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Daniela Carvalho – Turma LVI ARTRITE REUMATÓIDE Definição: é uma doença sistêmica autoimune do tecido conjuntivo cujas alterações predominantes ocorrem nas estruturas articulares, periarticulares e tendíneas. Manifesta-se por meio dos sinais cardinais de inflamação e seu substrato anatômico mais característico está sediado na membrana sinovial. • Embora as manifestações articulares sejam típicas, por se tratar de uma doença sistêmica, outros órgãos podem ser envolvidos, sobretudo nos pacientes com doença articular mais grave. EPIDEMIOLOGIA • É uma das doenças reumáticas mais frequente - prevalência de cerca de 1% no mundo. • América Latina: taxa de prevalência de 0,4% para todo o continente. • Estudo multicêntrico brasileiro: prevalência de até 1% da população adulta. o Senna et al., em um estudo seccional com 3.038 pessoas residentes na cidade de Montes Claros, Minas Gerais, encontraram uma prevalência de 0,46%. • Mulheres > Homens (3:1) • Ocorre mais frequentemente na faixa dos 30 aos 50 anos (América Latina: idade média de início da doença é por volta dos 40 anos). • A prevalência da enfermidade é 2 a 10 vezes mais alta entre os parentes de primeiro grau de pacientes com AR. • Esta associada a maior risco de morte por doenças cardiovasculares (DCV). ETIOPATOGÊNSE A AR é uma doença de patogênese complexa, com a participação de fatores genéticos, hormonais e ambientais. Trata-se de doença em que há, desde a fase inicial pré-articular, perda da autotolerância e consequente autoimunidade, traduzidas por ativação linfocitária e produção de autoanticorpos. Fatores neuroendócrinos, genéticos e ambientais determinam o aparecimento das manifestações articulares, fase caracterizada pelo desequilíbrio entre citocinas pró e anti-inflamatórias e recrutamento articular de macrófagos, neutrófilos, células T, B e natural killers (NK), além de ativação de fibroblastos, osteoclastos e condrócitos. Esse influxo celular é responsável por inflamação sinovial crônica, cujos mediadores principais são as citocinas interleucina (IL) 1,17 e o fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa), assim como prostaglandinas e metaloproteinases (MMP). Os resultados histopatológicos são a destruição da cartilagem articular e a erosão óssea mediadas por fibroblastos, condrócitos e osteoclastos, e o resultado clínico, por sua vez, se traduz pela ocorrência das deformidades e incapacidade funcional. Daniela Carvalho – Turma LVI • Os genes HLA que contribuem com uma importante parcela do risco genético de desenvolvimento da AR. Além disto, existe também a participação de um conjunto de múltiplos genes não HLA. Entre os mais de 30 diferentes genes não HLA relacionados com a AR, o protein tyrosine phosphatase, nonreceptor type 22 (PTPN22) e o cytotoxic Tlymphocyteassociated antigen4 (CTLA4) estão entre os mais importantes. • Diferentes mecanismos da epigenética, como metilação do DNA e acetilação e desacetilação de histonas, são descritos em AR, e seus resultados incluem aumento ou diminuição da transcrição genética. • Tabagismo o A exposição pulmonar a agentes tóxicos, entre eles fumaça do cigarro e partículas da sílica, bem como agentes microbianos ativam os receptores Toll, em particular TLR4 (toll like receptor – TLR). Isso induz a expressão da enzima peptidilarginina deiminase tipo 4 (PAD4). Outro evento relacionado é a contribuição dos agentes nocivos ao pulmão para o acúmulo e ativação das APC no próprio pulmão, incluindo células dendríticas e células B. O resultado da ação dos agressores brônquicos seria a transformação de resíduos de arginina em citrulina, evento denominado citrulinização, mediado pela PAD4. Comportando-se como um neoepítopo, esse “novo” aminoácido, por perda de tolerância, favorece uma reação contra proteínas citrulinadas, dando origem aos anticorpos antiproteínas e peptídeos citrulinados (ACPA), que podem ser identificados pela pesquisa de anticorpos antipeptídio citrulinado (anti-CCP). Diferentes aminoácidos citrulinados, presentes em diferentes proteínas, como alfaenolase, fibrinogênio, colágeno, vimentina e fibronectina, podem ser detectados pelos ensaios anti-CCP. o A ativação das células T tem como consequência a ativação das células B e a produção de anticorpos contra as proteínas com resíduos citrulinados. Esses anticorpos estão presentes por anos antes do início de sintomas de AR, evidenciando a autoimunidade que precede a doença clínica • Mais recentemente, tornou-se evidente que, à semelhança da resposta contra peptídios citrulinados, outro sistema de autoanticorpo direcionado a um determinante estrutural similar está presente na AR. Esses anticorpos reconhecem proteínas carbamiladas e, portanto, são chamados anticorpos antiproteínas carbamiladas (anti-CarP). Estimase que 16 a 30% dos pacientes anti-CCP negativos são anti-CarP positivos. • Bactérias e vírus também têm sido implicados na etiopatogênese da AR, entre eles os vírus parvovírus e EpsteinBarr, e o micoplasma Mycobacterium. Admitese que, durante a infecção por esses agentes, a formação de imunocomplexos pode determinar o aparecimento do FR. Há também evidências indicando que pacientes com doença periodontal apresentam maior incidência de AR (A infecção pela bactéria Porphyromonas gingivalis, que expressa a enzima PAD4, faz citrulinização de proteínas). Além disto, perturbações da microbiota intestinal e alterações na barreira intestinal, em modelos experimentais, têm contribuído para o desenvolvimento de artrite. • Não somente o sistema imune adaptativo, mas também o inato está envolvido na patogênese da AR. Os TLR das células do sistema inato podem ser estimulados por padrões moleculares associados a patógenos (PAMP), como também por padrões moleculares associados a dano endógeno (DAMP). Sua estimulação, seja por sequências proteicas bacterianas, ligantes virais ou fragmentos teciduais danificados, ativa os macrófagos, responsáveis pela produção de TNF-alfa, IL1, 6, 12, 15, 18 e 23, apresentação de antígenos e fagocitose. • Outro mecanismo envolvido na AR e que se segue à ativação linfocitária nos órgãos linfoides é a presença de linfócitos T nas articulações. O HLA nas células apresentadoras, mediante o processamento de peptídios, ativa células T CD4+. Os linfócitos T continuariam a responder aos antígenos próprios, perpetuando o processo inflamatório, mesmo sem a persistência da exposição ao antígeno. • As erosões ósseas decorrem também da ação do ligante do RANK (RANKL), fator importante para a diferenciação dos osteoclastos. • Esses osteoclastos ativados expressam a quimiocina CXCL8 (também chamada de IL8). A CXCL8 tem efeito autócrino para os osteoclastos e exacerba a diferenciação mediada pelos anti-CCP. A CXCL8 também estimula nociceptores articulares, podendo explicar o fenômeno de artralgia associada à presença do anti-CCP, condição sabidamente preditora de evolução para AR. • Além dos linfócitos T, estudos demonstram a importância dos linfócitos B presentes nos infiltrados inflamatórios sinoviais e nos centros germinais na AR. Daniela Carvalho – Turma LVI Nesse contexto de autoimunidade sistêmica, o mecanismo da localização articular que se segue à perda de tolerância e resulta em doença clínica não está esclarecido. Acredita-se que alterações da biomecânica e distúrbios hormonais e neurais levem ao substrato anatômico da AR: a sinovite reumatoide. • A sinovite, ao microscópio, pode ser caracterizada por uma fase de exsudação, uma de infiltração celular e, finalmente, pela formação de um tecido de granulação. Na fase de exsudação, a congestão e o edema são mais acentuados na superfície interna da membrana sinovial, particularmente próximo às bordas da cartilagem articular. Sua contrapartida é a formação de derrame no espaço articular. Na fase de infiltração, a célula predominante é o linfócito T, com predominância de auxiliares/indutores (célulasCD4+). A fase crônica é caracterizada por uma membrana sinovial hiperplasiada, com a formação de um tecido de granulação que recobre a cartilagem e o osso subcondral (pannus). o O pannus é um tecido invasivo composto por células que produzem grandes quantidades de enzimas destrutivas que progressivamente substitui a cartilagem hialina. O novo tecido apresenta uma rica formação vascular, a angiogênese, que é fundamental para o desenvolvimento e a manutenção da fase crônica. • O tecido conjuntivo recém-formado tem capacidade de maturação pluripotencial e pode apresentar metaplasia em tecido sinovial, cartilaginoso hialino, fibroso ou ósseo. O resultado final é a anquilose fibrosa ou óssea. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Manifestações articulares e periarticulares • Instala-se de maneira insidiosa e progressiva na maioria das ocasiões. o Os sintomas iniciais podem ser articulares e/ou sistêmicos: ▪ Astenia, fadiga, mal-estar, febre baixa ou dores musculoesqueléticas vagas. ▪ Poliartrite aditiva, simétrica (REGRA), associada a edema e rigidez articular. • 15 a 30% dos pacientes, o início da doença se dá de maneira aguda ou subaguda (poucos dias a algumas semanas): o Não é infrequente a presença de mialgia, fadiga, febre baixa, hiporexia, emagrecimento e depressão. • Articulações frequentemente envolvidas: o Precocemente: articulações metacarpofalângicas (MCF) e interfalângicas proximais (IFP) das mãos, interfalângicas dos polegares, os punhos e as articulações metatarsofalângicas (MTF), ombros e joelhos. o Com a evolução da doença: tornozelos, cotovelos, IFP dos pés, coluna cervical, esternoclaviculares, temporomandibulares, coxofemorais, cricoaritenóideas e, com menos frequência, as articulações entre os ossículos dos ouvidos e as interfalângicas distais (IFD) de mãos e pés. • Dor o A intensidade da dor depende de diversos fatores relacionados a doença e ao indivíduo, mas no geral é de intensidade moderada. o A dor é de ritmo inflamatório (pior pela manhã e à noite) • Rigidez articular > 1 hora de duração o Rigidez articular ao se levantar pela manhã e após períodos de imobilização prolongada. o Quanto maior a duração, maior é a atividade da doença. • Alterações locais de inflamação articular o Calor, edema com ou sem efusão (derrame articular), rubor (geralmente leve) e limitação de movimentos articulares. • Instabilidade articulares e deformidades – com a evolução da doença Daniela Carvalho – Turma LVI o “mãos em dorso de camelo” (tumefação das articulações MCF, em especial da segunda e da terceira, bem como tumefação dos punhos. Essas alterações associam-se frequentemente a uma hipotrofia dos músculos interósseos do dorso das mãos). Dedos em fuso (secundários à tumefação das articulações IFP). o Semi-flexão dos punhos, com saliência da cabeça da ulna. o Desvio ulnar dos dedos, ligado a um afrouxamento dos meios de contenção das articulações MCF. Acometimento dos polegares em uma posição em Z. Dedos em pescoço de cisne (ocorrem pela hiperextensão das articulações IFP e flexão das IFD). Daniela Carvalho – Turma LVI o Dedos em botoeira (caracterizados por uma flexão das articulações IFP e hiperextensão das IFD). o Dedos em martelo: formados pela flexão permanente das articulações IFD. • Os cotovelos, tumefeitos e dolorosos pela presença de inflamação, podem apresentar-se em rigidez viciosa: semi-flexão com semi-pronação de antebraços. Os ombros tendem a uma posição de adução e rotação interna. • Nos pés e nos tornozelos, são inicialmente acometidas as articulações MTF e as do tarso. A retificação, ou desabamento, do arco anterior (metatarsal) cria um pé plano anterior seguido por calosidades localizadas nas regiões de apoio sob as cabeças metatarsais luxadas. o Essas alterações levam à queixa de dor ao pisar e deambular (“andando sobre pedregulhos”). o Podem ocorrer, ainda, hálux valgo e calos sobre as articulações IFP, que muitas vezes se encontram em hiperflexão. o O acometimento dos tornozelos e das articulações subtalares pode levar à claudicação durante a marcha. O acometimento da articulação subtalar leva a redução da inversão e eversão do pé. o A sinovite das articulações subtalar e talonavicular causa dor e rigidez. À medida que ocorrem perda da cartilagem e erosão óssea, aparece a deformidade em valgo com progressivo achatamento do arco plantar longitudinal. Daniela Carvalho – Turma LVI • Os joelhos são acometidos precocemente e quase sempre apresentam efusões articulares de intensidade variável. A artrite ativa e persistente dessas articulações, somada às atitudes viciosas, pode resultar em relaxamento das formações ligamentotendíneas e em deformidades do tipo valgo ou varo. • O acometimento das articulações coxofemorais é mais raro. • O acometimento da coluna vertebral é, na maioria das vezes, limitado à coluna cervical, particularmente à sua porção superior (C1-C2). o Manifestações: dores cervicais altas, rigidez do pescoço e, às vezes, sinais neurológicos de compressão medular. A compressão, dependendo do seu grau, pode ser potencialmente fatal. • O acometimento das articulações temporomandibulares pode provocar dor local e dificuldades na mastigação. Ocasionalmente, a articulação cricoaritenóidea pode ser acometida, levando a rouquidão. • As manifestações periarticulares são resultantes da extensão do processo inflamatório articular para outras estruturas do tecido conjuntivo. Como consequência, podem ocorrer: o Tenossinovite estenosante estilorradial (tenossinovite de De Quervain) o Síndrome do túnel do carpo e do tarso. o Rupturas dos tendões extensores nas mãos (impotência na extensão dos dedos). o Bursites e cistos sinoviais (quando vistos na região posterior dos joelhos (fossa poplítea), são denominados cistos de Baker). → Uma forma menos frequente de apresentação da AR é o padrão palindrômico. A artrite é mono ou oligoarticular, e o início dos sintomas é súbito, habitualmente de forte intensidade e acompanhado por calor, edema e rubor. O quadro articular perdura, em média, de 12 h a alguns dias e evolui por crises, com períodos de remissão variando de dias a vários meses. Manifestações extra-articulares e acometimento sistêmico • Inicio da doença: astenia, hiporexia, ansiedade, mialgia e emagrecimento leve. Pode haver também, mais raramente, linfadenopatia e febre baixa a moderada. • AR grave: frequentemente associada a anemia de doença crônica. • Pele e unhas: hipotrofias, eritemas, alterações secundárias a vasculites, e menos frequentemente fenômeno de Raynaud; as unhas podem se tornar quebradiças. • Nódulos Reumatóides (NR) o Preditores clínicos de artrite mais grave e erosiva. o São firmes, não dolorosos e móveis no tecido subcutâneo; no entanto, eles também podem ser aderidos a estruturas subjacentes, como periósteo, fáscia e tendões. Apresentam-se de tamanho variado, de alguns milímetros a vários centímetros de diâmetro, são indolores. o Podem aumentar ou regredir, recorrer ou persistir indefinidamente. Daniela Carvalho – Turma LVI o A maioria dos nódulos subcutâneos é encontrada sobre proeminências ósseas, superfícies extensoras, áreas submetidas à pressão ou adjacentes a articulações. Ocasionalmente, manifestam-se também em esclera, orelhas, coração, cordas vocais, pulmões, sistema nervoso, parede abdominal e músculos. o A etiologia exata dos NR é desconhecida. Acredita-se que sejam o resultado de vasculite de pequenos vasos. • Vasculite Reumatoide (VR) o Manifestação menos comum e sua presença costuma estar associada à AR grave, ativa e com anos de evolução (complicação extra-articular mais grave da AR). o Trata-se de um processo inflamatório clinicamente heterogêneo que afeta sobretudo vasos sanguíneos de pequeno a médio calibre. Pode haver um envolvimento orgânico generalizado, e sua presença está associada a umprognóstico ruim. o A vasculite cutânea e a neuropatia vasculítica são as formas mais comuns. Um amplo espectro de manifestações cutâneas, com presença de arterite ou venulite, pode ocorrer e as lesões extensas tendem a estar associadas ao envolvimento simultâneo de outro órgão. o Em virtude do acometimento de artérias ou arteríolas de pequeno e médio calibre, pode haver ulceração cutânea, pioderma gangrenoso, formação de pequenos pontos hemorrágicos nos cantos das unhas, gangrena, osteólise digital, púrpura palpável, neuropatia periférica e acometimento de órgãos internos. • Neuropatia periférica o Secundária à vasculite dos vasa-nervorum, varia de uma forma sensorial discreta a uma neuropatia mista (mononeurite múltipla) de grave evolução. As formas de acometimento do sistema nervoso incluem nódulos no sistema nervoso central, mielopatia cervical e compressões nervosas periféricas. • Manifestações em estruturas cardíacas o Pericardite, miocardite pela formação de granulomas ou vasculite, distúrbios do sistema de condução, endocardite e arterite coronariana. A pericardite e a miocardite habitualmente não provocam sintomatologia. • Eventos cardíacos isquêmicos o O risco de cardiopatia isquêmica se encontra aumentado nos pacientes reumatoides e pode ser causa de insuficiência cardíaca. o É provável que a combinação de fatores de risco tradicionais e não tradicionais para DAC, como a inflamação persistente, sejam importantes para o aparecimento e desenvolvimento da aterosclerose. Indivíduos com AR possuem risco até 3 vezes maior de novo evento cardiovascular quando comparados com indivíduos sem doenças inflamatórias. • Manifestações pulmonares o Responsáveis por 10 a 20% das mortes dos pacientes com AR. o Ocorre principalmente na forma de pleurite com ou sem derrame, nódulos pulmonares, fibrose intersticial e pneumonite com ou sem vasculite. ▪ O derrame pleural da AR é um exsudato com pH baixo (< 7,3), glicose baixa (< 50% do nível sérico), desidrogenase láctica elevada (> 700 UI/ ℓ ) e dosagem do FR elevada. Daniela Carvalho – Turma LVI ▪ A doença das vias aéreas – incluindo pequenas e grandes vias aéreas – é comum na AR e pode ser a manifestação pulmonar mais precoce. Podem ocorrer bronquiectasias, bronquiolite constritiva (bronquiolite obliterante) e bronquiolite folicular. ▪ Mais raramente, nódulos reumatoides podem acometer o parênquima pulmonar. Na tomografia, aparecem bem definidos como nódulos redondos que podem cavitar o Síndrome de Caplan o Ocorre em pacientes com AR e pneumoconiose, sendo caracterizada pelo rápido desenvolvimento de múltiplos nódulos pulmonares. • A amiloidose secundária e o uso de medicações nefrotóxicas são as principais causas de doença renal na AR. o As glomerulonefrites são muito raras. • Olhos o São acometidos em 15 a 25% dos casos de AR. o O acometimento do segmento anterior inclui ceratoconjuntivite seca, ceratite ulcerativa periférica, episclerite e esclerite anterior. Já no segmento posterior pode haver esclerite posterior e, raramente, vasculite retiniana. ▪ Ceratoconjuntivite seca (manifestação ocular mais comum): doença multifatorial que reduz a produção e altera a composição das lágrimas, o que resulta em instabilidade do filme lacrimal, acompanhada de aumento da osmolaridade das lágrimas e inflamação da superfície ocular. Leva ao aumento da fricção e ao eventual dano da superfície ocular. Os sintomas são variáveis e incluem desconforto, dor, coceira ou queimação, sensação de corpo estranho ou areia nos olhos, fotofobia, entre outros. o Quando, ao quadro ocular, associa-se um comprometimento inflamatório das glândulas salivares, cuja tradução mais comum é a xerostomia, temse a síndrome de Sjögren secundária. o Ressalte-se ainda que os olhos podem ser sede de complicações por uso de medicamentos comumente adotados no tratamento da AR. É possível citar os antimaláricos, que podem se depositar na retina e na córnea, e os corticosteroides, que podem provocar o aparecimento de catarata e glaucoma. • Síndrome de Felty é definida como AR (poliartrite crônica) em combinação com esplenomegalia e leucopenia (neutropenia). • Os pacientes com AR apresentam um aumento no risco basal para infecções graves em comparação com a população em geral, sendo a presença de MEA um importante preditor da sua ocorrência. Doença de Still do adulto • A doença de Still de início na idade adulta (DSA) é uma doença multissistêmica rara, considerada uma síndrome auto-inflamatória complexa (multigênica). • A etiologia é desconhecida e o diagnóstico é difícil. o Um diagnóstico precoce pode melhorar o prognóstico dos pacientes. o Diagnóstico de exclusão! • Quadro Clínico: o Febre (>38,5ºC), 1 a 2 picos diários; temperaturas mais altas à noite. ▪ É comum a febre preceder o aparecimento das outras manifestações o Pode ocorrer um eritema róseo evanescente, por vezes pruriginoso, macular ou maculopapular, que piora com a febre. O eritema é predominantemente encontrado na região proximal dos membros e no tronco. o Dor articular ▪ Artralgia e artrite envolvem sobretudo punhos, joelhos e tornozelos. ▪ A coluna cervical é mais frequentemente acometida que nas formas iniciais da AR. ▪ Embora a artrite seja inicialmente leve e transitória, ela pode evoluir para uma poliartrite simétrica erosiva crônica. ▪ Dor de garganta pode ser um sintoma inicial o Outras manifestações típicas: ▪ Mialgia, linfadenopatia, esplenomegalia, hepatomegalia, serosites e perda de peso. Daniela Carvalho – Turma LVI • Testes laboratoriais: o Refletem a natureza inflamatória sistêmica não específica da doença. o Aumentos na velocidade de hemossedimentação (VHS) e no nível de proteína C reativa (PCR). o Leucocitose neutrofílica o Anemia e trombocitose (achados comuns) o Ferritina sérica: pode ser útil como marcador da atividade da doença. o Aumento leve a moderado de transaminases. o Anticorpos anti-CCP e anticorpos antinucleares são habitualmente negativos. • Critérios classificatórios →Yamaguchi; Fautrel. • Tratamento: o Corticosteroides (0,8 a 1 mg/kg/dia de prednisona ou equivalente) e metotrexato. o Casos refratários: imunobiológicos, como os bloqueadores de TNF-alfa, tocilizumabe e anakinra. MANIFESTAÇÕES LABORATORIAIS • Hemograma: o Pode ser detectada: anemia moderada, normocítica e hipocrômica ou normocrômica; o A concentração sérica do ferro pode estar baixa, enquanto a ferritina pode estar elevada por ser um reagente de fase aguda; o É possível encontrar, ainda, leucocitose (correlação com atividade de doença, vasculite, infecção ou uso de corticosteroide), eosinofilia e trombocitose (correlação com atividade de doença e presença de manifestações clínicas extra-articulares). • Provas de atividade inflamatória: o VHS, PCR • Pesquisa de autoanticorpos: o Fator Reumatoide (FR): positivo em 70-80% dos pacientes (negatividade do FR não exclui o diagnóstico) ▪ É constituído por autoanticorpos de diferentes classes de imunoglobulinas (IgM, IgG e IgA) dirigidos contra determinantes antigênicos do fragmento Fc das IgG. ▪ No início pode estar negativo → Não exclui o diagnóstico ▪ Pode estar positivo em outras doenças ▪ Níveis mais elevados: doença agressiva, presença de nódulos e manifestações extra- articulares. o Anti-CPP: ▪ Esses anticorpos podem ser detectados em aproximadamente 70 a 80% dos soros de pessoas com AR com especificidade de 90 a 98%. ▪ Raramente são detectados em outras doenças. ▪ Tem correlação com evolução mais grave da AR, de modo que eles podem ser usados como indicadores de progressão e prognóstico. o Anticorpos antinucleares ▪ Utilizado como teste de exclusão diagnóstica (no caso de diagnóstico diferencial com LES) ▪ Possa ser positivo em 30 a 40% dos pacientes com AR. o Análise do líquido articular ▪ O líquido articular pode ser retirado paraanálise por meio da artrocentese e pode ser útil para excluir diagnósticos como gota e infecção. ▪ A análise dolíquido sinovial na AR pode revelar redução de sua viscosidade, aspecto turvo e leucocitose em níveis inflamatórios, normalmente de 2 a 30 mil células/mm 3 , embora casos acima de 50 mil/mm 3 não sejam raros, ocorrendo às custas de neutrofilia e/ou monocitose. A concentração de proteína pode estar elevada e a glicose, diminuída. Daniela Carvalho – Turma LVI EXAMES DE IMAGEM • Raio-X: o Diagnóstico, identificação de dano estrutural, prognóstico e monitoramento do tratamento. o RX anteroposterior o Avaliação a cada 12 meses para acompanhamento o Manifestações radiológicas: ▪ Simetria ▪ Osteopenia ▪ Aumento das partes moles ▪ Redução do espaço articular ▪ Erosões ósseas ▪ Cistos ósseos ▪ Deformidades e instabilidade o Escore de Sharp modificado por van der Heidji ▪ Mão: 16 áreas de erosão e 15 áreas de estreitamento articular ▪ Pé: 6 áreas para erosão e 6 para estreitamento articular ▪ Total: 448 pontos - 280 nas mãos e 168 nos pés • US e RNM a depender da situação DIAGNÓSTICO • É basicamente clínico, não existindo exame complementar, seja laboratorial, de imagem ou histopatológico, que isoladamente possa confirmá-lo ou descarta-lo. • Manifestações clínicas + exames complementares • Os scores (ACR, ACR/EULAR) → têm melhor desempenho na doença de longa evolução. o American College of Rheumatology (ACR) o European League Against Rheumatism (EULAR) Daniela Carvalho – Turma LVI o ACR/EULAR → Apenas para indivíduos com pelo menos uma articulação com sinovite clínica definida (edema) e que não seja explicada por outra doença. Diagnóstico nas fases iniciais → introdução da medicação o mais rápido possível evitando deformidades articulares e a incapacidade física. Daniela Carvalho – Turma LVI TRATAMENTO Janela terapêutica • Os primeiros 12 meses da doença, considerada AR inicial, são referidos como uma janela de oportunidade terapêutica. • É o momento em que a introdução de medicamentos de maneira rápida e efetiva pode mudar o curso da doença no longo prazo, o que pode resultar em melhor controle da enfermidade, com a possibilidade de remissão sustentada. O seguimento dos enfermos e a terapia devem ser realizados de modo individual, caso a caso, já que a história natural da doença é, com frequência, imprevisível. Tratamento Modificador da Doença Os MMCD (medicamentos modificadores do curso da doença, que são – fármacos que previnem o dano e preservam a integridade e funcionalidade articular atuando sobre a resposta imune) dividem-se, em três categorias → medicamentos sintéticos convencionais, os sintéticos alvo-específico e os biológicos. Daniela Carvalho – Turma LVI Sintéticos • Metotrexato (1º escolha) o É um inibidor seletivo da enzima dihidrofolato redutase (DHFR) e de outras enzimas folatodependentes, como a AICAR transformilase (AICAR T’ase). • Antimaláricos o Inibiriam a ação de determinadas enzimas proteolíticas pela alteração do pH do interior de organelas lisossomais. • Sulfassalazina o Inibe a síntese de IL-1-alfa, IL-1-beta e TNF-alfa, a proliferação de células B e a migração de leucócitos. • Leflunomida o É um inibidor de síntese de pirimidina que reduz a proliferação de células T por meio do seu metabólito ativo, a teriflunomida. • Ciclosporina o Difunde-se pela membrana celular e, por mecanismos de inibição enzimática, reduz a síntese de IL-2 e outras citocinas com redução da proliferação de linfócitos T e da ativação de linfócitos B. • Sais de ouro o In vivo, reduz a síntese de interleucinas e do TNF-alfa. • Azatioprina o In vivo, a azatioprina é convertida na 6-mercaptopurina (6MP), seu princípio ativo. A 6MP interfere na síntese do DNA, com redução da proliferação de linfócitos B e, talvez, linfócitos T. • Ciclofosfamida o É um agente alquilante que atua cindindo o DNA e afetando as células em todas as fases de seu ciclo de crescimento. Agentes Biológicos • Indicados para pacientes que persistem com atividade da doença, apesar do tratamento com pelo menos 2 dos esquemas com os medicamentos anteriores, incluindo MTX. • Encontram-se comercialmente no Brasil: o Bloqueadores de TNF: adalimumabe, etanercepte, infliximabe, certolizumabe e golimumabe; o Depletor de linfócito B: rituximabe; o Bloqueador da coestimulação do linfócito T: abatacepte; o Bloqueador do receptor de IL-6: tocilizumabe. • Contraindicação: só podem ser usados na gravidez os anti-TNF (especialmente o certolizumabe). Os anti-TNF não devem ser usados em ICC classes III e IV, na vigência de infecção ativa, infecções pulmonares recorrentes, esclerose múltipla ou pacientes com doenças malignas atuais ou passadas. • Cuidado no uso em pacientes com suscetibilidade ou história prévia de tuberculose → fazer raio-x e PPD antes do início da terapêutica. • Controvérsia no uso em pacientes com antecedentes de malignidade. Tratamento Sintomático Para combate à dor e à inflamação por via sistêmica → não são modificadores da doença!! • AINE’s • Glicocorticoides o Dose não deve ultrapassar o equivalente a 10 mg/dia de prednisona o Se por tempo prolongado (mais de 3 meses) → suplementação de cálcio (1.500 mg/dia de cálcio elementar) e vitamina D3 (400 a 800 UI/dia). • Punções de alívio • Infiltrações periarticulares e intra-articulares de esteroides o As infiltrações com glicocorticoides estão indicadas para os casos de mono ou oligoartrites persistentes, com triancinolona hexacetonida. Daniela Carvalho – Turma LVI TRATAMENTO COMPLEMENTAR • Esclarecimentos quanto a condição clínica/ enfermidade e prognóstico. • Apoio psicoterapeutico se necessário • Repouso o É uma das medidas mais efetivas no combate à dor e à inflamação, sendo particularmente útil após o almoço e de duração variável, segundo a atividade da doença. • Repouso articular o As articulações inflamadas devem ser deixadas em repouso, evitando-se posições viciosas antálgicas, o que se consegue pelo uso de órteses, que, além de melhorarem o quadro doloroso, atuam na redução do espasmo muscular. • Hospitalização o Indicada para pacientes com comprometimento mais acentuado do estado geral, febre e complicações viscerais, ou quando suas condições clínicas não permitam terapia física em regime ambulatorial. • Transplante autólogo de células-tronco o Utilizado em pacientes que não são responsivos as terapias convencionais. o Utilizam-se altas doses de ciclofosfamida com posterior infusão de célulastronco. Observa-se uma redução de linfócitos T e células B. O sistema imune parece ser reajustado e os pacientes respondem bem, porém podem apresentar recidivas, com possibilidade de virem a responder a fármacos a que não respondiam anteriormente. EVOLUÇÃO/ PROGNÓSTICO • A AR é uma enfermidade que apresenta expressão clínica variada. Além disto, a doença apresenta fases de aumento e de redução dos sintomas articulares. o Há pacientes em que a enfermidade predomina apenas em algumas articulações; em outros, praticamente todas são envolvidas. o Alguns pacientes, a presença de manifestações viscerais é muito importante, enquanto outros podem não apresentar qualquer manifestação extra-articular. o Há também padrões muito variáveis do curso clínico evolutivo. • Em cerca de 10% das ocasiões, o paciente apresenta curso clínico persistente e, se não for submetido à terapia incisiva, poderá evoluir rapidamente para um quadro de extrema incapacitação. • Os danos estruturais secundários à enfermidade são cumulativos e irreversíveis. Características que se associam a melhor prognóstico: • Doença com pequena atividade nos primeiros meses de evolução • Menor incapacidade inicial • Baixos níveis de reagentes de fase aguda • Ausência de FR e de ACPA • Pouco ou nenhum dano articular ao estudoradiográfico inicial • Tratamento precoce com uso de medicamento modificador do curso da doença Fatores de mau prognóstico na evolução da artrite reumatoide: • Variáveis demográficas o Sexo feminino o Tabagismo o Início da doença em idade precoce o Baixo nível socioeconômico e de educação formal • Variáveis relacionadas com a doença o Demora no diagnóstico e atraso no início do tratamento Daniela Carvalho – Turma LVI o Níveis de atividade da doença: acometimento de mais de 20 articulações, VHS e/ou PCR persistentemente elevadas, ICAD elevados o Presença de fadiga e perda rápida da capacidade funcional o Proliferação sinovial de início rápido o Presença de manifestações extra-articulares o Alterações radiográficas ósseas precoces o Fator reumatoide e anti-CCP em títulos altos o Fatores genéticos: epítopo compartilhado AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE DA DOENÇA Os seguintes parâmetros podem ser empregados na avaliação e no acompanhamento dos pacientes: • Dados subjetivos (sintomas de atividade da doença): o Presença e duração da rigidez matinal e da fadiga o Grau de dor articular relatada pelo paciente • Exame físico (evidências objetivas de atividade da doença): o Número de articulações edemaciadas o Número de articulações dolorosas o Presença de manifestações viscerais: nódulos subcutâneos, episclerite, neuropatia sensorial, serosite, vasculite, síndrome de Felty, neuropatia motora, doença intersticial pulmonar. • Laboratório (evidências objetivas de atividade da doença ou presença de comorbidades e toxicidade por medicações): o VHS e PCR o Hemograma (anemia na ausência de perda crônica ou hematúria, leucocitose e trombocitose são sinais de doença ativa) o Testes de funções hepática e renal o Análise do líquido sinovial • Avaliação do estado funcional e da qualidade de vida (questionários padronizados) • Imagem o Radiografias de articulações acometidas o US e RNM articular a depender da situação Escores para avaliar a atividade da doença • DAS28 (mais usado) o Emprega-se a contagem de 28 articulações; presença de dor e edema; VHS; avaliação da saúde geral pelo paciente. • Clinical Disease Activity Index (CDAI) • Simplified Disease Activity Index (SDAI) Critérios para remissão clínica: • Rigidez matinal inferior a 15 min • Ausência de fadiga • Ausência de dor articular • Ausência de dor à mobilização articular • Ausência de edema articular e das bainhas tendíneas • VHS < 30 mm/h (mulheres) ou 20 mm/h (homens) Remissão: se 5 ou mais dos critérios presentes por no mínimo 2 meses consecutivos. Não deve também apresentar manifestações clínicas de vasculite ativa, serosite, miosite, febre e emagrecimento recente e inexplicável. Daniela Carvalho – Turma LVI PREVENÇÃO DE DEFORMIDADES ARTICULARES E TENDÍNEAS • Órteses • Medidas fisioterápicas • Cinesioterapia A função dos exercícios é preservar a mobilidade articular, o comprimento e o tônus dos músculos, prevenindo e corrigindo as atrofias musculares, podendo ser precedidos de termoterapia superficial ou profunda, de acordo com as articulações envolvidas, como medida de relaxamento muscular. CORREÇÃO DE DEFORMIDADES ARTICULARES E TENDÍNEAS • No caso de alterações articulares graves e que não respondem a tratamentos conservadores, é indicada a cirurgia ortopédica (sinovectomia, osteotomia, artrodese e artroplastia). Fonte – resumo baseado em: Reumatologia : diagnóstico e tratamento / Marco Antonio P. Carvalho ... [et al.]. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2019.
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