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Farmacologia: Anestésicos Gerais

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Anestésicos Gerais
Anestesia geral pode ser do tipo inalatória (halogenados com ou sem N2O - usada somente na pediatria), endovenosa ou balanceada (infusão por via intravenosa e manutenção pela via inalatória). 
Fases da anestesia: (1) Indução: administração de drogas anestésicas, perda de consciência, controle das vias aéreas; (2) Manutenção: controle do plano anestésico adequado durante a cirurgia; (3) Recuperação imediata: período desde a interrupção do fármaco até a volta da atividade respiratória espontânea; (4) Recuperação tardia: recuperação total da consciência. 
Efeitos clínicos: Os anestésicos gerais induzem a depressão generalizada e reversível do SNC. A anestesia geral provoca a perda da percepção de todas as sensações e o estado anestésico inclui perda de consciência, amnésia (efeito no hipocampo) e imobilidade (ausência de respostas protetoras), mas não necessariamente analgesia completa. Outros efeitos desejáveis incluem relaxamento muscular, perda dos reflexos autônomos, analgesia e ansiólise. As regiões mais sensíveis para produzir esses efeitos no SNC parecem ser a formação reticular, núcleos talâmicos e partes do córtex. 
Além disso, à medida que a concentração é aumentada, as funções cerebrais são progressivamente afetadas, incluindo o controle motor e atividade reflexa, a respiração e a regulação autônoma. Concentrações elevadas de qualquer anestésico podem afetar todas as partes do SNC, causando inibição profunda, a qual pode levar à morte por insuficiência respiratória. 
Ao nível celular, aumentam a inibição tônica, reduzem excitação e inibem a transmissão sináptica excitatória. Quanto aos efeitos cardiovasculares, a maioria dos anestésicos diminui a contratilidade cardíaca, porém, seus efeitos sobre débito cardíaco e pressão sanguínea variam. O isoflurano e outros halogenados inibem o fluxo simpático, reduzem o tônus arterial e venoso e a pressão. Já o óxido nitroso e a cetamina aumentam a descarga simpática, aumentando a frequência cardíaca e mantendo a pressão. Alguns anestésicos, como o halotano, podem causar extrassístoles ventriculares pela sensibilização à epinefrina. Se a secreção de catecolaminas for excessiva (ex: feocromocitoma), há risco de fibrilação ventricular. Por fim, todos os anestésicos, com exceção de N2O, cetamina e Xe deprimem a respiração e aumentam a PCO2. 
OBS: Débito cardíaco reduzido também diminui o fluxo sanguíneo para os rins, reduzindo a filtração glomerular e diminuindo a diurese. Excesso de anestésico pode causar insuficiência renal. 
Anestésicos ideais: (1) Não inflamável\não explosivo; (2) Aroma agradável ou não-irritante; (3) Estável à luz e temperatura; (4) Não reativo com bombas ou borracha; (5) Com boa margem de segurança.
Planos de Guedel: Se relacionam à profundidade da anestesia. O 1º plano é para intervenções superficiais; o 2º para cirurgias de redução; o 3º é o plano cirúrgico (engloba planos mais profundos e mais superficiais); 4º plano é o da anestesia; e o 5º do coma. 
Mecanismo de ação: Os anestésicos gerais incluem substâncias tão diversas como gases simples, hidrocarbonetos halogenados, barbitúricos e esteroides. Existem inúmeros mecanismos através dos quais a analgesia pode ser produzida. 
Solubilidade lipídica: O coeficiente de partição óleo-água faz a previsão da partição nas membranas lipídicas, com a sugestão de que a anestesia resulta de alteração na função da membrana. Acredita-se que esse distúrbio funcional pode se originar da ligação das moléculas de anestésicos aos bolsões hidrofóbicos dentro de alvos proteicos específicos da membrana. 
Efeitos nos canais iônicos: Após a descoberta de que os anestésicos podem se ligar a proteínas e lipídios, foi constatada a alteração em diferentes tipos de canais iônicos. Podem ocorrer em: receptores GABA (potencializam a ação do GABA em seu receptor), canais de K+ com domínio de dois poros (modulam a excitabilidade neuronal, reduzindo-a, o que pode contribuir para seus efeitos analgésicos, hipnóticos e imobilizantes), receptores NMDA (bloqueando-o) e em outros canais iônicos (receptores de glicina, nicotínicos e canais de Na+ ativados por voltagem). 
Farmacodinâmica dos anestésicos inalatórios: Os anestésicos gerais são bem distribuídos em todas as partes do corpo, havendo a maior concentração no tecido adiposo. O SNC é o principal local de ação, mas os anestésicos agem de forma diferente nas diversas partes do SNC, dando origem aos efeitos clássicos. *Propriedades farmacodinâmicas ideias: ação previsível e efeito completo, potência razoável e ausência de toxicidade. 
Concentração alveolar mínima (CAM): Para controlar a profundidade da anestesia, deve-se regular com muita precisão o nível do anestésico no SNC, indicado pela pressão parcial no SNC. Ela é mantida dentro da faixa desejada variando a pressão parcial inspirada. No entanto, como não é possível monitorar a Psnc diretamente, ela é calculada a partir da pressão parcial alveolar. A Palv que resulta na anestesia mais leve é chamada de concentração alveolar mínima, que é a pressão parcial alveolar que extingue o movimento em resposta a uma incisão cirúrgica em 50% dos pacientes. A potência (duração de ação) também se relaciona com a CAM, de forma inversamente proporcional. 
Índices terapêuticos e analgésicos: Em geral, os anestésicos têm curvas dose-resposta íngremes e baixos índices terapêuticos. Além disso, também não existem antagonistas farmacológicos dos anestésicos gerais para neutralizar níveis acidentalmente altos do anestésico. Assim, esses podem ser fármacos perigosos que exigem treinamento especializado para administração apropriada e segura. Já o índice analgésico é a razão entre CAM e a pressão parcial que provoca analgesia em 50% dos pacientes. Um alto índice indica que a analgesia é induzida em uma pressão parcial muito menor que a necessária para anestesia cirúrgica. 
Regra de Meyer-Overton: A potência de um anestésico pode ser prevista por suas características físico-químicas. É diretamente proporcional a sua solubilidade, ou seja, quando o coeficiente de partição óleo-gás aumenta, a CAM diminui. Esse coeficiente também influencia a cinética de sua distribuição pelo corpo e a solubilidade elevada retarda a recuperação da anestesia. 
Farmacocinética dos anestésicos inalatórios: O modelo de absorção de anestésico dos alvéolos para circulação e de distribuição da circulação para os tecidos permite determinar a velocidade de aumento da pressão parcial do anestésico no SNC. Além disso, as características farmacocinéticas ideais seriam: indução rápida e agradável, com recuperação suave e rápida para um estado funcional e consciente, ausência de biotransformação, fármaco que permita monitoramento contínuo da Cp. 
A pressão parcial do SNC e das vísceras entra em equilíbrio com a pressão parcial inspirada em duas etapas. Primeiro, há o equilíbrio das pressões alveolar e parcial inspirada. Depois, a pressão nos órgãos equilibra-se com a pressão parcial arterial (que é igual à pressão parcial alveolar). 
Etapa limitante da taxa: A primeira fase do equilíbrio varia muito entre diferentes anestésicos. Assim, os anestésicos podem ser divididos em: limitados pela ventilação e limitados pela perfusão. Os limitados pela ventilação têm um tempo de equilíbrio longo em função de seu elevado coeficiente de partição sangue-gás. Afinal, a alta taxa de absorção do anestésico para o sangue impede a rápida elevação da Palv. Esse lento equilíbrio resulta em lenta indução e lenta recuperação. Já nos limitados pela perfusão a primeira fase é rápida e, assim, a indução e a liberação são também rápidas, porque seu coeficiente sangue-gás é pequeno. Afinal, com esse menor coeficiente, a corrente sanguínea remove menos anestésico dos alvéolos e assim a pressão alveolar aumenta mais rápido (assim como a indução). 
*Coeficiente de partição sangue-gás: É o principal fator que determina a velocidade de indução e recuperação. Quanto menos solúvel no sangue, mais rápida a indução. 
Efeitos das alterações ventilatórias: A hipoventilação reduz achegada do anestésico aos alvéolos e assim, retarda a indução. Já quando você aumenta a oxigenação (PO2), há um aumento das trocas gasosas e superficialização da anestesia, já que há uma maior expiração e, consequentemente, maior eliminação do anestésico. Efeitos das alterações do débito cardíaco: Os anestésicos podem reduzir o débito cardíaco, reduzindo também a velocidade com que o anestésico é retirado dos alvéolos para o sangue. Assim, a diminuição do débito acelera a indução. 
Efeitos da idade: Crianças têm ventilação maior que os adultos, o que pode acelerar a indução. No entanto, também têm débito cardíaco maior, o que tende a retardar. Porém, esses efeitos não se anulam. Afinal, a pressão parcial do anestésico no retorno venoso misto aumenta mais rápido nas crianças, já que uma maior proporção do fluxo sanguíneo irriga o SNC e vísceras. Além disso, o débito cardíaco aumentado e a menor capacidade dos tecidos para anestésicos, aceleram a velocidade de saturação dos tecidos por anestésico. Assim, há redução da retirada do anestésico pela circulação pulmonar, desacelerando a elevação da pressão parcial alveolar e levando à indução mais rápida em crianças. 
Recuperação: É ideal que seja rápida. Em geral, as fases de recuperação ocorrem na sequência inversa à indução da anestesia, incluindo a fase de excitação. A ventilação remove o anestésico da corrente sanguínea e, por isso, aumento da ventilação sempre acelera a recuperação. Assim, fármacos depressores respiratórios, como a morfina, podem retardar a recuperação. *Quanto mais lipossolúvel o anestésico e mais obeso o paciente, mais tardia será a recuperação. 
OBS: Em pacientes doentes, depois do fim da anestesia, pode haver redução da pressão parcial alveolar de oxigênio devido à difusão do óxido nitroso para os alvéolos com rápida velocidade. Por isso, faz-se a administração de oxigênio após alguns minutos da retirada da anestesia com óxido nitroso. 
OBS2: A fase de recuperação pode ser seguida de lenta "ressaca", com náuseas e vômitos. 
Metabolismo e toxicidade: O metabolismo, embora não muito importante como via de eliminação, pode gerar metabólitos tóxicos. O clorofórmio causava hepatoxicidade por formação de radicais livres nos hepatócitos. O metoxiflurano é 50% transformado em fluoreto e oxalato, que causam toxicidade renal. O halotano, por sua vez, é de 20-30% convertido em brometo e outros metabólitos, implicados em toxicidade hepática. O enflurano e o sevoflurano geram fluoreto em quantidades muito mais baixas. 
ANESTÉSICOS INALATÓRIOS: Em geral, há equilíbrio entre indução rápida e potência elevada. Um anestésico que tem indução rápida costuma a ter baixa potência e vice-versa. 
Halotano: Tem alta potência e indução e recuperação lentas. É útil em anestesia pediátrica por não possuir odor irritante. Um efeito adverso raro, mais frequente com o halotano (mas também com outros halogenados) é a hipertermia maligna. A suscetibilidade a essa reação é hereditária, por uma mutação nos canais de cálcio do RER (receptor de rianodina). Causa, então, saída descontrolada de cálcio do retículo, com tetania e produção de calor. É tratada com dantroleno, que bloqueia a liberação de cálcio. *Efeito relaxante sobre o útero, o que pode causar sangramento pós-parto. *Sensibiliza o coração à adrenalina, não devendo ser utilizado na septoplastia. 
· Isoflurano: Menos potência que o halotano, porém mais rápida indução. É o anestésico mais comumente usado. Pode causar hipotensão e é potente vasodilatador coronário, podendo levar à isquemia cardíaca em pacientes com doença coronariana. *Irritante das vias aéreas. 
· Desflurano: Indução e recuperação mais rápidas que o isoflurano. Não é muito metabolizado. No entanto, causa irritação do trato respiratório, o que pode causar tosse e broncoespasmo, e assim, não deve ser utilizado em profissionais da voz. 
· Sevoflurano: Semelhante ao desflurano, mas sem irritação respiratória. É parcialmente metabolizado, mas não o suficiente para toxicidade (em alguns casos, porém, pode ser nefrotóxico). Ideal para profissionais da voz. 
· Enflurano: Velocidade moderada de indução. No entanto, pode causar convulsões, especialmente em pacientes que sofrem de epilepsia. 
· Éter dietilíco: Muito potente. Porém, é inflamável e tem indução muito lenta e, por isso, não costuma a ser utilizado. 
· Clorofórmio: Causa toxicidade hepática. 
· Ciclopropano: Deixou de ser utilizado por ser explosivo. 
Óxido nitroso: Sua ação tem rápido início e recuperação. No entanto, possui potência pequena. Nunca deve ser administrado como 100% do gás inspirado, porque o paciente necessita respirar oxigênio. Não é utilizado propriamente como anestésico, mas sim como um adjunto de anestésicos voláteis, permitindo que esses sejam usados em menor concentração. Outro ponto é que ele tende a entrar nas cavidades gasosas, fazendo com que essas se expandam, o que pode levar ao quadro de pneumotórax ou embolismo vascular. A exposição prolongada ao óxido nitroso também pode levar à depressão da medula óssea, que pode ocasionar anemia e leucopenia. *Também pode causar efeitos teratogênicos se inalados por gestantes. 
OBS: Halotano > Enflurano > Isoflurano > Sevofluranos > Desflurano. 
ANESTÉSICOS INTRAVENOSOS: Os intravenosos, como os barbitúricos, permitem indução rápida. No entanto, como não-voláteis, não podem ser removidos do corpo por ventilação e, assim, deve haver bastante cuidado durante sua administração. O metabolismo e a excreção reduzem lentamente os níveis do fármaco no corpo, devendo haver diálise se necessária remoção rápida. 
Uso combinado de anestésicos e outros fármacos: Em cirurgias complexas, uma gama de fármacos é administrada em diferentes tempos, no decorrer do procedimento. Esses podem incluir pré-medicação sedativa ou ansiolítica (benzodiazepínicos); opioide analgésico perioperatório; anestésico inalatório para manutenção da anestesia durante a cirurgia; agente bloqueador neuromuscular apropriado; agente antiemético; e um antagonista muscarínico para prevenir ou tratar bradicardia ou para reduzir secreções brônquicas ou salivares. Próximo ao final do procedimento, usa-se um anticolinesterásico para reverter o bloqueio neuromuscular e analgésicos para alívio da dor pós-operatória. Essas combinações evitam longos períodos de semiconsciência e permitem que a cirurgia seja realizada sem depressão cardiorrespiratória inadequada.

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