Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Desnutrição energético-proteica Distúrbio da nutrição decorrentes da falta concomitante de calorias e proteínas. Pode ocorrer logo ao nascimento - baixo peso < 2.500g. O estado nutricional é avaliado de acordo com parâmetros antropométricos, como peso, estatura e circunferência braquial. A consequência mais imediata da desnutrição é a morte precoce, cuja probabilidade aumenta em proporção direta ao aumento da gravidade da desnutrição. As consequências a longo prazo incluem perda do desempenho neuropsicomotor, da capacidade cognitiva e doenças crônicas da vida adulta (hipertensão, DM2 e AVC). Desnutrição grave: · Emagrecimento intenso visível. · Alterações de cabelos. · Alterações de pele (dermatoses). · Hipotrofia muscular (especialmente glútea). · Redução do tecido subcutâneo. · Circunferência braquial < 11,5 cm. · Escore Z no gráfico peso x estatura < -3. · Presença de edema nos pés bilateralmente. ETIOLOGIA PRIMÁRIA: combinação de carência alimentar, falta de acesso a condições sanitárias e serviços de saúde e falta de práticas de cuidados infantis. SECUNDÁRIA: provocada por doenças que aumentam as necessidades metabólicas, diminuem a absorção intestinal ou levam à perda de nutrientes. FISIOPATOLOGIA Pela baixa ingesta, a criança se torna hipoativa (a primeira resposta adaptativa do organismo à privação energética). Posteriormente, ocorre parada no crescimento. Alterações hormonais na desnutrição Queda de glicose e aminoácidos Estresse infeccioso Restrição energeticoproteica Aumento de cortisol Aumento de GH Aumento de catecolaminas ALTERAÇÕES METABÓLICAS · Redução global no metabolismo. · Redução dos substratos energéticos: glicólise, lipólise e neoglicogênese. O metabolismo cerebral é mantido à custa de ácidos graxos e corpos cetônicos produzidos pela lipólise. · Aumento de GH. · O estresse pela DEP e as infecções estimulam a secreção de cortisol, que atua aumentando a glicogenólise e a gliconeogênese. · Atividade da bomba de Na/K fica reduzida, e a célula passa a excretar menos sódio e importar menos potássio = hiponatremia e hipocalemia. · Hipomagnesemia. ALTERAÇÕES IMUNOLÓGICAS · Perda da integridade das barreiras. · Redução na população de linfócitos T. · Redução na produção de citocinas. · Deficiência de linfócitos B: a deficiência de IgA é a alteração mais frequente, o que facilita a ocorrência de diarreia e infecção de vias aéreas. ALTERAÇÕES NEUROLÓGICAS · Déficit no DNPM. · Déficit cognitivo. ALTERAÇÕES GASTROINTESTINAIS · Redução na secreção gástrica, pancreática e biliar. · Diminuição na atividade da lactase ➜ intolerância ao leite. · Diminuição da peristalse, favorecendo infecção bacteriana, o que também dificulta a absorção de água e eletrólitos. · Diminuição das vilosidades. · Esteatose hepática, principalmente na forma Kwashiorkor, podendo evoluir com fibrose e cirrose. DIAGNÓSTICO Antropometria: peso, comprimento/estatura, perímetro cefálico, circunferência do braço, prega cutânea. O sinal mais precoce é a insuficiência do crescimento. Ao exame, a criança desnutrida mostra-se apática, letárgica, com nível de atividade inferior ao esperado para sua faixa etária. A diminuição da atividade física na criança é um sinal precoce de desnutrição. FORMAS CLÍNICAS DEP grave: índices de peso ou estatura para idade abaixo de 3 DP da média, circunferência braquial < 115 mm nas crianças entre 6 e 59 meses, edema com cacifo bilateral. As principais síndromes de DEP grave são o marasmo (deficiência predominantemente de ingestão calórica) e o kwashiorkor (déficit fundamental é proteico). · Hipoalbuminemia: presente nas duas formas. · Forma edematosa: kwashiorkor. Crianças que desenvolvem essa forma parecem ter sofrido um maior estresse oxidativo, com redução de antioxidantes naturais (glutationa, vitaminas A, C e E) e cofatores (zinco, cobre e selênio). · Forma não edematosa: marasmo. MARASMO ➜ déficit calórico. KWASHIORKOR ➜ déficit proteico. Marasmo Comment by Maria Eduarda: Especialmente comum no primeiro ano de vida. Forma de DEP grave que resulta de uma DEFICIÊNCIA CALÓRICA TOTAL. É mais comum em crianças com menos de um ano de idade, pelas infecções intercorrentes serem mais comuns. Tem instalação insidiosa, permitindo adaptação à deficiência. · Causa + comum: retirada precoce do aleitamento. · A criança geralmente é internada por infecção, não pela desnutrição. · Atrofia muscular extrema, emagrecimento acentuado, com pobreza de TCSC (perda da bola gordurosa de Bichat) e pele enrugada = fácies senil. Comment by Maria Eduarda: Consome todo o tecido gorduroso. · Em geral, o apetite está preservado, diferente do kwashiorkor. · Anemia e diarreia são comuns. · Cabelos alterados. · Não há edema nem lesões cutâneas. · Pode haver hipoalbuminemia. · Choro forte, irritabilidade. Kwashiorkor Embora a ingesta calórica possa ser adequada, as crianças com kwashiorkor possuem déficit proteico. A instalação é mais rápida e impede a adaptação. É mais comum no segundo e terceiro anos de vida. · Estatura e peso diminuídos para a idade, mas o edema pode mascarar. O EDEMA é a manifestação mais importante e mascara a atrofia muscular dos MMSS e MMII. Em meninos, pode ocorrer edema de bolsa escrotal. · Apatia, hipoatividade, desinteresse, anorexia. · Diferente do marasmo, a criança com kwashiorkor tem TCSC. · Pele da face frequentemente despigmentada, desenvolvendo-se dermatoses em áreas de atrito. Surgem áreas de hiperpigmentação que descamam, dando aspecto de dermatite em escamas. · Cabelos quebradiços e com discromias. · Sinal da bandeira: alteração segmentar da cor dos cabelos. · Anemia na maioria dos casos = deficiência proteica para síntese de eritrócitos, deficiência de ferro e ácido fólico, parasitoses intestinais. · Hepatomegalia (esteatose). Despigmentação da pele Kwashiorkor-marasmático A criança evolui com carências na ingesta proteica e/ou energética, apresentando características dos 2 tipos. Marasmo Kwashiorkor ↧ de crescimento +++ + Atrofia muscular +++ +++ TCSC Ausente Presente Edema Ausente Presente Dermatoses Raro Comum Hepatomegalia Raro Comum Alterações de cabelo + +++ Atividade física Diminuída Muito diminuída Água corporal Aumentada Muito aumentada Anemia Comum Muito comum Albumina Baixa Baixa Marasmo Kwashiorkor Cortisol +++ + GH + +++ Somatomedinas + - Noma Ulceração crônica necrosante da gengiva e das bochechas, geralmente por desnutrição grave e doença infecciosa debilitante. Ocorre uma infecção polimicrobiana. Comment by Maria Eduarda: Fusobacterium necrophorum e Prevotela intermedia CLASSIFICAÇÃO DA DESNUTRIÇÃO Classificação de Gomez Avaliação do déficit de peso em relação ao peso do percentil 50 para sua idade. Não é possível diferenciar a aguda, passada ou crônica. O grande problema é a presença de edema, que aumenta o peso. NORMAL: peso ≥ 91% do p50 de peso para sua idade. LIMITAÇÕES: precisa da idade, não considera estatura e não informa duração. Classificação de Waterlow Leva em consideração o peso para a estatura e a estatura para a idade. É possível avaliar se a desnutrição é aguda ou crônica. Classificação de Welcome Baseia-se no déficit de peso e ausência ou presença de edema. Classificação da OMS DEP E/I Z escore P/E Z escore Moderada -2 a -3 -2 a -3 Grave < - 3 < - 3 TRATAMENTO INDICAÇÕES DE HOSPITALIZAÇÃO: · Crianças cujo peso para a altura esteja < -3 DP (magreza acentuada) ou menos que 70% da mediana dos valores de referência da OMS. · Crianças com edema simétrico envolvendo os pés, no mínimo, estão gravemente desnutridas. · Presença de descompensação. PESO BAIXO (z < -2 e ≥ -3): avaliar as causas, orientar alimentação, uso de ferro profilático em < 24 meses, retorno em 2 semanas. DESNUTRIÇÃO GRAVE (z ≤ -3): · Fase de estabilização (7 dias): identificação e tratamento das condições mais urgentes e ameaçadoras, como hipoglicemia, hipotermia, distúrbios hidroeletrolíticos e acidobásicos, tratar infecções.· Fase de reabilitação (2ª a 6ª semana): alimentação intensiva para recuperar a maior parte do tempo. · Fase de acompanhamento (7ª a 26ª semana). Se edema generalizado, é DEP grave. Fase de estabilização (1-7 dias) CORRIGIR DISTÚRBIOS HIDROELETROLÍTICOS. TRATAR INFECÇÕES: ampi + genta. PRIORIDADE. Sempre se faz. INICIAR ALIMENTAÇÃO (80 a 100 kcal/kg/dia): se consciente, VO. Não pode ser hipercalórica e hiperproteica, se não faz síndrome de realimentação. TRATAR HIPOGLICEMIA: todas as crianças gravemente desnutridas estão em risco de desenvolver hipoglicemia (glicose < 54 mg/dL). Pode ser causada por uma infecção sistêmica. · Se consciente: 50 mL glicose ou sacarose 10% ou alimentar de 2/2h. · Se inconsciente: SG 10% 5 mL/kg IV. TRATAR HIPOTERMIA. DESIDRATAÇÃO: 5 mL/kg a cada 30 min por 2h por VO ou SNG. Depois, 5-10 mL/kg VO ou SNG em horas alternadas por 10 horas. VITAMINA A: crianças gravemente desnutridas estão e alto risco de desenvolverem cegueira por deficiência de vitamina A. Por isso, uma dose alta deve ser dada para todas as crianças no 1º dia de internação – repetir nos dias 2 e 14. · 50.000 UI VO para < 6m. · 100.000 UI para crianças entre 6-12 meses. · Evitar manchas de Bitot, cegueira noturna e ceratomalácia. ÁCIDO FÓLICO: 5 mg no 1º dia e 1 mg/dia, por 2 sem. ZINCO: 2 mg/kg/dia por no mínimo 2 semanas. COBRE: 0,2 mg/kg/dia por no mínimo 2 semanas. ANEMIA: se Hb < 4-6 g/L e distúrbio respiratório 10 mL/kg em 3 horas + furosemida 1 mL/kg IV. ICC: parar toda a ingesta oral e de líquidos IV. Nenhum líquido deve ser dado até que a ICC melhore. · Furosemida 1 mg/kg EV. Fase de reabilitação (2-6 semanas) O grande marcador clínico dessa fase é o retorno do apetite. Dieta hiperproteica, hipercalórica, com reposição de vitaminas e micronutrientes para atingir ganho de peso de 10-15 g/kg/dia. Agora sim se faz ferro. · 150 a 220 kcal/kg. Fase de acompanhamento Acompanhamento semanal até a 26a semana. O risco de recaída é maior logo após a alta, então a criança deve voltar após 1 semana, 2 semanas, 1 mês, 3 meses e 6 meses. SÍNDROME DE RECUPERAÇÃO NUTRICIONAL Ocorre durante o tratamento correto dos casos de desnutrição grave, sendo mais exuberante nos casos de kwashiorkor. · Entre o 20º e 40º dia do tratamento. · Regride por volta da 10ª a 12ª semana. É caracterizada por hepatomegalia, distensão abdominal (ascite), fácies de lua cheia, sudorese, rede venosa colateral, hipertricose e telangiectasias. · Hipergamaglobulinemia. · Eosinofilia. · Aumento da volemia. SÍNDROME DA REALIMENTAÇÃO Ocorre quando a alimentação parenteral ou enteral se dá de forma muito agressiva. Na DEP grave, existe uma depleção intracelular de vários íons. Se a alimentação com carboidratos for muito excessiva, haverá elevação da insulina com marcante hipocalemia, hipofosfatemia e hipomagnesemia. · Fraqueza muscular (fósforo ≤ 0.5 mmMol/L). · Rabdomiólise. · Disfunção de neutrófilos. · Arritmias. · Convulsões. · Morte súbita. Hipofosfatemia + hipomagnesemia + hipocalemia.
Compartilhar