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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/330388319 O papel do grafite no mercado imobiliário, como agregador de valor e transformador local Conference Paper · January 2018 DOI: 10.15396/lares_2018_paper_115-Ribeiro CITATIONS 0 READS 477 1 author: Some of the authors of this publication are also working on these related projects: The role of graffiti in the aesthetic experience of ambiences View project Rayana Ribeiro Federal University of Rio de Janeiro 3 PUBLICATIONS 0 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Rayana Ribeiro on 12 April 2019. The user has requested enhancement of the downloaded file. https://www.researchgate.net/publication/330388319_O_papel_do_grafite_no_mercado_imobiliario_como_agregador_de_valor_e_transformador_local?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_2&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/publication/330388319_O_papel_do_grafite_no_mercado_imobiliario_como_agregador_de_valor_e_transformador_local?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_3&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/project/The-role-of-graffiti-in-the-aesthetic-experience-of-ambiences?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_9&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_1&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Rayana-Ribeiro?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_4&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Rayana-Ribeiro?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_5&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/institution/Federal-University-of-Rio-de-Janeiro2?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_6&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Rayana-Ribeiro?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_7&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Rayana-Ribeiro?enrichId=rgreq-5f031ccf3e8d69a3362bdce504aefd64-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzMDM4ODMxOTtBUzo3NDY5MTE2NjU1MDQyNTdAMTU1NTA4OTAyNjg0MQ%3D%3D&el=1_x_10&_esc=publicationCoverPdf 18ª Conferência Internacional da LARES São Paulo -‐ Brasil 26 a 28 de Setembro de 2018 O papel do grafite no mercado imobiliário, como agregador de valor e transformador local Rayana Gama Ribeiro1 1 Instituição: PROARQ - UFRJ, Endereço: Avenida Pedro Calmon, 550/433, Cidade Universitária, Rio de Janeiro, RJ, CEP 21941-485, País: Brasil, E-mail: gamarayana@gmail.com RESUMO Existe em grande número estudos a respeito da apropriação do espaço público por meio de grafites e pichações, sendo constantemente analisado no ponto de vista do artista da intervenção e sua motivação. Entretanto, alguns autores das áreas de ciências sociais aplicadas e ciências humanas têm se debruçado no conceito de “apropriação estética” como valorização e atração de um lugar através do uso da publicidade da vida marginalizada. Assim, acredita-se que análises dos grafites sob a ótica desse pensamento possa trazer resultados interessantes para a compreensão da relação com o mercado imobiliário e a sua associação de valor. Este trabalho tem como objetivo compreender a relação entre o grafite e o mercado imobiliário, através da valorização, ou não, de um edifício, via ou bairro. Respondendo a seguinte questão: o grafite pode ser usado no mercado imobiliário como agregador de valor e transformador local? O objeto de estudo utilizado para a análise parte de intervenções em áreas, antes degradadas, e agora revitalizadas. Sendo aplicada nos murais de: Boulevard Olímpico do Rio de Janeiro - RJ, Wynwood Walls de Miami – FL, Beco do Batman em São Paulo – SP, Salvador – BA e Castelo Kelburn na Escócia. A partir do revisão bibliográfica dos conceitos levantados; da análise dos estudos de caso, com a avaliação da valorização ou não imobiliária ; relacionando-os com a procura desses espaços, para compra e venda ou de turismo ; e como resultado, concluiu-se a relevância do grafite na revitalização desses espaços e o seu potencial como ferramenta de valorização no mercado imobiliário. Palavras-chave: grafite, murais, mercado imobiliário, empatia espacial, apropriação estética. 18ª Conferência Internacional da LARES São Paulo -‐ Brasil 26 a 28 de Setembro de 2018 The role of graffiti in the real estate market, as a value aggregator and local transformer ABSTRACT There are in large numbers studies on the appropriation of the public space through graffiti and tags, being constantly analyzed in the artist's point of view of the intervention and its motivation. However, some authors in the areas of applied social sciences and human sciences have focused on the concept of "aesthetic appropriation" as a valuation and attraction of a place through the use of the advertising of marginalized life. Thus, it is believed that graffiti analysis from the perspective of this concept can bring interesting results for the understanding of the relationship of the real estate market and its value association. This work aims to understand the relationship between graffiti and the real estate market, through the valuation or not of a building, road or neighborhood. Answering the following question: can graffiti be used in the real estate market as value aggregator and local transformer? The study object used for the analysis starts from interventions in areas, previously degraded, and now revitalized. Being applied in the murals of: Rio de Janeiro’s Olympic Boulevard - RJ, Wynwood Walls of Miami - FL, Alley of Batman in São Paulo - SP, Salvador - BA and Kelburn Castle in Scotland. From the bibliographic review of the concepts raised; the analysis of the case studies, with the evaluation of the valuation of the real estate; relating them to the demand of these spaces, for purchase and sale or tourism; and as a result, it was concluded the relevance of graffiti in the revitalization of these spaces and its potential as a valuation tool in the real estate market. Key-words: graffiti, murals, real estate market, space empathy, aesthetic appropriation. Página 1 de 18 1. INTRODUÇÃO Compreendido por uns como forma de expressão de opiniões e sentimentos, e por outros como crime e violação de propriedades, o grafite merece um estudo com um novo olhar. Acredita-se que análises dos grafites sob o conceito de “apropriação estética”, como valorização de um lugar e incentivo ao turismo, através do uso da publicidade da vida marginalizada. Assim, acredita-se que análises dos grafites sob a ótica desse conceito possa trazer resultados interessantes para a compreensão da relação do mercado imobiliário e com sua associação de valor. Procurando compreender algumas questões sobre o potencial do grafite, como valorização de um lugar para uso do mercado imobiliário e o turismo artístico, estabelecendo conexões com os conceitos de apropriação estética, identidade do lugar, e do uso da publicidade da vidamarginalizada. Pois, como bem observado por CRUZ E COSTA (2008), o grafite é um dos “elementos que fazer parte da rotina visual dos habitantes das grandes cidades, onde muros, paredes e outros espaços públicos e privados são testemunhos do registro de diferentes formas de expressão e inscrições urbanas.” A pesquisa foi elaborada, a princípio, através de introdução e explicação sobre o grafite urbano como forma de expressão, através do estudo de CRUZ E COSTA (2008), GITAHY (1999), LASSALA (2017) e RAMOS (1994), entre outros, um histórico e sua relevância na contemporaneidade. O objeto de estudo utilizado para a análise parte de intervenções em áreas, antes degradadas, e agora revitalizadas. Sendo aplicada nos murais de: Boulevard Olímpico do Rio de Janeiro - RJ, Wynwood Walls de Miami – FL, Beco do Batman em São Paulo – SP, Salvador – BA e Castelo Kelburn na Escócia. 1.1. Objetivos Compreender o potencial do grafite no mercado imobiliário, como ferramenta de valorização de um edifício, via ou bairro e como atrativo turístico. Respondendo a seguinte questão: o grafite pode ser usado no mercado imobiliário como agregador de valor e transformador local? 2. METODOLOGIA A pesquisa foi elaborada através de um aprofundamento bibliográfico, nos seguintes temas: o grafite urbano como forma de expressão, e a sua ligação com o turismo artístico e o mercado imobilário. Ressaltando relações com a apropriação estética e a identidade do lugar. Após isso, foram pesquisadas intervenções de grafite, em áreas antes degradadas, e agora revitalizadas, que se encaixassem com o tema de valorização de um lugar através da arte urbana. Foi realizado uma pesquisa a respeito dos seus efeitos, valorização fundiária, atrativo turístico, procura por novos negócios e imóveis, apresentando assim, soluções que tiveram êxito. 3. GRAFFITI, GRAFITE, ARTE URBANA A pintura rupestre é considerada como a origem e forma mais primitiva do grafite. Decorrente da necessidade pré-histórica de contar histórias e se comunicar, se utilizava de diversos materiais naturais, de técnica própria e foi responsável pela arte se desenvolver entre os homens. Evoluiu- se para as representações nos túmulos dos faraós egípcios, os murais da Pompéia, invadiu igrejas - nas catacumbas de Roma, e palácios na idade média até surgir o muralismo contemporâneo - uma vertente muito forte no México - passando a ocorrer no Brasil no início da década de 1970. “Na cidade de São Paulo, os grafiteiros desenvolveram suas próprias técnicas dando um toque de Página 2 de 18 ‘brasilidade’ e colocando em destaque o traço brasileiro. Dentre os grafiteiros brasileiros, os mais famosos como: Alex Vallauri, os Gêmeos, Eduardo Kobra e Ramon Martins.” (ARAUJO, 2017) “(…) o grafite veio para democratizar a arte, na medida que acontece de forma arbitrária e descomprometida com qualquer limitação espacial ou ideológica.”(GITAHY, 1999, p.13) A democratização da arte, que a torna acessível para todos, e nesse caso, especialmente aos público transeunte, é de extrema importância para a cidade contemporânea. Complementa afirmando que “o graffiti tem como suporte para sua realização não somente o muro, mas a cidade como um todo. Postes, calçadas, viadutos etc. são preenchidos por enigmáticas imagens (…)” (GITAHY, 1999, p.16) E ainda, “vale lembrar que toda manifestação artística representa a situação histórica em que essa ocorre, (…) porque é realizada pelo sujeito histórico dentro de um contexto histórico-social e econômico.” (GITAHY, 1999, p.17) Como complementa RAMOS (1994, p.45) “As imagens tatuadas no corpo da cidade, e consideradas, na maioria das vezes, como marginais à cultura, vão pouco a pouco nutrindo a cultura que as rejeita.” Inúmeras manifestações visuais em muros e fachadas subvertem a arquitetura das cidades ao mesmo tempo que ajudam a compor o contexto urbano atual. São imprevisíveis ocupações visuais que se espalham pelos mais diversos cantos da cidade e que podem facilmente ser captadas por qualquer transeunte. A dificuldade em classificar essas manifestações - se arte, escrita intervenção ou protesto - e a própria variedade de estilos gráficos fazem do assunto um campo fértil para desentendimentos. (LASSALA, 2017, p.33) Ao definir grafite, LASSALA (2017) o explica como forma de intervenção urbana, formado por elementos figurativos de uma maior complexidade na criação de imagens, com grande utilização de cores, formas e apelo estético. Ainda, destaca a elaboração com o uso de perspectiva, noções de movimento e profundidade, e que a obra pode ser composta por, além da pintura em sim, adesivos, estêncial e outras criatividades, podendo se ater aos mais deferentes suportes, como, por exemplo, calçadas e edificações abandonadas. Complementando, afirma que essas intervenções “tem por ideologia desmistificar os símbolos de dominação cultural na tentativa de contribuir, (…) com temáticas voltadas a questões sociais e políticas, bem como intervir para um aproveitamento diferenciado do espaço urbano.” (2017, p.38) Além disso, GITAHY (1999, p. 17-18) separa o grafite em dois tipos de características, sendo elas: Estéticas: expressão plática figurativa e abstrata; utilização de traço e/ou da massa para definição de formas; natureza gráfica e pictórica; utilização, basicamente, de imagens do inconsciente coletivo, produzindo releituras de imagens já editadas e/ou criações do próprio artista; repetição de um mesmo original por meio de uma matriz (máscara), característica herdada da pop art; repetição de um mesmo estilo feito à mão livre. Ou conceituais: subversivo, espontâneo, gratuito, efêmero; discute e denuncia valores sociais, políticos e econômicos com muito amor e ironia; apropria-se do espaço urbano a fim de discutir, recriar e imprimir a interferência humana na arquitetura da metrópole; democratiza e desburocratiza a arte, aproximando-a do homem, sem distinção de raça ou de credo; produz em espaço aberto sua galeria urbana, pois os espaços fechados dos museus e afins são quase sempre inacessíveis. Em adição, na Revista SB n.10 (Revista Original da Cultura Hip-Hop) apud CRUZ E COSTA (2008), também foi elencado ideais para o grafite, sendo eles: que defendam os ideais da Cultura Hip-Hop; que pintem pela arte, não só pela auto- promoção; que levem brilho a locais desolados e iluminem os becos; que coloquem suas Página 3 de 18 obras em grandes galerias e não esqueçam de pintar nas ruas; que façam quadros, esculturas, instalações, saiam em revistas, televisões e continuem humildes; que não atropelem a arte; e que utilizem a estética do Graffiti e, no futuro, após a evolução, não esqueçam de que cultura o seu conhecimento veio. De acordo com a autora CARTAXO (2009), a partir dos anos 60, houve uma “revolução das artes”, no quais artistas, insatisfeitos em terem suas obras expostas somente a museus, e a mercantilização gerada por isso, promovem manisfestações e indagações em busca de novos lugares e formas de exporem as suas artes. Assim, começam a surgir exposições em locais alternativos, como nas ruas, nos cruzamentos de trânsito, em prédios abandonados. Essa adoção por espaços do cotidiano destacaram a importância para o artista de aproximar a sua obra à sociedade. A arte passa a ter um papel relevante e público tendo em vista a relação direta que passa a ter com os cidadãos, mais especificamente, com os traseuntes desse espaço. E ainda, SALGUEIRO (2000, p.357) afirma que “as obras não deveriam apenas ocupar outros espaços, mas lançar-se na vastidão do mundo, ressignificando o ambiente da vida cotidiana.” Em entrevista com Faya E. C. à Plataforma Urbana apud GAETE (2016), o artista destaca que para ele “a arte no espaço público é um oásis, um escape da monotonia cotidiana da cidade”. Ainda, que esta “gera uma mudança na rotina das pessoas” e “ as faz questionar se isto é importante: questionar cada dia para poder avançar”.Sua intenção é distrair o transeunte, por um segundo sequer, e enchê-lo de indagações e pensamentos. E ainda, o que contribui para a arte permanecer no espaço público é a transmissão de uma sensação boa. Como complementa IMBROISI (2016) apud ARAUJO (2017), o grafite, como forma de intervenção do espaço, está sendo valorizado e reconhecido no mundo contemporâneo, recebendo o nome de Arte Urbana. E ainda, que “De uma maneira ou de outra, ela faz com que as pessoas parem sua rotina por alguns minutos, seja para questionar, criticar ou simplesmente contemplar a arte. Sua finalidade é provocar o público para questões políticas, sociais, ideológicas e estéticas”. BEGUOCI (2005) elenca 4 pontos fundamentais das invervenções urbanas, sendo eles: 1 - estão na rua e são feitas para todo mundo ver; 2 - expressam um ponto de vista ou o sentimento de uma pessoa ou grupo; 3 - protestam contra algum tema específico; e 4 - utilizam-se de uma boa quantidade de bom humor, provocação ou irreverência. Nelson Brissac, em entrevista com BEGUOCI (2005), afirma que a “intenção é provocar as pessoas para que elas percebam que a cidade não é apenas um lugar para ser explorado, é um lugar para ser vivido”. Pois, “(…) cabe a arte a função de realizar ideias e proposições.” (SALGUEIRO, 2000, p.358) É importante ressaltar que o “O graffiti muitas vezes revitaliza locais abandonados, tornando-os mais agradáveis e percebe-se uma maior aceitação da população em geral (…) O graffiti já vem sendo incorporado a roteiros turísticos.” (RODRIGUES, 2013) Segundo NOGUEIRA (2009), ao diferenciar pichação de grafite, afirma “Muitos teóricos costumam separar essas práticas da seguinte forma: grafite é algo mais elaborado, com o uso de diversas cores num mesmo desenho; pichação seria uma marca, assinatura, rabiscos feitos aleatoriamente, sem uma preocupação estética.” Neste artigo, serão considerados como grafites, os murais elaborados por artistas, reconhecidos ou não, independente da sua complexidade, que interviram nesses lugares, alterando a cenografia e ressignificando a identidade do lugar. Assim, “as imagens tatuadas no corpo da cidade, e consideradas, na maioria das vezes, como marginais à cultura, vão pouco a pouco nutrindo a cultura que as rejeita.” (RAMOS, 1994, p.45) Para MENDRADO (2018) “A arte de rua tem transformado cidades de todo o mundo e tem sido uma aliada na recaracterização de espaços urbanos.” Essas intervenções “trazem cultura para as ruas e podem ajudar a valorizar ruas e bairros, tendo potencial também para trazer oportunidades Página 4 de 18 no setor imobiliário.” E ainda “(…) bairros marcados por descaso e abandono passaram por grandes transformações após serem ocupados por galerias de rua. As obras (…) se tornaram verdadeiros museus a céu aberto e atraem turistas, moradores, e novos empreendimentos.” De acordo com RODRIGUES (2013), “O graffiti seria um atrativo que mostra a identidade do local, pois o traço dessa arte muda de artista para artista e de local para local. É uma manifestação artística e expressão de identidade de um grupo social.” Concluindo, RODRIGUES (2013) “Todos esses casos citados mostram como o graffiti tem sido difundido como arte das ruas e manifestação que revitaliza. […] A existência de galerias e museus a céu aberto torna a investigação do graffiti como atrativo turístico instigante.” Ainda, que o grafite é uma ferramenta de revitalização urbana e é uma arte pública acessível, e que tem “se apresentado assim com potencial para ser um atrativo turístico.” Afinal, “O grafite rompeu a arte convencional e alterou a paisagem de grandes cidades do mundo, com sua inserção nos espaços públicos e instituições culturais.” (ARAUJO, 2017) “A incorporação da estética do grafite de rua na publicidade tem crescido cada vez mais e a sua inserção nas artes plásticas tem se consolidado, resultado esse da superação de um preconceito sobre as pinturas até então marginalizadas.” (BRITO, 2014) E que “nos últimos anos, várias empresas perceberam a ascensão e aceitação gradativa do grafite pela sociedade e resolveram chamar os artistas para criarem anúncios ou estamparem seus produtos.” (ARAUJO, 2017) Transformando o grafite em agregador de valor e transformador local. 4. O GRAFITE COMO AGREGADOR DE VALOR E TRANSFORMADOR LOCAL “A ideia simples de desenhar em uma parede tornou-se algo extraordinário em um mundo cada vez mais emparedado e murado. Os muros são o suporte, a morada de todos esses grafismos, ícones e memórias de uma metrópole.” (ARAUJO, 2017) A revitalização de espaços públicos através da arte de rua é abordagem que está sendo realizada em várias cidades, no Brasil e no mundo. O uso grafite para colorir a vida cinza da metrópole pode trazer não somente benefícios sociais - ao permitir novas abordagens de apropriação espacial, como também uma valorização do lugar - que o torna mais atrativo e com identidade singular. Essa publicidade da vida marginalizada proprõe um modo de aproximação entre a arte e o público, na qual à retira das galerias, e se instala no cotidiano da cidade, fazendo com que ela se transforme em um agente benéfico e presente na vida das pessoas. Com sua extrema liberdade de expressão e de registro, pronuncia-se de forma democrática e descomprometida com qualquer limitação espacial ou ideológica. Evidencia-se com marcas, logotipos, rabiscos, ícones e símbolos, que separados ou reunidos, compõem determinadas significações que se dispersam e se agrupam, formando grandes painéis que registram nomes, sobrenomes, palavras de ordem, de amor e humor, mensagens, letras, imagens, poemas e provérbios, entre outros, configurando-se em segmentos sociais que podem vir a ser lidos por todos. Num tumulto de registros simbólicos e icônicos, vão pegando carona nos diferentes espaços urbanos, percorrendo a cidade e fazendo história. (CRUZ e COSTA, 2008) Apesar desse potencial de proporcionar um bem-estar à população, através da alteração da ambiência do espaço, o grafite também permite uma apropriação estética pela comunidade criativa, que anseia por lugares únicos de identidade própria. Além de valorizar o “espírito do lugar”, ele pode agregar valor ao espaço em si, se tornando uma ferramenta útil do mercado imobiliário. A fim de suplementar essa argumentação da relação do grafite com o espaço, que o Página 5 de 18 ressignifica, requalifica e o transforma em lugar de identidade própria, ao propor uma experiência e apropriação estética com esse lugar - que se relaciona com o momento, o motivo e o local da intervenção. E com o objetivo de exemplificar o potencial dessa mudança do espaço público através de intervenções de grafite realizadas no Brasil e no mundo. Para assim, compreender como essa cenografia gerada pelo grafite, altera o mercado imobiliário, intercede na relação com o espaço, de como interfere no cenário urbano, e as suas mudanças na percepção da paisagem. E complementando, CRUZ E COSTA (2008) afirmam que “ essa maneira de arte (…) precisa ser entendida em toda a sua dimensão, pois se configura em espaços de diálogo da cidade e com a cidade, (…) as cidades são mais que suporte.” 4.1. Boulevard Olímpico no Rio de Janeiro - RJ O Porto Maravilha é considerado o maior projeto de revitalização urbana do país, com uma área de 5 milhões de metros quadrados. Foi realizado através de investimento privado e de parceria público-privada. É um projeto grandioso que transformou uma área subdesenvolvida e desvalorizada em um centro de lazer, cultura e negócios na cidade, e convida os cariocas a turistarem na própria cidade. O Boulevard Olímpico tem 3,5 km de extensão de passeio público, sendo onde se localiza os murais de grafite realizados durante a intervenção. Na esteira por onde passa a valorização do mercado imobiliário do Rio de Janeiro, alguns fatores foram fundamentais para que o setor chegasse no elevado patamar onde se encontra. Dentreeles, podemos citar os grandes investimentos em infraestrutura no Rio e Grande Rio, uma nova política de segurança pública e a perspectiva dos grandes eventos que a cidade sediará. […] Através desses agentes, diferentes zonas da cidade foram impactadas, alcançando excelente destaque para o mercado de imóveis [grifo nosso]. Bairros tradicionais que antes viviam em estado de esquecimento, violência contínua e degradação, foram revitalizados, não só no quesito da urbanização em si, mas também no sentimento de quem é morador e na visão da sociedade. Além disso, localidades que já vinham em forte crescimento, ganharam mais fôlego e agora caminham a passos enormes na direção de maior valorização. […] Desde 2009 com o início das obras, o Centro passa por uma nova fase onde as pessoas acreditam mais na região como oportunidade de negócios [grifo nosso] Com isso, as salas comerciais chegaram a 55% de valorização em 2011 [grifo nosso], uma das maiores dos últimos anos. Os empresários voltaram a olhar com boas perspectivas a área central do município. Especialmente na Zona Portuária [grifo nosso] a revitalização no local inclui obras de habitação, infraestrutura e cultura como o Museu de Arte do Rio, inaugurado em março deste ano, e o Museu do Amanhã, com previsão de término das obras para 2015. (CRECI-RJ, 2013) É na zona portuária onde se encontra o mural do grafiteiro Eduardo Kobra, titulado “Todos somos um”, realizado pelo brasileiro em 2016, foi reconhecido como o maior grafite do mundo pelo “Guiness world records”. A obra possui 15 metros de altura por 170 metros de comprimento, na altura do armazém 3, e retrata cinco rostos indígenas de cinco continentes diferentes: os huli, da Nova Guiné - Oceania; os mursi, da Etiópia - África; os kayin, da Tailândia - Ásia; os supi, da Europa; e os tapajós, das Américas. Esse mural foi encomendado para as olimpíadas na cidade do Rio de Janeiro, e o objetivo do trabalho era remeter ao espírito olímpico de cooperação. Sendo assim, o autor da obra, inspirado na ideia de representar os cinco aros olímpicos que representam os cinco continentes, representou cinco povos originários de cada um dos continentes. “O mural, portanto, reflete diferentes povos, bem demarcados, num mural cujo nome reflete união, visando, assim, simbolizar a união e a paz entre esses diferentes grupos ali representados.” (FALCÃO, 2017) Em relação ao projeto Porto Maravilha, Página 6 de 18 Este novo “ícone arquitetônico” passou a ser o símbolo da renovação urbana da Zona Portuária, com vistas a abrigar os grandes eventos internacionais – Copa do Mundo (2014) e Jogos Olímpicos (2016) – que a cidade sediou. Antiga porta de entrada da cidade, praticamente abandonada pelo poder público na segunda metade do século XX, a Zona Portuária passou por um processo de gentrificação e especulação imobiliária associado ao projeto Porto Maravilha, que incluiu a demolição do elevado da Avenida Perimetral, a recuperação e abertura ao público da orla marítima entre as Praças XV e Mauá, o projeto e a construção do Museu de Arte do Rio de Janeiro (MAR), do Museu do Amanhã, do Aquário Marinho e de edifícios de habitação e de escritórios e serviços, entre os quais, o megaprojeto das Torres Trump – com três torres de 50 andares. (SBARRA, 2017) O Boulevard Olímpico se localiza em dois bairros, além do centro: Saúde e Gambôa. Saúde é o bairro mais próximo ao centro, com maior número de edifícios, empresas e infraestrutura. Gambôa é onde se localiza a intervenção de grafite, marjoritariamente com galpões e edifícios mais antigos de médio gabarito. O gráfico abaixo mostra o valor unitário padrão da Avenida Rodrigues Alves, sendo a via paralela ao Boulevard Olímpico, na qual é responsável pelo cálculo do valor do logradouro dos lotes adjacentes. R E S U M O P O R C AT E G O R I A Categoria Saúde - Trecho 001 Gambôa - Trecho 002 2000 R$5.284,66 R$3.170,79 2006 R$8.439,90 R$5.063,94 2009 R$9.621,77 R$5.773,06 2010 R$10.023,95 R$6.014,37 2011 R$10.604,33 R$6.362,60 2012 R$11.299,97 R$6.779,98 2013 R$11.953,10 R$7.171,86 2014 R$12.652,35 R$7.591,41 2015 R$13.469,69 R$8.081,81 2016 R$14.912,29 R$8.947,37 2017 R$15.893,51 R$9.536,10 2018 R$13.588,08 R$16.305,69 VA L O R U N I T Á R I O PA D R Ã O D O L O G R A D O U R O R$0,00 R$3.600,00 R$7.200,00 R$10.800,00 R$14.400,00 R$18.000,00 20 00 20 06 20 09 20 10 20 11 20 12 20 13 20 14 20 15 20 16 20 17 20 18 Saúde - Trecho 001 Gambôa - Trecho 002 Figura 1 : Valor Unitário Padrão da Av. Rodrigues Alves Fonte: Elaborado pela Autora [Adaptação de RIO DE JANEIRO (2018)] Através do gráfico é possível analisar a crescente valorização imobiliária dos dois trechos referidos, sendo um pouco mais intensa no Bairro Saúde. Apesar das obras só terem iniciado em 2009 - com a demolição do elevado da Avenida Perimetral - e ter sido concluída em 2015 - com a finalização da construção do Museu do Amanhã, e com a instalação do Mural Etnias em 2016, Página 7 de 18 não é possível perceber nenhuma influência drástica no mercado imobiliário. Sendo possível interpretar como uma tendência natural da região em sua valorização. O desafio, então, é tentar compreender o que ocorreu entre o ano passado e esse ano: no qual o Bairro Saúde, deixa de ser o mais valorizado, e teve uma queda de 15%; e o Bairro Gambôa tem uma valorização surpreendente de 70%. O trecho referido de Gambôa se extende da Parada dos Navios, do VLT, ao aquário AquaRio. É importante ressaltar a presença do Armazém da Utopia nesse trecho, um galpão que em 2010 foi convertido em Centro Cultural, no qual ocorrem peças de teatro e cursos profissionalizantes, com murais de grafite de releituras das obras de Jean-Jacques Debret sobre a escravidão em sua fachada - iniciativa que se assemelha muito à de Wynwood, que será detalhada mais a frente. E ainda, a forte presença de grafites em toda a sua extensão, sendo integrantes da rota turística artística, que se inicia nos museus e conclui no AquaRio. Figura 2: Boulevard Olímpico Fonte: Dronestagr http://www.dronestagr.am/boulevard-olimpico-rio-de-janeiro-brazil/ Página 8 de 18 Figura 3: Boulevard Olímpico Fonte: International Route <http://www.internationalroute.com.br/2016/07/rio-2016-boulevard-olimpico-e- bonde.html> 4.2. The Wynwood Walls em Miami - Fl FURST (2017) em palestra em Curitiba, conta um pouco sobre a história de Wynwood e como conseguiu desenvolver esse bairro, transformando-o de “dark and desolate to alive and vibrant”, com o objetivo de atrair a comunidade criativa e assim valorizar o mercado imobiliário local. Wynwood é um bairro de Miami-Fl, repleto de instalações industriais, que estavam subutilizados pois as indústrias tinham sido transferidas para locais de menor custo e com maiores incentivos fiscais, com poucos carros e quase sem pedestres nas ruas. A partir de 2000, algumas galerias de arte começaram a se instalar nesse bairro, devido principalmente ao baixo custo do terreno e aos grandes espaços. Apesar de os galpões não possuírem nenhum tipo de apelo arquitetônico formal, o bairro era muito bem projetado, com vias largas e calçadas, favorecendo a ideia de trazer pessoas para percorrê-lo. A empresa na qual FURST trabalha, Goldman Properties, era proprietária de parte desses galpões, e então entrou em contato com o restante dos proprietários do bairro e propôs uma revitalização através da utilização do grafite, transformando essas extensas paredes em telas. Em 2001 foram pintados os primeiros murais. Os artistas responsáveis por essas intervenções eram tanto locais quanto de nível mundial, convidados [com todos os custos pagos] à compartilhar a sua arte. Um bairro privado, porém abandonado, foi convertido em um dos maiores museus a céu aberto. Tony Goldman percebeu que o grafite era algo para ser celebrado e usado para criar aquele sentido de local e de identidade.Assim, Wynwood se transformou em uma área de 2,5 acres de parque público, com restaurantes, bares, cafés, escritórios, coworking, lojas etc. com atrações durante o dia e a noite. Segue abaixo a tabela com informações de valores médios para compra e venda de terreno em Wynwood, em dólares por pé quadrado: Página 9 de 18 Valor médio de venda de terreno - US$ / ft2 ANO UNIDADES 2012 50 2013 100 2014 150 2015 200 2016 300 Valor médio de venda de terreno - US$ / ft2 Dó la re s po r p é qu ad ra do US$0 US$50 US$100 US$150 US$200 US$250 US$300 2012 2013 2014 2015 2016 US$300 US$200 US$150 US$100 US$50 (40 transações) (44 transações) (62 transações) (75 transações) (38 transações) Figura 4: Valores Médios para Compra e Venda de Terreno em Wynwood (U$ / sf) Fonte: Elaborado pela autora [Adaptação de FURST, J. (2017)] Ele comenta que o valor das edificações hoje, por exemplo restaurantes, chegam a valer US$1000 por pé quadrado, o que antes da intervenção era em média apenas US$70. E atribui esse sucesso aos seguintes fatores: “common vision, cohesive planning, demand generators and unique user experiences”. Através da cobrança de impostos adicionais para o deselvolvimento do próprio bairro, como a limpeza, a segurança, o marketing e outras políticas; de uma abordagem contextual e temática, na qual as pessoas entendam onde estão e porquê; e um espaço onde os indivíduos criativos são representados. Para isso, ele afirma ser essencial o bom planejamento, o trabalho da comunidade, ser inclusivo [evitando se tornar algo caro e elitista], e assim se tornar em um bairro comercial individual. FURST afirma que pode ser utilizado sim o grafite e a arte de rua como forma de desenvolvimento e valorização imobiliária. Complementando, para MUSCA (2017) Grafite, arte de rua, arte urbana, destruição de propriedade, chame do que quiser. Ele rejeita a consciência social e protesta a injustiça. Incorpora o empoderamento das vozes marginalizadas da sociedade. Não há como negar seu impacto, especialmente seu poder transformador. Algum tempo atrás o Wynwood Art District de Miami era um bairro destruído com uma das maiores taxas de criminalidade do país. Algumas dúzias de murais mais tarde e a área se transformou na vizinhança mais elegante imaginável, com as mais modernas galerias, restaurantes e bares. Ancorando a aura artística do bairro estão os famosos “Wynwood Walls,” um museu de arte de rua ao ar livre, sancionado de forma privada, fundado em 2009. As paredes apresentam o trabalho original de mais de 50 artistas de rua famosos de 16 países, todos exclusivamente convidados a decorar mais de 7.400 metros quadrados de telas de concreto. A valorização e a transformação que o grafite proporcionou nesse bairro é surpreendente. Através de uma iniciativa privada, com parceria público-privada, um bairro árido sem muitos atrativos, após intervenções de grafite em grandes murais, alterou completamente a percepção estética do espaço. O público, principalmente a comunidade criativa, quer se apropriar desse espaço e ter essa experiência estética única. “Originalmente destinado a desencorajar a destruição de propriedades privadas, esses centros de arte de rua são os novos Cavalos de Tróia das revitalizações.” (MUSCA, 2017) E ainda, se tornou ponto turístico de referência na cidade, Página 10 de 18 atraindo pessoas de outros estados e países. “O graffiti como manifestação artística pode ser um atrativo turístico como as demais manifestações existentes.” (RODRIGUES, 2013) Sendo integrante importante a rota artística do país. Assim, com o uso grafite, ocorre a democratização da arte, que a torna acessível para todos, especialmente aos público transeunte, e é de extrema importância para a cidade contemporânea. Assim, como afirma SALGUEIRO (2000), a arte para de ocupar espaços (fechados, de exposição) e passa a criar lugares, estabelecendo relações com múltiplos significados aos que dele se apropriam. E, para FLUSSER (1976), a motivação do artista é de inovar, e proporcionar diferentes experiências e assim prosperar a nossa existência, pois “ a beleza é a novidade, a originalidade de uma proposição estética, é o aumento do parâmetro real.” Figura 5: The Wynwood Walls Fonte: Wynwood Business Improvement District <https://www.wynwoodmiami.com/explore/street-art-grid- view/> Página 11 de 18 Figura 6: The Wynwood Walls Fonte: Wynwood Business Improvement District <https://www.wynwoodmiami.com/explore/street-art-grid- view/> Figura 7: The Wynwood Walls (antes e depois) Fonte: Miami New Times <https://www.miaminewtimes.com/news/in-photos-ten-miami-neighborhoods-that- have-changed-the-most-in-the-past-decade-8480285> Com intervenções assim, os artistas destacam e valorizam a rua - a sua cultura e suas ideias - que antes passavam despercebidas pelos pedestres. E o grafite se torna algo ainda mais único e efêmero, por estar intimamente ligada com ao momento em que foi instalado. Como complementa OSTROWER (2001, p.101) “em toda forma, em tudo o que se configura, encontramos conteúdos significativos e valores. Por mais fugidio que seja o instante, no fundo é Página 12 de 18 suficiente ele ter sido percebido. Já o interpretamos, pois não existe a percepção, em si, isenta de projeções valorativas.” 4.3. “Beco do Batman” em São Paulo - SP Outro exemplo de sucesso, principalmente no turismo artístico, é a Galeria de Arte a Céu Aberto, na Vila Madalena, conhecida como “O Beco do Batman”. Sendo referência mundial de grafite, o projeto começou nos anos 1980, com Rui Amaral e John Howard, que começaram a intervir nos muros abandonados. Foi nessa época que surgiu o desenho icônico que deu nome popular à rua: “o Beco do Batman”. (ARAUJO, 2017) Figura 8: Beco do Batman Fonte: VIA Estação de Conhecimento <http://via.ufsc.br/wp-content/uploads/2018/04/IMG_5702.jpg> O sucesso maior foi principalmente na Copa de 2014, onde turistas de todo o mundo iam conhecer a galeria e aproveitavam para assistir os jogos e se hospedar nesse ambiente artístico - o que chegou até a causar irritação e aborrecimento aos moradores, por deturpar o sossego da vizinhança. Entretanto, em reportagem, GUEDES (2018) afirma o crescimento e o reconhecimento do bairro perdura até hoje, e que, de 2014 para 2018, o número de apartamentos novos cresceu em 300%, os hostels praticamente dobraram de tamanho e a procura continua, principalmente por turistas estrangeiros - todos à procura dessa apropriação estética única. 4.4. Salvador - BA Em Salvador, as galerias a céu aberto já passam a inspirar circuitos turísticos, com roteiros que levam os participantes a locais como o Comércio, a Ladeira da Preguiça, no bairro 2 de Julho, Solar do Unhão, e Rio Vermelho. Alguns grafiteiros da cidade, como o artista visual Eder Muniz, realizam esses passeios ocasionalmente. […] As obras de arte de rua trabalham a autoestima dos moradores locais, e muitas vezes trazem temas ligados à história dos bairros e da população. (MENDRADO, 2018) Página 13 de 18 Em Salvador, foi realizado o projeto Movimento Urbano de Arte Livre (MURAL) que trouxe, em 2016, 9 artistas para intervirem na região do Comércio, com o intuito de criar um corredor artístico - estimulando esse nicho do turismo, e de revitalizar espaços pouco valorizados dessa parte da cidade. Essa exposição ao ar livre de arte vertical, foi organizada pelo Trevo Produções, contemplado pelo edital “Arte em toda parte”, ano III, da Prefeitura de Salvador com a Fundação Gregório de Matos. Os painéis são bem coloridos e dialogam com a cultura baiana, através do grafite, pintura, estêncial e desenho. (TREVO, 2017) “A maneira pela qual o indivíduo aborda e avalia certos problemas traduz, sem dúvida, algo de exclusivo de sua personalidade. Reflete anseios e convicções de caráter particulara partir de suas vivências também particulares.” (OSTROWER, 2001, p.101) O Bairro Rio Vermelho, é outro exemplo que deu certo em Salvador. O grafite se aponderou dos muros do bairro tradicionalmente boêmio, sendo considerado um dos mais descolados da cidade, atraindo novos negócios. MENDRADO (2018) afirma que “Os trabalhos, além de deixar as áreas mais bonitas, têm trazido uma valorização das regiões, que passam a atrair eventos e empreendimentos.” O que se assemelha muito ao “Beco do Batman” de São Paulo. E ainda que “A área tem atraído, além de novos negócios, moradores, sobretudo jovens à procura do primeiro apartamento.” Figura 9: Mural Eder Muniz Fonte: Galeria de arte a céu aberto em Salvador, ArchDaily Brasil <https://www.archdaily.com.br/br/798820/galeria-de-arte-a-ceu-aberto-em-salvador> 4.5. Castelo Kelburn, Escócia A ideia surgiu com os filhos do atual herdeiro - Conde Glasgow - do castelo, que ao programarem a restauração das paredes externas da construção - que previa a remoção de todo o reboco, por não pertencer ao projeto original - proporam aproveitar a oportunidade e fazer algo diferente. Encantados e já familiarizados com com o grafite brasileiro, a proposta foi de pegar algo alegre e efêmero, como a nossa arte de rua, e colocar fora do seu contexto tradicional - nas paredes de um castelo rural histórico na Escócia. Essa atitude irreverente atraiu bastante popularidade para o grafite e também sobre a preservação de edifícios históricos no Reino Página 14 de 18 Unido. (KELBURN, 2018) O Castelo de Kelburn se assemelha a centenas de outros antigos castelos da Escócia, com suas torres pitorescas e seus grandes e majestosos salões. A diferença, no entanto, fica por conta de sua fachada, que exibe um brilhante e psicodélico mural de grafite. A obra reacendeu o debate sobre a forma como os europeus preservam seus prédios antigos. O conde de Glasgow, cuja família ocupou o castelo nos últimos 800 anos, convidou em 2007 quatro grafiteiros brasileiros para criar, em caráter temporário, uma obra de arte em parte da construção […] para decorar a construção do século 13. (MCDOWALL, 2011) “The graffiti project” foi realizado por quatro artistas brasileiros, sendo eles: Nina Pandolfo, Francisco Rodrigues (conhecido como o “Nunca”), e Gustavo e Otávio (conhecidos como “Os Gêmeos”). Eles passaram cerca de um mês hospedados no castelo com os idealizadores do projetos, enquanto concebiam o conceito e elaboravam a intervenção. A obra que era para permanecer por apenas 3 anos, mas até hoje ainda hoje está instalada, devido a publicidade e popularidade que ganhou, e o sucesso que faz com os visitantes. Figura 10: Castelo Kelburn Fonte: Aero Pixel Scotland < https://www.youtube.com/watch?v=B2dpxx6cPcE> 5. CONCLUSÃO O artista, ao grafitar um lugar, altera a ambiência desse lugar, e o personifica – o dá identidade. Ao utilizar a arte urbana como ferramenta de revitalização, seja de edifícios, ruas ou bairros, é possível que também ocorra a valorização desse lugar. Esse uso de cor e tinta, por mais simples que possa parecer, possui um efeito psicológico muito grande, criando lugares com características únicas, que podem atrair novos negócios e o turismo. Além disso, também ocorre a democratização da arte, que a torna acessível para todos, especialmente aos público transeunte, e é de extrema importância para a cidade contemporânea. Assim, como afirma Salgueiro (2000), a arte para de ocupar espaços (fechados, de exposição) e passa a criar lugares, estabelecendo relações com múltiplos significados aos que dele se apropriam. Página 15 de 18 6. REFERÊNCIAS ARAUJO, Adriana G. de. O olhar do grafite como arte, mídia e inserção social: Análise Semiótica. Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste – Volta Redonda - RJ – 22 a 24 Jun. 2017. BEGUOCI, Leandro Pereira. Entre o museu e o outdoor. Revista Superinteressante. 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Aula não-publicada, escrita originariamente em francês [“L’art: le beau et joli”], para ser usada num curso intitulado “Les phénomènes de la communication” (Théâtre du Centre, Aix-en-Provence, 1975- 1976). Tradução e Notas: Rachel Cecília de Oliveira Costa. Revisão Técnica e Notas: Romero Freitas. FURST, J. “Como a parceria público-privada em Wynwood conseguiu surgir e desenvolver com o objetivo de atrair a comunidade criativa” [How did the public-private partnership in Wynwood originate and develop in order to atract the creative community]. In: Palestra sobre Revitalização Urbana. Em 19 Set. 2017. Curitiba. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ySTOqWRitds> Acesso em: 20 Jul. 2018. GAETE, Constanza Martínez. "Arte e Cidade: "Existe um poder muito lindo por trás de cada mural ou grafite"" [Arte y Ciudad. Entrevista al muralista Faya: “Hay un poder muy lindo detrás de cada mural o graiti”] 02 Out. 2016. ArchDaily Brasil. (Trad. Sbeghen Ghisleni, Camila). 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