolíticas. Jejum · Acreditava-se que a alimentação estimulava ainda mais secreção de suco pancreático. Hoje, jejum pela dor. a) Reiniciar alimentação: melhora parcial da dor/diminuição do íleo paralítico. b) SNG: vômitos, íleo paralítico, distensão abdominal. Hidratação vigorosa · Primeiro fator de má evolução da PA é insuficiência renal. Ps: IR pré-renal. · Até 250 a 500 ml/h. Ex: 6L de SF/dia, se possível. · Monitoração débito urinário (> 50ml/h ou 0,5 ml/kg/h). · Controle função renal. · Parcimônia idosos, IC, insuficiência renal. Analgesia · Hioscina ± dipirona, tramadol, meperidina, morfina?. Ex: Buscopan, Tramal. Tipo de pancreatite aguda Leve, intersticial ou edematosa · Doença restrita ao pâncreas. · Evolução favorável. Grave, necrosante ou necro-hemorrágica · Necrose pancreática e peri-pancreática. · SRIS: pode evoluir com falência de múltiplos órgãos. · Mortalidade cerca de 20%. · SARA: hipoxemia refratária à suplementação de oxigênio decorrente da presença de exsudato inflamatório nos alvéolos. Papel da TC de abdome com contraste · Casos graves. · Falta de melhora clínica em 48 a 72 horas. · Diagnóstico diferencial (pancreatite crônica, outras causas de dor abdominal). · Diagnósticos das complicações (abscesso, pseudocisto).· Coleção ou necrose. Pseudocistos · Podem involuir após 6-12 semanas; mais de 12 semanas não involui. · Pseudocistos assintomáticos, independentemente do tamanho, devem apenas ser observados. · Se sintomáticos ou com aumento de tamanho, devem ser tratados. Uso de antibiótico · Controverso. · Translocação bacteriana: Gram negativas intestinais. · Necrose estéril NÃO necessita de antibiótico OU antibioticoterapia profilática. · Suspeita de necrose infectada: piora clínica (febre, leucocitose, taquicardia e hipotensão), sintomas persistentes ou falha na melhora clínica = antibioticoterapia terapêutica. · Na suspeita de necrose infectada: a) Punção guiada por TC; ou b) Início de antibiótico empírico (com boa penetração no tecido pancreático). · Imipenem: boa penetração pancreática. c) Considerar drenagem percutânea ou necrosectomia/debridamento. · Até 20% dos pacientes com pancreatite aguda desenvolvem infecção extrapancreática (bacteremia, pneumonia, ITU). · Na suspeita, antibióticos deveriam ser iniciados até a fonte suspeita de infecção ser determinada. · Manutenção do antibiótico deve ser guiada pela comprovação da infecção extrapancreática (imagem e/ou culturas). Resumo 1. Sem necrose: sem antibiótico. 2. Necrose estéril: antibiótico profilático OU sem antibiótico. 3. Necrose infectada (piora clínica ou punção com cultura): antibiótico terapêutico + necrosectomia. Outros tratamentos Três principais indicações cirúrgicas na PA 1. Colescistectomia: após resolução da PA. 2. Necrosectomia: PA com má evolução, na vigência do episódio. 3. Drenagem de cistos pancreáticos: ressecção da área, Y de Roux para drenagem do cisto. CPRE · Casos graves de pancreatite biliar (cálculo impactado). Casos idiopáticos · ColangioRM, ecoendoscopia, CPRE. Pancreatite crônica Introdução · Substituição irreversível do parênquima pancreático normal por áreas de fibrose e pelo surgimento de estenoses e irregularidades nos ductos pancreáticos. · Persistência das lesões mesmo com a retirada do fator causal. · Alterações anatômicas e funcionais pancreáticas. · Calcificações. Resumo · Endócrino: insulina e glucagon → tratar DM com insulina. · Exócrino: enzimas digestivas e bicarbonato. Ausência de enzimas leva à má absorção de nutrientes, emagrecimento, diarreia e esteatorreia. · Insuficiência pancreática exócrina tratada com reposição de enzimas pancreáticas = extratos, tomados durante a refeição. · Crises dolorosas assemelham-se à PA. Tipos PC calcificante · Quase totalidade · Etiologias: alcóolicas, hereditárias (CFTR, SPINK1, PRSS1), idiopáticas, metabólicas (hipertrigliceridemia, hiperclacemia), nutricionais, pós necróticas, vascularisquêmicas, pós radiação. PC obstrutivas · Dificuldade de drenagem da secreção pancreática. · Estenose cictricial Wirsung, oddites, pancreas divisum. · Grupo etário mais avançado. · Calcificação excepcional. · Pouco comum insuficiência pancreática. PC autoimune · Pâncreas com nodulações, assemelha-se com CA de pâncreas. · Aumento difuso do pâncreas. · Aumento de IgG4. · Tortuosidade com estreitamento irregular do ducto pancreático principal. Etiologia · Brasil: pancreatite crônica alcóolica. Fisiopatogenia · Tampões proteicos formam rolhas. · Deposição de cálcio na matriz proteica. · Lesão do epitélio de revestimento ductal. · Atrofia, estenose, dificuldade de drenagem. · Fibrose gradual e dilatação do ducto pancreático. Quadro clínico · Dor abdominal (em crises ou contínua): muitas vezes refratária ao tratamento clínico. · Emagrecimento: diminuição da ingesta, má-absorção e DM descompensado. · Esteatorreia: insuficiência pancreática exócrina. · Diabetes: insuficiência pancreática endócrina. Ex: etilista, dor mal definida em abdome superior = pancreatite crônica. · Perda de 90% da função pancreática = insuficiências endócrina e exócrina. Mecanismos da dor · Hipertensão intraductal e parenquimatosa. · Inflamação perineural: ablação do tronco/plexo celíaco. · Hipersensibilidade nervosa. Diagnóstico Achados laboratoriais · Amilase e lipase normais ou discretamente elevadas. · Glicose e Hb1AC elevadas, se DM. · SUDAM III: pesquisa de gordura nas fezes (precisa de quadro clínico associado). · Não faz na prática, porém feitos para diagnóstico precoce: 1. Elastase fecal: enzima que sai intacta nas fezes (> 200μg/g de fezes). · Insuficiência pancreática = < 100 μg/g de fezes. 2. Teste da secretina: usado em estudos. · Secretina estimula secreção dos ductos pancreáticos (bicarbonato). · Pico de bicarbonato, no aspirado duodenal, que é posteriormente dosado (> 80mEq/L). Exames de imagem · Alterações do pâncreas = irregularidades dos ductos + calcificações. · Ecoendoscopia ou US endoscópico. · TC: melhor custo benefício, maior sensibilidade. · RM. Tratamento · Suspensão etilismo. · Suporte psicoterápico. · Dieta hipolipídica, normo ou hiperproteica. · Analgésicos nas crises dolorosas (meperidina, codeína, tramadol). · Enzimas pancreáticas: diminuir crises dolorosas e quando há esteatorreia (sose ajustada pelo balanço de gordura). · Hipoglicemiantes orais ou insulina. · Reposição de vitaminas lipossolúveis e do complexo B (etilismo). Tratamento cirúrgico ou endoscópico · Esfincterotomia pancreática e retirada de cálculos: cálculos de cálcio. · Colocação de endopróteses. · Drenagem de pseudocisto. · Correção de fístulas. Tratamento PC autoimune · Corticoide. Tratamento PC obstrutiva · Correção cirúrgica específica. Complicações · Pseudocistos. · Crises de icterícia. · Derrames cavitários. · Necrose pancreática. · Abscessos. · Hemorragia digestiva. · Compressão TGI.
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