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Nanda Prado – Turma 91 – Ginecologia e Obstetrícia Doenças Anexiais e Ovarianas Introdução O câncer ovariano representa uma doença grave, inclusive de maior gravidade em relação às neoplasias mamárias, endometriais e uterinas, de forma que cerca de 2/3 das mulheres com essa condição falecem No Brasil, representa o oitavo câncer mais comum em mulheres, apesar de apresentar incidência reduzida quando comparado aos países desenvolvidos, e, de uma forma geral, é considerado 23% de todos as neoplasias malignas ginecológicas, mas abarca cerca de 47% das mortes Afeta especialmente mulheres de idade superior a 60 anos de idade e seu diagnóstico é dado em estágios avançados por ser uma condição assintomática e os métodos de rastreios serem pobres e falhos Nesse sentido, a maioria das pacientes é diagnosticada nos estágios 3 e 4, quando o câncer de ovário passa a manifestar sintomatologia exuberante com presença de ascite, distensão abdominal e massas palpáveis, enquanto alguma minoria recebe diagnóstico em estágio 1 como um achado ocasional de prognóstico excelente, notadamente sobrevida em 5 anos de 93% O principal fator de risco para câncer de ovário é a idade, com mediana de incidência aos 63 anos (acima de útero e mama) e queda do risco após os 80, seguido de histórico familiar em caso de um parente direto, especialmente linhagem materna, e, por fim, nuliparidade com aumento do risco em cerca de 2 a 3 vezes Carcinoma Seroso de ovário estágio 3C em tomografia computadorizada que demonstra tumor volumoso e heterogêneo, ascite (líquido escuro circundando a lesão e praticamente todo o abdome) e linfonodos retroperitoniais aumentados (seta menor) Nanda Prado – Turma 91 – Ginecologia e Obstetrícia A história familiar se relaciona a genes oncológicos importantes, tais como BRCA 1 (41 a 46%) e BRCA 2 (10 a 27%) mutantes, além da própria Síndrome de Lynch, com risco em até 10%, embora predomine casos de neoplasias intestinais e endometriais Dentre os fatores de proteção, se destaca a multiparidade, notadamente três ou mais filhos; o uso prolongado de anticoncepcionais (> 5 anos); idade de primeiro parto precoce (< 25 anos); menopausa precoce (< 45 anos); e salpingectomia: prévia, com redução de 50% do risco Nesse sentido, é recomendada a realização de salpingectomia em mulheres que irão realizar histerectomia ou laqueadura com intuito de prevenir o desenvolvimento desse câncer Massas Anexiais As massas anexiais são eventos muito comuns ao longo da vida das mulheres, ultrapassando 25% de incidência na pré-menopausa, especialmente após a popularização da ultrassonografia, sendo que a grande maioria representa cistos simples benignos Cistoadenoma ovariano, neoplasia benigna representada com cápsula fina e homogênea com interior fluido e límpido, retirado por imagem suspeita mista sólido-cística Os achados das massas anexiais podem variar com a fase do ciclo, podendo representar corpo lúteo hemorrágico ou folículo ovariano não rompido, enquanto na pós- menopausa há um aumento do risco de câncer, mas não necessariamente Dentre os diagnósticos diferenciais de massas anexiais e ovarianas de causas ginecológicas e benignas, se destacam os cistos funcionais, derivados do processo ovulatório folicular ou corpo lúteo hemorrágico, sendo facilmente reconhecidos pela clara correlação com fase do ciclo menstrual Nessa mesma classificação, se destacam endometriomas, notadamente massas homogêneas de conteúdo denso associadas a foco de sangramento e reabsorção na formação do ‘‘cisto chocolate’’; abcesso tubo-ovariano, o qual se apresenta com manifestações clínicas relevantes associadas; e teratoma maduro, um tumor germinativo resultante de células dos 3 folhetos embrionários, apresentando densidades totalmente diferentes que favorece processos de torção ovariana (abdome agudo com indicação cirúrgica imediata) Ainda nesse grupo, se destacam cistoadenoma seroso, uma neoplasia benigna de imagem de risco representada por massa mista o que acaba determinando abordagem cirúrgica; cistoadenoma mucinoso, notadamente os maiores tumores em seres humanos; e hidrossalpinge, como resultado de doença inflamatória pélvica crônica, que se apresenta com uma imagem tortuosa da trompa pela presença de líquido na simulação de septos tumorais ovarianos Nanda Prado – Turma 91 – Ginecologia e Obstetrícia Cistadenoma Mucinoso ovariano, um tumor benigno que, quando se rompe, determina a formação de pseudomixoma por disseminação da mucina no peritônio, determinando implantes císticos nas mais variadas localizações de cavidade abdominal Por fim, ainda dentro desse grupo, se considera a prenhez ectópica como importante diagnóstico diferencial, inclusive, deve ser a primeira hipótese em mulheres na menacme, demandando a solicitação de B-HCG; além de mioma subseroso (metade das massas pélvicas é mioma e a outra metade é câncer), que não são bem identificados ao ultrassom; e resquícios mullerianos, notadamente fragmentos embriológicos Prenhez ectópica, com imagem demonstrando útero vazio e em sua periferia, lesão mista sólido-cística (periferia solida e interior cístico) com vesícula vitelínica central Dentre o grupo dos diagnósticos diferenciais de causas ginecológicas e malignas, se destacam os tumores malignos de cinco famílias diferentes, notadamente carcinomas epiteliais (seroso, mucinoso, borderline, coriocarcinoma e endometrioide), tumores de linhagem germinativa (disgeminoma comótimo prognóstico e teratoma imaturo com prognóstico péssimo), tumor de cordões sexuais (tumor da granulosa e tecoma, ambos de prognóstico bom, afetando faixa etária de 40 a 50 anos, com pelo menos 50% deles produzindo estradiol e testosterona); tumor do estroma (mesenquimais, sarcomas, linfomas e neuronal) e metastático (mais famoso é o tumor de Krukenberg, quando o foco primário é algum câncer de TGI com metástases para ovário, portanto, é obrigatória a investigação desse sistema diante de massa pélvica, preferencialmente por endoscopia e colonoscopia) Dentre as etiologias não ginecológicas, se destacam causas benignas, tais como diverticulite; abcesso apendicular de origem proctológica; tumor de bainha neural como Swichannoma; divertículo de ureter; rim pélvico; e divertículo de bexiga, enquanto dos quadros malignos podem ser primários ou metastáticos, relacionados principalmente ao trato gastrointestinal ou urinário Carcinoma Seroso de ovário tipo 2A (pela invasão das trompas), com tomografia computadorizada demonstrando massa amplas ocupando a área entre as duas setas, de característica císticas e sólidas Diagnóstico O médico generalista deve ser capaz de extrair história clínica detalhada, com detalhamento do interrogatório dos diversos aparelhos, especialmente trato gastrointestinal e urinário, e antecedentes familiares e pessoais; realizar o exame físico e solicitar os exames de ultrassonografia Nanda Prado – Turma 91 – Ginecologia e Obstetrícia transvaginal e CA-125, sendo que outros testes complementares estão a cargo do especialista As principais manifestações clínicas associadas a massas anexiais e ovarianas incluem dor ou peso abdominal (50%); distensão abdominal por ascite (50%); tumoração palpável pelo paciente (50%); queixas gastrointestinais (20%), incluindo diarreia, constipação, tenesmo e meteorismo, refletindo compressão de vísceras; queixas urinárias (20%), polaciúria, noctúria e tenesmo vesical, associadas à compressão de bexiga; emagrecimento (15%), sendo um dos tumores que mais induzem caquexia pelo alto consumo de albumina pela ascite, geralmente paradoxal (braços e pernas magras e barriga grande); distúrbios menstruais ou sangramentopós-menopausa (2%) Sensibilidade e especificidade de sintomas associados ao câncer ovariano, note que sintomas isolados são pouco específicos, enquanto combinados tornam a especificidade alta Em relação ao exame físico, primeiramente é necessária a avaliação do estado geral, especialmente na procura de caquexia; seguida de um exame abdominal rigoroso, verificando a presença de massas e/ou ascite Além disso, o exame de toque bimanual deve ser realizado com intuito de identificar a presença de tumores pélvicos ou ovários palpáveis na pós-menopausa, período na qual haveria a regressão desses órgãos, porém se trata da faixa etária de risco, especialmente quando mais de 5 anos menopausada Além disso, devem ser buscados ao exame físico sinais de ação hormonal, notadamente androgenização com pilificação aumentada, acne e alopecia ou estímulo estrogênico pós-menopausa com vagina rósea e lubrificada não característica da paciente em climatério sem reposição hormonal, apesar de ser uma minoria de tumores que geram esse tipo de alteração Outras alterações sistêmicas podem estar presentes, com destaque para o derrame pleural, um indicativo de carcinomatose peritoneal que acarreta a obstrução de vasos linfáticos os quais drenam líquido peritoneal e pleural, podendo acarretar disseminação para a pleura Em pacientes com suspeita de massa anexial, a ultrassonografia transvaginal é o exame de escolha, exceto em crianças e virgens que devem necessariamente fazer por via abdominal, embora o padrão ouro para investigação etiológica seja a ressonância magnética (não é função do generalista) Lesão ovariana cística com vegetações em seu interior, sendo que o ideal é associar doppler colorido para detectar vascularização (marcador de risco importante para câncer) Nanda Prado – Turma 91 – Ginecologia e Obstetrícia Na ultrassonografia devem ser analisados os parâmetros de morfologia da lesão, na classificação em císticas, quando formação de conteúdo anecoico (escuro e totalmente homogêneo); mista; e sólida, quando completamente espessada e preenchida por tecido Além disso, outro critério é a ecogenicidade da lesão, classificada em homogênea (benignidade) e heterogênea (risco), ademais, a presença de características especiais denota potencial maligno, tais como espessamento de cápsula, septação (transversais ou longitudinais), vegetação (especialmente quando alta vasculatização e/ou tamanho aumentado) e ascite Ultrassonografia Doppler Colorida de câncer ovariano com aspecto misto multiloculado e alta vascularização em seu interior Por fim, deve ser determinado o volume da lesão, por meio de três eixos, sendo dois deles determinado em um mesmo corte e terceiro em outro, multiplicados por uma constante, notadamente 0,52, de forma que tumores muito grandes apresentam indicação de complementação com ultrassonografia abdominal Dentre os exames laboratoriais, deve ser solicitado hemograma e outros exames gerais a depender do caso; B-HCG em todas as pacientes no menacme, por suspeição de prenhez ectópica, mesmo em laqueadas; CA-125, o marcador sérico mais importante na investigação de tumor anexial na pós-menopausa; e outros marcadores, como CEA, alfa-fetoproteína, B-HCG, estradiol, testosterona e CA-19-9 devem ser solicitados apenas pelo especialista Cistoadenocarcinoma Seroso border-line de ovário que apresenta todas as características de risco na ultrassonografia, tais como cápsula espessa, septos grosseiros e vegetações projetadas em áreas císticas O CA-125 é um exame limitado para pacientes na pré- menopausa porque ele se encontra positivo em diversas condições benignas, tais como endometriose (usado até para acompanhar evolução de tratamento), gravidez, menstruação e câncer de endométrio, porém dentro de um limite porque valores extremamente elevados, como 2000, obviamente não denotam condições ‘‘benignas’’ Em mulheres pós-menopausa, deve ser calculado o escore para risco de malignidade denominado RMI (risk of malignancy indez score), que inclui critérios de ultrassonografia, idade e CA-125 RMI = Ultrassom x Idade x CA-125 Para a categoria ultrassom, se considera 1 ponto para cada um dos seguintes itens: lesão bilateral, áreas sólidas, cisto multilocular, ascite e metástases, sendo que 0 pontos Nanda Prado – Turma 91 – Ginecologia e Obstetrícia equivalem a score 1; 1 ponto equivale a score 2; e 2 ou mais pontos determinam score 3 Quanto a idade, se considera o score 1 para pré- menopausa e 3 para pós-menopausa, enquanto o valor de CA-125 é absoluto na equação, de forma que resultados acima de 200 representam alto risco de malignidade Massa anexial mista bastante heterogênea Por outro lado, para mulheres na pré-menopausa, o escore de escolha é o IOTA (International Ovarian Tumor Analysis), que abarca critérios de ultrassonografia, status menstrual, idade e CA-125 na análise, calculado em softwares online Cisto simples ovariano (< 8 cm) em ovário direito na pré-menopausa, característico de cisto folicular, com reabsorção espontânea entre 3 semanas e 3 meses Nos casos específicos de cistos simples de baixo risco, é considerado apenas o diâmetro como parâmetro, de forma que valores acima de 8 a 10 cm na pré ou 6 a 8 cm na pós menopausa indicam investigação Propedêutica Pacientes que ainda não tiveram menarca, mas apresentaram identificação de massa pélvica, devem ser encaminhadas imediatamente para unidade oncológica de referência pelo alto risco de neoplasia maligna (25%), especialmente aquelas de natureza embrionária congênita Disgerminoma estágio 2A, um tumor ovariano maligno de bom prognóstico Por outro lado, em pacientes gestantes é obrigatório excluir gestação ectópica gemelar, na qual um dos sacos gestacionais seria tópico e o outro não, embora a etiologia mais comum do primeiro trimestre seja o cisto de corpo lúteo o qual regride ao longo do segundo Massa sólida extrauterina, compatível com câncer de ovário Ademais, o luteoma é outro diagnóstico diferencial, sendo um tumor sólido específico da gravidez que tendem a regredir espontaneamente no pós-parto, após cerca de 3 Nanda Prado – Turma 91 – Ginecologia e Obstetrícia a 6 meses, mesmo quando > 10 cm, portanto a conduta é expectante Tecoma ovariano, tumor denso e pesado, mas de comportamento positivo, maioria cura sem necessidade de quimioterapia, apenas com cirurgia Por fim, massa anexial em gestante pode ser resultante de torção de teratoma maduro (maior risco pelo crescimento do útero), quando quadro de abdome agudo, e mais raramente de neoplasias malignas Em mulheres em menacme, devem ser avaliados aspectos clínicos, risco familiar e padrões ultrassonográficos, sendo que em situações de cisto simples, a conduta é repetição da ultrassonografia em 3 a 6 meses, enquanto cistos de aspecto de risco demandam solicitação de CA-125 e, caso alteração, encaminhamento para unidade especializada Carcinoma Mucinoso de ovário grau 1A, com tomografia demonstrando septos finos e massa bem delimitada e homogênea, restrito ao ovário com alta taxa de cura Por outro lado, em mulheres pós-menopausa deve ser solicitada a ultrassonografia transvaginal e CA-125 para cálculo do RMI, sendo que cistos simples < 10 cm demandam repetição do ultrassom de 3 em 3 meses, enquanto outras condições (RMI alto, cisto de risco, lesões > 10 cm ou que não regridem em 6 meses) demandam encaminhamento para unidade especializada Em suma, as recomendações para referenciamento de pacientes com massas anexiais incluem: Qualquer idade com RMI > 200 Pós-menopausa com CA-125 alterado ou ultrassonografia não cisto simples Ausência de regressão após 6 meses de acompanhamento Pré-menopausa com elevação significativa de CA-125 ou massa fortemente suspeita, com ascite, nodulação de parede ou evidência de metástase Carcinoma mucinoso de ovário grau 3C, com invasão de alça de intestino delgado, retirada cirurgicamente; e perspectiva de cura de apenas 40%
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