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Conceitos fundamentais da eletrocardiografia João Pedro de Souza Bezerra T29 UFCA Eletrocardiograma é um exame que permite o registro extracelular das variações do potencial elétrico do músculo cardíaco, ou seja, o registro da atividade elétrica do coração. Anatomia e eletrofisiologia Existem dois tipos de miócitos no coração, as fibras musculares contráteis, responsáveis pela função de bomba, e as células do sistema de condução, caracterizadas pelo automatismo, produção de estimulo elétrico e condução da corrente. A entrada de íons é muito diferente entre as células, e, no caso do sistema de condução, a célula não entra em repouso devido ao equilíbrio iônico estabelecido. As células contráteis são capazes gerar impulso elétrico, mas o automatismo cardíaco é denominado pelo nó sinusal, um feixe muscular localizado próximo a junção da veia cava superior no átrio direito, pois suas células se despolarizam em maior frequência e são moduladas pelo sistema nervoso autonômico. O impulso então pode ser transmitido para todos miócitos contráteis, porém o sistema de condução é especializado para condução por meio dos tratos internodais nos átrios e pelo sistema His-Purkinje nos ventrículos. Embora o sistema de condução seja mais rápido, as células do nó atrioventricular, feixe muscular localizado próximo a valva tricúspide, na junção atrioventricular, em uma região denominada triangulo de koch, retardam a condução, dando tempo para que os átrios possam esvaziar completamente antes da contração ventricular. Existem células especializadas, com potencial de ação diferentes nesse sistema elétrico cardíaco. O coração começa a bater do ápex para a base pois existe uma bainha de gordura que envolve o feixe inicial, sendo transportado facilmente e fazendo com que o ápex do coração se contraia mais rapidamente. Os ventrículos então dão o impulso sistólico. Potencial de repouso e despolarização Potencial de repouso é a carga elétrica inicial da célula. Devido ao trabalho prévio da bomba de sódio- potássio, a célula contem muito K+ dentro da célula e muito Na+ e Ca2+ fora da célula. Devido a permeabilidade ao potássio, mas semipermeabilidade ao sódio e cálcio, o potássio pode sair a favor do gradiente de concentração, mesmo estando contra o gradiente elétrico. Dessa forma a célula fica relativamente negativa em relação ao meio externo. Diz-se que o potencial de repouso é de -90mV. Ao receber um estímulo elétrico essa célula aumenta a permeabilidade ao sódio, fazendo com que os canais se abram, gerando uma inversão de carga elétrica da membrana, fenômeno denominado despolarização. A repolarização é um fenômeno ativo por meio dos canais sódio e potássio, utilizando de ATPs para reestabelecer o potencial elétrico de repouso. Conceitos fundamentais da eletrocardiografia João Pedro de Souza Bezerra T29 UFCA Dessa forma, a despolarização tem um vetor positivo, pois aumenta a quantidade de carga positiva dentro da célula e a repolarização tem um vetor negativo. O potencial de ação é o gráfico da variação do potencial elétrico da membrana celular e podem ser divido em 4 fases, definidas pela movimentação de íons. Fase 0; entrada rápida de sódio (despolarização rápida) Fase 1: entrada lenta de sódio (início da repolarização) Fase 2; abertura dos canais lentos de cálcio e saída de potássio Fase 3: Saída rápida de potássio (repolarização rápida) Fase 4: saída de sódio e entrada potássio pela ação da bomba de sódio-potássio (potencial de repouso) O potencial de ação tem um limiar de -60mV, tudo ou nada. Existem algumas células cardíacas que possuem um potencial de repouso próximo ao limiar e na fase de repouso consegue permitir a entrada de sódio e potássio, produzindo uma despolarização espontânea pela entrada desses íons. Quando o potencial limiar é (facilmente) atingido, o estímulo cardíaco é desencadeado. Esse fenômeno explica o automatismo! Como dito, outras células também podem possuir automatismo, mas o nó sinusal realiza um fenômeno denominado overdrive supression, que ocorre pela hiperativação da bomba de sódio e potássio levando a hiperpolarização de outras células com potencial de automatismo. A figura anterior apresenta o sistema elétrico cardíaco e os diferentes tipos de potencial de ação em diversas regiões e células descritas a seguir: Conceitos fundamentais da eletrocardiografia João Pedro de Souza Bezerra T29 UFCA As células do sistema elétrico podem ser de 3 tipos: as células P (pacemaker cells) responsáveis pelo automatismo no nó sinusal e atrioventricular. Essas células apresentam fase 1 mais lenta e fase 4 mais íngreme. As do nó sinusal apresentam aclive ainda maior, apresentando uma frequência maior. As células T estão localizadas na conexão com o tecido atrial circundante. Apresentam potencial de ação curto e fase 4 estável. As células Purkinje apresentam maior densidade de canais rápidos de sódio, apresentando maior velocidade de condução. Podem desencadear automatismos. As células do miocárdio atrial possuem potencial de ação do tipo rápido, apresentando menor período refratário e maior predisposição a arritmias, como fibrilação atrial. As células do miocárdio ventricular apresentam diferenças conforme a espessura da parede e podem ser de 3 tipos: as células epicárdicas, M e endocárdicas. As células epicárdicas e endocárdicas têm poucas diferenças no potencial de ação, mas as células M apresentam potencial de ação de longa duração. Na síndrome do QT longo, essas células são responsáveis pela dispersão da repolarização ventricular, o que pode gerar taquicardias ventriculares. Principais vetores resultantes Como o nó sinusal localiza-se no átrio direito, o estimulo elétrico ativa inicialmente o átrio direito e, logo em seguida o átrio esquerdo. O vetor resultante é somatório das forças elétricas dos átrios, sendo denominado , orientado para esquerda e para baixo. Corresponde à onda P Ultrapassando o nó atrioventricular, a corrente elétrica percorre os feixes de his. A corrente proveniente do ramo esquerdo despolariza o lado direito e vice-versa, como um zig zag. No entanto, como a massa do ventrículo esquerdo é 2 a 3 vezes maior que a do direito, as forças da parede septal esquerda predomina. O vetor teórico resultante é denominado vetor septal ou vetor 1, orientando-se a direita. Em um eletrodo a esquerda do coração, ele é registrado como uma onda negativa, a onda q. Corresponde a despolarização do septo Em seguida ocorre a despolarização das paredes lisas dos ventrículos, ou seja, as paredes não septais, que apresentam maior massa. A soma das forças elétricas geral um vetor orientado para o lado esquerdo, denominado vetor 2, e no ECG exibe uma onda de maior magnitude, a onda R. Corresponde a despolarização da parede ventricular esquerda. Por fim, ocorre a ativação das porções basais dos ventrículos, proximas ao sulco atrioventricular, gerando o vetor 3, se apresentando como um vetor orientado para o lado esquerdo. A repolarização ventricular não ocorre de dentro para fora, como seria esperado pelo sentido da despolarização. Isso ocorre devido ao fato de que células do epicardio repolarizam mais rapidamente. Se os dois processos tivessem o mesmo sentido, as ondas no ECG seriam opostas, pois têm valores diferentes. Portanto, a onda T, tem a mesma orientação do sistema QRS Conceitos fundamentais da eletrocardiografia João Pedro de Souza Bezerra T29 UFCA Derivações O ECG foi inventado por Einthoven, um fisiologista holandes que usou um eletrocardiógrafo pela primeira vez registrando a atividade elétrica do coração. Um eletrocardiógrafo é um galvanômetro que registra pequenas diferenças de potencial elétrico entre dois pontos de uma superfície. Uma derivação então é uma conformação de eletrodos que permite o registro do potencial elétrico em uma orientação espacialdeterminada. :) As derivações bipolares são determinadas por três eletrodos determinando um plano frontal e a relação entre dois desses. Esses eletrodos são colocados no braço esquerdo, no braço direito e na perna esquerda, constituindo o triangulo de Einthoven. Elas são denominadas D1, D2 e D3 As derivações unipolares são obtidas ao conectar os três membros a uma central terminal, considerada de potencial zero, servindo como eletrodo indiferente. Quando um eletrodo é utilizado como eletrodo explorador, ele determina o potencial absoluto de determinado membro, sendo designado então de V. As unipolares melhoras desconectam da central terminal o eletrodo em que o potencial está sendo registrado. São denominadas aVR, aVL e aVF. Superpondo as derivações bipolares com a unipolares, tem-se o sistema hexa-axial do plano frontal: No plano horizontal, são utilizadas outras seis derivações com eletrodos exploradores colocados no precórdio em determinados pontos, o V1, no 4º EIC direito na linha paraesternal, V2, no 4º EIC esquerdo na linha paraesternal, V3, ponto médio entre V2 e V4, V4, no 5º EIC esquerdo na linha hemiclavicular, V5, na linha horizontal de V4 na linha axilar anterior e V6, na linha horizontal de V4 na linha axilar média. Como cada vetor representativo da ativação elétrica tem uma orientação espacial e as derivações têm posição fixa e dois polos, um positivo e um negativo, o ECG registra as projeções desses em ondas positivas, negativas ou isoelétricas. Conceitos fundamentais da eletrocardiografia João Pedro de Souza Bezerra T29 UFCA O eletrocardiograma tem grande sensibilidade em arritmias cardíacas, bloqueios cardíacos e infarto agudo do miocárdio. A isquemia miocardica onde o infarto não se concretizou, a sensibilidade não é tão alta. É um método simples com acurácia muito grande. Interpretação do ECG normal I. Identificação do paciente. Determinar nome, idade, peso e altura, sexo e quadro clínico. ECG de criança é diferente de adulto. II. Padronização A velocidade padrão de um eletro é 25 mm/s . Se 1s percorre 25 mm, 1 mm demora 0,04 seg para correr. A voltagem padrão é a propoção de 1 mm/0,1 mV e é denominada N. (N – 10mm/1mvolt) (2N – 20mm/1mvolt) (N/2 – 5mm/1mvolt) III. Ritmo e Frequencia cardíaca Para determinar se o ritmo é sinusal temos 3 critérios: onda P positiva em D1 e positiva em AVf; se cada onda P é seguida por um complexo QRS; e se as ondas P tem a mesma morfologia. Além disso a frequência deve encontrar-se entre 50 e 100 bpm em adultos Para determinar a frequência cardíaca devemos contar a quantidade de quadradinhos entre dois complexos QRS. Se 1 mm equivale a 0,04s, 1s equivale a 25mm. 1 minuto tem 60 segundos. 1 minuto tem 1500 quadradinhos. 1500/distancia entre dois QRS equivale a frequencia cardíaca. IV. Determinação do eixo do QRS Para determinação dos eixos de P, QRS e T primeiramente devemos encontrar a angulação no plano frontal. Determinamos o quadrante ao analisar o QRS em D1 e AVF, pois correspondem, respectivamente a 0º e 90º. Se positiva em ambos, encontra-se nesse mesmo quadrante, por exemplo. Isso se deve pela decomposição vetorial e a orientação dessas projeções nas derivações. Posteriormente procura-se em qual variação há onda isoelétrica e o eixo será perpendicular a essa. Se não houver, faz-se por tentativa e erro nas derivações vizinhas ao quadrante determinado. Em relação ao eixo horizontal, V1 é praticamente perpendicualr ao plano frontal. Se a onda for positiva, o vetor está indo para a frente. Se negativa, indo para trás. Dica rápida! Ta normal? Olha D1 e D2. Tem que estar positivo ou isodifasico em ambos!! Conceitos fundamentais da eletrocardiografia João Pedro de Souza Bezerra T29 UFCA Onda P: É o registro da despolarização atrial. Duração normal em torno de 0,1s. A amplitude da onda P não pode ultrapassar 2mm, pois pode indicar sobrecarga atrial direita. Quando tem-se uma sobrecarga atrial esquerda, tem-se uma onda P mais alargada. Entre 0º e 90º no plano frontal. Geralmente isodifasica em V1, sendo denominado de padrão plus-minus. Para avaliação dessa onda, a melhor derivação seria DII. O intervalo PR é o tempo entre o início da onda P e o início do QRS. Corresponde o tempo gasto para o impulso elétrico sair do nó sinusal até alcançar os ventrículos, em um intervalo normal que varia de 0,12 a 0,20, e é retardado no nó AV para possibilitar o esvaziamento atrial. Esse intervalo pode sofrer influencia do tonus simpático e parassimpático, variando inversamente com a frequencia cardíaca. O intervalo PR tende a aumentar com a idade. O segmento PR, por sua vez, é o intervalo entre o fim da onda P e o início do QRS. Ele não é medido normalmente, mas apenas visualizado par a ser um ponto de referência para a linha de base. A linha de base é marcado pela linha isoeletrica do ponto J no mesmo nível do segmente PR. QRS: É o registro da despolarização ventricular. Duração normal em torno de 0,11s. Uma duração aumentada pode indicar um bloqueio de ramo. Entre -30º e 90º no plano frontal. Orientado para trás, negativa em V1. Esse complexo pode se apresentar de forma diferenciada em outras derivações. A nomenclatura Q corresponde a primeira onda negativa. A nomenclatura R corresponde a positiva e a S corresponde a onda negativa seguida da onda R. Se maiúsculo tem grande amplitude. Se minúsculo tem baixa amplitude. Em V1, a morfologia normal é rS. O segmento ST deve estar no mesmo nivel do segmento PR. Supradesnivelamentos podem inidicar lesão miocardica nas fases inicias do IAM e pericardite aguda. Um infradesnivelamento pode indicar lesão miocardica de infarto sem supra, ação digitalica, sobrecargas, etc. O intervalo QT é medido do inicio do QRS até o fim da onda T. Representa a sístole elétrica ventricular, o tempo entre a despolarização e a repolarização. Esse intervalo varia com a FC, então utiliza-se o intervalo QT corrigido, QTc, obtido pela fórmula de Bazzet: QTc = QT/√RR, onde RR é o intervalo entre duas ondas R. Outra formula de obter é pela formula de Hodges: 𝑄𝑇𝑐 = 𝑄𝑇 + 1,75(𝐹𝐶 − 60). Onda T: É uma onda de maior duração e menor voltagem. A onda T é positiva e paralela ao QRS, geralmente. Em V1 e V2 o QRS é negativo e a onda T pode ser negativo ou positiva. É uma onda única, assimétrica, com ramo ascendente mais lento que o descendente, com apice arredondado. Sua duração e amplitude não são medidas, mas mede-se o intervalo QT Onda U: quando presente, é uma pequena deflexão que segue a onda T, de mesma polaridade. Corresponde a despolarização dos músculos papilares. Deflecção intrinsicoide é o tempo marcado do inicio do QRS até o apex da onda R e retrata o tempo de ativação ventricular. Atenção: determinadas derivação mostram melhor alterações em determinadas paredes. Conceitos fundamentais da eletrocardiografia João Pedro de Souza Bezerra T29 UFCA Parede septal: V1, V2, V3 Parede anterior: V1, V2, V3, V4,V5 e V6 Parede anterior extensa: V1, V2, V3, V4,V5, V6, D1 e AVL Parede inferior: D2, D3 e AVF Parede lateral: V5 e V6 Parede lateral alta: D1 e AVL Parede dorsal: V7 e V8 (derivações modificadas)
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