principalmente, se a leguminosa for de fácil decomposição, como o feijão-bravo-do-ceará (CHADDA; DE POLLI, 1988; MAGALHÃES et al., 1991; CARVALHO, 2005). Deve-se ressaltar, ainda, que a baixa razão C:N das leguminosas permite rápida liberação no solo do N fixado simbióticamente. É desejável que haja sincronização dessa mineralização, com a demanda da cultura subseqüente, levando a um mínimo de perdas tanto do nitrogênio quanto de outros nutrientes. Estudos que podem ser desenvolvidos em solos de Cerrado, com plantas condicionadoras, possibilitam a identificação de leguminosas com padrões de mineralização que se aproximem da curva de demanda de N da cultura seguinte. Um manejo adequado a cada sistema agrícola, envolvendo o uso das espécies vegetais para adubação verde e a fixação biológica de nitrogênio, depende ainda do conhecimento mais preciso da dinâmica do nitrogênio nesses solos em diferentes tipos de manejo e períodos do ano. Cerrado: adubação verde 173 DEFINIÇÃO DA FIXAÇÃO BIOLÓGICA DO NITROGÊNIO (FBN) E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA SIMBIÓTICO A fixação biológica do nitrogênio é a transformação do nitrogênio atmosférico elementar (N2) em forma assimilável pelas plantas através de microrganismos procarióticos. Quando o sistema envolve além do microrganismo uma planta hospedeira, é chamado “fixação simbiótica do nitrogênio” que tem na associação Rhizobium-leguminosas o exemplo agronômico mais notável. Em leguminosas, há várias etapas para a formação dos nódulos, desde os sinais moleculares entre a planta hospedeira e o microssimbionte até o funcionamento dos nódulos radiculares. Dependendo da planta hospedeira, a ela são associadas bactérias dos gêneros: Rhizobium, Bradyrhizobium, Azorhizobium, Mesorhizoibium, Sinorhizobium e Allorhizobium. O rizóbio é uma bactéria aeróbia e pode viver saprofiticamente no solo sem a presença da leguminosa hospedeira. Por isso, em termos práticos, muitas vezes não é necessária a inoculação uma vez que a bactéria já se encontra no solo. A interação entre a planta e o microssimbionte é bastante complexa. Antes da formação do nódulo, ocorre a troca de sinais moleculares entre a planta hospedeira e o microssimbionte. Cada espécie de leguminosa libera compostos fenólicos (flavonóides) que ativam os genes de nodulação das bactérias, estimulando sua multiplicação e aderência às raízes. Em seguida, há o encurvamento do pêlo radicular que é causado pela liberação de moléculas pela bactéria. Deve-se ressaltar que, em algumas associações simbióticas, a penetração da bactéria dá-se nas raízes emergentes, não formando o cordão de infecção. As enzimas bacterianas degradam parte da parede celular e permitem a entrada da bactéria no pêlo radicular; em seguida, forma-se o cordão de infecção (contendo as bactérias envoltas por uma membrana) que vai em direção ao córtex. As células do córtex dividem-se, e as bactérias são liberadas no citoplasma e estimulam a divisão de algumas células, levando-as à proliferação Fixação biológica de nitrogênio em espécies... 174 dos tecidos e formando o nódulo maduro (Figura 1a); as bactérias passam à forma imóvel chamada de bacteróide. Os bacteróides ocorrem geralmente no citoplasma das células infectadas e em grupos rodeados pela membrana peribacteróide (Figura 1b). A fixação biológica do nitrogênio ocorre dentro dos bacteróides; a planta hospedeira disponibiliza carboidratos (principalmente a sacarose) que servem como fonte de energia, através de sua oxidação. Figura 1Figura 1Figura 1Figura 1Figura 1. (a) Corte transversal de nódulo de leguminosa (Phaseolus vulgaris) mostrando o córtex e a região central infectada pelos bacteróides. Barra = 100 mm. (b) Fotomicrografia eletrônica de transmissão mostrando a região central do nódulo de leguminosa. b = bacteróide. Barra = 2 mm. Para que ocorra a fixação biológica do nitrogênio, é necessário que o microrganismo tenha o complexo enzimático chamado nitrogenase, e o primeiro produto produzido por essa reação é a amônia. Para o funcionamento desse complexo enzimático, são também necessários: Mg, Fe, Mo, Co e ATP. Ao Fo to s: W al te r Q ua dr os R . Jú ni or bbbbb (b)(a) Cerrado: adubação verde 175 mesmo tempo que ocorre a redução do N2, a nitrogenase reduz prótons de hidrogênio em H2, levando-os a um gasto de pelo menos 25% dos elétrons destinados à nitrogenase. De acordo com Hungria et al. (1989) e Bergersen et al. (1995) há estirpes de Rhizobium e Bradyrhizobium que contêm a enzima hidrogenase a qual recupera parte da energia perdida pela redução do hidrogênio. A reação enzimática é a seguinte: N2 + 8H + + 8e- + 16 ATP ⇒ 2NH3 + H2 + 16 ADP + Pi A amônia é liberada dos bacteróides e no citosol é metabolizada a glutamina, ácido glutâmico e asparagina ou ureídos (em geral, em plantas tropicais). A asparagina (C4N2H7O4) ou os ureídos (alantoína - C4N4H6O3 e ácido alantóico - C4N4H8O4) são os principais compostos translocados dos nódulos para o xilema, através do sistema vascular. Plantas que transportam ureídos cuja razão C:N é baixa (p. exemplo, C:N =1) em relação às amidas e aos aminoácidos levam a uma economia de esqueletos de carbono pela planta, mas também a um menor gasto de ATP na síntese de ureídos (MINCHIN et al., 1981; THOMAS; SCHRANDER, 1981). Entre as leguminosas utilizadas como plantas condicionadoras de solo, sabe-se que a mucuna-preta (M. aterrima), a mucuna-anã (M. deeriagiasum) e o feijão-bravo-do-ceará (Canavalia brasiliensis) estão entre as leguminosas que transportam ureídos nos vasos do xilema (AGUIAR et al., 1997), além da Leucaena leucocephala (GOI; NEVES, 1987), Gliricida sepium, Mimosa scabrella e Sesbania grandiflora (KESSEL et al., 1988). A fixação do nitrogênio é sensível ao O2, pois as duas proteínas que compõem a nitrogenase (Fe proteína e Fe-Mo proteína) são desnaturadas pelo O2. A leghemoglobina que dá a coloração rósea aos nódulos, quando as bactérias estão fixando o nitrogênio atmosférico, só é sintetizada se a planta e a bactéria estiverem em simbiose (ELLFOLK, 1972) e localizarem-se no citoplasma das células infectadas do nódulo (VERMA; BAL, 1976). Essa hemeproteína controla parcialmente a disponibilidade de O2 nos bacteróides, mas outras características anatômicas do nódulo, também, são importantes para o controle e a Fixação biológica de nitrogênio em espécies... 176 manutenção de baixos teores de oxigênio na região central dos nódulos como: presença de glicoproteínas nos espaços intercelulares do córtex e conformação das células do córtex (JAMES et al., 1993; PARSONS; DAY, 1990; WITTY et al., 1986). O nódulo é uma estrutura que tem, entre outras funções, a de proteger a nitrogenase (responsável pela FBN) contra o oxigênio que inativa a enzima. O oxigênio fica adsorvido à leghemoglobina, evitando a inativação dela. Essa ligação oxigênio-leghemoglobina fornece o oxigênio para os bacteróides sem afetar a atividade da nitrogenase, promovendo uma coloração rósea interna- mente na região central do nódulo que é utilizada como indicativo de eficiência simbiótica (Figura 2). Em termos práticos, empiricamente, os agricultores podem determinar se a inoculação das sementes ou a nodulação natural são eficientes, cortando os nódulos ao meio e observando a coloração rósea deles. Figura 2Figura 2Figura 2Figura 2Figura 2. (a) Raiz de Mucuna aterrima nodulada. (b) Corte transversal de nódulo de feijão (Phaseolus vulgaris L.) mostrando a produção de leghemoglobina (coloração rósea na região central do nódulo). (a) (b) Fo to s: W al te r Q ua dr os R . Jú ni or Cerrado: adubação verde 177 IMPORTÂNCIA DA FBN EM PLANTAS CONDICIONADORAS DE SOLO Apesar de o N2 atmosférico representar 78% da composição dos gases da atmosfera, ele é inerte, estável quimicamente e insolúvel. A perda que ocorre no solo e o alto custo da adubação nitrogenada, aliados à baixa eficiência das plantas na extração desse nutriente no solo, que, para a maioria