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Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Me. Júlia Lelis Vieira Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação • Introdução; • Conceitos de Lazer; • Um Pouco de História; • Equipamentos Específicos e Não Específicos de Lazer; • Barreiras para o Lazer; • Duplo Processo Educativo do Lazer; • Ludicidade; • Recreação; • Animação Sociocultural. • Contextualizar o aluno quanto aos conceitos básicos do lazer, do papel do animador sociocultural e das possibilidades de recreação no dia a dia; • Compreender a complexidade dessa área e a necessidade de constantes estudos acerca da temática. OBJETIVOS DE APRENDIZADO História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam- bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Introdução Nesta Unidade, conduzirei você ao conhecimento sobre o lazer, sua história, mudanças ao longo do tempo quanto aos seus objetivos e como vivenciamos as possibilidades de prazer no tempo livre. Trabalharei com você conceitos sobre o amplo mundo do lazer, o conceito de recreação, ludicidade e o termo animador cultural, também conhecido como ani- mador sociocultural. Antes de iniciar a leitura, convido a fazer uma reflexão: O que é o lazer para você? Ex pl or Conceitos de Lazer Dumazedier (1974, p. 34) conceituou o lazer como: [...] conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de li- vre vontade, ou seja, para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se, ou ainda, para desenvolver sua informação ou formação de- sinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais. Para pensar em lazer, é fundamental pensar na cultura. Somos o que vivemos e vivemos numa Sociedade que, ao longo das gerações, foi desenvolvendo suas características e sua identidade, e assim foi desenhando sua cultura. Para Marcellino (1990, p. 31), o lazer é: [...] a cultura – compreendida no seu sentido mais amplo – vivenciada (praticada ou fruída) no “tempo disponível”. O importante, como traço definidor, é o caráter “desinteressado” dessa vivência. Não se busca, pelo menos fundamentalmente, outra recompensa além da satisfação provo- cada pela situação. A “disponibilidade de tempo” significa possibilidade de opção pela atividade prática ou contemplativa. É de suma importância entender o conceito do lazer. Assim como os autores acima citados, outros pesquisadores também escrevem sobre tal conceito, uns mais recentes, outros mais antigos; entretanto, todos têm por base pontos importantes a serem observados na construção desse saber. 8 9 Importante! • 1º disponibilidade de tempo: o lazer se contrapõe ao trabalho; essa é uma pre- missa fundamental na conceituação do lazer; • 2º não se pode ter recompensa: mais especificamente, questões financeiras, pois se estamos partindo da premissa de que o lazer é oposto ao trabalho, isso significa que o sujeito no lazer não está desejando ganho monetário; apenas o prazer da vivência em si; • 3º liberdade de escolha: a seguir, veremos que o lazer está associado ao prazer intrínseco, por isso o poder da escolha é considerado um traço indispensável para o lazer. Importante! Caráter Desinteressado Poder de Escolha Tempo Disponível Figura 1 Um Pouco de História Na Antiguidade o lazer era visto como a possibilidade de desenvolvimento pessoal, tempo disponibilizado para realizar atividades que ofertassem prazer intrínseco. Nesse período, o lazer não contemplava práticas cor- porais, visto que tais práticas estavam voltadas ao culto do corpo e suas capacidades, a busca por excelência e espaço de ofertas ao deus Olimpo. Lazer: teve sua origem da palavra latim otium: “[...] ócio deriva do latim, que significa o fruto de horas vagas, do descanso e da tranquilidade, carregando consigo o sentido de ocupação suave e prazerosa” (MARTINS, 2013, p.17). Embora a palavra lazer venha da origem inglesa leisure, ambas têm suas raízes na história antiga, carregando em seu sentido o conceito do latim otium. Ex pl or Você vai observar que ora utilizo a palavra la- zer e ora a palavra ócio. Para que você entenda, veja a caixa de glossá- rio abaixo. 9 UNIDADE História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Mergulhando na Idade Antiga, podemos destacar duas cidades importantes da Grécia: Esparta e Atenas. Enquanto a primeira tinha um perfil mais envolvido com desenvolvimento da ginástica e da educação moral – intimamente ligada ao poder do Estado, Atenas apresentava um período de apogeu urbano, espaço em que a intelec- tualidade era valorizada e os artistas tinham espaço para sua arte (GOMES, 2008). Atenas era o local escolhido por aqueles que desejavam mergulhar no conhe- cimento, experimentar a riqueza dos debates políticos, filosóficos e científicos. Foi nessa cidade que os estudiosos debateram seus conhecimentos (GOMES, 2008). Nessa época, somente podiam vivenciar o ócio aqueles homens livres do traba- lho braçal, que tinham como dever social desempenhar cargos políticos e/ou ad- ministrar suas riquezas, tendo assim tempo livre para se dedicar aos pensamentos. Tais vivências experimentadas por esses nobres homens que ali viviam giravam em torno dos sentimentos e emoções vividas por eles enquanto indivíduo e enquanto sociedade (GOMES, 2008). Outro termo que era utilizado para descrever esse momento, esta vivência de busca o prazer intrínseco, é a palavra Skholé na qual, embora não tenha uma cor- relação direta com o lazer em muitos textos, é possível observar uma íntima ligação com suas experiências. Aristóteles, um dos filósofos mais conhecidos dessa era, utilizava muito esse ter- mo, pois na concepção dele, o ócio era o estado filosófico no qual se podia cultivar a mente por meio da música e da contemplação. O termo Skholé esteve ligado ao ócio, assim como foi a base para a palavra Escola, visto que o desenvolvimento intelectual do ser humano era baseado no cultivo das indagaçõese das buscas intrínsecas de prazer no conhecimento e na experimentação (GOMES, 2008). Leia mais sobre as origens do lazer no livro de Christianne Luce Gomes intitulado Lazer, trabalho e educação: relações históricas, questões contemporâneas. 2.e. rev.amp. Belo Ho- rizonte: Editora da UFMG, 2008. Ex pl or Dando um salto na história, chamo você a pensar na Revolução Industrial, entre tantas espalhadas mundo afora, e convido você a pensar na nossa Revolução Industrial. Aqui no Brasil, o modo de viver sofreu mudanças bruscas nas décadas de 1930 e 1940. Nesse período, nosso país começou sua transformação – de lavouras a indústrias, das atividades artesanais a produção em escala. Paul Lafarge, em seu livro Direito a preguiça, publicado em 2005, descrevia as fábricas como “[...] casas ideais de correção onde massas operárias são encarce- radas, onde se condenam a trabalhos forçados, durante 12 a 14 horas, não só os homens, como também as mulheres e as crianças” (LAFARGE, 2003, p. 27). 10 11 De maneira incomodante, ele descreve as funcionárias que ali trabalhavam: “[...] hoje as moças e as mulheres estão na fábrica, insignificantes flores de cores pá- lidas, com o sangue sem força, estômago deteriorado, os membros sem energia” (LAFARGE, 2003, p. 29). Em nota no final do seu livro, Lafarge reproduz as palavras daquela época, de um respeitado manufatureiro na cidade de Bruxelas, em 1857, que dizia: Introduzimos algumas distrações para as crianças. Nós as ensinamos a cantar durante o trabalho, e também a contar enquanto trabalham: isso as distrai e as faz aceitar com coragem aquelas doze horas de trabalho que são necessárias para lhes proporcionar os meios de subsistência. (LAFARGE, 2003, p.89) Indústria de madrepérola: Mississippi – Botão de moagem em uma fábrica por mulheres trabalhadoras, disponível em: http://bit.ly/2UkHZgaEx pl or Ler tais relatos nos dias de hoje, chega a incomodar nossas emoções; infeliz- mente, naquela época, as pessoas eram forçadas a trabalhar tamanha jornadas de trabalho para conseguir custear a vida na cidade, pois saíram do campo com o pensamento de que na cidade, no meio urbano, a vida seria melhor. Entre essas duas décadas de lutas por direitos e vidas perdidas por condições insalubres de trabalho, além, é claro, da infância roubada das crianças que viviam nas fábricas para melhorar a renda familiar, a Sociedade viu que havia a necessida- de de mudanças, dando assim início à política de Wellfare State – em português: política do bem estar. Fernando Mascarenhas, professor da UNB – Universidade de Brasília, apresen- tou em sua Dissertação de Mestrado essa transição, essas mudanças na Política e a criação das Leis Trabalhistas, garantindo ao trabalhador: Seguro Desemprego, Previdência, Proteção Legal do trabalhador, dessa forma, criando os direitos à cida- dania, dentre eles, o direito ao lazer (MASCARENHAS, 2005). A criação das Leis Trabalhistas tinha um enfoque mais prático – o objetivo dos empresários ao aceitar tais imposições estava focado na melhoria da produtividade de seus trabalhadores. Vejamos: um corpo cansado consegue produzir igual a um corpo descansado? Pense no seu dia a dia – seu rendimento profissional é o mesmo no início da semana e mais para o final da semana? Se você não tiver uma boa noite de sono, uma alimentação adequada, a probabi- lidade de seu rendimento cair é altíssima; assim era com aqueles trabalhadores que labutavam por jornadas de trabalho extensas e desgastantes. 11 UNIDADE História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Entre os direitos à cidadania, focaremos no direito ao dia de descanso. Na con- cepção dos políticos e empresários, o dia livre do trabalho a priori deveria ser associado ao descanso do corpo e ao cultivo da espiritualidade, visto que com toda a jornada extensa de trabalho, homens e mulheres deixaram de vivenciar suas reli- giões por falta de tempo ou por esgotamento físico e mental. Seguindo a História, nos deparamos com o período em que o lazer se distancia da ideia do prazer intrínseco, da busca pelo intelecto, do ócio da Era Antiga – e nos deparamos com o período em que o lazer se associa ao descanso, às necessidades psicobiológicas do ser humano, para assim produzir mais e melhor. Por fim, chegamos à era que estamos vivendo, a era em que o lazer associa-se à diversão e ao consumismo. Faz parte do lazer a diversão; por outro lado, assistimos a realidade de uma Sociedade que tem visado mais ao TER que ao SER; o foco maior em quantificar o lazer por meio de compras ao invés do experimentar as sensações de uma determinada vivência. Exemplo disso, muitas vezes, está nas atividades em família, em que levar a criança no Shopping e comprar o que ela quer é mais valorizado pelos adultos do que estar com a criança e vivenciar as escolhas dela. Há algum tempo, o lazer tem sido visto como uma mercadoria que se compra, e não que se vivencia. Martins (2013) descreve o lazer no período em que vivemos como:“O mun- do hipermoderno tomado pelo consumismo termina por influenciá-lo de forma a deteriorá-lo, mercantilizá-lo, coisificando-o e empobrecendo-o de significados” (MARTINS, 2013, p. 14). Figura 2 – Shopping – Mulher com várias sacolas nas mãos Fonte: Getty Images Podemos, sim, comprar uma passagem para uma viagem, hospedagem em um Hotel legal e passeios no local, mas o mais importante não são os valores atribuídos a tais compras e sim as experiências vividas naquele local, na riqueza 12 13 do descobrimento de novas culturas, seja ela gastronômica, seja musical, arquite- tônica, sejam outras. Infelizmente, hoje, o tempo destinado ao lazer está cada vez mais escasso e, quando permitido, tais vivências não temos o repertório, o conhecimento sobre as possibilidades de lazer; dessa forma, tornando-nos limitados às experiências que somente o lazer pode propiciar ao homem. Toda e qualquer vivência no âmbito do lazer deve por conceito próprio do lazer ofertar a possibilidade de prazer intrínseco ao sujeito, independente da escolha da atividade. Assim, quero fazer uma pergunta: Quais são as possibilidades de lazer? Se pensarmos em categorias, em interesses do lazer, quais atividades no dia a dia são atividades do amplo conceito do lazer? Ex pl or Bem, pensou? Então, agora, quero recapitular com você os interesses do lazer. Dois autores importantes descrevem tais interesses. Joffre Dumazedier (1975 e 1980) descreve cinco interesses: artístico, intelectual, físico-esportivo, manual e social e, anos depois, Camargo (1986) descreve o sexto, que vem a ser o turístico. Recentemente, Gisele Schwartz (2003) descreveu o sétimo interesse, o vir- tual, ainda em discussão no meio acadêmico; entretanto, é válido pensarmos na possibilidade. Exemplos de cada interesse: • Artístico: visita a Museus e a Bibliotecas, ir ao Cinema, Teatro e/ou Shows, assistir televisão, tocar algum instrumento e ouvir músicas; • Intelectual: jogos como damas, xadrez, gamão, memória, participar de pales- tras e Cursos, leituras de livros, revistas e/ou jornais; • Físico-esportivo: esportes coletivos e individuais recreativos e/ou competi- tivos em que os atletas não são profissionais, desenvolvem tais esportes no tempo livre, sem a obrigação ordinal do trabalho em si; • Manual: artesanato, carpintaria, marcenaria, corte e costura, culinária e jar- dinagem; • Social: festas, casas noturnas, encontros em Restaurantes, Pizzarias, Lancho- netes, Clubes e Bares; • Turístico: viagens regionais, nacionais, internacionais, parques temáticos; • Virtual: jogos eletrônicos e Redes Sociais. Agora que já dialogamos sobre o conceito do lazer, sua história e seus interesses, é importante entender outros conceitos que há dentro do lazer. 13 UNIDADE História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Equipamentos Específicos e Não Específicos de Lazer Com a velocidade com que muitas cidades foram desenvolvidas, muitos dos espa- ços naturaisforam sendo destruídos para a formação dos centros urbanos. É possível observar em bairros mais antigos pouco espaço para socialização da população, pois ou a localização está voltada para o centro comercial ou é um espaço de moradias. Hoje, há Políticas Públicas voltadas à Arquitetura e ao Urbanismo de novos bair- ros, assegurando ao local espaço específico de lazer, assim como espaços específi- cos para Educação e saúde (AZEVEDO; BRAMANTE, 2017). Mas afinal, o que vem a ser equipamento específico de lazer? Equipamento específico de lazer são locais construídos e destinados à vivência no âmbito do lazer, como praças, parques, bosques e quadras esportivas. Há também equipamentos não específicos de lazer que utilizamos para tal fim, como shoppings, bares, pátios das escolas, avenidas e ruas. Leia mais no capítulo 13 do livro Gestão Estratégica das experiências de lazer, de Paulo Henrique Azevêdo e Antonio Carlos Bramante.Ex pl or Por que devemos identificar tais equipamentos? Vejamos: se o local foi criado para o lazer, o ambiente apresenta o mínimo de estrutura para tais vivências, como, por exemplo, o parque, no qual há trilhas, qua- dras, ambientes naturais para contemplação etc. Quando o local não foi criado para o lazer, mas o utilizamos como espaço para o lazer, é preciso buscar meios para adaptar esse espaço para tal vivência – exem- plificando, podemos pensar na avenida Paulista, em São Paulo, aos domingos: ela é fechada para manifestações culturais e esportivas. Por meio da permissão do Poder Público, uma das principais avenidas da capital do Estado de São Paulo se fecha ao longo do domingo para vivências no âmbito do lazer. Figura 3 – Avenida Paulista Fonte: Getty Images Figura 4 – Parque Vila Lobos Fonte: Getty Images 14 15 Barreiras para o Lazer O que são barreiras para você? Ex pl or Pois bem, no lazer, assim como em outras inúmeras experiências do cotidiano, há algumas barreiras que dificultam ou não permitem que vivenciamos tal experi- ência desejada. As barreiras são os obstáculos que impedem ou dificultam o acesso ao lazer, às vivências no tempo livre que são escolhidas por anseio do prazer intrínseco, como, por exemplo: desejo de viajar e conhecer a África do Sul, explorar a natureza por meio de um Safari; entretanto, não tenho condições financeiras para custear todo o passeio. A seguir, veja uma lista com uma série de barreiras para o lazer: • Fatores econômicos; • Gênero; • Faixa etária; • Plano cultural; • Classe social; • Nível de instrução; • Acesso ao espaço; • Violência. Leia sobre as barreiras no capítulo As barreiras para o lazer, do livro Estudos do lazer: uma introdução, de Nelson Carvalho Marcellino.Ex pl or Duplo Processo Educativo do Lazer Nas palavras de Marcellino (2012, p. 54) o duplo processo educativo do lazer é: [...] um posicionamento baseado em duas constatações: a primeira, de que o lazer é um veículo privilegiado de educação; a segunda, de que para a prática das atividades de lazer é necessário o aprendizado, o estímulo, a iniciação aos conteúdos culturais que possibilitem a passagem de níveis menos elaborados, simples, para níveis mais elaborados, complexos [...]. 15 UNIDADE História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Esse duplo processo educativo é dividido em: EDUCAÇÃO LAZER PARA PELO Figura 5 Quando utilizamos o PARA, queremos dizer que as orientações dadas previa- mente são direcionadas à experiência do lazer em si, sem qualquer outro interesse ou busca que não seja a vivência no âmbito do lazer. Essa educação está pautada no objetivo de criar um repertório de informações acerca da vivência a fim de dar a possibilidade plena da experiência. Como diz Marcellino, desenvolve-se a iniciação dos níveis menos elaborados com o intuito de alcançar os níveis mais elaborados. Ao utilizar o PELO, queremos dizer que o lazer será uma estratégia, uma ferra- menta utilizada para ensinar algum outro conteúdo. O foco aqui não é em si a busca pelo lazer em si, pelo prazer intrínseco e sim o aprendizado de um novo conteúdo de maneira divertida. É muito comum utilizarmos essa estratégia em ambientes es- colares, cujo objetivo é ensinar conteúdos escolares por meio de atividades lúdicas. Ludicidade Você sabe o que é ludicidade? Ex pl or Muitas vezes, utilizamos a palavra “lúdico” para identificar o estilo da atividade, da vivência ou do aprendizado. Por exemplo, aula lúdica, jogos lúdicos, leitura lúdica. Essa palavra tem origem do latim ludus, que quer dizer jogo. Poderíamos parar nossas buscas por significados aqui certo? Afinal, muitas das atividades lúdicas que conhecemos são desenvolvidas por meio dos jogos. NÃO... não vamos parar, pois é de suma importância compreender a origem das palavras e seus conceitos para assim saber incorporar tais Teorias às nossas práticas profissionais. Ao longo da evolução semântica da palavra “lúdico” foi sendo incorporado em seu conceito a ciência da psicomotricidade, entendendo que o lúdico vai além de um simples jogo. Ele apresenta um traço importante no desenvolvimento psicomo- tor do ser humano. 16 17 Em 2009, a especialista Anne Almeida publicou um artigo intitulado “Recreação Ludicidade como instrumento pedagógico”, em que discute a essência do lúdico, a importância atribuída à ludicidade nas questões do desenvolvimento psíquico e motor, em especial na infância. Essa pesquisadora diz que: A ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser vista apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lú- dico facilita a aprendizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa saúde mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de socialização, comunicação, expressão e construção do conhecimento. (ALMEIDA, 2009) Pimentel (2010) cita Bracht (2003) ao problematizar o lúdico no dia a dia do ser humano. Podemos utilizar a ludicidade para atividades educacionais planejadas, assim como precisamos da ludicidade no âmbito empresarial, seja para criar uma propaganda, seja para criar um produto, seja para melhorar a produtividade. Autores como Luckesi discorrem sobre ludicidade, caracterizando-a por experi- ências de plenitude, vivências em que o sujeito se envolve por inteiro, ações vividas e sentidas, sendo até mesmo difícil de descrever, entretanto compreendida pela fruição, pela possibilidade de explorar as fantasias, a imaginação do ser humano. Pensar no ludus somente como jogo não torna seu pensamento errado; por ou- tro lado, você limita as possibilidades desse jogo. Nas sociedades nascentes, muitas das regras sociais foram derivadas de jogos, como os direitos, deveres, privilégios e responsabilidades (CAILLOIS, 1990 apud PIMENTEL, 2010). É preciso compreender que a ludicidade faz parte do lazer; entretanto ela tem a liberdade de ser vivenciada tanto dentro do tempo livre do ser humano – condição essencial para se caracterizar lazer, como no dia a dia do ser humano – seja no apren- dizado escolar, seja no psicomotor, no desenvolvimento interpessoal na Sociedade. Dessa forma, a ludicidade vai além do descanso e da diversão, ela pode ser a ferra- menta utilizada em várias áreas da vida para a evolução do homem como sujeito e ho- mem como sociedade (CAILLOIS, 1990; BRUHNS, 1993 apud PIMENTEL, 2010). Rubin (2000, apud Pimentel, 2010) apresenta atividades lúdicas como o dese- nhar uma estratégia de resistência das crianças em campos de extermínio, exter- nando seus medos e esperanças por meio da Arte. Pensando nessa possibilidade, as atividades artísticas são ferramentas de gran- de valia em ambientes hospitalares, e por isso atividades de recreação terapêutica pode ter grandes resultados quando instrumentalizadas com atividades lúdicas. Por fim, e não menos importante, mas talvez por ainda não haver um consenso sobre um conceito definido para ludicidade, ouso, como professora da área, utilizar das palavras de Pimentel(2010) para traçar uma possível linha de conceituação: “Lúdico está sendo considerado o ânima do prazer improdutivo, isto é, aquilo que move ou alimenta o jogar, o brincar, o festar e outras atividades pontuadas pelo fim em si mesmo” (PIMENTEL, 2010, p. 19). 17 UNIDADE História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Outro conceito importante trazido por Olivieira (1982 apud PIMENTEL, 2010) é sobre a diferença entre jogo e brincadeira – a primeira se trata de uma atividade com predominância de regras, e a segunda, com predominância da imaginação. Ludicidade: recreação: ludicidade como instrumento pedagógico. Disponível em: https://bit.ly/2Gq2HWa e o livro Teorias do lazer, capítulo 1: Dos clássicos aos contem- porâneos: revendo e conhecendo importantes categorias referentes às teorias do lazer. Ex pl or Recreação Waichman (2004), em sua publicação intitulada A respeito dos enfoques em recreação, discute vários conceitos acerca da recreação. Recreação: Segundo o Mini Aurélio – Minidicionário da Língua Portuguesa do século XXI (2001), a palavra recreação tem origem na palavra recreio, que significa: “1. Divertimento, prazer [...]”. Ex pl or Em seu entendimento é possível caracterizar a recreação sendo: • Uma atividade (ou conjunto delas) que; • Possui lugar em um tempo liberado de obrigações exteriores; • O sujeito elege (opta, decide) e; • Provoca-lhe prazer (diversão, entretenimento, alegria). Para Waichman a recreação se caracteriza por “conjunto de atividades que têm como sentido o uso positivo e construtivo do tempo livre” (2004, p.26). O foco da recreação é a busca pela diversão, pelo prazer, lembrando-se de que essas vivências fazem parte do lazer e isso significa a necessidade do tempo livre e disponível para tal vivência. Não se pode participar de uma atividade recreativa durante o período de trabalho, assim como nem todas as atividades fora do trabalho ordinal vem a ser recreação. Importante! Em muitas Empresas, é ofertada a ginástica laboral sem a obrigatoriedade de participar. Dessa forma, o funcionário tem a escolha de participar ou não, caracterizando, assim, um tempo livre que pode ser utilizado para ele se recrear e divertir por meio de bate papo, brincadeiras entre colegas de trabalho ou se prevenir de doenças ocupacionais por meio da prática corporal orientada. Importante! A recreação tem como significado literal o divertimento e o prazer. 18 19 Animação Sociocultural Quem é o profissional que atua com vivências no âmbito do lazer? Quem é o profissional que atua com o duplo processo educativo do lazer, que pode utilizar atividades recreativas assim como atividades lúdicas para conquistar seus objetivos? Ex pl or Essas perguntas por muito tempo foram respondidas, e até hoje ainda encontra- mos no Mercado de trabalho vários nomes para tal profissional. Há quem os chame de recreadores, recreacionistas, monitores, consultor de lazer e militante cultural, entre outras (MARCELLINO, 2000 apud AZEVEDO; BRAMANTE, 2017). Essa multiplicidade de denominações existe pois, ao longo da evolução do lazer e de suas possibilidades, foram aumentado as atribuições dadas ao profissional que atua nessa área. Stoppa e Isayama em 2001 (apud AZEVEDO; BRAMANTE, 2017) afirmaram que para algumas dessas denominações não há formações específicas para a função. Para compreendermos essa profissão, é importante compreender o conceito dado à animação sociocultural pela UNESCO, em 1982: Animação sociocultural é um conjunto de práticas sociais que têm como finalidade estimular a iniciativa e a participação das comunidades no processo de seu próprio desenvolvimento e na dinâmica da vida socio- política em que estão integradas. (UNESCO, 1982 apud AZEVEDO; BRAMANTE, 2017, p. 244) Pois bem, se o lazer está intimamente ligado à cultura, se dentro do âmbito do lazer eu posso desenvolver vivências de possibilidades práticas ou contemplativas, sejam elas com a intenção de recreação, sejam focadas na ludicidade, no mínimo, esse profissional tem de ter embasamento teórico-prático em várias áreas frente ao conhecimento. O meio acadêmico se preocupa muito com a formação desse profissional, e graças a Cursos como este que você esta cursando é possível ampliarmos o co- nhecimento dos futuros profissionais da área, enriquecendo você, aluno(a), com conhecimento acerca do lazer e sua ampla e complexa rede de conhecimento. Marcellino (2010 apud AZEVEDO; BRAMANTE, 2017) salienta a necessidade de romper com a visão tecnicista que muitas vezes nos cega pela comodidade das tarefas. Na visão dele, o importante é buscar a “práxis consciente”, ou seja, uma ação consciente das vivências. A Literatura nos mostra a necessidade da formação do animador sociocultural ser embasada nos conhecimentos políticos, científicos, filosóficos e pedagógicos. A for- mação desse profissional deve ser ampla e contínua, uma vez que estará atuando em diversas possibilidades culturais e com públicos diferentes que trazem consigo conhe- cimentos diferentes e buscam novas experiências (AZEVEDO; BRAMANTE, 2017). 19 UNIDADE História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Isayama (2013 apud AZEVEDO; BRAMANTE, 2017) descreve a formação do animador sociocultural em dois momentos: o primeiro focado nas questões técni- cas, embasamentos teóricos, conhecimento das possibilidades, e a segunda focada em desenvolvimento da formação centrada no conhecimento – cultura e crítica, cujo objetivo é a construção dos saberes, sempre alicerçados nas políticas da nossa sociedade democrática, assim, como uma visão crítica sobre seu papel como pro- fissional da Educação no duplo processo do lazer. Veremos mais sobre a formação do animador sociocultural no próximo módulo, assim como outros pontos importantes para a atuação desse profissional no campo do lazer. Leia mais sobre a formação do animador sociocultural no livro Gestão Estratégica das experiências de lazer, capítulo 18, dos autores Paulo Henrique Azevêdo e Antonio Carlos Bramante. Ex pl or Importante! O lazer surgiu em contraposição ao trabalho e desde a Era Antiga já havia essa diferen- ciação entre trabalho x lazer. Na Idade Antiga, o lazer era visto como um período de desenvolvimento pessoal, o prazer intrínseco era buscado nas manifestações artísticas e culturais. Ao correr na linha do tempo, podemos observar que o lazer passa a ter outro objetivo pós-Revolução Industrial. Se antes o objetivo era o desenvolvimento pessoal, nesse perí- odo, o lazer é marcado pelo descanso. Nessa época, observou-se que descansar não estava associado diretamente ao descanso físico, visto que práticas corporais eram muito vivenciadas pelos trabalhadores como ati- vidades no âmbito do lazer, assim como vivências na natureza. Por fim, hoje, vivemos uma era focada no consumismo, em que o lazer tem sido cada vez menos explorado na sua essência; por outro lado, também vivemos a era da diversão, a busca por vivências que nos tiram das atividades alienantes do dia a dia. Embora haja vários conceitos acerca do lazer, é importante observar que todos estão embasados em características que ouso chamar de tripé do conceito do lazer: tempo livre – disponibilidade de tempo; caráter desinteressado – sem objetivo de ganho monetário e liberdade de escolha: busca pelo prazer intrínseco. Recreação são atividades realizadas nos intervalos, nos recreios das obrigações cujo ob- jetivo é se divertir e sentir prazer no tempo livre. Ludicidade tem como base o jogo; entretanto, o termo lúdico vai além do jogar. Ele explora o co- nhecimento, o aprendizado psicomotor, as emoções e as superações que o jogo pode oferecer. O termo ludicidade é muito utilizado em ambientes educacionais devido à amplitude de suas possibilidades no desenvolvimento do ser humano como sujeito e como Sociedade. Para finalizar, iniciei com você o conhecimento sobre o animador sociocultural; desen- volvi o breve histórico das inúmeras formas que esse profissionaljá foi e, em algumas situações, ainda é chamado a atuar com o lazer, assim como a necessidade de formação ampla e contínua para ter liberdade na prática profissional. Em Síntese 20 21 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Gestão Estratégica das experiências de lazer AZEVEDO, P. H.; BRAMANTE, A. C. Gestão Estratégica das experiências de lazer. Curitiba: Appris, 2017; Lazer, trabalho e educação: relações históricas, questões contemporâneas GOMES, C. L. Lazer, trabalho e educação: relações históricas, questões contempo- râneas. 2.ed. Belo Horizonte: UFMG, 2008; Estudos do lazer: uma introdução MARCELLINO, N. C. Estudos do lazer: uma introdução. 5.ed. Campinas: Autores Associados, 2012; Teorias do Lazer PIMENTEL, G. G. A. Teorias do Lazer. Maringá: Eduem, 2010. Leitura Recreação: ludicidade como instrumento pedagógico https://bit.ly/2Gq2HWa 21 UNIDADE História e Conceito de Animação Sociocultural, Lazer e Recreação Referências ALMEIDA, A. Recreação: Ludicidade como instrumento pedagógico. Coopera- tiva do Fitness, 2009. Disponível em: <https://www.cdof.com.br/recrea22.htm>. Acesso em: 26 nov. 2018. AZEVEDO, P. H.; BRAMANTE, A. C. Gestão Estratégica das experiências de lazer. Curitiba: Appris, 2017. CAMARGO, L. O. L. O que é lazer? São Paulo: Brasiliense, 1986. DUMAZEDIER, J. Questionamento teórico do lazer. São Paulo: SESC, 1975. ________. Valores e conteúdos culturais do lazer. São Paulo: SESC, 1980. ________. Lazer e cultura popular. São Paulo: Perspectiva, 1974. FERREIRA, A. B. H. Miniaurélio Século XXI: o minidicionário da língua portu- guesa. 4.ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000. GOMES, C. L. Lazer, trabalho e educação: relações históricas, questões contem- porâneas. 2.ed. Belo Horizonte: UFMG, 2008. LAFARGE, P. O direito à preguiça. São Paulo: Claridade, 2003. LUCKESI, C. Ludicidade e atividades lúdicas: uma abordagem a partir da expe- riência interna. Disponível em: <http://portal.unemat.br/media/files/ludicidade_e_ atividades_ludicas.pdf>. Acesso em: 21 nov. 2018. MARCELLINO, N. C. Estudos do lazer: uma introdução. 5.ed. Campinas: Auto- res Associados, 2012. ________. Lazer e educação. 2.ed. Campinas: Papirus, 1990. MARTINS, J. C.; BAPTISTA, M. M. O ócio nas culturas contemporâneas – Teorias e novas perspectivas em investigação. In. ________. (org.) Tempo livre, ócio e lazer: sobre palavras, conceitos e experiências. Coimbra: Grácio, 2013. p. 11-22. MASCARENHAS, F. Entre o ócio e o negócio. Teses acerca da anatomia do lazer. 2005. 320f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2005. PIMENTEL, G. G. A. Teorias do Lazer. Maringá: Eduem, 2010. SCHWARTZ, G. M. O conteúdo virtual do lazer: contemporizando Dumazedier. Licere, Belo Horizonte: v. 2, n. 6, 2003, p. 23-31. WAICHMAN, P. A. A respeito dos enfoques em recreação. Rev. da Educação Física/UEM, Maringá, v. 15, n. 2, p. 22-31, 2004. 22
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