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MIMA ANDRADE 1 INTRODUÇÃO O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) é caracterizado pela presença de obsessões e compulsões. Obsessões são idéias, pensamentos, imagens ou impulsos repetitivos e persistentes que são vivenciados como intrusivos e provocam ansiedade. Não são apenas preocupações excessivas em relação a problemas cotidianos. A pessoa tenta ignorá-los, suprimi-los ou neutralizá-los através de um outro pensamento ou ação. Compulsões são comportamentos repetitivos ou atos mentais que visam reduzir a ansiedade e afastar as obsessões. Esses rituais freqüentemente são percebidos como algo sem sentido e o indivíduo reconhece que seu comportamento é irracional. Geralmente a pessoa realiza uma compulsão para reduzir o sofrimento causado por uma obsessão. As obsessões mais comuns são: preocupação com sujeira ou secreções corporais, medo de que algo terrível possa acontecer a si mesmo ou a alguém querido, preocupação com simetria e escrupulosidade. As principais compulsões são: lavagem de mãos, verificação de portas, ordenação e arrumação, contagem e colecionismo. Para se fazer um diagnóstico de TOC é necessário que o nível da sintomatologia interfira no funcionamento social, interpessoal, ocupacional ou acadêmico do indivíduo e que os sintomas ocupem mais de uma hora por dia. ETIOLOGIA FATORES BIOLÓGICOS NEUROTRANSMISSORES SISTEMA SEROTONÉRGI CO Os muitos ensaios clínicos que foram conduzidos sustentam a hipótese de que a desregulação da serotonina está envolvida na formação do sintoma de obsessões e compulsões no transtorno. Os dados mostram que fármacos serotonérgicos são mais eficazes no tratamento do TOC do que fármacos que afetam outros sistemas neurotransmissores, mas ainda não está claro se a serotonina está envolvida no TOC. MIMA ANDRADE 2 SISTEMA NORADRENÉRGICO Atualmente, há menos evidências para a disfunção do sistema noradrenérgico no TOC. Relatos informais demonstram melhoras em sintomas de TOC com o uso de clonidina oral (Catapres), um fármaco que reduz a quantidade de norepinefrina liberada dos terminais nervosos pré-sinápticos. NEUROIMUNOLOGIA. Existe algum interesse em uma ligação positiva entre infecção estreptocócica e TOC. Infecção estreptocócica de grupo A-hemolítico pode causar febre reumática, e aproximadamente 10 a 30% dos pacientes desenvolvem coreia de Sydenham e exibem sintomas obsessivo-compulsivo. GENÉTICA Dados genéticos disponíveis sobre o TOC sustentam a hipótese de que o transtorno tem um componente genético significativo. Familiares de probandos com TOC consistentemente têm uma probabilidade 3 a 5 vezes maior de apresentar características de TOC do que famílias de probandos-controle. Os dados, contudo, ainda não distinguem os fatores herdáveis da influência de efeitos culturais e comportamentais na transmissão do transtorno. Estudos de concordância para o transtorno com gêmeos encontraram índices de concordância bem mais altos para os monozigóticos do que para dizigóticos. DIAGNÓSTICO E CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS Obsessões podem ser definidas como eventos mentais, tais como pensamentos, idéias, impulsos e imagens, vivenciados como intrusivos e incômodos. Como produtos mentais, as obsessões podem ser criadas a partir de qualquer substrato da mente, tais como palavras, medos, preocupações, memórias, imagens, músicas ou cenas. Compulsões são definidas como comportamentos ou atos mentais repetitivos, realizados para diminuir o incômodo ou a ansiedade causados pelas obsessões ou para evitar que uma situação temida venha a ocorrer. Não existem limites para a variedade possível das obsessões e das compulsões. QUADRO CLINICO E O PADRÃO DE SINTOMAS Obsessões e compulsões são as características essenciais do TOC. Uma ideia ou um impulso se impõem com insistência e de forma persistente na percepção consciente da pessoa. Típicas obsessões asso ciadas com TOC incluem pensamentos sobre contaminação (“Minhas mãos estão sujas”) ou dúvidas (“Esqueci de desligar o fogão”). Uma sensação de terrível ansiedade acompanha a manifestação central, e a característica-chave de uma compulsão é que ela reduz a ansiedade associada com a obsessão. A obsessão ou a compulsão são estranhas ao ego; ou seja, são sentidas como algo fora da experiência pessoal do indivíduo como ser psicológico. Não importa o quão vívida ou persuasiva seja a obsessão ou a compulsão, a pessoa normalmente a reconhece como algo absurdo e irracional. A pessoa que sofre das obsessões e compulsões, em geral, sente um forte desejo de resistir a elas. Ainda assim, quase metade de todos os pacientes oferece pouca resistência às compulsões, apesar de cerca de 80% acreditarem que elas sejam irracionais. Às vezes, os pacientes supervalorizam as obsessões e as compulsões; por exemplo, podem insistir que limpeza compulsiva é moralmente correta, mesmo que tenham perdido seus empregos devido ao tempo em que passam se limpando. PADRÕES DE SINTOMAS MIMA ANDRADE 3 A apresentação das obsessões e das compulsões é heterogênea em adultos (Tab. 10.1-3) e em crianças e adolescentes (Tab. 10.1-4). Os sintomas individuais de um paciente podem se sobrepor e mudar com o tempo, mas o TOC tem quatro padrões principais de sintomas. CONTAMINAÇÃO O padrão mais comum é uma obsessão de contaminação, seguida de lavagem ou acompanhada de evitação compulsiva do objeto que se presume contaminado. O objeto temido costuma ser difícil de evitar (p. ex., fezes, urina, pó ou germes). Os pacientes podem literalmente arrancar a pele das mãos se lavando demais ou não conseguir sair de casa por medo dos germes. Apesar de a ansiedade ser a resposta emocional mais comum ao objeto temido, vergonha e nojo obsessivos também são frequentes. Indivíduos com obsessão por contaminação costumam acreditar que ela se espalha de objeto para objeto ou de pessoa para pessoa com mínimo contato. DÚVIDA PATOLÓGICA. O segundo padrão mais comum é uma obsessão de dúvida, seguida de uma compulsão por ficar verificando. A obsessão costuma implicar algum perigo de violência (p. ex., esquecer de desligar o fogão ou de trancar uma porta). A verificação pode envolver múltiplas viagens de volta para casa para verificar o fogão, por exemplo. Esses indivíduos têm dúvidas obsessivas sobre si mesmos e sempre se sentem culpados achando que esqueceram ou cometeram algo. PENSAMENTOS INTRUSIVOS. No terceiro padrão mais comum, há pensamentos obsessivos intrusivos sem uma compulsão. Tais obsessões costumam ser pensamentos repetitivos de um ato agressivo ou sexual repreensível para o paciente. Os pacientes obcecados com pensamentos de atos sexuais ou agressivos podem se reportar à polícia ou se confessar a um padre. As ideias suicidas também podem ser obsessivas, mas uma avaliação cuidadosa sobre os riscos de suicídio deve sempre ser feita. SIMETRIA O quarto padrão mais comum é a necessidade de simetria ou precisão, que pode levar a uma compulsão de lentidão. Os pacientes podem literalmente levar horas para terminar uma refeição ou fazer a barba. OUTROS PADRÕES DE SINTOMAS. Obsessões religiosas e acúmulo compulsivo são comuns em pacientes com TOC. Puxar o cabelo e roer as unhas de maneira compulsiva são padrões comportamentais relacionados ao TOC. A masturbação também pode ser compulsiva EXAME DO ESTADO MENTAL Em exames do estado mental, indivíduos com TOC podem exibir sintomas de transtornos depressivos. Tais sintomas estão presentes em cerca de 50% dos pacientes. Alguns com TOC têm traços de caráter que sugerem transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva (p. ex., necessidade excessiva de precisão e arrumação), mas não são a maioria. Indivíduos com TOC, especialmente os homens, têm maior índice de celibato. Os casados têm maior incidência de desacordo matrimonial do que a norma. MIMA ANDRADE 4 TRATAMENTO Estudos bem controlados verificaram quea farmacotera pia, a terapia comportamental, ou uma combinação de ambas, são efetivas na redução significativa dos sintomas dos indivíduos com TOC. A decisão sobre qual terapia usar se baseia no julgamento e na experiência médicos, além de na aceitação do paciente das várias modalidades. A abordagem-padrão é iniciar o tratamento com um ISRS ou clomipramina e depois passar a outras estratégias farmacoló gicas se as drogas específicas serotonérgicas não forem efetivas. As drogas serotonérgicas aumentaram a porcentagem de pacientes com TOC que tendem a responder melhor ao tratamento em um índice de 50 a 70%. INIBIDORES SELETIVOS DA RECAPTAÇÃO DE SEROT ONINA Cada ISRS disponível nos Estados Unidos – fluoxetina, fluvoxamina (Luvox), paroxetina, sertralina, citalopram – foi aprovado pela US Food and Drug Administration (FDA) para tratamento do TOC. Doses mais altas foram frequentemente necessárias para um efeito benéfico, como 80 mg de fluoxetina por dia. Embora os ISRSs possam causar perturbação do sono, náusea e diarreia, dores de cabeça, ansiedade e inquietação, esses efeitos adversos costumam ser transitórios, causando menos trabalho do que os efeitos adversos associados com as drogas tricíclicas, tais como clomipramina. Os melhores desfechos clínicos ocorrem quando os ISRSs são usados em combi nação com terapia comportamental. CLOMIPRAMINA De todas as drogas tricíclicas e tetracíclicas, a clomipramina é a mais seletiva para recaptação de serotonina ver sus recaptação de norepinefrina, sendo excedida nisso apenas pelos ISRSs. A potência de recaptação de serotonina da clomipramina é excedida apenas pela sertralina e pela paroxetina. A clomipramina foi a primeira droga a ser aprovada pela FDA para o tratamento do TOC. Sua dosagem deve ser titulada para cima por 2 ou 3 semanas para evitar efeitos gastrintestinais adversos e hipotensão ortostática, e, como ocorre com as outras drogas tricíclicas, causa sedação e efeitos anticolinérgicos significativos, incluindo boca seca e constipação. Como acontece com os ISRSs, os melhores desfechos são resultado de uma combinação de farmacoterapia e terapia comportamental. OUTRAS DROGAS Se o tratamento com clomipramina ou com um ISRS não obtiver sucesso, muitos terapeutas aumentam a primeira droga com a adição de valproato, lítio ou carbamazepina. Outras drogas que podem ser experimentadas no tratamento para TOC são venlafaxina, pindolol e os inibidores de monoaminoxidase (IMAO), especialmente fenelzina. Outros agentes farmaco lógicos para o tratamento de pacientes não responsivos incluem buspirona, 5-hidroxitriptamina (5-HT), L-triptofano e clonazepam. A adição de um antipsicótico atípico, como a risperidona, ajudou em alguns casos. TERAPIA COMPORTAMENTAL Apesar de poucas comparações terem sido feitas, a terapia comportamental é tão efetiva quanto as farmacoterapias no TOC, sendo que alguns dados indicam que os efeitos benéficos são mais duradouros com a terapia comportamental. Muitos clínicos, portanto, consideram essa terapia o tratamento de escolha para o TOC. Ela pode ser conduzida tanto em cenários ambulatoriais quanto de internação. As principais abordagens comportamentais no TOC são a exposição e a prevenção de resposta. Dessensibilização, prevenção de pensamentos, inundação, terapia implosiva e condicionamento aversivo MIMA ANDRADE 5 também foram usados em pacientes com TOC. Na terapia compor tamental, os pacientes devem estar realmente comprometidos com sua melhora. PSICOTERAPIA Na ausência de estudos adequados de psicoterapia orientada por insight para TOC, é difícil fazer qualquer generalização válida sobre sua efetividade, apesar de haver relatos informais de sucessos. Analistas individuais observaram alterações marcantes e duradouras para melhor em pacientes com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, sobretudo quando conseguem aceitar os impulsos agressivos subjacentes a seus traços característicos. Da mesma forma, analistas e psiquiatras orientados dinamicamente verificaram melhoras sintomáticas consistentes em pacientes com TOC no curso da análise ou da psicoterapia de insight prolongado.
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