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Prévia do material em texto

SAULO GABRIEL MONTEIRO DANTAS 
RECORDAÇÕES DA CASA DOS MORTOS 
 
1. RESENHA 
Essa resenha não é apenas um resumo informativo e não poderia sê-lo 
principalmente pela profundidade da obra. Portanto, essa resenha sintetiza os 
principais pontos narrados ao longo da obra de forma interpretativa relacionando-a 
com outros textos e contextualizando-a com questões contemporâneas importantes. 
Inicialmente, para uma melhor compreensão do livro faz-se mister que estejamos 
inteirados do contexto histórico no qual ele fora escrito e, posteriormente, publicado. 
Em meados do século XIX, na Rússia, um grupo de jovens progressistas vinha sendo 
formado em face do governo autoritário do Czar Nicolau I. Nesta perspectiva, 
Dostoévski, autor da obra “Recordações da Casa dos Mortos”, era um dos membros 
desse grupo e acabou sendo condenado por atividade antigovernamental, perfazendo 
por cumprir pena em um presídio na Sibéria. 
Dessa forma, o livro retrata o cotidiano de um personagem fictício -que muitos 
alegam ser o próprio Dostoévski-, Alexander Petrovich Goriantchikov (ou alter ego de 
Dostoévski), personagem principal da obra, bem como o convívio entre os detentos, 
os esforços, artimanhas para tornar os dias menos desagradáveis e entre outros fatos 
que aconteciam corriqueiramente no presidio, porém sempre com a intenção de 
mostrar o descaso existente ao tratamento dentro da prisão e os pensamentos dos 
“desgraçados” (referência utilizada por Dostoievski para os presidiários). 
 
2. PRIMEIRA PARTE 
A história retrata, incialmente, o presidio onde Alexander Petrovich Goriantchikov 
cumprira sua pena, um lugar, na Sibéria, afastado, arrodeado de mato e cercado por 
estacas encravadas na terra. Semelhante ao lugar onde o próprio Dostoievski 
cumprira sua pena. 
Imaginai um vasto pátio de duzentos passos de comprimento e cento e 
cinquenta de largura, com a forma dum hexágono irregular. Uma paliçada 
feita de altos moirões, profundamente encravados no solo, fortemente 
ligados uns aos outros, e talhados em ponta- rodeava por todos os lados 
o nosso presídio (DOSTOIEVSKI, 2006, p. 9). 
Alexander Petrovich Goriantchikov, o personagem principal dessa obra, era um 
indivíduo da nobreza que acabara de ser condenado por matar sua companheira. 
Todavia, Dostoievski não o enfatiza na obra, centrando-se, pois, nas relações 
existentes no sombrio e longínquo presido na Sibéria. 
 Ao nos debruçarmos no texto percebemos os hábitos dos “desgraçados” e as 
relações mercantis (apesar de irrisórias, de um ponto de vista pecuniário) dentro dos 
portões do recinto o qual cumprira sua pena. 
Um trabalho enorme e difícil pagava-se com uma ou duas moedas de 
cobre. Outros faziam empréstimos com vencimento semanal. O detento 
pródigo ou arruinado levava o seu derradeiro objeto ao usurário, que lhe 
emprestava sob penhor alguns copeques a juros monstruosos. Se o 
cliente não resgatava o objeto na data marcada, via-o vendido sem 
piedade (DOSTOIEVSKI, 2006, p.15). 
Não obstante, o romance nos traz uma reflexão acerca do trabalho forçado, o 
qual ele reconhece que o sofrimento não se dá pelo esforço, em si, realizado pelo 
exercício da atividade, mas sim por ser algo que é imposto e considerado improdutivo 
para o próprio indivíduo. Porquanto, em inúmeras ocasiões observamos pessoas que 
passam dias sem dormir (em busca de um objetivo pessoal) e não tem o mesmo 
sofrimento dos detentos que, por sua vez, passam menos tempo na realização das 
atividades laborais impositivas. Chegando à conclusão de que o sofrimento, do 
trabalho forçado, decorre de saber que essas atividades não os levarão a lugar algum, 
é, portanto, apenas, o cumprimento de uma obrigação que lhes fora impreterivelmente 
imposta. 
Quanto aos trabalhos, pareceram-me muito menos duros, muito menos 
"trabalhos forçados" do que seria de pensar; só muito tempo depois 
compreendi o verdadeiro caráter desses trabalhos, menos penosos por 
sua dureza e continuidade que pelo fato de serem "impostos", 
obrigatórios, cumpridos sob a azorrague (DOSTOIEVSKI, 2006, p.18). 
 
3. PRIMEIRAS IMPRESSÕES NO PRESÍDIO 
A narrativa, pois, nos fala também sobre as relações entre os detentos. A 
convivência dos presos nem sempre era pacífica no recinto, inevitavelmente ocorriam 
momentos em que eles trocavam insultos e até mesmo brigavam. Porém, isso não 
era de tão desagrado, muitas vezes eles insultavam-se para divertir os outros 
detentos, era como uma forma de arte para eles. Como descreve na narrativa: “Não 
compreendia que alguém pudesse trocar insultos por prazer, encontrar nesse mister 
um encanto, um deleite, um divertimento” (DOSTOIEVSKI, 2006, p.22) 
Na contemporaneidade é, realmente, de se estranhar tal comportamento, 
porém, como os detentos não tinham tanta variedade para se entreterem, surgia, 
portanto, como uma espécie de devaneio, naquele lugar sem muitas perspectivas. 
Outro ponto interessante de se ressaltar no romance é a relação que os 
detentos têm com os ex-fidalgos (ou ex membros da nobreza), eles têm um sentimento 
de resistência em face a esses que uma vez foram membros da nobreza. Porquanto, 
aos olhos dos detentos os nobres não deixaram de ser nobres, e por isso eles têm a 
oportunidade ou deleite de gozar de sua derrota, tendo em vista que foram presos e 
perderam, portanto, suas regalias. Como explicita no texto: 
Aos seus olhos continuamos sempre a ser fidalgos, o que não os impede 
de gozar a nossa queda: "Agora acabou! Ainda ontem Piotr andava 
brilhando em Moscou! Agora, Piotr torce a corda que vai usar no 
pescoço!" (DOSTOIEVSKI, 2006, p.23). 
Seguindo esse raciocínio de separação e distinção dos presos por sua casta 
(ou melhor dizendo segregação por sua classe social), Alexander Petrovich, acaba 
por aproximar-se de Akim Akimitch (um ex-fidalgo), que o explicou o motivo dos 
detentos não se familiarizarem com os ex-fidalgos. 
Para começar, vocês e eles nada tem de comum. Em segundo lugar, 
antes de virem para cá eram todos pobres servos ou simples soldados. 
Julgue por si se podem gostar de nobres (DOSTOIEVSKI, 2006, p.24). 
Ainda nesse contexto, a narrativa nos conta que por diversas vezes Alexander 
Petrovich forjava uma doença para ir à enfermaria, e por conseguinte, se afastar do 
convívio com os demais presos, os quais o repeliam por sua condição de outrora fora 
do presídio. 
Todavia, com o passar dos dias, Alexander Petrovich fora acostumando-se com 
o convívio por trás das lascas da paliçada baluarte, criando, por sua vez, uma espécie 
de sentimento pelo lugar. 
Em certo dia, caminhando ao longo dos muros do presídio ele começara a sentir 
uma sensação que lhe deixara aflito. Indagou-se o motivo da desigualdade das 
consequências do castigo aplicado, muitas vezes, a crimes semelhantes. Enquanto 
uns, se corroem pelo remorso, outros, por sua vez, se realizam em estarem presos, 
porquanto, não esperavam que no presidio pudessem encontrar tantas pessoas, 
consideradas agradáveis, ou até mesmo encontrar no presídio um porto seguro. 
Um dos condenados se consome, derrete-se como uma vela; outro, não 
desconfiara nunca que houvesse no mundo vida tão divertida, grupo tão 
agradável de esplêndidos camaradas; porque, no presidio, até gente com 
esses sentimentos se encontra (DOSTOIEVSKI, 2006, p.37). 
Sendo assim, Dostoievski, sugere o questionamento de que: seria justo o mesmo 
castigo a pessoas tão diferentes? Porém, entendamos diferentes no sentido de suas 
reações e motivações. Todavia, apesar disso, ele considera um problema sem 
solução. Porquanto, essas diferenças representam um enigma que, por sua vez, seria 
vagaroso e incerto (ou tão irresoluto quanto a quadratura do círculo, como expressar-
se-ia Dostoievski). 
4. REFLEXÃO: PARA ALÉM DO BEM E DO MAL (NIETZHE) 
Não obstante, como todo grande clássico, podemos fazer relações com outras obras 
importantes. Portanto, há de se ressaltar a genialidade de Dostoievski,porquanto, nos 
traz reflexões tão atemporais que se relacionam com outras narrativas. Dessa forma, 
ao analisar a narrativa de Dostoievski nesse livro, junto a filosofia de Nietzsche, 
conseguimos perceber uma analogia do “fraco” de Nietzche, desenvolvida em “Para 
além do bem e do mal. Prelúdio a uma filosofia do futuro”, tradução em português. 
Como explana, Dostoievski: 
Eram pobretões "natos". Chamo-os "natos", e acentuo particularmente a 
expressão. Com efeito, no nosso povo, qualquer que seja a condição ou 
a situação social, sempre houve e haverá esses estranhos indivíduos que 
um temperamento pacífico e indolente destina a uma eterna mendicidade. 
São eternamente uns pobres diabos, uns perpétuos esmoleres. Sempre 
esmagados, numa espécie de apatia, servem de bode expiatório ou de 
factótum a todos: às vezes a um libertino, às vezes a um novo-rico, às 
vezes a um ambicioso (DOSTOIEVSKI, 2006, p.42). 
Faço aqui essa analogia, pois, Nietzche, em sua grande contribuição para a 
comunidade acadêmica, diga-se de passagem, trouxe uma divisão da moral (bem e 
mal), no qual retrata o espírito do “forte” e do “fraco”, na sua perspectiva de 
moralidade, desenvolvida em seu livro. Nesse ensaio, Nietzche caracteriza o fraco 
sempre como uma pessoa cuja sua vida será guiada pela submissão e 
arrependimento. O que é bem retratado por Dostoievski, ao analisar alguns detentos 
em especial. 
5. O PRIMEIRO MÊS 
Não obstante, em decorrência da tamanha e profunda sensibilidade de 
Dostoiveski em narrar os fatos, verificamos em seu “alter ego”, Alexander Petrovich, 
um fascínio por entender os hábitos e costumes de cada indivíduo que estava ali, 
preso, e acabara ao longo de sua convivência por fazer novas amizades. Devido à 
essa sua sensibilidade chegou, certa vez, até a indagar que sentiria saudades: “E 
quem sabe se, daqui há muito tempo, no momento de partir não terei saudades!” 
(DOSTOIEVSKI, 2006, p.48). 
Ademais, retornando a falar das relações mercantis que eram vigorosas e 
recorrentes dentro do presídio. Nos fica evidente ao decorrer da narrativa a forte 
influência pecuniária no convívio dos detentos, onde quem conseguira dinheiro 
sofreria bem menos do que os que não o conseguiam tão facilmente. 
O dinheiro também - já fiz a isso uma rápida referência- tinha um valor 
extraordinário, um poder assustador. Pode-se afirmar que um preso 
possuidor de alguns recursos sofre dez vezes menos que aquele que 
nada tem (DOSTOIEVSKI, 2006, p.55). 
Além disso, a contrario sensu do que se pensa em relação as atividades 
laborais forçadas, Dostoievski as considera essenciais para saúde dos demais 
detentos. E isso é percebido, através da narração das variadas atividades que os 
forçados tinham de executar. Logo, considerando-as, por sua vez, proveitosas à 
saúde, porquanto, ajudava-os tanto em sua saúde física, como mental: “Nós juntos 
conseguíamos fazer girar a roda, e o exercício nos interessava: eu o considerava 
excelente para a saúde” (DOSTOIEVSKI, 2006, p.69). 
No decurso da narrativa percebemos a familiarização de Alexander Petrovich 
com os demais detentos, conhecendo-os, pouco a pouco, não necessitando mais ter 
que fingir doenças para ir à enfermaria, como observamos no trecho: “De início um 
sentimento irresistível me obrigava a fugir deles. Com o tempo, meu modo de julgar 
modificou-se muito, mesmo a respeito dos piores bandidos” (DOSTOIEVSKI, 2006, 
p.74). 
6. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO PRESÍDIO 
Ao longo do texto, percebemos outra problemática trazida por Dostoievski, que 
diga-se de passagem é bastante atual na conjuntura social e política brasileira: a 
dignidade do homem preso. Como ele diz "[...] ninguém tem o direito de transformar 
em cadáver um homem vivo [...]" (DOSTOIEVSKI, 2006, p.38). E, nessa perspectiva, 
apesar de aqueles homens terem cometidos os mais cruéis crimes (ou as mais cruéis 
“desgraças”, como falar-se-ia Dostoievski) eles ainda têm dignidade, e sendo assim, 
merecem ser tratados com respeito. Como afirma em seu texto: 
Por mais aviltado que esteja, todo indivíduo exige institivamente o respeito 
pela sua dignidade de homem. Sabe que é um galé, um réprobo, conhece 
a distância que o separa dos seus superiores, mas nem as grilhetas nem 
as cicatrizes do cnute lhe fazem esquecer que é um homem. E já que é 
um homem deve ser tratado como tal (DOSTOIEVSKI, 2006, p. 77). 
Outra passagem, bastante pertinente e que não poderia ser deixada de 
mencionar, narrada por Dostoievski, é o banho dos detentos, que chegava a ser 
desapiedado (e até mesmo desumano): 
De tempos em tempos, na janela ou na porta entreaberta, um soldado 
barbudo, com o fuzil na mão, verificava se não estava acontecendo 
alguma coisa de anormal. As cabeças raspadas e os corpos vermelhos 
de suor pareciam ainda mais monstruosos. Nas costas, amolecidas pelo 
vapor, as cicatrizes do cnute ou das varas sobressaiam com tanta nitidez 
que pareciam recentíssimas. Horrendas cicatrizes! Dava-me arrepios 
simplesmente olhá-las. Tornavam a atirar água sobre a pedra ardente do 
forno, e um vapor espesso enchia a estufa com uma nuvem chamejante. 
Todos ganiam, gritavam. Entre o nevoeiro, apareciam dorsos 
remendados, cabeças raspadas, dedos crispados de mãos em garra, 
pernas tortas (DOSTOIEVSKI, 2006, p. 84). 
Dostoievski chega a comparar aquele momento a algo semelhante ao que se tem de 
ideia de como é o inferno, no pior sentido da palavra, como descreve na narrativa: 
“Ocorre-me que se um dia tivermos que nos reunir todos no Inferno - lá há de ser muito 
parecido com o lugar onde nos encontramos agora” (DOSTOIEVSKI, 2006, p. 84). 
Essa referência, ou melhor dizendo, alusão ao inferno nos deixa claro o 
completo descaso pela dignidade do homem em seu momento mais ínfimo. Porém, o 
que nos atrai mais a atenção nesse trecho da narrativa de Dostoievski, é a 
contemporaneidade dos fatos, que por sua vez, estão cada vez mais presentes e 
enraizados na cultura mundial, e mais precisamente, brasileira. Podemos, portanto, 
tomar por base a narrativa de Drauzio Varella, em Carandirú, e perceber através da 
retratação das condições e vulnerabilidades dos presos, que amiúde são 
desprezados, em presídios brasileiros o total abandono por parte da sociedade e das 
políticas governamentais de ressocialização dos detentos. O que nos cabe uma nova 
discussão, que por enquanto não a faremos aqui. 
7. DATAS COMEMORATIVAS 
Sendo assim, seguindo ao longo da narrativa, Dostoievski também nos traz 
alguns momentos onde é possível enxergar humanidade naquele presídio, na Sibéria. 
Em determinados ápices da história percebemos a mobilização dos demais detentos 
no empenho e na realização de atividades que trouxessem entretenimento ao grupo, 
o que fazia com que os dias no presidio se tornassem menos monótonos. 
Realmente, os detentos andavam planejando uma representação para as 
festas. Tinham-se arranjado atores, e um ou dois cenários. Algumas 
pessoas da cidade prometiam emprestar trajos, até mesmo para os 
papéis femininos. Por intermédio de um bagageiro, esperavam obter uma 
farda de oficial, completa, inclusive as dragonas (DOSTOIEVSKI, 2006, 
p.85). 
Ainda sob esse prisma de mobilização entre os demais detentos, cabe aqui 
enfatizar um outro momento, bastante comovedor, que é o do Natal entre os 
prisioneiros. Todos se organizam e se preparam para poderem juntos celebrar e se 
solidarizar. Para os detentos esse era um momento único, um dos únicos dias do ano, 
onde eles não mereciam estar trabalhando. 
Alguns dos nossos, entre os mais simples e o mais econômico, até 
mesmo aqueles que durante o ano inteiro iam juntando um a um os seus 
copques, sentiam-se obrigados a afrouxar os cordões da bolsa, e a 
comemorar condignamente a festa. O Natal representava para os 
forçados uma solenidade de que ninguém os poderia privar, que a lei lhes 
reconhecia formalmente. Era um dos três dias do ano em que ninguém 
tinhao direito de os fazer trabalhar (DOSTOIEVSKI, 2006, p.90). 
Era tão comovente o dia de Natal no presídio que até mesmo os detentos que 
não cultuavam a festa se mobilizavam para fazer com que esse dia fosse único e 
especial, naquele longínquo e esquecido presídio. 
O próprio Akim Akimitch se preparava ativamente. Não tinha recordações 
de família, pois se criara órfão em casa de estranhos e, aos quinze anos, 
iniciara os duros trabalhos do serviço militar (DOSTOIVESKI, 2006, p. 91). 
Enfim, era uma monção do qual ninguém ficara de fora, todos queriam 
participar e compartilhar suas felicitações em um dia sui generis (pode-se entender 
assim), porque não se comemora tão somente o nascimento de Cristo, mas como 
também (para as igrejas ortodoxias russas) faz-se uma relação entre o clima, as 
colheitas e também têm um momento ímpar de felicidade e generosidade entre todos 
entes terrestres. E, por isso era um momento especial e singular para todos. 
8. O BANHO E O HOSPITAL 
Mais à frente, em outro momento, Alexander Petrovich fora parar no Hospital, 
que acolhia os “desgraçados”, Dostoievski o retrata como um lugar até que agradável 
(se comparado ao lugar onde estavam condenados a passar o resto de suas penas), 
mas não necessariamente por causa do ambiente, todavia, muito por causa dos 
médicos: 
Quando, porém, trava mais amplo conhecimento com os médicos (há 
exceções, embora pouco numerosas), todas essas repugnâncias caem 
por si, graças, creio eu, à probidade dos nossos clínicos - particularmente 
os moços. A maioria deles sabe granjear a estima e até mesmo o amor 
da gente do povo (DOSTOIEVSKI, 2006, p.123). 
Os internos eram afáveis com todos os detentos, os tratavam com respeito e 
muitas vezes até os ajudavam a ficar mais tempo no hospital, antes de retornarem 
para o presídio, lugar cujo o qual teriam que voltar ao trabalho forçado: “Às vezes 
notava que o "enfermo" estava de boa saúde, mas deixava-o ficar assim mesmo” 
(DOSTOIEVSKI, 2006, p.124). 
Por isso, amiudadamente, alguns detentos procuravam forçar enfermidades 
para que pudessem residir por mais tempo no hospital e aos cuidados dos médicos e 
enfermeiros. 
Com o passar dos dias, chegara a Primava na Sibéria, e com sua chegada os 
detentos observam e até mesmo sentem o renascimento da natureza e toda sua 
grandeza. E isso, os deixava ainda mais inquietos e com a vontade de partir em busca 
da liberdade (fugir). Dostoievski ressalta ainda que nesse período as brigas eram mais 
recorrentes, tendo em vista todo o misto de emoções que a época trazia. 
A verdade é que, tomada em conjunto, a vida na floresta, a vida de 
vagabundo, é um paraíso comparada à do presídio. Nenhuma 
aproximação é aliás possível entre a vida do presídio e avida livre, difícil 
embora, mas livre. E eis a razão por que, em toda a nossa querida Rússia, 
qualquer detento, seja qual for o local da sua prisão, fica inquieto nos 
primeiros dias de primavera, com os primeiros raios sorridentes do sol 
(DOSTOIEVSKI, 2006, p.151). 
Todavia, em raríssimas ocasiões um forçado empenhava-se por evadir-se do 
presídio, tendo em vista todos os riscos e angústias numa possível tentativa de fuga 
(que possivelmente seria sem sucesso). É possível notar, também, a benevolência 
das pessoas nesse período do ano para com os presos: quando os forçados iam a 
igreja na semana santa recebiam muita esmola. 
9. FIDALGOS E PLEBEUS 
Retomando o que fora dito, anteriormente, ao decorrer da narrativa fica cada 
vez mais evidente a separação dos “ex-nobres” em relação aos demais presos, em 
sua maioria ex-plebeus. Isso fica ainda mais explicito quando em determinado 
momento, os forçados já não suportando mais a má alimentação foram queixar-se por 
melhorias na comida, e Alexander Petrovich (ex-fidalgo), com intuito de ajudá-los, faz-
se partidário da ideia (mesmo alimentando-se separadamente dos demais detentos), 
e tenta ajudá-los em suas queixas. Porém, acaba por ser repelido pelo grupo. 
"Como é que vocês poderiam ser nossos companheiros?”, essa 
expressão me ficou gravada na lembrança. Havia nela tão franca 
ingenuidade, tão singela surpresa, que perguntei a mim mesmo se não 
dissimulava a ironia, o ódio, o escárnio. Mas não: -eu não era 
companheiro deles, e nada mais! (DOSTOIEVSKI, 2006, p.179). 
Apesar de, em um primeiro instante, não compreender o motivo de tamanha 
convicção, por parte dos demais detentos, em se sentirem diferentes dos que uma 
vez foram nobres, aos poucos Alexander Petrovich fora percebendo que por mais que 
tentasse compartilhar de suas causas eles nunca o viriam como um semelhante. 
Porquanto, nascera em um berço de ouro, enquanto os demais nem berço tinham, e 
isso já era suficiente para distingui-los. Todavia, Dostoievski não se prolonga tanto 
nesse debate. 
10. PARTE FINAL 
Mais adiante, ao decorrer da narrativa, dois detentos conseguiram lograr êxito 
em fugir do presídio, um era um preso político e o outro um prisioneiro de alta 
periculosidade, A e Kulikov, respectivamente. Sendo assim, com a fuga desses 
forçados (A. e Kulikov) do presídio fora intensificada a ideia de fuga (“mudar de sorte”, 
como diziam os detentos), muitos cogitavam que: se seus companheiros (A. e Kulikov) 
já conseguiram realizar tal façanha, eles também a conseguiriam. Nesse momento, 
surge uma frase importante, de um dos detentos, que vale ser ressaltada: "-Que 
estamos fazendo? Somos vivos sem vida, e mortos que não foram enterrados, não é 
mesmo? (DOSTOIEVSKI, 2006, p. 194). Essa frase nos traz a ideia central, cujo o 
qual, é o título da narrativa: Recordações da “Casa dos Mortos”. É importante, porque 
essa metáfora (“Casa dos Mortos”) se refere ao recinto dos detentos, e mais 
precisamente a eles, que não mais têm vida, porém ainda existem e têm de cumprir 
com os trabalhos que os fora designado, apenas alastrando os seus sofrimentos e 
angustias até que chegue o dia final (fim de sua pena ou de sua vida). 
O fim dessa narrativa se dá com a saída de Alexander Petrovich da paliçada do 
presidio da Sibéria: “Despedi-me de todas as vigas enegrecidas e mal esquadrejadas 
da nossa caserna. ” (DOSTOIEVSKI, 2006, p.199). 
11. Conclusão 
Nessa obra, Dostoievski desenvolveu uma narrativa que, inicialmente, retratará 
o presidio, o qual ele fora exilado. No entanto, essa obra acabou por ir muito além 
disso, trazendo fatos, narrados, que se assemelham amiudadamente aos 
acontecimentos contemporâneos. Através dessa, podemos traçar inúmeras reflexões 
que são abrenunciadas pela sociedade atual. Sendo assim, ao fim dessa breve 
explanação da obra de Dostoiesvki, torna-se evidente a presença de problemáticas 
atuais, como: vitupérios aos direitos humanos e ultrajes à dignidade da pessoa 
humana.

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