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Radiologia Emergências Cirúrgicas Aula 7 - Abdome agudo - Apendite

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Marina Ribeiro Portugal 
 
MARINA RIBEIRO PORTUGAL 
 
AULA 7: ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO 
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1. Introdução 
 O abdome agudo é definido como uma condição mórbida, súbita e inesperada, 
manifestada, fundamentalmente, pela presença de dor abdominal com menos de oito 
horas de evolução. Seu diagnóstico precoce assume vital importância na conduta e na 
evolução desses pacientes. De igual importância é tentar definir se estamos diante de um 
abdome agudo de tratamento clínico ou cirúrgico, sendo, então, a história clínica e o 
exame físico fundamentais na abordagem dessa entidade. 
 Desde os primeiros relatos feitos por Hipócrates (460-375 a.C.) até os nossos dias, o 
abdome agudo permanece um desafio para clínicos, cirurgiões e imagenologistas, mesmo 
com o concurso de modernos métodos diagnósticos e terapêuticos. Como já mencionado 
em outro capítulo, a síndrome decorrente da irritação peritoneal está presente em vários 
tipos de abdome agudo. Contudo, é o abdome agudo inflamatório aquele que suscita 
maiores dúvidas diagnósticas, sendo, também, o que mais frequentemente leva a 
internações em serviços de pronto-atendimento, em busca de diagnóstico definitivo. 
 O abdome agudo inflamatório pode ser definido como um quadro de dor abdominal, com 
as características inicialmente mencionadas, decorrente de um processo inflamatório e/ou 
infeccioso localizado na cavidade abdominal, ou em órgãos e estruturas adjacentes. 
 Existem diversas causas de abdome agudo inflamatório, sendo as mais frequentes a 
apendicite aguda, a colecistite aguda, a pancreatite aguda e a diverticulite por doença 
diverticular dos colos. Outras causas de abdome agudo inflamatório serão mencionadas 
na seção Diagnóstico Diferencial, especialmente aquelas cuja abordagem é 
eminentemente clínica. Vale lembrar que, com grande frequência, episódios de dor 
abdominal aguda, eventualmente de origem inflamatória, não têm sua confirmação 
estabelecida, e sua resolução é espontânea. 
 A apendicite aguda é a causa mais frequente de abdome agudo inflamatório, sendo, 
provavelmente, a doença cirúrgica mais comum no abdome. Incide mais frequentemente 
entre a segunda e terceira décadas, e reconhece na obstrução do lume apendicular, por 
corpo estranho (fecalito) ou processo inflamatório, seu principal agente fisiopatológico. 
 A anamnese é de fundamental importância. A dor, anteriormente referida como o 
principal sintoma no abdome agudo inflamatório, localiza-se inicialmente, e mais 
frequentemente, no epigástrio e na região periumbilical, para, posteriormente, localizar-
se na fossa ilíaca direita. De caráter contínuo, piora com a movimentação, podendo 
acompanhar-se de náuseas e vômitos, além de febre e calafrios. A apendicite aguda pode 
ser de diagnóstico difícil nos extremos da vida ou quando o apêndice tiver topografia 
atípica, particularmente pélvica ou retrocecal. Nos doentes com apendicite aguda, o 
estado geral costuma estar preservado, assim como as condições hemodinâmicas. A 
temperatura, pouco elevada nas fases iniciais, costuma apresentar diferença axilo-retal 
acima de 1°C. 
 O exame do abdome é, provavelmente, a parte mais importante da semiologia do abdome 
agudo, devendo ser respeitada, sempre que possível, a sequência inspeção, palpação, 
percussão e auscultação. A inspeção revela um paciente com pouca movimentação, 
atitude antálgica (flexão do membro inferior direito) no sentido de aliviar a dor. Manobras 
como pular ou tossir podem desencadear ou exacerbar a dor na fossa ilíaca direita. 
 Ao realizar a palpação, o examinador não pode esquecer de aquecer as mãos e de evitar 
movimentos bruscos. A palpação inicialmente superficial e a seguir profunda pretende 
identificar dor localizada na fossa ilíaca direita ou difusa, resistência voluntária ou 
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espontânea (sinais de irritação peritoneal), ou, ainda, presença de massas (plastrão ou 
tumor inflamatório). 
 A dor pode ser difusa e a resistência generalizada em casos de apendicite aguda 
complicada com peritonite difusa. A percussão da parede abdominal deve ser iniciada num 
ponto distante ao de McBurney, encaminhando-se para a fossa ilíaca direita, onde a dor a 
essa manobra será expressão da irritação peritoneal localizada. 
 Por fim, a auscultação do abdome costuma evidenciar diminuição dos ruídos hidroaéreos, 
mais evidente quanto mais avançada a fase em que se encontra a apendicite aguda. 
Diagnosticada precocemente, a apendicite mostra sinais de peritonismo localizado, 
tornandose difusa à medida que o processo inflamatório atinge toda a serosa peritoneal. 
2. Epidemiologia 
 É a causa mais comum de abdome agudo cirúrgico 
 Acomete cerca de 7-10% da população 
 Mais frequente em jovens com o pico na segunda década de vida 
 Mortalidade de 1% (5% nos extremos de idade, imunodeprimidos e perforadas) 
3. Fisiopatologia 
 Evolução sequencial 
❖ Obstrução da luz do apêndice 
❖ Aumento da pressão intraluminal e congestão venosa 
❖ Isquemia e invasão bacteriana 
❖ Necrose e perfuração 
4. Meios de diagnóstico 
 Clínico 
❖ Mulheres, idosos e <2 anos → Necessário exames complementares 
 Exames laboratoriais 
❖ HMG 
❖ Urina 1 
❖ BHCG 
❖ Amilase 
 Exames de imagem 
❖ Raio X de abdome agudo 
❖ USG 
❖ Tc abdominal 
5. Sinais semiológicos 
 Sinal de Rovsing → Dor observada na fossa ilíaca direita por ocasião da palpação profunda 
na fossa ilíaca e flanco esquerdo 
 
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 Sinal de Blumberg → Dor à descompressão brusca na seqüência da palpação profunda da 
fossa ilíaca direita 
 
 Sinal do Psoas (ou Lapinsky) → Dor na fossa ilíaca direita desencadeada pela palpação 
profunda no ponto de McBurney com o membro inferior direito hiperestendido e elevado 
 
 Sinal do obturador 
 
 Sinal de Chutro → Desvio da cicatriz umbilical lado do processo inflamatório 
 Sinal de Lenander → Dissociação da temperatura axilo-retal em mais de um grau 
 Sinal de Dunphy → Dor na FID que piora com a tosse 
6. Meios de diagnóstico – raio x do abdome 
 O diagnóstico rápido e preciso da apendicite aguda é essencial para minimizar a sua 
morbidade. A tomografia computadorizada helicoidal (TC) e o exame ultrassonográfico 
(US) são métodos com alta acurácia, que assumem, portanto, papel essencial no 
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diagnóstico, estadiamento e direcionamento terapêutico de pacientes com suspeita clínica 
de apendicite aguda. 
 Raio X do abdome 
❖ Borramento do musculo psoas 
❖ Escoliose a direita 
❖ Alça sentinela 
❖ Fecálito 
❖ Pneumoperitôneo 
 
 USG 
❖ Operador dependente 
❖ Espessamento do apêndice >6mm 
❖ Imagem em alvo 
❖ Distensão (pouco compressível) 
❖ Aumento da ecogenicidade da parede 
❖ Fecálito ou apendicolito ou coprolito 
❖ Líquido pericecal 
❖ Espessura da parede >2mm 
❖ Ausência de peristaltismo 
 
 Tc de abdome 
❖ USG inconclusivo e pacientes com IMC>30 
 
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 Laparoscopia → Serve para diagnóstico e tratamento 
7. Score de Alvarado 
 
8. Diagnóstico diferencial 
 Linfadenite mesentérica aguda → Crianças com IVAS; pode promover uma 
linfonodomegalia quase que generalizada; o aumento dos linfonodos 
abdominais/mesentéricos pode promover dor e mimetizar apendicite 
 Rotura do folículo de Graaf → Dor de Mittelschmerz (dor do meio do ciclo); quando a 
mulher ovula ela pode sentir dor 
 Diverticulite de Meckel → É um divertículo congênito localizado no íleo próximo ao 
apêndice; pode conter mucosa gástrica no seu interior; pode produzir ácido que causa 
hemorragia digestiva em pacientes mais jovens (há ulceração do íleo e sangramento) 
9. Apresentação macroscópica 
 Edematosa ou catarralFlegmonosa ou supurativa 
 Gangrenosa 
 Perfurada 
10. Vias de acesso 
 Mc Burney 
 Rockey-Daves 
 Jalaguier 
 Laparoscópica 
11. Tratamento 
 Cirurgia 
❖ Apendicectomia videolaparoscópica → O paciente é submetido a anestesia geral via de 
regra. O paciente é posicionado em decúbito dorsal na mesa da sala de cirurgia com o 
braço esquerdo dobrado. O monitor de vídeo é colocado do lado direito do paciente 
porque, uma vez instalado o pneumoperitônio, o cirurgião e o assistente ficam do lado 
esquerdo do paciente. O pneumoperitônio é obtido por meio de uma porta periumbilical 
de 12 mm, por meio da qual o laparoscópio é inserido e realizada a laparoscopia 
exploratória. As outras duas portas são colocadas sob visão direta: uma porta de 5 mm 
no quadrante inferior esquerdo e uma porta suprapúbica de 5 mm na linha média. Uma 
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vez que o apêndice doente é 
identificado, quaisquer 
aderências às estruturas 
circundantes podem ser lisadas 
com uma combinação de 
dissecção romba e cortante. O 
apêndice ou mesoapêndice 
pode ser segurado suavemente 
com uma pinça Babcock e 
retraído anteriormente. A 
artéria apendicular, ou 
mesoapêndice que a contém, 
pode ser dividida nitidamente 
entre clipes hemostáticos, com 
um grampeador de 
anastomose gastrointestinal 
laparoscópica (GIA), cautério 
monopolar ou um dos 
dispositivos de ligadura de 
vasos avançados. O apêndice é 
desobstruído até sua fixação 
com o ceco, e a base do apêndice é dividida usando um grampeador GIA laparoscópico, 
tomando cuidado para não deixar um coto significativo. Às vezes, é necessário incluir 
parte do ceco dentro do grampeador para garantir que os grampos sejam colocados em 
tecido saudável e não infectado. O apêndice é removido através da porta umbilical em 
um saco de amostra para prevenir infecção da ferida. O campo operatório é inspecionado 
para hemostasia e irrigado com solução salina, se necessário, e então o defeito fascial e 
as incisões na pele são fechados. 
❖ Apendicectomia aberta → A 
apendicectomia aberta em 
adultos pode ser realizada sob 
anestesia geral ou regional 
(raquianestesia). A incisão 
deve ser centralizada sobre o 
ponto de McBurney, um terço 
da distância da espinha ilíaca 
ântero-superior ao umbigo. 
Uma incisão curvilínea em 
uma dobra da pele permite 
um excelente resultado 
cosmético. Uma outra opção de incisão é a de Rockey-Davis, que permite boa ampliação 
do campo. Trata-se de uma incisão transversa que é realizada cerca de 2 cm abaixo da 
cicatriz umbilical na linha médio-clavicula. A dissecção começa pelo tecido subcutâneo 
até a fáscia oblíqua externa, que é agudamente incisada lateralmente à bainha do reto. 
O oblíquo externo é separado abruptamente na direção das fibras musculares e os 
músculos oblíquo interno e transverso do abdome são separados sem corte de maneira 
semelhante. O peritônio é penetrado de forma abrupta, evitando lesões no intestino 
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subjacente. O cirurgião pode frequentemente localizar o apêndice varrendo um dedo 
lateralmente para medialmente na sarjeta paracólica direita. 
 
Uma vez identificado e livre de aderências, o apêndice é administrado por meio da 
incisão. O mesoapêndice pode ser preso com uma pinça Babcock, tomando cuidado para 
não rasgar a parede do apêndice e causar derramamento de conteúdo entérico. A artéria 
apendicular, que corre no mesoapêndice, é dividida entre pinças hemostáticas e 
amarrada com suturas absorvíveis 3-0. 
 
Uma sutura em bolsa não absorvível é 
colocada na parede cecal ao redor do 
apêndice. Após esmagar a base do 
apêndice com uma pinça Kelly, o 
apêndice é duplamente amarrado 
com suturas absorvíveis 2-0. O 
apêndice é excisado com um bisturi e 
o coto remanescente é cauterizado 
para evitar mucocele. O coto 
apendicular é tipicamente invertido 
no ceco enquanto a sutura em bolsa é 
apertada, embora a utilidade da 
inversão do coto seja discutível. O 
leito cirúrgico é então irrigado com 
solução salina e está pronto para 
sutura por planos. Após 
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apendicectomia aberta ou laparoscópica para apendicite não perfurada, os pacientes 
podem ser iniciados com uma dieta líquida clara e avançada conforme tolerado para 
uma dieta regular. Os antibióticos não são necessários no pós-operatório. A maioria dos 
pacientes recebe alta em 24 a 48 horas após a cirurgia. A alta no mesmo dia é viável, 
mais comumente após uma apendicectomia laparoscópica. 
 
*O tratamento da apendicite aguda e de suas complicações é sempre cirúrgico. Embora alguns 
poucos autores indiquem tratamento inicialmente clínico, essa conduta somente deve ser 
preconizada para raras situações, como em doentes moribundos. É discutida a possibilidade de 
instaurar conduta conservadora diante dos abscessos apendiculares e da apendicite 
hiperplásica; contudo, em ambas as situações, o tratamento definitivo será a apendicectomia 
eletiva. Para a quase totalidade dos doentes portadores de apendicite aguda, impõe-se a 
apendicectomia como método terapêutico ideal, estando sua precocidade relacionada à 
evolução pós-operatória. A laparotomia clássica, por incisão oblíqua ou transversa, na fossa 
ilíaca direita, permite acesso ao apêndice cecal, que é removido, seguindo-se a limpeza da 
cavidade abdominal. A drenagem da cavidade peritoneal é tema controverso, sendo justificável 
em casos de necrose do apêndice e abscesso local. No entanto, nota-se tendência ao seu 
abandono. Nos últimos anos, muitos autores têm preferido a abordagem por 
videolaparoscopia, com excelentes resultados não apenas cosméticos mas, particularmente, 
no que diz respeito à volta às atividades físicas. Restrições se fazem ao custo do procedimento 
e à experiência dos profissionais. O tratamento cirúrgico da apendicite aguda tem como 
principais complicações o abscesso de parede abdominal e abscesso intraperitoneal. Fístulas 
estercorais são raras e de tratamento complexo. 
12. Consequências do pneumoperitônio 
 Retorno venoso diminuído 
 RVP aumentada 
 Diurese reduzida 
 Pressão em via aérea aumentada 
 Distúrbios ácido-base → Acidose respiratória 
 Fluxo cerebral aumentado com tendência a aumentar a PIC 
13. Antibiótico 
 Cobertura para infecção por germes gram negativos e anaeróbios → Cipro (gram 
negativos) + metronizadol (anaeróbios) 
 Não complicada (edematosa ou flegmonosa) → Profilático, podendo ser matido por 24 
horas 
 Complicada (gangrenosa ou perforativa) → Até 48 horas após o último episódio de febre 
e por, no mínimo, 5 dias 
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14. Complicações 
 Infecção da incisão cirúrgica → Maior frequência 
 Abcessos pélvicos e subfrênicos 
 Deiscência do coto apendicular → Pouco comum 
15. Caso e Prescrição 
 Caso 
 
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 Prescrição 
❖ Repouso relativo 
❖ Dieta líquida 
❖ Solução aquosa 5% 500mL, IVM 104mL/H 
❖ Cloreto de sódio 20%, uma ampola em cada frasco 
❖ Ciprofloxacino 400mg, IV, 12/12h 
❖ Metronidazol 500mg, 8/8h 
❖ Dipirona 2g, IV, 5/5h 
❖ Cetoprofeno 100mg, IV, 12/12h 
❖ Luftal 40mg, VO, 8/8h 
❖ Dramin 1 ampola, IV, 8/8h se náuseas ou vômitos 
❖ Tramal 100mg, IV, 8/8h, se dor intensa 
16. Fluxograma 
 
Referências bibliográficas 
Aula de Dra. Thamy Marques (25/10/2021) 
Torrez, F. R. A., & Triviño, T. (2004). Abdome agudo inflamatório. LOPES, AC; REIBSCHEID, S.; 
SZEJNFELD, J. Abdome agudo: clínica e imagem. São Paulo: Atheneu, 51-77. 
Feres, O., & Parra, R. S. (2008). Abdômen agudo. Medicina (Ribeirão Preto), 41(4), 430-436.

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