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CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG Aula 4 PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Na seqüencia do programa representa a quinta aula Conteúdo 8. Mecanismos de intermediação de interesses e articulação entre o estado e a sociedade. 10. Presidencialismo e dinâmica de relacionamento entre os poderes no Brasil. 11. O papel do Poder Legislativo na produção de políticas públicas. 12. Representação política, dinâmica parlamentar, governança e governabilidade no Brasil. 8. Mecanismos de intermediação de interesses e articulação entre o estado e a sociedade. Quando se fala em intermediação de interesses, em geral, o que se tem em mente é a maneira como sociedade e Estado se relacionam. Numa primeira dimensão, quais são as formas de relações estabelecidas entre essas duas esferas no Brasil. Nesse sentido, podemos dizer que existem quatro padrões básicos de relacionamento entre Estado e sociedade definidos na nossa gramática política: clientelismo, corporativismo, insulamento burocrático e, mais recentemente, universalismo de procedimentos. 1. Clientelismo O clientelismo aparece na histórica política brasileira como um importante instrumento de legitimação política. Um conjunto de relações sociais estruturadas para ordenar a vida social e política com regras que perpassam sociedade e Estado, contribuindo para que não haja uma distinção muito clara entre os dois mundos, ou entre a esfera pública e privada. O sistema social clientelista decorre de traços herdados do absolutismo português, daí o patrimonialismo ser um dos seus traços mais fundamentais. www.pontodosconcursos.com.br 1 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES De modo que, quando o assunto é clientelismo, é forçoso tratar do modelo Estado patrimonialista, uma vez que o sistema cartorial e distribuição prebentária de funções públicas são típicos do clientelismo. Pode-se dizer que um Estado patrimonialista dá a estrutura para o clientelismo vigorar, e este, por sua vez, legitima o outro. Nesse tipo de situação é típico o fato de a classe improdutiva apropriar- se dos cargos públicos. Mas não é só isso, na realidade, a o clientelismo estrutura todo um conjunto de relações sociais hierarquizadas, em que essa classe assume lugares no topo da hierarquia, ficando sua clientela abaixo. Uma ordem social piramidal, em que há patrões e clientes de diversos níveis. No caso brasileiro, os patrões eram principalmente os grandes proprietários, os quais assumiam as funções do Estado nas localidades sob seu domínio. Assim, a prestação ou o acesso a serviços públicos torna-se condicionada a uma troca por fidelidade, trabalho, etc. Desse tipo de ordem que derivam os coronéis, detentores da autoridade pública local, que dominaram (e em alguns casos ainda dominam em certa medida) a política brasileira durante décadas a fio. Do outro lado da relação, ficam os clientes. A idéia de „clientes‟ remete a um conjunto de indivíduos que dependem dos meios monopolizados pelo patrão. Precisa dos bens e serviços que um patrão pode oferecer, porque este controla o pouco Estado que chega à localidade. Se não tiver um patrão, o indivíduo pode ficar completamente marginalizado do processo. O relacionamento entre clientes e patrões é definido por meio de relações de trocas generalizadas e imbuídas de forte personalismo, num ciclo de promessas e dívidas futuras, as quais podem ser pagas, por exemplo, por meio de apoio eleitoral. Como o número de patrões e de clientelas não é definido (e mesmo entre uma cliente e um grande patrão pode haver vários patrões menores, intermediários, com suas próprias clientelas), o clientelismo é marcado por certa desordem, inexistindo um número fixo ou organizado de unidades constitutivas. As unidades constitutivas do clientelismo são grupamentos, pirâmides ou redes baseados em relações pessoais que repousam em troca www.pontodosconcursos.com.br 2 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES generalizada. Pode haver até disputas entre essas redes, de maneira que, as unidades clientelistas tendem a disputar o fluxo de recursos em um território. É importante frisar que a participação nessas redes clientelistas não está codificada em nenhum regulamento formal. O clientelismo baseia-se numa rede informal de arranjos hierárquicos, os quais são fundamentados em consentimento individual e não tem respaldo jurídico e, em tese, não utiliza a força ou violência para contar com a participação dos indivíduos neste ou naquele grupo. Por fim, uma característica essencial do clientelismo é a fragilidade do Estado. O clientelismo representa o domínio do privado sobre o público, a fragilidade institucional que permite a um patrão tomar instituições públicas como sendo de sua posse pessoal, com qual ele pode arregimentar clientes para conseguir mais poder, mais clientes, mais poder... 2. Corporativismo O corporativismo também funciona como um instrumento de legitimação política. Esse tipo de sistema de relacionamento entre Estado e sociedade foi a base do modelo nacional-desenvolvimentista, o qual permitiu a industrialização brasileira e a implementação da política de substituições de importações. No Brasil, os processos que sustentaram ou que embasaram o desenvolvimento do Estado corporativista foram: o fortalecimento do poder central, para implementar o projeto nacional-desenvolvimentista; a criação de um aparelho de Estado burocrático; a expansão da atuação pública; a criação de um sistema de interventorias estaduais; e a formação de uma burocracia profissional. Esse novo modelo de Estado rompe – ou tenta romper – de forma significativa com valores oligárquicos e clientelistas. A principal característica disso vai ser a forte centralização político-administrativa, combinada, obviamente, com expressivo enfraquecimento do poder local. As características fundamentais do corporativismo (em especial o brasileiro) são: www.pontodosconcursos.com.br 3 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES o Unidades constitutivas organizadas em um número limitado de categorias singulares, criadas, definidas e controladas pelo Estado; o Unidades singulares são compulsórias, não-competitivas e ordenadas hierarquicamente e funcionalmente diferenciadas. Ou seja, o que define o pertencimento do indivíduo a este ou àquele grupo é a sua profissão ou atividade econômica, seu relacionamento com o Estado se dará por meio desse grupo (mormente um sindicato) e somente com esse grupo; o As unidades que constituem esse sistema de representação de interesses só existem porque são reconhecidas e até criadas pelo Estado, não se pode falar em espontaneidade de interesses como forma de criação de associações; o A existência dessas unidades “representativas” é garantida pelo monopólio da representação de sua categoria em troca da obediência de certas regras (definidas pelo Estado) para seleção e articulação de demandas e apoios. Tipos de corporativismo: O primeiro tipo, historicamente falando, é o corporativismo estatal. Este é o tipo mais clássico, que vigorou no Brasil, na Itália, na Espanha das décadas de 1930 e 1940. Consiste em verdadeiro monopólio de representação de grupos produtivos. Só representação via sindicato funcional. A estrutura de representação é marcada por forte hierarquização de associações, as quais são ligadas ao Estado, o qual autoriza ou reconhece sua existência. Analisando a história do séculoXX, é facilmente perceptível a relação do corporativismo estatal com autoritarismo. Foi um instrumento que, por um lado, representou a crescente influência do estado nas sociedades que o experimentaram e, por outro lado, contribuiu para legitimar o sistema político vigente. Sua principal característica é a organização da coletividade com base na associação representativa dos interesses e das atividades profissionais baseadas na associação representativa dos interesses e atividades www.pontodosconcursos.com.br 4 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES profissionais. A idéia é que o corte profissional é o aspecto mais relevante dos indivíduos e, portanto, o que deve orientar a relação desses com o Estado. A visão de sociedade na qual o corporativismo estatal se baseia na idéia da existência – ou necessidade de existir – uma solidariedade orgânica entre interesses e fórmulas de colaboração. Para tanto, aposta na remoção (em alguns casos pela força) ou neutralização dos elementos de conflito. Nesse contexto, o Estado corporativismo, plano social, tende a buscar o controle da luta de classe, harmonizando, principalmente, capital e trabalho. No plano econômico o corporativos tende a ser implementado em Estados capitalistas, mas o Estado tende a restringir a concorrência de mercado, para evitar graves desequilíbrios. Além disso, não se trata de um sistema liberal, sendo comum monopólios e normatização de preços,etc. No plano político-partidário, o conflito entre partidos tende a ser inibido. Configurando uma espécie de democracia orgânica. Em alguns casos, os partidos chegam a ser completamente desarticulados. Concebe-se o indivíduo como parte de uma categoria e não isolado, e essa categoria é parte orgânica na sociedade, não um grupo descolado do restante do todo. Por fim, o corporativismo estatal tente a absorver o conflito através da incorporação e organização do trabalho. Ou seja, pela inserção regulamentada no processo estatal. Dessa maneira, o estado corporativista tenta incorporar massa no jogo político de forma controlada e, ao mesmo tempo, disciplinar a burguesia. O segundo tipo de corporativismo é o mais atual e dinâmico. Trata-se do neocorporativismo ou corporativismo societal. Nesse tipo de organizações intermediárias são livres para aceitar ou não suas relações com o Estado. Elas mantêm significativa liberdade em relação ao Estado, não dependem dele para surgir e podem reivindicar ou não o seu reconhecimento para atuar junto à sociedade, apesar de necessitar o reconhecimento (mesmo que parcial) para compor participação no desenvolvimento de políticas públicas. Contudo, permanece a intermediação dos interesses da sociedade junto ao Estado por meio de grupos. Uma das dimensões mais importantes continua sendo a integração da classe trabalhadora ao estado capitalista, com vista a permitir o incremento do www.pontodosconcursos.com.br 5 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES crescimento econômico, por meio da harmonia entre as classes. O Estado contribui para a ocorrência de um capitalismo monopolista, mas, ao mesmo tempo, assume grande responsabilidade no desenvolvimento de ampla estrutura e serviços de bem-estar social. É o caso da Suécia no pós-guerra. As características fundamentais o neocorporativismo são: a formação de associações de maneira autônoma, sendo que elas tendem a interpenetrar o Estado. Além disso, o resultado da dinâmica dos interesses tem interface com Estado, mas é respaldado pelas políticas governamentais. 3. Insulamento burocrático Esse seria um tipo antidemocrático de intermediação de interesse, no qual, o Estado, para fugir das influências retrogradas do patrimonialismo, estrutura uma maneira de as elites modernizantes tecnocráticas e empresariais promovem o desenvolvimento. Um dos momentos em que o Brasil viveu isso com maior força foi durante o governo JK. Nessa ocasião, era comum várias políticas serem guiadas por um núcleo técnico do estado capaz de formular e acompanhar a implementação das políticas, principalmente as políticas econômicas e sociais. O objetivo seria desenvolver políticas públicas capazes de contribuir para a industrialização pesada e de alta tecnologia no país. Foi nesse contexto que se estruturaram os grupos executivos, os quais, supostamente, representariam um alto grau de racionalidade, por serem técnicos desvinculados de tudo. Uma das questões fundamentais que esse sistema desperta é um problemas de dualidade dentro do Estado, que passa a possuir uma burocracia estatal e os grupos técnicos: A. No corpo de funcionários normais da administração pública verifica-se excesso de quadros ou má alocação de pessoal, baixa qualificação e falta de treinamento. Ao mesmo tempo em que é comum altas taxas de absenteísmo e a baixa de produtividade. B. Nos altos escalões insulados há racionalidade nas distribuições dos cargos e alta qualificação. www.pontodosconcursos.com.br 6 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES No que tange especificamente à representação de interesses, o insulamento burocrático representa a proteção do núcleo técnico do Estado contra a interferência do público e de organizações intermediárias (mesmo que representem ou pretendam representar grupos sociais relevantes). Assim, há uma significativa redução da arena onde aberturas para existem aberturas para interesses e demandas populares. Todavia, é importante observar que existem graus diferentes de insulamento e nem todo insulamento é permanente. A tendência normal é que apenas algumas políticas – as mais importantes para o governo – sejam conduzidas por um núcleo estratégico insulado. Por mais que os objetivos alegados do insulamento burocrático seja caracterizado por objetivos voltados para o aumento da eficiência e da racionalidade, existem problemas graves nesse modelos de organização estatal. Primeiramente, esses grupos isolados não são puramente técnico ou apolítico, existem grupos em competição e relações com organizações fora da arena distributiva e relações com congresso para aprovação de medidas favoráveis às suas decisões. O segundo problema, e mais grave para a democracia, é a formação dos anéis burocráticos (conceito formulado por FHC, quando era sociólogo – e de esquerda!). A idéia básica desse conceito é que, as burocracias insuladas não são isoladas, mas seletivas nos interesses que acolhe. Os interesses populares não têm vez, mas é formado um padrão de relação entre capital privado (burguesia internacional e nacional) e o Estado capitalismo. O interesse popular é desprezado, mas os das elites não. A elite burocrática e a elite econômica forma círculos de informação e pressão que permitem a articulação entre setores do Estado e de grupos da burguesia para garantir acesso privilegiado a certas decisões públicas. Assim, as relações entre grupos de industriais ligados a burocratas suprimem a intermediação parlamentar e as relações do Estado com o restante da sociedade civil. 4. Universalismo de procedimentos www.pontodosconcursos.com.br 7 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Não é um tipo de intermediação já definido e estruturado, mas uma afirmação lenta e gradual de um regime racional-legal e eventualmente democrático (já que está relacionado ao universalismo eleitoral). Segundo esse modelo, as relações estabelecidas entre Estado e sociedade devem contribuir para o desenvolvimento de uma noção de cidadania plena e de igualdade perante alei. Os benefícios não são considerados benesses dos líderes estatais – como no clientelismo – são obrigações do Estado e direitos dos cidadãos. O universalismo de procedimento está atrelado à ascensão da classe media, ao surgimento de uma tecnoburocracia de profissionais do Estado, com carreiras, vencimentos e atribuições bem definidas. Além disso, é um tipo de intermediação essencialmente associado à democracia representativa e à economia de mercado. Isso porque seus procedimentos são essencialmente voltados para o cumprimento dos pressupostos da democracia formal. 10. Presidencialismo e dinâmica de relacionamento entre os poderes no Brasil. Presidencialismo O presidencialismo é um sistema de governo, isto é, que diz respeito ao funcionamento do Estado e o relacionamento entre os poderes que o compõem, principalmente Executivo e Legislativo (não confundir com forma de governo, que diz respeito a maneira como se dá o relacionamento entre governantes e governados e pode ser monarquia ou república, por exemplo), O presidencialismo foi inventado nos EUA, em 1787, com influência dos trabalhos dos federalistas. Nesse sistema de governo: 1. Há um presidente que é chefe de governo e chefe de Estado; 2. O presidente é escolhido em eleição popular direta; 3. O mandato do presidente e o dos parlamentares são fixos e não podem ser interrompidos (exceto em caso de impeachment do presidente ou cassação de parlamentares); www.pontodosconcursos.com.br 8 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES 4. A equipe de governo é designada pelo presidente e responsável perante ele, não perante o Legislativo. O presidencialismo usualmente adota o sistema de separação de poderes (doutrina de Montesquieu estudada na aula 1). E é comum que as eleições, bem como as ações e funções de cada um dos poderes sejam autônomas, sendo vinculantes apenas nos casos previstos na constituição. Dessa maneira, podemos dizer que não há co-responsabilidade entre Executivo e Legislativo pela implementação de políticas públicas. Autores americanos costumam dizer que essa separação rígida das funções (legislativa e executiva), principalmente em sistemas partidários, pode gerar o “governo dividido”. Situação em que o Poder Legislativo é dominado por um partido e o Poder Executivo por outro. Os americanos dizem que isso é bom porque um poder controla o outro, mas reconhecem o risco que este estado de coisas pode representar para a governabilidade do sistema como um todo. Uma das questões fundamentais do presidencialismo – e que serve inclusive para perceber as variações de um sistema presidencialista para outro – é a quantidade de poder que possui o presidente. Os poderes presidências podem classificados em: 1. Pró-ativos: permitem ao presidente legislar (ou influenciar os legisladores) e estabelecer um novo status quo. É o caso das Medidas Provisórias, do pedido de urgência, etc. 2. Reativos: poderes concedidos ao presidente de ir contra mudanças operadas no status quo pelos parlamentares. Um exemplo é o poder de veto, o qual varia de acordo com a facilidade que o parlamento tem de derrubar a decisão do presidente. Outra questão fundamental é o relacionamento do sistema presidencialista com o sistema partidário. Existem duas teses fundamentias sobre esse relacionamento com base na discussão sobre fragmentação e disciplina partidária: 1. Primeiramente, argumenta-se que, em sistemas partidários fragmentados, o presidente tende a ser de uma minoria, tendo dificuldades para governar e pendendo para relações clientelistas (veremos abaixo que o presidente brasileiro conta com um www.pontodosconcursos.com.br 9 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES conjunto de recursos de poder e institucionais que lhe permite construir maioria e fazer com que essa tese seja demais simplista para explicar a realidade brasileira); 2. Quando há autonomia parlamentar (= baixa disciplina), o governo tem que fazer negociações individuais (no congresso e nas localidades) para passar suas políticas. Quando há disciplina, os líderes tornam-se os interlocutores preferidos, mas pode surgir problemas caso o presidente não tenha a maioria no Congresso. No caso brasileiro, os líderes são pecas fundamentais do jogo político e conseguem controlar os membros de suas bancadas com razoável sucesso. Em função dessas teses, e dos problemas que tenderiam a causas, várias novas constituições (notadamente a brasileira e de outros países latino- americanos) têm fortalecido o presidente para que não ocorra instabilidade ou paralisia decisória. Dinâmica de relacionamento entre os poderes no Brasil O relacionamento entre os poderes no Brasil é objeto de vasta produção bibliográfica no Brasil e no exterior. A respeito dessa temática e focalizado especificamente o caso brasileiro, a literatura especializada em ciência política aponta para algumas características ou traços importantes que serão apresentados nos parágrafos seguintes. Primeiramente, há uma leitura unânime nas interpretações institucionais sobre a crise de 64 de que o conflito Executivo/Legislativo esteve na sua raiz. Ou seja, os constantes impasses entre o parlamento e o governo Quadros/Jango seriam os responsáveis, ou um dos principais responsáveis para que a ordem institucional fosse quebrada, abrindo caminho para um dos traumas históricos mais fortes da história sócio-política brasileira. Assim, a Constituição de 1988 (CF) apresenta um documento no qual os constituintes tentaram construir uma realidade que evitasse a repetição de 1964. Assim, com o novo arcabouço institucional, criado em 1988, o Executivo sobrepõe-se sobre o Legislativo (teoria da preponderância executiva). De www.pontodosconcursos.com.br 10 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES maneira que, as instituições democráticas, acabaram fortalecendo tanto o presidente que, chegam a permite que haja uma continuidade legal entre o período autoritário e o atual no que diz respeito às regras que regulam as relações entre os poderes Executivo e Legislativo. Uma democracia, mas com um domínio do Executivo sobre o Legislativo semelhante ao tipo de relação que existia durante o período da ditadura. A prova desse domínio fica claro quando avaliamos as atividades do Legislativo. Uma análise da participação relativa de cada um dos poderes na iniciativa de matérias aprovadas revela que a promulgação da nova Constituição não alterou significativamente o padrão da produção legal. Manteve-se a forte preponderância do Executivo observada ao longo do regime militar. Isso ocorre porque o Executivo possui suficientes meios e instrumentos para controlar as comissões e, em considerável medida, o plenário. Nesse contexto, dois aspectos do processo de tomada de decisão no Congresso brasileiro são fundamentais para o entendimento de como o Executivo controla o Legislativo: A. O poder de legislar garantido ao presidente pela Constituição; e B. A centralização do poder decisório nas mãos dos líderes dos partidos no Congresso. Os poderes presidenciais, no tocante a sua capacidade de influenciar e dirigir os trabalhos legislativos, não foram limitados de maneira acentuada pela nova Constituição. Atualmente, eles são superiores àqueles de que dispunham os presidentes do período 1946-1964 e similares aos dos presidentes do período militar. Além disso, o funcionamento do Congresso brasileiro mostra que se o partido do presidente (ou acoalizão governista) dispuser de uma maioria na Câmara, o Executivo pode contar com os líderes do partido para requerer urgência para as propostas que mais lhe interessar ver aprovadas. A combinação de Medidas Provisórias, vetos e pedidos de urgência fornece ao Executivo um poderoso conjunto de instrumentos para controlar a agenda do www.pontodosconcursos.com.br 11 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Congresso, bloqueando legislação que não lhe interesse e promovendo aquelas consideradas prioritárias. No que diz respeito ao segundo aspecto, a centralização do processo de tomada de decisão dentro do Congresso também serve ao propósito de fortalecer o presidente – ainda que não tenha sido desenhada para isso de forma proposital. As regras internas da Câmara, principalmente, garantem aos líderes dos partidos, na Mesa Diretora e no Colégio dos Líderes, um papel central na condução do processo legislativo e na definição do sistema de comissões. Contribui para reforçar essa situação, as comissões do Congresso brasileiro têm uma base institucional muito fraca, isso fica claro se compararmos nosso sistema de comissões com o sistema americano, neste há especialização e valorização do trabalho feito pelas sub-organizações, naquele as comissões são literalmente esvaziadas. Todavia, mesmo com as comissões enfraquecidas, o Executivo deu-se ao trabalho de fazer com que as comissões tivessem, em geral, membros medianos leais aos seus interesses, pois, eventualmente, as comissões podem desempenhar algum papel relevante para o Executivo. Quando observamos o caso específico da Câmara dos Deputados, percebemos que ela está organizada de forma centralizada. As medidas que vêm a ser sancionadas dependem, em grande medida, da atuação do Colégio de Líderes que, através dos poderes institucionais que detém, estrutura a pauta dos trabalhos e agiliza o processo legislativo, em especial as propostas originárias do Executivo e do Judiciário. O Colégio de Líderes opera por intermédio da aprovação do requerimento de urgência e de urgência urgentíssima para a tramitação das matérias que quer ver votadas. Como, com freqüência, esse expediente é usado para aprovar matérias de caráter administrativo, a Câmara lança mão de recursos extremos, reservados para situações extraordinárias, para dar conta de seu trabalho corriqueiro. Conclusão Diante do quadro traçado assim, podemos chegar a diversas conclusões. www.pontodosconcursos.com.br 12 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Primeiramente, é possível afirmar com segurança que a preponderância do Executivo resulta no esvaziamento das Comissões e do próprio plenário. Um e outro perdem suas razões de ser, na medida em que a deliberação do Colégio de Líderes antecede a deliberação nesses espaços de poder. Em resumo, a Câmara dos Deputados apresenta uma organização ineficiente. Mais que isso, a forma como os trabalhos se encontram organizados cria um círculo vicioso: não participamos porque não adianta; com menor participação, mais esvaziados ficam os órgãos do Congresso. Como os líderes são o ponto fundamental das decisões importantes e da distribuição dos recursos, o parlamentar focaliza no líder aumentando ainda mais o poder de barganha deste em relação aos demais. Assim, a participação dos parlamentares ocorre somente quando se encerram todas as possibilidades de um acordo no Colégio dos líderes e a matéria é submetida a voto. Ainda que ineficiente do ponto de vista organizacional (principalmente no que diz respeito à construção de informações e ao ganho de escala dos trabalhos legislativos), a forma centralizada como os trabalhos estão organizados favorece o Executivo. Ao dispor de uma instância centralizada para negociar, o Colégio de Líderes, o Executivo vê minimizadas as incertezas e dificuldades próprias a uma negociação descentralizada. Outra questão importante diz respeito à postura dos parlamentares em relação ao funcionamento do Legislativo e seu relacionamento com o Executivo. Os parlamentares não desconhecem problemas assinalados acima, apenas aceitam que a ordem das coisas seja assim. Tanto que é que as evidências mostram que o Legislativo tem um comportamento cooperativo para com as iniciativas presidenciais, dando a elas um tratamento privilegiado. Dessa forma, diferentemente do que é mostrado na mídia de tempos em tempos, o Congresso Nacional está longe de se constituir em obstáculo à ação governativa do Executivo. (Contudo, a cooperação do Legislativo para com os projetos presidenciais de fato apresentados não garante a cooperação para toda e qualquer iniciativa presidencial. O tratamento especial é dado principalmente www.pontodosconcursos.com.br 13 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES para aqueles projetos para os quais o Executivo pede urgência e articula bases de apoio para promovê-los). Um terceiro ponto que vale a pena lembrar é uma carta importante guardada na manga presidencial. O presidente conta a vantagem estratégica de poder, a qualquer instante, apelar diretamente à opinião pública, por exemplo, parando o horário nobre da TV e apresentando seu ponto de vista durante uma crise política grave. Por fim, as evidências analisadas acima mostram que a fragmentação partidária e o fato de o presidente não contar com apoio de uma maioria sólida não impedem que as iniciativas do Executivo sejam aprovadas. Dado o marco legal existente, as vantagens estratégicas com que conta o Executivo lhe permitem neutralizar as dificuldades decorrentes da estrutura partidária existente. Note-se, ainda, que as perspectivas para alteração desse quadro são pequenas e que o tipo de relacionamento verificado na esfera federal tende a se repetir no relacionamento entre os executivos e legislativos estaduais. 11. O papel do Poder Legislativo na produção de políticas públicas. Dinâmica congressual e funcionamento do legislativo brasileiro Proposições legislativas Toda matéria que está sujeita à deliberação nas casas legislativas e/ou no Congresso Nacional como um todo é definida como proposição legislativa. Em função das diferenças existentes entre as proposições os tipos de matérias legislativas presentes no processo legislativo brasileiro estão descritos abaixo. A nomenclatura das proposições varia entre a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Abaixo serão indicados os possíveis nomes para cada tipo de proposição, quando for o caso. www.pontodosconcursos.com.br 14 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Proposta de Emenda à Constituição (PEC): propõe alterações na Constituição Federal, excetuadas as mudanças relacionadas às clausulas pétreas sobre a forma federativa do Estado, voto direto, secreto, universal e periódico, à separação dos poderes e aos direitos e garantias individuais. A Constituição não poderá ser alterada na vigência de intervenção federal, do estado de defesa ou estado de sitio. Na Câmara dos Deputados, a iniciativa de PEC deve ser apresentada por um terço da casa ou pelo presidente da República quando começará sua tramitação, sempre, pela Câmara dos Deputados e, após aprovada, será encaminhada ao Senado1. A iniciativa de PEC cabe também à mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação. Projeto de Lei Ordinária (PL ou PLS): regula as matérias de competência do legislativo com a sanção do Presidente da República. Na Câmara, o PL podeser de iniciativa de uma/um deputada/o; de mais deputadas/os; de uma Comissão ou da Mesa; do Senado Federal ou da Presidência da república2; dos Tribunais Superiores, do STF, do Procurador Geral da República ou por iniciativa popular subscrita por, no mínimo, um centésimo do eleitorado nacional. Projeto de Lei Complementar (PLC ou PLP) e PLS- Complementar: destinado à regulamentar dispositivos da Constituição Federal que exigem lei complementar. Será apreciada na Câmara em dois turnos tramitando com prioridade. Projeto de Lei de Conversão (PLV): refere-se à Medida Provisória alterada por emenda ou por substitutivo do relator ao seu texto original. Projeto de Decreto Legislativo (PDL, PDC ou PDS): matéria de competência exclusiva do Congresso Nacional sem a sanção do Presidente da República. Projeto de Resolução (PRC, PRS e PRD): matéria de competência privativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, de caráter político, processual, legislativo ou administrativo, entre outros. Requerimento (REQ): instrumento usado pelos parlamentares para encaminharem suas solicitações. Poderão ser por escrito ou oral, em função da complexidade do assunto. Subdividem-se em alguns tipos listados a seguir, 1 Regime de tramitação diferenciado e quórum diferente tb. 2 Os ministérios setoriais enviam anteprojeto de lei de sua autoria à Presidência da República. www.pontodosconcursos.com.br 15 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES dentre outros: inclusão na ordem do dia; comparecimento de Ministro de Estado; retificação da ata; esclarecimento de ato da administração; reconstituição de proposição; homenagem; licença para tratamento de saúde; pesar; levantamento de sessão.3 Os requerimentos podem ser ainda de dois tipos: Requerimento de informação (RIC) usado quando faz-se necessária a prestação de informação de autoridade pública ao Congresso Nacional e Requerimento de Instauração de CPI (RCP) usado para propor a abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito. Indicação: proposição usada para sugerir manifestação de uma ou mais comissões sobre determinado assunto visando a elaboração de projeto de iniciativa da Câmara ou sugerir a outro órgão a adoção de providencias, realização do ato administrativo ou gestão, entre outros. Parecer: proposição através da qual uma comissão se pronuncia sobre qualquer matéria. É apresentado por relatores às matérias em tramitação, e após ser aprovado, constitui o parecer da Comissão. Emenda: proposição apresentada como acessório a outra. Poderá ser supressiva; aglutinativa; substitutiva; modificativa ou aditiva e de redação. Sugestão (SUG): proposta apresentada por associações, sindicatos e órgãos da sociedade civil à Comissão de Legislação Participativa. Se aprovadas, essas sugestões tramitam como projeto de iniciativa da CLP. Proposta de Fiscalização e Controle (PFC): Proposição que tem por objetivo fiscalizar os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta. Em nossa pesquisa analisamos a atuação legislativa das deputadas com base em alguns tipos de proposições apresentadas. Para os fins da pesquisa, consideramos os seguintes tipos de proposições: Projeto de Lei (PL); Projeto de Lei Complementar (PLP); Proposta de Emenda à Constituição (PEC); Projeto de Decreto Legislativo (PDC); Requerimento (REQ); Requerimento de Informação (RIC), Proposta de Fiscalização e Controle (PFC) e Requerimento de Instituição de CPI (RCP). 3 A Sessão poderá ser suspensa por determinado período devido a ocorrência de morte ou acontecimento de força maior. www.pontodosconcursos.com.br 16 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Tramitação de matérias A tramitação de matérias pode variar em função da natureza legislativa da proposição, entretanto é possível descrever em linhas gerais, como mostra o organograma XX as principais fases de tramitação de uma matéria dentro da Câmara dos Deputados. Todos os projetos para iniciarem seu rito legislativo são encaminhados à Mesa Diretora, após sua apresentação em Plenário onde é dada a ciência de sua entrada na Casa. A Mesa Diretora4 é responsável pela distribuição das proposições para as comissões legislativas de acordo com seu tema predominante.5 Nas comissões os projetos são distribuídos para seus relatores, são discutidos, recebem emendas e os pareceres do relator e da comissão são elaborados com a apresentação de argumentos favoráveis ou não à aprovação da matéria. Algumas comissões possuem poder conclusivo (CD)6. Nesses casos, as matérias passam por apreciação apenas no interior das comissões, dispensando a deliberação final do Plenário, exceto quando forem projetos de Código, de Lei complementar, de Iniciativa popular, projeto vindo do Senado federal (original ou com emendado), projetos com pareceres divergentes, projetos em regime de urgência e os de autoria de Comissão. Após a apreciação do mérito do conteúdo das matérias pelas comissões competentes, todas elas seguem para a apreciação de sua constitucionalidade, legalidade, juridicidade, regimentalidade e técnica legislativa na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (RI-CD, art.139, II, c). 4 Além de ser responsável pela direção dos trabalhos legislativos e dos serviços administrativos da Casa. A Mesa Diretora é composta de Presidência - Presidente e dois Vice-Presidentes - e de Secretaria, composta por quatro Secretários e quatro Suplentes. Os membros efetivos da Mesa não podem fazer parte de Liderança nem de Comissão Permanente, Especial ou de Inquérito (RI-CD, art. 14). Nunca houve uma parlamentar do sexo feminino entre os membros da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. 5 Proposições que versem sobre mesmo assunto podem ser apensadas ao projeto de lei mais antigo ou de origem do senado para tramitação conjunta (RI-CD, arts. 139, I, 142 e 143) 6 No Senado, o poder conclusivo é chamado de poder terminativo. Enquanto na Câmara a expressão poder terminativo está ligada aos casos em que os pareceres de competência exclusiva pertencem às comissões de Constituição e Justiça e Redação; Finanças e Tributação; e comissões especiais criadas para tratar de matérias que pertençam a mais de três comissões (RI-CD, arts. 34 e 54). www.pontodosconcursos.com.br 17 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES APRESENTAÇÃO DO PROJETO ORGANOGRAMA DE TRAMITAÇÃO DE P ROJETO DE LEI (PL) NA CÂMARA DOS D EPUTADOS MESA DIRETORA Projeto numerado e COMISSÃO LEGISLATIVA Recebimen to de emendas; designaçã o de PROJETO REJEITADO PROJETO APROVADO PROJETO SEGUE PARA ARQUIVAMENTO Comissão com poder conclusivo DISCUSSÃO NA CCJR Elaboração e votação da DISCUSSÃO EM PLENÁRIO Elaboração e votação da redação final SEGUE PARA SENADO FEDERAL DISCUSSÃO NA CCJR Elaboração e votação da www.pontodosconcursos.com.br 18 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Comissões legislativas As comissões legislativas são os órgãos em que as matérias são discutidas e deliberadas pelos parlamentares. As comissões variam quanto ao seu caráter e quanto aos temas sobre os quais versam. As comissões podem ter caráter técnicolegislativo ou especializado que são permanentes e podem ser comissões temporárias. Comissões temporárias As comissões temporárias são criadas para a apreciação de determinado assunto e são extintas ao final da legislatura ou, antes disso, quando forem atingidos os fins para os quais a comissão foi criada ou quando se extingue o prazo previsto para sua duração. O ato ou requerimento de constituição de uma comissão temporária prevê ainda quantos serão seus membros e quais parlamentares irão compor a comissão, designados pelo Presidente por indicação dos Líderes. As comissões temporárias se subdividem em: 1. especiais; 2. de Inquérito; 3. Externas. Comissões especiais (CESP): são criadas para dar parecer sobre Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e Projeto de Código7. Poderá ser criada também para apreciar matérias de competência de mais de três comissões permanentes na análise de seu mérito, sendo criada através de iniciativa do presidente da Câmara ou por requerimento de líder ou do Presidente da comissão interessada. A composição desta comissão terá que complementar pelo menos metade dos membros titulares das comissões permanentes que versam sobre o tema da matéria. A comissão especial julgará a admissibilidade e o mérito da proposição. Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI): a CPI é instituída através de requerimento de um terço de seus membros (171 deputadas/os) visando a apuração de um fato específico, determinado e por prazo certo, sobre a qual 7 Discussões sobre código de trânsito, etc. www.pontodosconcursos.com.br 19 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES terá poderes de investigação próprios de autoridades judiciais. Não é permitida a existência de mais de cinco CPIs, exceto mediante Projeto de Resolução. Comissões externas: são instituídas pelo presidente da câmara, de oficio ou a requerimento de qualquer deputada/o para cumprir missão temporária autorizada, sujeitas à deliberação do plenário quando significarem ônus para a casa legislativa. Comissões permanentes O número de membros efetivos das comissões é estabelecido através de ato da Mesa Diretora, ouvido o Colégio de Líderes, no inicio dos trabalhos da primeira e terceira sessão legislativa de cada legislatura. Esse número poderá ser alterado visando permitir a observância, quando possível, da proporcionalidade partidária, inclusive da representação das bancadas. É vetada a participação de uma/um deputada/o participar como membro titular de mais de uma comissão permanente, ressalvadas as comissões da Amazônia e do Desenvolvimento Regional, de Direitos Humanos, de Legislação Participativa e de Segurança Pública e combate ao crime organizado. A estrutura de organização dos trabalhos da mesa é: 1 presidente e três vice- presidentes, eleitos por seus pares, com o mandato de um ano, sendo vedada a reeleição. As atribuições dos presidentes das comissões são, entre outras: assinar os documentos expedidos pela Comissão; convocar e presidir as reuniões; resolver as questões de ordem e reclamações surgidas na reunião; ler a ata da reunião anterior e submetê-la a discussão e votação, assim como determinar sua publicação no Diário Oficial da CD; estabelecer a pauta das reuniões e dar conhecimento dela aos parlamentares da Comissão e Lideranças; designar relatores e distribuir-lhes as matérias sujeitas a parecer; conceder vistas das proposições aos membros da Comissão; requerer a distribuição da matéria a outras comissões; poderá assumir a função de relator ou relator substituto e ter voto nas deliberações da Comissão. www.pontodosconcursos.com.br 20 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Os trabalhos das comissões podem seguir dinâmicas diferenciadas. As comissões podem formar duas Turmas, ambas sem poder decisório, que geram relatórios separados que são, posteriormente, encaminhados para a deliberação do Plenário da comissão. As comissões permanentes também podem constituir subcomissões, limitadas em seu número e natureza. As atribuições das comissões permanentes são, entre outras: 1. Discussão e votação: 1. de proposições sujeitas à deliberação do Plenário que lhes forem distribuídas; 2. de proposições que não precisem ser deliberadas pelo Plenário – deliberação conclusiva das comissões. 2. Convocação de Ministros de Estado: para prestar, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado ou conceder-lhe audiência para expor-lhe assunto de relevância de seu Ministério; 3. Receber petições, reclamações, representações ou queixas de qualquer pessoa contra atos ou omissões das autoridades ou entidades públicas; 4. Acompanhamento de programas de obras, planos de desenvolvimento de qualquer nível e emitir parecer em relação ao Plano Plurianual (PPA), assim como exercer o acompanhamento contábil, financeiro e orçamentário da União e entidades da administração direta, indireta e mantidas pelo poder público; 5. Estudar qualquer assunto compreendido no respectivo campo temático ou área de atividade e promover conferências, exposições, palestras ou seminários; 6. Solicitar audiência ou colaboração de órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta ou fundacional e da sociedade civil, para elucidação de matérias sujeitas a seu pronunciamento. As comissões permanentes se dividem, segundo suas áreas temáticas, em: Comissão da Amazônia e de Desenvolvimento Regional – CADR; Comissão de Agricultura e Política Rural – CAPR; Comissão de Constituição e Justiça e Redação – CCJR; Comissão de Ciência e Tecnologia; Comunicação e informática – CCTCI; Comissão de defesa do consumidor, meio ambiente e minorias – CDCMAM; Comissão de Direitos Humanos – CDH; Comissão de Desenvolvimento Urbano e interior – CDUI; Comissão de Educação e Cultura – CEC; Comissão de Economia, Indústria e Comércio – CEIC; Comissão de www.pontodosconcursos.com.br 21 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Fiscalização Financeira e Controle – CFFC; Comissão de Finanças e Tributação – CFT; Comissão de Legislação Participativa – CLP; Comissão de Minas e Energia – CME; Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional; Comissão de Segurança Pública e combate ao crime organizado, violência e narcotráfico – CSPCCVN; Comissão de Seguridade Social e Família – CSSF; Comissão de trabalho, de administração e serviço público – CTASP; Comissão de Turismo e Desporto – CTD Comissão de Viação e Transportes – CVT Parlamentares, políticas públicas: uma leitura a partir do neo‐institucionalismo A literatura neo-institucionalista na Ciência Política apresenta considerável extensão quando o tema é o estudo do funcionamento dos legislativos. Aqui, a bibliografia pode ser abrigada em três vertentes principais: distributiva, partidária e informacional. 1. A Vertente Distributiva Esta vertente do neo-institucionalismo é construída sobre a idéia de que os legisladores estão constantemente preocupados com a reeleição8 e que suas ações são definidas considerando-se que, no momento da disputa eleitoral, sua atuação parlamentar prévia pode influenciar a decisão do eleitor. Assim sendo, o parlamentar estaria todo tempo preocupado com a opinião futura do constituinte, tentando antecipar as conseqüências eleitorais de suas decisões, ou seja, seu comportamento é guiado pela noção de “preferências potenciais” do eleitorado, as quais seriam captadas pela experiência e pelaintuição do congressista. Consoante à abordagem distributiva, as preocupações com a reeleição moldaria a ação parlamentar em toda a arena política (entendida em seu sentido amplo) o que induziria o congressista a capitalizar benefícios políticos 8 Questões de políticas públicas não estariam relacionadas diretamente ao resultado eleitoral. www.pontodosconcursos.com.br 22 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES de seus direitos de propriedade dentro do Legislativo. O congressista é incentivado a cultivar o voto pessoal com o seu eleitorado por meio da provisão de bens tangíveis e localizados que trariam alto retorno eleitoral, em contrapartida dos benefícios concentrados para determinados grupos, os custos destes benefícios são dispersos por toda a população. Uma vez que o sistema eleitoral estadunidense é distrital, a literatura institucionalista neste país confere grande importância aos benéficos conferidos a localizações geográficas específicas. Todavia, é necessário salientar que alguns autores, como Douglas Arnold, admitem que os benefícios os quais conferem maior retorno eleitoral sejam aqueles que tendem a possuir uma natureza de benefício concentrado e custo disperso, no entanto, não delimitam a definição dos grupos beneficiados por aspectos simplesmente geográficos, uma vez que grupos de interesses também podem ser beneficiados por ações parlamentares que ocasionam custos dispersos, são os chamados “grupos atentos”. Esses grupos atentos são aptos a influir mais contundentemente sobre o comportamento do parlamentar visto que dispõem de capacidade organizacional, financeira e, na maioria das vezes, técnica necessárias para a vocalização de demandas e promoção de injunções contra políticas que firam seus interesses. No que tange ao papel das comissões, a versão distributiva assume que sendo as comissões compostas por membros que partilham preferências e valores semelhantes, elas representam um microcosmo diferenciado em relação ao universo do plenário, assim, ela é obrigada a agir estrategicamente em relação a ele para fazer valer suas posições. Esse ponto aplica-se ao caso brasileiro, pois o plenário tem a capacidade de modificar as proposições das comissões, sendo o soberano das decisões do Senado, da Câmara e do Congresso nacional. Contudo, as comissões brasileiras têm bem menos poder que as estadunidenses, uma vez que sua capacidade de “fechar as portas”9 é extremamente reduzida e, no caso do processo orçamentário, inexistente. 9 Expressão que tem origem em termo inglês que equivale à atribuição que algumas comissões têm na Câmara e no Senado de deliberarem sobre determinadas matérias com poder conclusivo. www.pontodosconcursos.com.br 23 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Em suma, a versão distributiva sustenta "o modelo do voto pessoal que está ancorado no sistema de comissões, isto é, os incentivos para cultivar o voto pessoal encontram-se em harmonia com um processo decisório centralizado em que os parlamentares controlam a produção legislativa na jurisdição que mais afeta os eleitores de seu distrito"10. No que concerne à política orçamentária, este comportamento pode teoricamente ser verificado na apreciação do perfil das emendas ao Projeto de Lei Orçamentária que é um dos objetivos deste trabalho. Ressalte-se que a corrente distributiva possui uma dimensão ético- normativa segundo a qual a organização ótima do Congresso seria aquela que coibisse o desejo dos congressistas de oferecer mais e mais políticas clientelistas para seus eleitores. 2. A Vertente Informacional A versão informacional tem dois postulados fundamentais acerca da organização interna do Congresso. O primeiro é relativo à decisão majoritária. Ele argumenta que a forma de tomada de decisão delega o poder à maioria de modo que há mecanismos garantindo a ela a palavra final em qualquer assunto em pauta. Assim sendo, o órgão central de decisões seria o Plenário, o qual possui meios de salvaguardar seu poder deliberativo. O segundo postulado diz respeito à incerteza quanto às políticas adotadas pelos parlamentares em virtude da existência de assimetria na distribuição interna de informações. Dessa forma, admite-se que os legisladores têm aversão a correr riscos preferindo reduzir seus ganhos imediatos a deliberar num contexto de incerteza. Nesta concepção, o funcionamento do Legislativo é bastante semelhante ao de uma empresa. O Plenário garante aos seus membros a possibilidade de especialização em áreas de interesse privado com a contrapartida de que os conhecimentos auferidos sejam disponibilizados e aproveitados publicamente. Esta é a medida de sua eficiência. Assim, esta organização padeceria do problema da relação principal-agent. O Plenário precisa dispor de instrumentos 10 FIGUEIREDO e LIMONGI, 2002. P. 313 www.pontodosconcursos.com.br 24 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES passíveis de incentivar a correspondência de interesses entre ele e seus membros tomados individualmente (ou em comissões). Com tal intuito, o ideal é que as comissões sejam constituídas por especialistas e sejam razoavelmente representativas. Isto porque a presença dessas características viabilizaria o fornecimento de informações mais confiáveis do ponto de vista técnico e político. A razão está no fato de que esta composição aproxima o eleitor mediano da comissão ao do Plenário a ponto de certificar informações mais seguras, reduzindo a assimetria informacional. Uma característica importante da organização legislativa para esta abordagem é a existência do chairman, isto é, do sistema de antiguidade que existe nos Estados Unidos, onde os membros mais antigos de determinadas comissões têm nelas preeminência, inclusive para ocupar sua presidência. Esta versão também não deixa de possuir um aspecto ético-normativo, segundo o qual o Poder Legislativo deve possuir uma organização legislativa racionalmente concebida marcada pela redução da incerteza e pela garantia que as decisões sejam tomadas com base no maior volume de informações disponível. 3. A Vertente Partidária A versão partidária apresenta os partidos políticos como os efetivos elementos estruturadores e determinantes da atividade legislativa. Em oposição as perspectivas anteriores que assumem a deficiência dos partidos político como um fato histórico, a versão partidária defende que a força e a importância dos partidos políticos no processo legislativo norte-americano advêm de duas fontes. A primeira é o poder de definir a agenda decisória. No Brasil, isto é realizado pelo Colégio de Líderes, o qual é substituído pela figura do Speaker. A segunda consiste na combinação do poder de escolha e seleção das indicações às comissões com o critério de antigüidade para a escolha dos presidentes de comissão (este pertinente ao sistema americano). Essencialmente, devido a essas prerrogativas dos partidos, os parlamentares sentem-se compelidos a negociar no seio de seu partido a fim de alçar cargos e posições que possam trazer-lhe poder e benefícios variados. www.pontodosconcursos.com.br 25 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES O Colégio de Líderes possui atribuições tais como: (i) a tarefa de auxiliar a Presidência da Câmara na elaboraçãoda pauta; (ii) a utilização do instituto de tramitação urgente e urgentíssima, aprovado via assinatura dos líderes, e (iii) representação da bancada na apresentação e aprovação de destaques, requerimentos, emendas... Destarte, é imprescindível a figura dos partidos, sobretudo, quando o assunto é política orçamentária. Visto que o preenchimento dos cargos, assim como dos membros em geral, ocorre mediante indicação de liderança, os acordos interpartidários são indispensáveis para a compreensão da dinâmica da fase legislativa do processo. Quer exista paroquialismo no comportamento dos congressistas ou não, eles têm a necessidade de estabelecer algum acordo com seus líderes para a consecução de uma posição dentro do Congresso e de suas instancias mais importantes. 12. Representação política, dinâmica parlament ar, governança e governabilidade no Brasil. Representação, democracia, e partidos políticos Os partidos são entendidos por vários analistas da política brasileira como meios de manter a governabilidade democrática e detentores da capacidade de estruturar a competição eleitoral. Partidos surgem, assim, como agentes que organizam o processo eleitoral em detrimento da visão dos partidos enquanto canais legítimos de expressão de diferentes demandas da sociedade, mesmo daqueles indivíduos que não são eleitores. No entanto, as interações intra-partidárias e em relação ao processo eleitoral podem ser vistas como mais do que uma competição em busca de mais votos objetivando, unicamente, o alcance do poder, podem ser vistas como canais que, na esfera pública, deliberam e agem de forma dialética entre si na busca por legitimar e alcançar diferentes demandas representativas de www.pontodosconcursos.com.br 26 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES diversos setores. Neste caso, a competição eleitoral é vista, não como processo estabilizante de padrões de previsibilidade, mas a democracia vista como a esfera do dissenso ao invés de esfera da luta ordenada ou pactuada que, deliberadamente, exclui itens da agenda que se colocam como „anti- sistema‟. O personalismo, a volatilidade, a falta de legitimidade, a não- identificação entre políticos e sociedade, antes de conseqüências da falta de institucionalização, podem ser entendidos como efeitos da falta de representatividade dos partidos políticos. Partidos que representam grupos sociais tradicionais não constroem laços de pertencimento e identidade com a maior parte da sociedade. A fórmula pragmática em detrimento da ideologia (entendida aqui como conjunto de valores que norteiam projetos políticos) nos partidos tem como reflexo atuações pragmáticas dos eleitores que votam em diferentes momentos de formas diversas, considerando as condições históricas e sociais que os cercam. É possível apontar em diversas pesquisas que existem laços partidários e apoio coerente a determinados partidos nas parcelas da população com maior nível educacional e de maior poder aquisitivo, isso se daria não em função da possibilidade desses setores de entender melhor a complexidade do sistema político, mas sim porque a composição social dos partidos políticos mostra que são esses setores que estão efetivamente representados na esfera pública. Em seu artigo Partidos, ideologia e composição social (2002) Leôncio Martins Rodrigues analisa a composição sócio-ocupacional dos partidos que compuseram a bancada da Câmara dos Deputados na 51° legislatura (1999- 2002)11. Rodrigues analisa as relações entre os partidos políticos e os grupos sociais e observa a existência de diferenças partidárias em relação à representação de interesses e ideologia programática. O autor partiu da hipótese de que existiam diferenças significativas na composição dos partidos e que esse fato teria influência também nas posições políticas, programáticas e 11 Os pressupostos e indicações de resultados atingidos por Rodrigues podem ser expandidos como análise válida também para a 52° legislatura, considerando a taxa de renovação dos parlamentares e a inexistência de alterações estruturais no ethos de formação e recrutamento dos partidos considerados. www.pontodosconcursos.com.br 27 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES ideológicas assumidas em alguns casos pelos diferentes partidos, em contraposição à critica comumente feita na literatura sobre partidos no Brasil de que nosso sistema partidário seria caracterizado pelo amorfismo e pela indefinição ideológica e programática. Com base no estudo de Rodrigues, é possível perceber que apenas certos grupos e, conseqüentemente, certos interesses estão representados na Câmara dos Deputados. Conforme mostram os dados trabalhados por ele, 43,5% dos parlamentares da Câmara dos Deputados podem ser classificados como empresários e, se somarmos a eles, os profissionais liberais, as duas categorias perfazem 75,1% da casa legislativa12. Fica explícita a pouca representatividade da Câmara em relação à população brasileira de uma forma geral e a possibilidade de observar diferenças ideológicas na composição dos partidos políticos. As conclusões de Rodrigues são relevantes ao evidenciarem a necessidade de inclusão da composição social do partido e das diferenças de interesses defendidos por grupos sociais específicos, além dos elementos que caracterizam a dinâmica do processo decisório no Brasil, nas análises sobre o papel dos partidos e sua importância no modelo de democracia representativa. Considerando isso, a presença de mais setores nos âmbitos legislativos, por exemplo, seria de extrema importância para o aumento potencial da representatividade de setores minoritários nos processos decisórios. Antes de um problema institucional, a falta de representatividade dos partidos é um problema político e pode ser considerado como o principal elemento de fragilidade e fraqueza dos partidos nas democracias de modelo representativo. Analisar os partidos políticos e o papel que desempenham nos sistemas políticos atuais é relevante em função da centralidade dos partidos como elementos institucionais em torno dos quais as regras eleitorais circulam. Nos modelos de democracia representativa, os partidos são a priori os agentes da disputa que apresentam as opções disponíveis ao eleitorado, quer existam diferenças entre essas opções ou não. De qualquer forma, a centralidade dos partidos como organizações de apoio para os pressupostos da democracia eleitoral, ou concorrencial, definida por Schumpeter (1961) é inegável. 12 percebemos que partidos de direita são compostos, em grande parte, pelos grupos majoritários na Câmara e que os maiores percentuais de setores dos partidos de esquerda correspondem aos setores minoritários com representação na Câmara. www.pontodosconcursos.com.br 28 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Longe de adotar o modelo de democracia schumpeteriana como pressuposto, é preciso que se diferencie o papel dos partidos políticos em diferentes tipos de arranjos democráticos. Falar em democracia eleitoral, definida e mantida apenas como método de seleção entre candidatos apresentados pelos partidos, requer que os partidos sejam considerados apenas como instituições de agregação de grupos concorrentes que visam alcançar o poder. Nesse sentido, explicitamente, a noção de representatividade, entendida como característica necessária à democratizaçãodas esferas de deliberação, não é contemplada pelos teóricos que adotam a perspectiva de democracia concorrencial ou schumpeteriana. A simples existência de partidos políticos não é condição suficiente para que haja representatividade democrática efetiva. Prova disso é a defesa da função de agentes do processo eleitoral atribuída aos partidos pelas correntes elitistas. Partindo disso, adotaremos uma perspectiva conceitual acerca dos partidos políticos que amplie seu sentido, funções e atribuições de forma a ampliar também o conjunto de regras, valores e instituições que definimos como democracia representativa. Existe uma tensão explícita entre democracia eleitoral, no sentido dado por Schumpeter, e representação democrática, no sentido dado por Nadia Urbinati (2006) que adotaremos em nossa análise. Segundo Urbinati, as idéias de representação mais comuns estão ligadas a duas perspectivas diferentes. Na primeira, são combinados o que ela chama de: 1) „elitismo nas instituições políticas‟ em que alguns espaços são definidos como próprios para a discussão e tomada de decisões e nos quais, concomitantemente, apenas alguns indivíduos possuem a legitimidade para participarem do processo decisório; e 2) legitimação popular baseada no voto e nas eleições. Dessa forma, são somados o consentimento do eleitorado que vota, elege uma das opções e aceita os resultados da disputa, e o reconhecimento da competência dos eleitos através do método de seleção eleitoral. A representação torna-se, assim, o resultado da seleção dos „melhores‟ feita pelos eleitores através do processo eleitoral. Em outras palavras, com base nessa perspectiva, toda e qualquer eleição feita com base no respeito às regras de disputa e seleção dos candidatos apresentados pelos partidos seria, indiscutivelmente, representativa. www.pontodosconcursos.com.br 29 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Para Urbinati, uma segunda vertente definiria a representação com base no entendimento de que a eleição é, não mais um método de seleção de políticos profissionais, mas sim uma expressão do direito de participar aliado à não concentração da fonte de legitimidade do processo político nas instituições estatais. Nessa perspectiva, figura ainda o consentimento através das eleições, entretanto, ele pode ser considerado mais do que um ato de autorização em função da ampliação do sentido atribuído à participação política. A perspectiva adotada por Urbinati analisa a representação não mais como esquema de delegação, e sim como um “(...) processo político que conecta a sociedade e instituições”. Dessa forma, a noção de política estaria mais ligada à idéia de uma “arena de opiniões contestáveis e decisões sujeitas à revisão” e menos à noção de escolha entre „sim‟ e „não‟ como meios de participação. Partindo disso, o próprio conceito de presença política e, conseqüentemente, de representação política, é ressignificado em Urbinati. A presença política passa a ser entendida como „vocalização’ de demandas e avaliações sobre as políticas e projetos políticos e não mais apenas como delegação pura e simples, o que complexifica a noção de perspectiva social defendida por Young como justificativa para a inclusão de mulheres e reforça a preocupação exposta por Phillips em unir uma política de presença e à política de idéias como forma de manter a prestação de contas e accountability nas esferas representativas. Pensar a representação a partir da idéia de vocalização atribui à presença um significado e uma relevância diferenciada em relação às perspectivas tradicionais ligadas à noção liberal de representação. Assumir que a presença é relevante implica em considerar que as eleições produzem, potencialmente, governos responsáveis e limitados, sem que, no entanto, sejam, necessariamente, representativos. Dessa forma, Urbinati argumenta que a noção usual de representação deve ser revista para que seja incluído o sentido assumido pela representatividade como elemento de democratização da arena política. Para a autora, é impossível considerar a idéia de representação situada fora das relações que se deram ao longo da história e das variadas práticas de democratização e, com base nisso, podem existir diferentes teorias da representação dependendo das formas assumidas pelas relações entre Estado e sociedade em diferentes momentos sociais e www.pontodosconcursos.com.br 30 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES históricos. Por último, em Urbinati, é relevante considerar os papéis da ideologia e do partidarismo como elementos de compreensão para as noções teóricas da representação e para a prática política. Para Urbinati, as eleições e a representação política devem ser entendidas a partir da relação entre Estado e sociedade civil. Através das eleições, o Estado e a sociedade estariam conectados no interior de um processo dinâmico, embora não seja possível desconsiderar outros canais de conexão entre as estruturas estatais e a sociedade. A representação não estaria restrita aos agentes ou instituições governamentais ou à deliberação e processos decisórios que ocorrem no interior das esferas formais de representação. A representação como processo político estruturado com base na „circularidade entre instituições e sociedade‟, nos termos de Urbinati, seria constantemente criada e recriada no interior da dinâmica das atividades políticas. “A representação espelha esta tensão. Pode-se dizer que ela reflete não simplesmente idéias e opiniões, mas idéias e opiniões a respeito das visões dos cidadãos acerca da relação entre a sociedade e o Estado. Qualquer reivindicação que os cidadãos tragam para a arena política e queiram tornar um tema de representação é invariavelmente um reflexo da luta para a redefinição das fronteiras entre as suas condições sociais e a legislação”. A análise da noção de representação deve considerar não mais apenas os elementos jurídicos que a definem, mas os processos políticos subjacentes a suas estruturas de configuração. A representação política não está fora das relações de poder e menos ainda estão os processos eleitorais e as escolhas feitas pelo eleitorado. A democracia não é apenas método e nem a representação é apenas o resultado da seleção dos „melhores‟ ou de uma „elite ilustrada‟ localizada fora da realidade social e, por isso mesmo, mais capacitada a resolver os problemas da sociedade imersa nos assuntos cotidianos. Os representantes não são imparciais, nem podem ser considerados como agentes universais ou livres de suas posições sociais e políticas na www.pontodosconcursos.com.br 31 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES configuração de poder, embora, na análise feita por Bourdieu (1989), as relações de dominação tenham como ponto de apoio a imposição, via violência simbólica, das visões de grupos hegemônicos como se fossem visões universais compartilhada por todos os demais sujeitos sociais. Nos termos de Young, os representantes, longe de serem imparciais, carregam em si perspectivas sociais marcadas pelas experiências pelas quais passaram e que são delimitadas e possibilitadas pelo lugar social que ocupam no interior da realidade social. Representatividade e legitimidade precisam ser diferenciadas e localizadas adequadamente. As eleições legitimam representantes que não, necessariamente, são representativos quando é adotado o sentido mais amplo de representação política. Uma casa legislativa formadapor empresários e médicos em 75% de sua composição pode ser legítima, entretanto, não é, obviamente, representativa das demandas, perspectivas e interesses da maior parte da população brasileira. A perspectiva de democracia extraída dessas discussões implica, necessariamente, na adoção da idéia de representação com base em elementos de vocalização de demandas, presença diversificada de grupos sociais e de democratização do acesso às esferas representativas de forma a possibilitar que novas vozes, e perspectivas no sentido dado por Young, sejam incluídas nas discussões como passo inicial para a reconfiguração, ao menos, das discussões que permeiam as decisões políticas. Como já foi ressaltado, incluir grupos minoritários e vozes dissidentes não garante que as demandas sejam efetivamente vocalizadas e que esses representantes tenham compromissos com bases excluídas, entretanto a diversificação da composição social dos partidos e das instituições representativas é condição necessária para que a luta por mais representatividade no modelo de democracia vigente tenha início. Daí a importância de analisar os partidos políticos como canais de intercâmbio entre as estruturas estatais de deliberação e decisão e as demandas da sociedade, a diversificação da composição social dos partidos e o empoderamento (empowerment) de setores variados no interior das estruturas de escolha de www.pontodosconcursos.com.br 32 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES candidatos e dirigentes nas estruturas partidárias, potencialmente, gera as condições para que esses grupos sociais tenham mais representantes eleitos. Nas palavras de Urbinati: “A representação política invalida a opinião de que a sociedade é a soma de indivíduos dissociados que competem e se unem, votam e agregam preferências por atos discretos de livre escolha e cálculo instrumental. Ela se contrapõe a uma concepção da democracia como uma multidão numérica de unidades singulares ou associadas forçadas a delegar seu poder pela simples razão de que uma multidão não pode ter uma vontade, não pode exercer nenhum poder ou ser um governo. Uma política representacional concebe a sociedade democrática como uma malha intrincada de significados e interpretações das crenças e opiniões dos cidadãos a respeito de quais são seus interesses; crenças que são específicas, diferenciadas e sujeitas à variação ao longo da vida real das pessoas. A democracia é única porque extrai das diferenças a força para a união”. A democracia não mais entendida como consenso, mas como um processo inerentemente conflitivo, em que algumas regras básicas são internalizadas de forma a manter a continuidade dos processos que estruturam o sistema político vigente e garantir que a derrota de uns não implique na destruição das condições que permitem que os „perdedores‟ venham a vencer em eleições posteriores. Dessa forma, a democracia se mostra como arena do „conflito controlado‟ ou „delimitado‟ em que forças sociais travam entre si lutas pela reconfiguração da distribuição dos recursos de poder existentes. Nesse contexto, os partidos surgem como, não só instrumentos de provimento de organização e recursos para a alternância política e resolução pacífica das disputas eleitorais sucessivas, mas também poderiam desempenhar uma outra função de „integração da multidão‟, reunindo e caracterizando idéias, interesses, demandas e percepções espalhadas na sociedade em torno de diferentes projetos políticos. www.pontodosconcursos.com.br 33 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Mais algumas palavrinhas sobre representação política Um dos pontos mais relevantes a cerca da representação política é que ela se associa à idéia de controle do poder político por quem não pode fazê-lo diretamente, nem exercê-lo. Em suma, a representação parte do pressuposto de que todo poder político precisa ser controlado. Representação também pode ser entendida como um mecanismo político particular para a realização de uma relação de controle regular entre governantes e governados. Modelos de Representação 1. Representação como relação de delegação: o representante é concebido como um executor privado de iniciativa e autonomia, das instituições que os representados lhes atribuem – o “embaixador”. Mandato Imperativo. Rigidez. Controle. 2. Representação como relação de confiança/fiduciária: atribui ao representante autonomia e supõe que a única orientação para sua ação seja o interesse dos representados como foi por ele concebido. Edmund Burke. Liberdade de ação. 3. Representação como espelho ou representatividade sociológica: preocupação se não com cada representante individualmente, mas com o efeito do conjunto de representantes. Concebe o organismo representativo como m microcosmo que fielmente reproduz as características do corpo político. Em nenhuma realidade, predomina as formas puras, mas sim misto dos tipos acima. Governança e governabilidade no Brasil. Os conceitos de governabilidade e governança estão intimamente relacionados hoje às temáticas da reforma do Estado e de seu aparelho. Originalmente, Atribui-se, via de regra, a formulação dos conceitos a Samuel www.pontodosconcursos.com.br 34 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES Huntington, mas na verdade ele foi apenas o primeiro a utilizá-los de forma sistemática por volta dos 60. Antes disso, já existiam como noções gerais concernentes ao funcionamento do Estado e seu relacionamento com a sociedade. Uma visão geral dos conceitos Uma análise da literatura que trata sobre o assunto aponta para uma relativa convergência sobre os conceitos, de maneira que é possível traçar linhas gerais concernentes ao significado de governabilidade e governança A em um regime democrático. Em geral, governabilidade refere-se às próprias condições substantivas (ou materiais) de exercício do poder e de legitimidade do Estado e do seu governo derivadas da sua postura diante da sociedade civil e do mercado. Sendo assim, governabilidade pode ser concebida como a autoridade política do Estado em si, entendida como a capacidade que este tem para agregar os múltiplos interesses dispersos pela sociedade e apresentar-lhes um objetivo comum para o curto, médio e longo prazo. Estas condições podem ser sumarizadas como o apoio obtido pelo Estado às suas políticas e à sua capacidade de articular alianças e coalizões/pactos entre os diferentes grupos sócio-políticos para viabilizar o projeto de Estado e sociedade a ser implementado. Por fim, a fonte ou origem principal da governabilidade são os cidadãos e a cidadania organizada. Capacidade de articulação dos cidadãos que gera as condições para governabilidade. Um importante elemento distintivo em relação à governança. Uma leitura genérica do conceito de governança, por sua vez, permite entendê-la como a outra face de um mesmo processo, ou seja, ela compreende os aspectos instrumentais (ou adjetivos) da governabilidade. Governabilidade, portanto, tem que ver com a capacidade financeira, gerencial e técnica que um determinado governo tem para formular e implementar as suas políticas ou seu programa de governo. Por isso, é www.pontodosconcursos.com.br 35 CURSO ON-LINE - CIÊNCIA POLÍTICA PARA MPOG PROFESSOR MARCELO GONÇALVES importante ter em mente que governança pressupõe condições mínimas de governabilidade. A
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