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Ana Luiza Spiassi Sampaio @anassampaioo Síndrome de má absorção intestinal • Resultado da hidrólise ineficiente de nutrientes (má digestão) e de defeitos na absorção intestinal pela mucosa (má absorção propriamente dita) e no transporte de nutrientes para a circulação sanguínea (no caso dos carboidratos e proteínas) e linfática (no caso das gorduras); • Problemas na digestão e no transporte de nutrientes também causam má absorção; ETIOLOGIA E CLASSIFICAÇÃO FISIOPATOLÓGICA • A digestão e a absorção dos nutrientes envolvem três fases: 1) Fase luminal: processos de digestão intraluminal dos nutrientes; 2) Fase mucosa: digestão complementar (hidrólise executada pelas oligossacaridases e peptidases da borda em es - cova) e absorção pela mucosa; 3) Fase de transporte: relacionada à passagem dos nutrientes para a circulação sanguínea e linfática • A má absorção intestinal pode ser classificada em condições que afetam as fases luminal (pré- entérica), mucosa (entérica) e de transporte (pós-entérica); o Doença celíaca: má absorção ocorre por lesão da mucosa; • Lesão da mucosa ➝ provoca redução na liberação de secretina e colecistocinina (CCK) ➝ redução na estimulação pancreática e déficit na digestão; • Absorção de nutrientes, vitaminas e sais minerais: depende de várias etapas ➝ solubilização; liberação do substrato ou ligação a fatores; alteração química; digestão de macromoléculas; funcionamento motor e sensitivo do intestino; funções hormonais e neuro- humorais; absorção e transporte pós-mucosa - qualquer uma delas pode estar comprometida na síndrome de má absorção; Ana Luiza Spiassi Sampaio @anassampaioo • As causas de má absorção intestinal podem ser divididas de acordo com as fases dos processos de digestão e absorção normais: o Distúrbios na mistura; o Distúrbios na hidrólise luminal dos nutrientes - em especial a lipólise; o Distúrbios na formação de micelas; o Distúrbios na hidrólise da borda em escova; o Distúrbios na absorção pela mucosa; o Distúrbios no transporte de nutrientes; o Mecanismos não totalmente esclarecidos; Distúrbios na mistura: • Pacientes submetidos à gastrectomia parcial com reconstrução a Billroth II (gastrojejunoanastomose); • A síndrome de má absorção é resultante da liberação de secreções biliares e pancreáticas distante de onde o quimo chega ao jejuno; • Apresentam tendência ao supercrescimento bacteriano, pelas anastomoses criadas pelo procedimento; Distúrbios na hidrólise luminal dos nutrientes: • Lesão da mucosa provoca déficit na digestão luminal dos nutrientes por falta de estímulo pancreático pela secretina e CCK; • Lipase pancreática: enzima responsável pela degradação dos lipídios ➝ condições que podem prejudicar sua síntese ou ativação: deficiência congênita de lipase pancreática; hipersecreção ácida gástrica (síndrome de Zollinger-Ellison ou gastrinoma); destruição da glândula pancreática (por fibrose cística (mucoviscidose)); inflamação crônica (pancreatite crônica) ou neoplasia; Distúrbios na formação de micelas: • Após a lipólise, o produto resultante (ácidos graxos e glicerol) interage com sais biliares e fosfolipídios para a formação de micelas, e sob essa forma ocorre a maior parte da absorção desses nutrientes; • As micelas incorporam colesterol e vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K) em seus centros hidrofóbico; • Condições em que a síntese (cirrose hepática), transporte (obstrução das vias biliares) ou reabsorção (lesão do íleo terminal como na doença de Crohn ou ressecção ileal) das micelas estejam prejudicados, ou em casos de remoção ou inativação luminal dos sais biliares - existe uma concentração mínima de sais biliares necessária para a formação de micelas - (uso de colestiramina, quelando os sais biliares, desconjugação precoce dos sais biliares no super - crescimento bacteriano de delgado etc.) ocorre má absorção; • Se caracteriza principalmente pela deficiência de vitaminas lipossolúveis; • Diminuição na síntese ou transporte/secreção de sais biliares o Doenças hepáticas, colestáticas ou não, e obstrução dos ductos biliares podem causar má absorção; o Cirrose biliar primária - manifestação mais comum é a doença óssea, como osteoporose e osteomalácia; • Supercrescimento bacteriano: o Principais causas estão relacionadas à diminuição da secreção ácida pelo estômago (gastrite atrófica, uso de antiácidos ou cirurgias gástricas que diminuem a secreção cloridropéptica) e à diminuição da motilidade intestinal (diabete melittus ou esclerodermia); o Condições anatômicas ou pós-cirúrgicas que causam estase ou recirculação das bactérias também provocam o supercrescimento; o Bactérias anaeróbias desconjugam precocemente os ácidos biliares, que são mais facilmente absorvidos no delgado superior, diminuindo a concentração luminal e prejudicando a formação de micelas; ▪ Os ácidos biliares desconjugados perdem seu poder de solubilizar as gorduras; ▪ Bactérias utilizam a vitamina B12 para a produção de folato e liberam proteases que degradam dissacaridases presentes na borda em escova do intestino delgado ➝ deficiência na hidrólise complementar da mucosa intestinal e de vitamina B12; ▪ Diarreia aquosa; Distúrbios na hidrólise da borda em escova: • Intolerância à lactose: deficiência adquirida de lactase é a causa mais comum de má absorção seletiva de carboidratos; o Ocorre principalmente por uma diminuição em sua síntese, por deficiência no transporte intracelular e na glicosilação da lactose; Ana Luiza Spiassi Sampaio @anassampaioo o Quadro clínico: dor abdominal em cólica, flatulência e eructações após ingestão de leite e derivados; pode ocorrer diarreia osmótica; o Etiologias secundárias (reversíveis): gastroenterite aguda (viral ou bacteriana), giardíase, doença celíaca e supercrescimento bacteriano; • Intolerância à trealose (deficiência de trealose): sintomas semelhantes aos da intolerância à lactose; Distúrbios na absorção pela mucosa: • Infecções: o Giardia intestinalis: ▪ Quadro clínico: pode variar de assintomático até diarreia crônica, esteatorreia, desnutrição e retardo de crescimento; ▪ Fatores que provocam quadros mais graves: hipogamaglobulinemia, alta densidade de parasitas e fatores relacionados à própria virulência do protozoário; ▪ Casos de má absorção: atrofia subtotal de vilos, com hiperplasia de criptas e infiltração intraepitelial de linfócitos; ▪ Pode ser acompanhada de supercrescimento bacteriano, desconjugação de sais biliares e inibição de enzimas; o Doença de Whipple: ▪ Causada pelo Tropheryma whippelii; ▪ Multissistêmica (envolve TGI, SNC, coração e articulações); ▪ Quadro clínico: diarreia e má absorção de pelo menos duas substâncias não correlatas (xilose e vitamina B12); o Enterite actínica: ▪ Pacientes submetidos à radioterapia por tumores pélvicos podem desenvolver quadros de diarreia até 20 anos após as sessões, por má absorção de sais biliares, vitamina B12 e lactose; ▪ Quadro típico: endarterite obliterativa de pequenos vasos; Distúrbios no transporte de nutrientes: • Distúrbios na drenagem linfática: aumento na pressão do sistema linfático ➝ perda e até ruptura dos vasos linfáticos ➝ extravasamento para o lúmen intestinal de lipídios, gamaglobulina, albumina e linfócitos ➝ diarreia e edema, por hipoalbuminemia; o Etiologia: linfangiectasia intestinal congênita primária e linfangiectasias secundárias ao linfoma, à tuberculose, à blastomicose, ao lúpus, à doença de Crohn, ao sarcoma de Kaposi, à fibrose retroperitoneal, à pericardite constritiva e à insuficiência cardíaca congestiva em graus avançados; • Enteropatia perdedora de proteínas: o Com dano na mucosa: linfoma, doençacelíaca, espru tropical, doença de Whipple, lúpus eritematoso sistêmico (LES) e supercrescimento bacteriano; o Com lesão linfática; Mecanismos não totalmente esclarecidos: • Hipoparatireoidismo, insuficiência de suprarrenal, hipertireoidismo e síndrome carcinoide; SÍNDROME DE MÁ ABSORÇÃO INTESTINAL NO IDOSO • Prevalência aumentada de certas afecções com o aumento da idade ➝ a pancreatite crônica e o supercrescimento bacteriano; • Pode haver má absorção por isquemia intestinal crônica; • Investigação em etapas: o Primeira etapa: exames gerais ➝ hemograma, provas de atividade inflamatória (velocidade de hemossedimentação – VHS, proteí - na C-reativa, alfa-1-glicoproteína ácida), eletrólitos, função renal, função hepática, ferro sérico, dosagem de vitamina B12, folato, hormônios tireoidianos, marcadores sorológicos para doença celíaca (antiendomísio, antitransglutaminase), parasitológico de fezes etc; ▪ Quando disponíveis, testes respiratórios para avaliação de intolerância à lactose e de supercrescimento bacteriano também são recomendados nessa fase; o Segunda etapa: aprofundamento da investigação laboratorial (dosagens hormonais - gastrina, calcitonina, polipeptídio intestinal vasoativo (VIP), dosagem do ácido 5-hidroxi- indolacético na urina de 24 horas (tumor carcinoide etc.) Ana Luiza Spiassi Sampaio @anassampaioo ▪ Se os testes respiratórios não tiverem sido feitos , poderão ser realizados nessa etapa; ▪ Exames de imagem - trânsito intestinal de delgado, tomografia computadorizada (enterografia por TC) - e exames endoscópicos – endoscopia (com biópsias duodenais) e colonoscopia; o Terceira etapa: endoscópicos mais refinados – enteroscopia e cápsula endoscópica; ▪ Exames laboratoriais, até então não solicitados, podem ser pedidos; ▪ Testes de medicina nuclear - PET-scan; HISTÓRIA CLÍNICA • Diferenciar se a natureza dos sintomas é orgânica ou funcional; se a diarreia é alta (tipo delgada, com ou sem esteatorreia) ou baixa (tipo colônica, inflamatória); • Verificar se há fatores de piora e/ou melhora da diarreia (consumo de leite e derivados, alimentos contendo glúten); • Sintomas sugestivos de doença orgânica: perda de peso, diarreia com duração menor que três meses, anemia e sangramento, paciente é acordado à noite pela diarreia; • Diarreia de origem colônica ou inflamatória: fezes líquidas ou pastosas, com muco, sangue ou pus (disenteria) e, frequentemente, é acompanhada de tenesmo e puxo; • Quadro de má absorção: acompanhado de esteatorreia - fezes de coloração pálida, em grandes volumes, espumosas, brilhantes e com tendência a flutuar; • Distensão abdominal e flatulência são comuns ➝ resultam da fermentação excessiva pela microbiota colônica dos carboidratos não absorvidos; • Perda de peso ➝ casos graves; • Avaliar história de cirurgias prévias com ressecções extensas do intestino, doença pancreática prévia, uso crônico de álcool, viagens recentes, doenças sistêmicas como diabete melito, hipertireoidismo e colagenoses, bem como história familiar de neoplasia, doença inflamatória intestinal e doença celíaca; QUADRO CLÍNICO • Sintomas: causados pela maior passagem de nutrientes não absorvidos pelo trato digestivo ou pelas deficiências nutricionais que resultam de uma absorção inadequada; • Sintoma mais comum: diarreia crônica; o Esteatorreia: quando ocorre a absorção inadequada de gorduras no trato digestivo, as fezes contêm um excesso de gordura e ficam com cor clara, moles, volumosas, gordurosas e fétidas; o Absorção inadequada de determinados açúcares pode provocar diarreia explosiva, distensão abdominal e flatulência; • A má absorção pode causar deficiência de nutrientes ou deficiências seletivas de proteínas, gorduras, açúcares, vitaminas ou minerais; • Má absorção geralmente causa perda de peso ou dificuldade de manter o peso, apesar do consumo adequado de alimentos; • Mulheres podem parar de menstruar; • Deficiência de proteínas: pode causar inchaço e acúmulo de líquidos (edema) em qualquer parte do corpo, secura da pele e queda de cabelo; • Anemia: causada por uma deficiência de vitaminas ou ferro; pode causar fadiga e fraqueza. • Diarreia, borborigmos ➝ deficiência de dissacaridase ou infecção intestinal; • Distensão abdominal, cólicas, flatulência ➝ aumento na produção de H2/CO2/CH4; • Perda de peso ➝ má absorção de nutrientes; • Tetania, parestesias, fraturas patológicas ➝ deficiência de Vit. D, cálcio e magnésio; • Sangramentos/ Equimoses ➝ deficiência de Vit.C e K; • Glossite/quelite ➝ deficiência do complex B , ác. Fólico e ferro; • Edema ➝ hipoalbuminemia; • Amenorreia, diminuição da libido ➝ hipoproteinemia, deficiência da vit. E; • Nictalopia ➝ deficiência de vit. “A”; • Acrodermite ➝ deficiência de ac. Graxos essenciais e zinco; • A1lterações nas fezes: esteatorreia, fezes aquosas➝ pancreatopatias; • Fadiga, fraqueza ➝ anemia; Ana Luiza Spiassi Sampaio @anassampaioo EXAMES LABORATORIAIS • Exames básicos: hemograma completo, função hepática, função tireoidiana, dosagem de folato e vitamina B12, zinco, provas de atividade inflamatória, ureia e creatinina, eletrólitos, ferro, ferritina e parasitológico de fezes; • Marcadores sorológicos para a doença celíaca ➝ testes antiendomísio (IgA) e antitransglutaminase (IgA); o Suspeita de doença celíaca, com exames sorológicos forem negativos ➝ endoscopia digestiva alta e biópsias duodenais - pacientes com deficiência de IgA, os testes sorológicos são falsamente negativos; • Suspeita de infecção por ameba ou giárdia: exame a fresco de pelo menos três amostras de fezes; • Avaliação da absorção de gordura: exame qualitativo das fezes - coloração Sudan III; • Avaliação da perda proteica: medida do clearance da alfa-1-antitripsina - marcador de perda proteica intestinal.; o Valores maiores que 25 mL/dia: associados a hipoalbuminemia; • Avaliação de absorção de carboidratos: o Análise química das fezes - açúcares são fermentados no cólon➝ queda no pH fecal para nível menor que 5,5 sugere má absorção de carboidratos; o Teste respiratório com hidrogênio - lactose ou sacarose são ingeridos e, caso não sejam absorvidos no intestino delgado, passam para o cólon, sofrendo fermentação pelas bactérias e tendo como subproduto o hidrogênio; teste falso-positivo pode ocorrer nos casos de supercrescimento bacteriano; • Exames de imagem: o Exame radiológico simples do abdome: identificação de fístulas, tumores e condições que facilitem a hiperproliferação bacteriana (divertículos ou alças com hipomotilidade ou dilatação); o TC: detecção de lesões focais intestinais (espessamento da parede do delgado, fístulas e dilatação de alças intestinai); ensível na avaliação do aumento dos linfonodos abdominais (doença de Whipple, linfoma, tuberculose, blastomicose e doença de Crohn); • Exames endoscópicos: o Úlceras aftoides: sugere doença de Crohn; o Pontos esbranquiçados: linfangiectasia primária e secundária; o Redução do número de pregas, com mucosa nodular ou com padrão em mosaico: sugestivos de doença celíaca; o Colonoscopia: investigação da diarreia crônica; útil no diagnóstico da doença inflamatória intestinal, do câncer colorretal e na obtenção de biópsias para o diagnóstico da colite microscópica; TRATAMENTO • Direcionado para a condição subjacente; • Correção dos déficits eletrolíticos e nutricionais; • Pacientes desnutridos, com lesão intestinal: terapia enteral com dieta oligomérica - à base de di e tripeptídios, (são mais bem absorvidos que os aminoácidos) • Doença de Whipple: antibióticos; • Condições crônicas: o Doença celíaca: tratada com a retirada do glúten da dieta; o Intolerância à lactose: tratada com a supressão do leite e derivadosda dieta (a enzima lactase pode ser ofertada); o Diarreia aquosa leve a moderada: opioides fracos - loperamida ou difenoxilato; o Casos graves: tintura de ópio ou codeína; o Reposição de eletrólitos e fluidos, minerais (zinco, magnésio) e vitaminas; • Casos de doença pancreática grave, distúrbios linfáticos (linfangiectasia intestinal) e síndrome de intestino curto: triglicerídios de cadeia média (TCM) - absorção dos TCMs dá-se por via sanguínea, e não linfática; Ana Luiza Spiassi Sampaio @anassampaioo REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ASTER, K. A. Robbins Patologia Básica. 10. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. Brasileiro Filho, Geraldo. Bogliolo, Patologia. 9. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. Hall, John E. Tratado de fisiologia médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. Patologia: processos gerais. 6. ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2015. SILVERTHORN, D. Fisiologia Humana: Uma Abordagem Integrada. 7. ed. Artmed, 2017. Tratado de gastroenterologia: da graduação à pós- graduação. Editores Schlioma Zaterka, Jaime Natan Eisig. 2. ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2016.
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