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TIREOIDITES Gama de doenças com diferentes etiologias, caracterizadas por um processo inflamatório da glândula tireoide, podendo levar à disfunção tireoidiana transitória ou permanente. De acordo com sua evolução clínica, são classificadas em agudas, subagudas e crônicas. * Eventualmente, pode ser causada por fungos ou Pneumocystis jirovecii, sobretudo em imunodeprimidos. 1) TIREOIDITE AGUDA A tireoidite aguda (TA), também chamada de tireoidite supurativa aguda ou infecciosa, é uma doença rara, mas sua incidência tem aumentado em decorrência da elevação do número de pacientes imunodeprimidos. Em geral, a TA tem origem bacteriana (70% dos casos) e, teoricamente, qualquer microrganismo pode estar envolvido. Os agentes etiológicos mais comuns são Staphylococcus aureus, Streptococcus pyogenes e Streptococcus pneumoniae. A baixa frequência da TA resulta da resistência da tireoide a infecções, em função de sua encapsulação, seu alto teor de iodo, seu rico suprimento sanguíneo e sua extensa drenagem linfática. A TA é mais frequente em indivíduos com doença tireoidiana prévia (câncer, tireoidite de Hashimoto [TH] e bócio multinodular) ou com anomalias congênitas (p. ex., persistência do cisto tireoglosso ou fístula do seio piriforme; anormalidades do terceiro e quarto arcos). Em adultos sem doenças preexistentes ou inatas, a causa mais habitual é a disseminação hematogênica ou linfática de infecção oriunda de vias respiratórias superiores ou a distância para a tireoide com alteração prévia. TA também é mais observada em imunodeprimidos, debilitados ou idosos. Ela é particularmente comum em portadores de síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). Outros fatores de risco raramente descritos foram endocardite, punção aspirativa por agulha fina (PAAF) e abscesso dentário. TA também é mais prevalente em crianças do que em adultos. Diagnóstico: Manifestações clínicas: Normalmente o quadro da TA tem início súbito, mas pode desenvolver-se gradualmente, dependendo do microrganismo envolvido. O acometimento é, em geral, assimétrico. Os sintomas mais usuais são dor cervical anterior unilateral (podendo irradiar-se para a mandíbula ou o ouvido homolateral), febre, sudorese e astenia. Podem ocorrer calafrios, se houver bacteriemia; disfonia e disfagia também podem ser observadas. O quadro pode ocasionalmente agravar-se, com desenvolvimento de sepse. Os sintomas, geralmente mais óbvios em crianças do que em adultos, frequentemente são precedidos por uma infecção aguda do trato respiratório superior. Em adultos, a TA pode muito raramente manifestar-se por massa indolor na face anterior do pescoço, simulando um carcinoma. Sintomas de hipertireoidismo são excepcionalmente detectados, quando a tireoidite é difusa (situação mais comum diante de infecção por fungos ou micobactérias). Ao exame físico, notam-se sinais flogísticos no lado acometido da tireoide, com pele eritematosa, intensa dor à palpação e, às vezes, flutuação. O lobo esquerdo tireoidiano é mais atingido, sobretudo quando existe uma fístula piriforme. Linfadenomegalia cervical é comum. Sinais de hipertireoidismo (p. ex., taquicardia, pele quente, tremor nas mãos etc.) são excepcionalmente encontrados. Alterações laboratoriais: Leucocitose com desvio à esquerda e elevação da velocidade de hemossedimentação (VHS) ocorrem na maioria dos casos; sua ausência pode indicar infecção anaeróbica. A função tireoidiana mostra-se geralmente normal, com anticorpos antitireoidianos (antitireoperoxidase [antiTPO] e antitireoglobulina [antiTg]) comumente indetectáveis. A ocorrência de hipertireoidismo é excepcional, como já comentado, e resulta da liberação de uma grande quantidade de hormônios tireoidianos na circulação. A captação do iodo radioativo nas 24 horas (RAIU/24 h) pela tireoide é normal; contudo, pode estar reduzida, se a inflamação da glândula for difusa. Na cintilografia, hipocaptação pode ser observada na região envolvida. A ultrassonografia (US) da tireoide geralmente possibilita a localização do abscesso ou do processo supurativo. O diagnóstico da TA é confirmado por citologia obtida por PAAF. O material coletado é submetido a bacterioscopia e cultura. Histologicamente, encontra-se na TA um infiltrado de leucócitos polimorfonucleares e linfócitos, o qual pode vir associado a franca necrose tireoidiana e formação de abscesso. Diagnóstico diferencial: A principal distinção a ser feita é com a tireoidite granulomatosa subaguda (TGSA), uma vez que ambas são clinicamente similares, mas requerem tratamentos distintos. Na TA, em geral, a dor tem maior intensidade, e também é mais comum a linfadenomegalia cervical. Da mesma maneira, eritema ou formação de abscesso aponta para o diagnóstico de TA. Leucocitose com desvio à esquerda e elevação da VHS são comuns em ambas as situações, mas sinais de hipertireoidismo são bem mais frequentes na TGSA. Evidência laboratorial de hipertireoidismo com captação cervical ausente ou muito baixa (em geral, < 2%) do radioiodo à cintilografia praticamente confirma o diagnóstico de TGSA. Tratamento: A terapêutica consiste em antibioticoterapia apropriada, orientada por bacterioscopia e cultura do material obtido pela PAAF. Nos casos mais graves, o paciente deve ser internado para receber antibioticoterapia ou terapia antifúngica parenteral. Se nenhuma bactéria for isolada, pode-se iniciar tratamento empírico de amplo espectro. Em pacientes pediátricos, deve-se realizar tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM) da região cervical para investigar se há fístula comunicante, como a do seio piriforme, que é o sítio mais frequente de infecção em crianças. Caso essas fístulas sejam encontradas, elas devem ser removidas para prevenir recorrências da TA. Qualquer abscesso deve ser drenado, seja por PAAF ou por cirurgia. Prognóstico: As infecções tireoidianas são potencialmente letais e seu prognóstico depende de pronto reconhecimento e tratamento adequado. A taxa de mortalidade pode chegar a 12%. A resposta ao tratamento clínico é geralmente satisfatória. Em alguns pacientes, entretanto, a destruição da tireoide pode ser tão intensa que resulte em hipotireoidismo. Assim, pacientes com tireoidite difusa devem ser avaliados periodicamente, para que se determine o status funcional tireoidiano. 2) TIREOIDITES SUBAGUDAS Incluem-se a TGSA, que caracteristicamente é dolorosa, a tireoidite linfocítica subaguda (TLSA), que é indolor, e a tireoidite pós-parto. A TLSA surge de modo esporádico ou após partos ou abortos, caracterizando a chamada tireoidite pós-parto. 2.1) TIREOIDITE GRANULOMATOSA SUBAGUDA Apresenta uma multiplicidade de sinônimos, sendo os mais usados: tireoidite de De Quervain, tireoidite subaguda dolorosa, tireoidite de células gigantes e tireoidite granulomatosa. A TGSA é um processo inflamatório autolimitado que constitui a causa mais comum de dor na tireoide. Pode ocorrer em qualquer idade, mas acomete principalmente indivíduos entre a 3ª e 5ª década de vida. Apenas 9% dos casos surgem antes dos 30 anos de idade, e crianças raramente são acometidas. A incidência é 5 vezes maior no sexo feminino. Acredita-se que a TGSA seja causada direta ou indiretamente por infecção viral da glândula tireoidiana. Frequentemente, ela surge após infecção aguda do trato respiratório superior, e sua incidência é maior no verão, correlacionando-se com o pico de incidência do enterovírus. Outros estudos relacionam a TGSA com caxumba, sarampo, doença da arranhadura do gato, encefalite de Saint Louis e outros vírus (influenza, adenovírus, ecovírus, Coxsackie, EpsteinBarr etc.). Recentemente, a TGSA foi relacionada com a infecção pela influenza H1N1, com a vacinação contra esse vírus e com a vacinação contra a influenza, bem como com a doença mão-pé-boca (causada pelo vírus Coxsackie B4). Uma predisposição genética é provável em razão da associação frequente com antígenosde histocompatibilidade HLA-Bw35. Histologicamente, a TGSA é caracterizada por infiltração de polimorfonucleares, mononucleares e células gigantes, com formação de microabscessos e fibrose. Isso resulta em destruição dos folículos e proteólise da tireoglobulina. Diagnóstico Manifestações clínicas: O quadro da TGSA tende a começar com uma fase prodrômica, caracterizada por astenia, mal-estar, artralgia, mialgia, faringite e febre baixa. Posteriormente, intensifica-se a febre (pode chegar a 40°C) e surge dor na região da tireoide, moderada ou intensa, que pode inicialmente comprometer apenas um dos lobos, ou já de início envolver toda a glândula. Ela agrava-se com a tosse, a deglutição e a movimentação do pescoço. Além disso, pode irradiar-se para a região occipital, parte superior do pescoço, mandíbula, garganta ou ouvidos, o que leva alguns pacientes a procurar inicialmente um otorrinolaringologista. Pode, também, irradiar-se para a parte superior do tórax. Aproximadamente 50 a 60% dos pacientes apresentam sintomas e sinais de hipertireoidismo, porém a dor e a hipersensibilidade local são os aspectos dominantes da doença. A ausência de dor não exclui, contudo, o diagnóstico, havendo na literatura o relato de casos de TGSA indolor, confirmados por biopsia. Paralisia transitória das cordas vocais também ocorre ocasionalmente. Caracteristicamente, a evolução da TGSA consiste em quatro fases: (1) fase dolorosa aguda inicial com hipertireoidismo (2) eutireoidismo (3) hipotireoidismo (4) eutireoidismo Entretanto, nem todos os pacientes seguem essa evolução, e alguns deles podem cursar apenas com um leve hipertireoidismo, seguido de recuperação funcional da glândula. Além disso, as fases de hiper ou hipotireoidismo podem passar despercebidas ou ter uma duração menor nos casos menos graves. A fase dolorosa aguda inicial e o hipertireoidismo são transitórios, geralmente regredindo no período de 2 a 6 semanas, mesmo no paciente não tratado. Em alguns pacientes, uma tireoidite sintomática, mas não o hipertireoidismo, pode persistir por vários meses. O hipertireoidismo resulta do processo de destruição dos folículos, com consequente liberação de tireoglobulina, hormônios tireoidianos e outras aminas iodadas na circulação. Em função da destruição do parênquima tireoidiano, até 70% dos pacientes podem apresentar hipotireoidismo, o qual é geralmente transitório (duração variável, de algumas semanas a meses) e pode ser subclínico ou manifesto. É precedido pela fase de eutireoidismo, que pode prolongar- se por várias semanas. A maioria dos pacientes com hipotireoidismo é assintomática. Em regra, a glândula é totalmente reconstituída, e a função tireoidiana normaliza-se; entretanto, hipotireoidismo permanente pode acontecer. Ao exame da tireoide, encontra-se um bócio nodular, de consistência firme, bastante doloroso e, na maioria das vezes, unilateral. A dor e a hipersensibilidade local muitas vezes não tornam possível ao médico delimitar a lesão. Raramente pode haver eritema e calor na pele sobrejacente, casos em que o processo inflamatório é mais intenso. Adenopatia cervical é rara. Alterações laboratoriais A alteração mais marcante da TGSA é a intensa elevação da VHS, a qual geralmente excede 50 mm/h. Aumento dos níveis de proteína C reativa (PCR) também é comum. Há leve anemia normocítica, normocrômica, e a contagem leucocitária é normal ou discretamente elevada. Alteração da função hepática pode ocorrer na fase inicial da doença. Na fase de hipertireoidismo, observa-se elevação (geralmente moderada) dos níveis séricos de tireoglobulina, triiodotironina (T3) e tiroxina (T4), refletindo o extravasamento dessas substâncias para a circulação, em razão da ruptura dos folículos. Os níveis séricos de T4 são desproporcionalmente elevados em relação aos de T3 (relação T3/T4 < 20), em função das maiores concentrações intratireoidianas de T4. Caracteristicamente o hormônio tireoestimulante (TSH) está suprimido. Na fase de hipotireoidismo, observam-se valores baixos de tiroxina livre (FT4) e elevação do TSH. A RAIU/24 h é muito baixa (geralmente < 1% e sempre < 5%) durante o processo inflamatório agudo, conforme mencionado. Nessa fase, a cintilografia com iodo radioativo mostra um padrão irregular de distribuição do radioisótopo ou a glândula totalmente “apagada”. A captação de tecnécio pela tireoide pode, entretanto, estar normal, observando-se, à cintilografia, área de hipocaptação no local afetado. À US, observam-se áreas hipoecoicas irregulares e mal delimitadas, localizadas nas regiões subcapsulares. O mapeamento com Doppler colorido mostra vascularização normal ou reduzida devido ao edema do parênquima. A concentração sérica dos anticorpos antitireoidianos geralmente é normal, mas pode elevar-se transitoriamente em alguns pacientes. Isso se deve a uma resposta imunológica secundária a antígenos liberados pela tireoide. Em resumo, a fase aguda da TGSA caracteriza-se por dor na região cervical anterior e evidências clinicolaboratoriais de hipertireoidismo, associadas a RAIU/24 h muito baixa ou ausente. * Diagnóstico diferencial TGSA e hemorragia em cisto ou adenoma tireoidianos representam mais de 90% dos casos de tumoração cervical anterior dolorosa. Outras condições são: tireoidite aguda, celulite, infecção em cisto do ducto tireoglosso ou cisto branquial, hemorragia em carcinoma tireoidiano e, raramente, TH dolorosa. TGSA deve também ser diferenciada de condições que cursam com tireotoxicose e baixa RAIU (p. ex., tireotoxicose factícia, tireotoxicose por hambúrguer etc.). Nos casos de TGSA indolor, deve ser feita a distinção com a doença de Graves (DG). Tratamento O tratamento da TGSA visa, sobretudo, ao alívio do quadro doloroso. Quando necessário, devem-se controlar os sintomas de tireotoxicose e tratar o hipotireoidismo. Controle da dor Anti-inflamatórios não esteroides: Devem ser tentados inicialmente, mas só se mostram eficazes nos casos mais brandos. Podem-se usar o ácido acetilsalicílico (AAS), na dose de 500 mg a cada 4 a 6 horas, ou outros anti-inflamatórios mais potentes (nimesulida, naproxeno, piroxicam etc.), nas doses usuais. Se não houver melhora em 2 ou 3 dias, inicia-se o uso de um glicocorticoide. Glicocorticoides (GC): São indicados nos casos de dor refratária aos anti-inflamatórios não esteroides. O alívio dos sintomas ocorre nas primeiras 24 a 48 horas. Caso contrário, o diagnóstico deve ser questionado. Em geral, emprega-se a prednisona, na dose inicial de 40 a 60 mg/dia, ou um outro GC, em dose equivalente, com diminuição gradual durante 4 a 6 semanas (iniciar 1 semana após o desaparecimento da dor e da hipersensibilidade local). Em caso de recidiva ou agravamento da dor, a dose da prednisona deve ser aumentada, e, posteriormente, deve-se tentar uma nova redução gradual. Cirurgia: Tireoidectomia pode ocasionalmente ser necessária nos casos de tireoidite dolorosa não responsiva aos GC. Controle dos sintomas de hipertireoidismo Betabloqueadores: Representam a melhor opção. Mais comumente, usa-se o propranolol. Antitireoidianos de síntese (metimazol, propiltiouracil): Não são indicados, porque não há síntese hormonal excessiva, mas, sim, liberação demasiada dos hormônios estocados dentro da glândula, devido à destruição dos folículos tireoidianos. Controle do hipotireoidismo Levotiroxina (LT4): A maioria dos pacientes com hipotireoidismo tem sintomas leves e não requer tratamento. Nos casos mais graves ou mais sintomáticos, administram-se 50 ou 100 μg/dia de LT4 por 6 a 8 semanas. Depois desse período, a medicação deve ser descontinuada, com nova avaliação da função tireoidiana após 4 a 6 semanas, para confirmar se o hipotireoidismo é permanente ou não. Prognóstico Hipotireoidismo permanente tem sido relatado em até 15% dos casos. A recidiva da TSGA é rara (2 a 4%), sendo mais comum nos pacientes que fizeram usode corticoterapia. 2.2) TIREOIDITE LINFOCÍTICA SUBAGUDA (TLSA) A TLSA pode ocorrer espontaneamente ou após o término da gravidez, caracterizando a chamada tireoidite pós-parto (TTP). Estudos imunológicos e histopatológicos têm sugerido que a TLSA seria uma doença autoimune. Alguns autores acreditam que ela poderia ser uma forma subaguda da TH, pois os achados histológicos de infiltrado linfocítico são semelhantes aos desta última, porém bem menos intensos. A TLSA tem sido também descrita em associação com outras doenças autoimunes. Foi detectada uma frequência aumentada de HLA-DRw3 e HLA-DRw5 na TLSA, o que torna provável a predisposição genética. Os achados histológicos da tireoidite silenciosa são semelhantes aos da TH, embora muitas vezes menos acentuados. Durante a fase tireotóxica, há infiltração linfocítica acentuada, que pode ser difusa ou focal. No período de recuperação ou de hipotireoidismo, encontra-se infiltração linfocítica discreta, com folículos em regeneração contendo pouco coloide. Meses ou anos depois ainda pode-se reconhecer uma tireoidite linfocítica leve. Tireoidite linfocítica indolor A forma espontânea da TLSA tem sido também denominada tireoidite linfocítica indolor (TLI) ou silenciosa. Ela é mais frequente no sexo feminino (na proporção de 1,5:1 a 2:1) e pode ocorrer em qualquer faixa etária (mais comum entre os 30 e os 60 anos de idade). Pode responder por, aproximadamente, 1% de todos os casos de tireotoxicose. Diagnóstico Manifestações clínicas A exemplo da TGSA, a TLI também pode cursar com quatro fases: hipertireoidismo inicial, seguido de eutireoidismo, hipotireoidismo e, finalmente, recuperação funcional da glândula. A doença é, geralmente, diagnosticada na fase de hipertireoidismo, com duração de, aproximadamente, 6 semanas a 3 a 4 meses (raramente mais). Os pacientes queixam-se de intolerância ao calor, nervosismo, palpitações, emagrecimento etc. Algumas vezes, essa fase inicial pode passar despercebida, sendo a doença detectada já por sintomas de hipotireoidismo ou apenas pelo bócio, que ocorre em cerca de 50% dos casos e é indolor, difuso, com consistência firme e dimensão pequena (duas a três vezes o normal). O hipotireoidismo ocorre em 25 a 40% dos casos, pode ser assintomático e geralmente tem um curso de 8 a 12 semanas, mas há a possibilidade de tornar-se permanente. Alterações laboratoriais O comportamento da função tireoidiana bem como os achados cintilográficos e ultrassonográficos são similares aos da TGSA e dependem da fase em que a doença é detectada. Na fase inicial de hipertireoidismo, há elevação dos níveis séricos de T3 e T4 livre e da tireoglobulina (pela destruição tecidual), com supressão do TSH. Além disso, a RAIU/24 h está sempre baixa. Elevação dos anticorpos antitireoidianos é bem mais frequente do que na TGSA: anticorpos antiTg em 24 a 100% (dependendo do ensaio utilizado) e antiTPO em 60%. A VHS encontra-se normal (em cerca de 40% dos casos) ou apenas discretamente elevada. O hemograma geralmente é normal (leucocitose ocasional). A imagem com Doppler colorido geralmente mostra redução da vascularização. Diagnóstico diferencial O principal diagnóstico diferencial da tireoidite indolor é com a DG, da qual se distingue principalmente pela ausência de orbitopatia, pela baixa RAIU/24 h e por valores dos anticorpos antirreceptores do TSH (TRAb) habitualmente normais (Quadro 34.4). Por outro lado, a destruição da tireoide pelo processo inflamatório pode raramente estimular a produção de TRAb, ocasionalmente desencadeando a DG. Conforme já mencionado, a TGSA raramente é indolor. Tratamento Em virtude do caráter transitório da doença e da ausência de dor, a terapêutica da TLI objetiva o controle dos sintomas de hiper ou hipotireoidismo, se necessário. Controle dos sintomas de hipertireoidismo: Como a tireotoxicose na tireoidite silenciosa é geralmente leve, muitas vezes não requer tratamento. Quando necessário, utiliza-se um betabloqueador (p. ex., propranolol, 40 mg a cada 6 ou 8 horas) para alívio das manifestações hipertireóideas (tremor, palpitações, insônia, nervosismo etc.). Raramente são necessárias outras medidas, como o uso de GC, que deve ser reservado para os casos sem resposta adequada aos fármacos mencionados. Inicia-se com 40 a 60 mg/dia de prednisona e reduz-se a dose, após 1 a 2 semanas, em 7,5 a 10 mg/semana. A resposta aos GC é habitualmente satisfatória. Nos casos de tireoidite recidivante, excepcionalmente radioiodo ou tireoidectomia subtotal pode ser necessário. Tratamento do hipotireoidismo: Após a fase tireotóxica, vários pacientes tornam-se temporariamente hipotireóideos. Entretanto, a reposição de LT4, em geral, não é necessária nesse período. Somente uma pequena proporção de pacientes permanece com hipotireoidismo definitivo, requerendo doses terapêuticas plenas de LT4. Prognóstico O risco do desenvolvimento de disfunção tireoidiana e bócio permanentes é significativamente maior na TLSA do que na TGSA. Hipotireoidismo crônico residual ocorre em 20% dos casos de TLSA. As recidivas também são bem mais frequentes. TIREOIDITE PÓS-PARTO A tireoidite pós-parto (TPP) é uma doença tireoidiana relativamente comum. É mais comum em mulheres com altos títulos de antiTPO no 1º trimestre ou imediatamente após o parto, assim como no caso de existência de outras doenças autoimunes, como diabetes tipo 1 ou história familiar de doenças tireoidianas autoimunes. A positividade do antiTPO no primeiro trimestre relaciona-se com a TPP em mais de 80% dos casos. Ela também foi relatada após abortos espontâneos ou induzidos. Diagnóstico Manifestações clínicas A TPP pode apresentar-se por uma das três seguintes maneiras: Apenas hipertireoidismo transitório Apenas hipotireoidismo transitório Hipertireoidismo transitório seguido de hipotireoidismo transitório e, depois, recuperação com eutireoidismo. Os sintomas de hipertireoidismo, quando ocorrem, geralmente são leves e consistem, sobretudo, em ansiedade, fraqueza, irritabilidade, palpitações, taquicardia e tremor. As manifestações do hipotireoidismo também costumam ser discretas, tais como astenia, falta de energia e pele seca. Além disso, o hipotireoidismo pode associar-se à depressão pós-parto e talvez, também, agravá-la. A maioria das mulheres com TPP tem bócio difuso, pequeno e indolor que desaparece após o retorno ao eutireoidismo. Alterações laboratoriais Os achados laboratoriais da TPP são semelhantes aos da tireoidite silenciosa. Na fase hipertireóidea, observam-se níveis altos ou no limite superior da normalidade de T3 e T4, com supressão do TSH e baixa RAIU/24 h. Na fase de hipotireoidismo, encontram-se TSH elevado e T4 baixo ou normal. Nas mulheres com hipertireoidismo seguido de hipotireoidismo, os níveis séricos de T4 podem permanecer baixos por vários dias ou semanas antes que a concentração do TSH exceda os valores normais, em razão da supressão do TSH durante a fase de hipertireoidismo. Títulos elevados de antiTPO são detectados em até 85% das pacientes, sendo mais altos durante a fase hipotireóidea ou logo depois dela. AntiTg são também encontrados em concentrações elevadas, e os TRAb podem raramente ser demonstrados, em títulos baixos, durante as fases de hipotireoidismo ou recuperação. Resultariam de autoimunização durante a fase de agressão tireoidiana ativa. A VHS pode mostrar-se levemente aumentada em algumas pacientes. Em casos de TPP, a US pode mostrar aumento da tireoide, com hipoecogenicidade multifocal ou difusa (quase sempre presente), bem como calcificações e áreas císticas. Diagnóstico diferencial O principal diagnóstico diferencial da fase de hipertireoidismo da TPP é feito com a DG.2 O hipertireoidismo na TPP é geralmente leve (clínico e laboratorialmente) e transitório, o aumento tireoidiano é mínimo, e não há orbitopatia. As duas doenças podem, com frequência, ser diferenciadaspor meio de reavaliação após 3 a 4 semanas. Nessa época, a maioria das mulheres com TPP terá melhorado, e o estado daquelas com DG permanecerá inalterado. A melhor maneira de distinguir os dois distúrbios tireoidianos é pela determinação da RAIU/24 h (baixa na TPP e alta na DG), mas este exame não pode ser feito em mulheres que estejam amamentando, e pela demonstração de títulos elevados do TRAb (presentes em 80 a 100% dos casos de DG). Prevenção Existem limitadas evidências de que a administração de selênio em gestantes antiTPOpositivas reduza os títulos desses anticorpos e a incidência de TPP. Tratamento A maioria das mulheres com TPP não necessitará de tratamento durante a fase de hiper ou hipotireoidismo. Em casos de sintomas incômodos de hipertireoidismo, deve-se administrar um betabloqueador (40 a 120 mg/dia de propranolol ou 25 a 50 mg/dia de atenolol, diariamente) até que as concentrações séricas de T4 se normalizem. As pacientes com hipotireoidismo sintomático devem ser tratadas com 50 a 100 μg/dia de LT4, durante 8 a 12 semanas. Depois desse período, a medicação deve ser descontinuada, e a paciente, reavaliada após 4 a 6 semanas. Rastreamento Apesar de ainda não haver consenso quanto ao modo de rastreamento da TPP, alguns autores têm preconizado, como medida inicial, a determinação dos antiTPO no primeiro trimestre, seguida de avaliações periódicas do status tireoidiano, nos casos positivos, durante 6 a 12 meses após o parto. Como mencionado, pacientes antiTPOpositivas no início da gravidez apresentam risco elevado (33 a 50%) de desenvolver TPP. Entretanto, tal condição também afeta até 30% das mulheres antiTPOnegativas. A determinação precoce dos antiTPO na gravidez serviria, também, para identificar mulheres com alto risco de aborto espontâneo. Observou-se que, em pacientes antiTPOpositivas, a frequência dessa complicação obstétrica foi duas a três vezes maior, em comparação às antiTPOnegativas. Outros autores não encontraram, contudo, tal associação. Segundo recentes diretrizes da American Thyroid Association28 e da Endocrine Society, o rastreamento da TPP é indicado, quando há história pessoal de hipotireoidismo, hipertireoidismo, bócio, positividade para anticorpos antiTPO, TPP prévia, tireoidectomia parcial, história familiar de doença tireoidiana, sintomas ou sinais de hipo ou hipertireoidismo (incluindo anemia), hipercolesterolemia e hiponatremia, diabetes tipo 1 ou outras doenças autoimunes, história de irradiação de cabeça e pescoço, e de abortamento espontâneo. Nas gestantes consideradas de alto risco, deve-se rastrear a TPP antes da gravidez ou imediatamente após a confirmação dessa condição. Esse rastreamento seria particularmente benéfico para mulheres com diagnóstico prévio de TPP, nas quais a prevalência de tireoidite recorrente chega a 75%, e para diabéticas tipo 1 (prevalência de até 25%). 3) TIREOIDITES CRÔNICAS TIREOIDITE DE HASHIMOTO Tireoidite linfocítica crônica, tem etiologia autoimune e é a forma mais comum de tireoidite. A TH tem prevalência mundial de 0,3 a 1,5 por 1.000 indivíduos e predomina no sexo feminino (5 a 20 vezes mais frequente). Ocorre em qualquer faixa etária, mas tem pico de incidência entre 40 e 60 anos de idade. Fatores de risco Fatores intrínsecos (70-80%) Genética. risco aumentado em irmãos de indivíduos afetados e maior taxa de concordância em gêmeos monozigóticos, em comparação aos heterozigotos. Os genes imunomoduladores de suscetibilidade à TH, identificados e confirmados, são o CTLA4 e o da proteína tirosina fosfatase22 (PTPN22). Os estudos de associação da TH com antígenos HLA são pouco consistentes, tendo sido descritas associações a HLADR3 e DQB1*0301 em caucasianos, HLA-DRw53 em japoneses e HLA-DR9 em chineses. A TH com bócio foi associada à HLA-DR5, e TH atrófica, à HLA-DR3. A molécula CTLA4 é o principal regulador negativo da ativação dos linfócitos T, pela competição da ligação da proteína B7 (expressa na célula apresentadora de antígeno) à proteína coestimuladora CD28. Portanto, mutações no gene CTLA4 poderiam resultar em ativação exagerada dos linfócitos T e desenvolvimento de autoimunidade. Idade. a prevalência de autoanticorpos tireoidianos (TAb) aumenta com a idade. Acredita-se que a idade aumentaria o tempo de exposição aos agentes ambientais e produziria alterações na imunorregulação, que poderiam contribuir para o surgimento da tireoidite autoimune. Sexo. A TH é 10 vezes mais frequente no sexo feminino em comparação ao masculino. O cromossomo X poderia estar envolvido nessa diferença. No entanto, o mais provável seria um efeito dos hormônios sexuais no sistema imune, em que os estrógenos teriam papel exacerbador e a testosterona, efeito protetor. O uso de contraceptivos orais também tem sido citado como outro fator que contribuiria para a maior prevalência de TH em mulheres. Fatores extrínsecos Iodo e medicamentos que contêm iodo. Estudos populacionais têm correlacionado um crescimento na incidência da TH com o incremento na ingestão de iodo, em regiões com quantidades adequadas de iodo. Medicamentos ricos em iodo (p. ex., amiodarona [AMD]) precipitam tireoidite autoimune em populações suscetíveis. Nestas, o excesso de iodo aumenta a quantidade intratireoidiana de linfócitos Th17 e inibe o desenvolvimento de células T regulatórias, enquanto ele gera uma expressão anormal da citocina TRAIL (tumor necrosis factorrelated apoptosisinducing ligand) nos tireócitos, induzindo, assim, apoptose e destruição do parênquima. Selênio. Micronutriente essencial para a produção de selenoproteínas que exercem um papel importante na síntese, no metabolismo e na ação dos hormônios tireoidianos. Sua deficiência foi associada a bócio e hipoecogenicidade da tireoide, aspectos característicos da TH; sua suplementação parece modificar a resposta imune, reduzindo de modo significativo os títulos de antiTPO e a ecogenicidade da tireoide em pessoas com tireoidite autoimune. No entanto, os dados sobre a eficácia da administração de selênio na redução dos antiTPO e na prevenção do hipotireoidismo subclínico são ainda conflitantes e inconclusivos. Vitamina D. Pacientes com níveis baixos de vitamina D têm maior prevalência de antiTPO. Contudo, ainda não há estudos de intervenção com a administração de vitamina D nesses casos. Citocinas. O tratamento de pacientes com interleucina2 (IL2) ou interferonα pode precipitar o aparecimento de DTA na forma de TH ou DG. Radiação. Uma série de estudos mostrou que a exposição à radiação (terapêutica ou acidental) é capaz de induzir o surgimento de anticorpos antitireoidianos e DTA. Infecção. Evidências que apoiam uma causa infecciosa para DTA incluem sazonalidade em sua incidência, variação geográfica e evidência sorológica de uma recente infecção bacteriana ou viral. Vários agentes infecciosos têm sido implicados na patogênese das DTA, incluindo Yersinia enterocolitica, vírus Coxsackie B, retrovírus, Helicobacter pylori e Borrelia. Em contrapartida, o vírus da hepatite C (HCV) é o único agente infeccioso que, por mecanismo ainda não estabelecido, está claramente associado a risco aumentado para DTA. Histopatologia Cito-histologicamente, a TH caracteriza-se por um infiltrado de linfócitos, plasmócitos e macrófagos no parênquima tireoidiano, com graus variáveis de atrofia e fibrose. As células foliculares podem ser pequenas ou hiperplasiadas com epitélio colunar alto. Um achado quase patognomônico são achados de células de Hürthle ou células de Askanazy, manifestas como células grandes com núcleo hipercromático, vacuolizado e citoplasma eosinofílico. Patogênese Os mecanismos patogênicos da TH não são plenamente conhecidos. No entanto, é sabido que as células T CD4+ excessivamente estimuladas desempenham o papel principal nesse processo. As células T executam duas funções na patogênese da HT. De fato, as células T helper do tipo 2 (Th2) promovem excessivas estimulaçãoe produção de células B e plasmócitos que produzem anticorpos contra antígenos tireoidianos, causando tireoidite. Ademais, as células Th1 ativam linfócitos e macrófagos citotóxicos, os quais diretamente afetam o tecido tireoidiano, destruindo suas células foliculares. Pesquisas recentes têm demonstrado um papel cada vez maior de células recentemente descobertas, como Th17 (CD4+IL17+) ou células T reguladoras (CD4+CD25+FoxP3+) na indução de doenças autoimunes. O processo de morte celular programada também desempenha um papel igualmente importante na patogênese e no desenvolvimento de hipotireoidismo. O bloqueio do receptor de TSH por autoanticorpos, que atuam como antagonistas do TSH, pode ser a causa de alguns casos da forma atrófica da doença de Hashimoto. A TH relacionada ao IgG4 é um novo subtipo dessa doença, caracterizada por inflamação tireoidiana rica em plasmócitos IgG4positivos e fibrose acentuada. Ela pode ser parte da doença sistêmica relacionada à IgG4. Diagnóstico Manifestações clínicas A maioria dos pacientes com TH é assintomática. Geralmente, o diagnóstico é feito por investigação a partir de anormalidades em exames de rotina ou pela detecção de um bócio discreto ao exame físico. Sintomas de hipotireoidismo são a queixa inicial do paciente com TH em 10 a 20% dos casos. O hipertireoidismo é bem menos frequente, ocorrendo em menos de 5% dos casos. Alguns pacientes cursam com alternância de hipo e hipertireoidismo. O bócio é observado na maioria dos casos. Geralmente é difuso, mas, não raramente, pode ser uni ou multinodular. Em geral, é indolor, de consistência firme, superfície irregular ou lobulado e de tamanho variável. Mais comumente, o volume da tireoide corresponde a 2 a 4 vezes o normal. Ocasionalmente pode haver queixa de dor, em geral de intensidade leve, ou apenas desconforto local. Muito raramente, o quadro doloroso pode mimetizar a tireoidite granulomatosa. Nos casos de crescimento rápido do bócio, pode haver sintomas de disfagia, dispneia e rouquidão por pressão sobre estruturas cervicais. Existe ainda a tireoidite atrófica, que seria a evolução tardia da TH, com anticorpos também positivos, porém sem bócio e geralmente cursando com hipotireoidismo. No passado, era chamada de mixedema primário. Na TH, há uma relação temporal quanto às suas manifestações clínicas. O hipotireoidismo incide progressivamente com o avançar da idade. Já a ocorrência de bócio é inversamente proporcional. Alterações laboratoriais A principal característica laboratorial da TH são os anticorpos antiTPO, encontrados em títulos elevados em cerca de 80 a 99% dos pacientes. Anticorpos antiTg são detectados em até 60% dos casos (Quadro 34.6). Sua dosagem rotineira não é indicada. De fato, enquanto 95% dos pacientes positivos para antiTg também o são para antiTPO, cerca de 50 a 60% dos soropositivos para antiTPO são negativos para antiTg. Em pacientes jovens com TH, os antiTPO tendem a se apresentar com níveis séricos mais baixos do que os dos adultos. Os TRAb podem ser positivos em 6 a 60% dos casos de TH, mas com nítida predominância de TRAb bloqueadores (ver Quadro 34.6). Na TH, os níveis de FT4 e TSH podem estar compatíveis com hipotireoidismo, eutireoidismo ou, raramente, hipertireoidismo. É comum o achado de hipotireoidismo subclínico (TSH elevado com FT4 normal). Esses pacientes tendem a progredir para o hipotireoidismo franco. Em alguns estudos, a taxa de progressão foi de 3 a 5% ao ano, sendo prevalente em mulheres com mais de 60 anos de idade. A RAIU/24 h pode estar normal, baixa ou elevada, sendo de pouca utilidade para o diagnóstico, assim como a cintilografia. O aspecto ultrassonográfico da TH foi bem estudado e é descrito como uma tireoide difusamente aumentada, heterogênea e hipervascular, com micronódulos, septações ecogênicas e diminuição da ecogenicidade. Tais características ultrassonográficas podem anteceder as alterações bioquímicas e são muito sugestivas. Na fase final da tireoidite crônica, a glândula apresenta-se de tamanho reduzido com contornos irregulares e mal definidos e com textura heterogênea em razão da intensa fibrose. São comuns os achados de pseudonódulos e calcificações. A avaliação citológica pela PAAF confirma o diagnóstico, porém não é fundamental. Torna-se mandatória no caso de dor local, crescimento rápido ou palpação de nódulos, para investigação da possibilidade de neoplasias associadas. Diagnóstico diferencial A TH deve sempre ser a primeira hipótese diagnóstica em pacientes com hipotireoidismo primário ou bócio difuso atóxico. Nessas situações, achados de anticorpos antiTPO em títulos elevados confirmam o diagnóstico. Devem, também, ser considerados em qualquer paciente com bócio nodular atóxico, mas nesses casos a PAAF torna-se obrigatória para pesquisa de uma eventual neoplasia tireoidiana. Em pacientes com hipertireoidismo e bócio difuso, a oftalmopatia infiltrativa e antiTPO em títulos não muito elevados são mais indicativos da DG. Raramente, oftalmopatia infiltrativa pode ser observada em pacientes com TH, na ausência de hipertireoidismo. Na realidade, TH e DG são síndromes muito intimamente relacionadas e fazem parte do espectro das DAT. Doenças associadas Doenças autoimunes. A TH pode ser associada a outras doenças autoimunes, endócrinas ou não, caracterizando a síndrome poliglandular autoimune. A associação mais comum é com o diabetes melito tipo 1. Neoplasias tireoidianas. A concomitância de TH com o carcinoma papilífero de tireoide (CPT) não é rara, mas aparentemente não tem relação causal. Nessa situação, o CPT parece ser menos agressivo e cursar com menor tamanho, bem como com taxas de recorrência e mortalidade mais baixas. Em contrapartida, a maioria dos casos de linfoma primário da tireoide ocorre em pacientes com TH (risco 60 a 80 vezes maior). Deve-se sempre pensar nessa associação, diante de um nódulo de crescimento rápido em pacientes com TH. Outras enfermidades. Pacientes com síndrome de Down ou de Turner têm risco aumentado para TH. O mesmo parece acontecer com a síndrome dos ovários policísticos, conforme recentemente relatado. Encefalopatia de Hashimoto (EH). Trata-se de uma condição recentemente descrita que tem prevalência estimada de 2,1:100.000 e caracteriza-se por encefalopatia e altos títulos de anticorpos antiTPO no soro, com boa resposta à terapia com GC. Até o momento, não foi definido se esses anticorpos representam um epifenômeno imune em um subgrupo de pacientes com processos encefalopáticos ou se realmente estão envolvidos nos mecanismos patogênicos da EH. Tratamento Pacientes com TH e eutireoidismo, em geral, não requerem tratamento. A reposição com LT4está prioritariamente indicada para pacientes hipotireóideos. GC e cirurgia raramente são necessários. Reposição de levotiroxina A dose da LT4 deve ser suficiente para reduzir o TSH a valores entre 0,5 e 2,5 μUI/mℓ (em geral, 75 a 125 μg/dia em mulheres e 100 a 200 μg/dia em homens). Também tem se recomendado o uso da LT4 em pacientes com TH que apresentem hipotireoidismo subclínico (TSH elevado, com T3 e T4 normais), uma vez que é elevada a progressão para o hipotireoidismo franco nesses casos. Uma vez iniciada, em geral, a reposição de LT4 não tem prazo definido. Entretanto, estima-se que até 10% dos pacientes inicialmente hipotireóideos futuramente poderão recuperar a função tireoidiana normal. Isso poderia resultar da redução de anticorpos citotóxicos, modulação de anticorpos bloqueadores para o receptor do TSH ou algum outro mecanismo. Além do alívio sintomático, o tratamento com LT4 pode reduzir o tamanho do bócio e geralmente leva à diminuição dos níveis de antiTPO, mas a normalização dos mesmos, na prática diária, não é frequente. Glicocorticoides GC podem ser úteis nos raros casos acompanhados de dor tireoidiana importante, ou nos casos com bócio de crescimento rápido que leve a sintomas compressivos, masessa apresentação é, também, bastante infrequente. Cirurgia Tireoidectomia subtotal geralmente é indicada no caso de sintomas compressivos ou de dor refratária ao tratamento medicamentoso. Motivações estéticas (bócios muito volumosos) ou malignidade (confirmada ou suspeitada) em nódulo tireoidiano são outras indicações cirúrgicas. TIREOIDITE DE RIEDEL Também chamada de tireoidite fibrosa invasiva, a TR é a tireoidite mais rara e tem etiopatogênese desconhecida. Sua incidência é de apenas 0,05% entre pacientes submetidos à tireoidectomia. Na Mayo Clinic, nos EUA, foram confirmados histologicamente 20 casos entre 42.000 tireoidectomias realizadas entre 1920 e 1955. TR acomete, em geral, indivíduos entre a quarta e a sexta década de vida, embora existam casos descritos em indivíduos de 23 a 78 anos de idade. É 2 a 4 vezes mais comum no sexo feminino. Manifestações clínicas A TR é caracterizada por fibrose extensa da glândula tireoide, que também afeta os tecidos adjacentes. Clinicamente, ela assemelha-se a linfoma ou carcinoma anaplásico tireoidianos, apresentando-se como um bócio de consistência endurecida. Geralmente, existe história de crescimento cervical indolor, com progressão e evolução variáveis, de poucas semanas a vários anos. Os sintomas frequentes são compressão esofágica ou traqueal, disfagia, sensação de peso ou pressão em região cervical, rouquidão e estridor (por lesão do nervo laríngeo recorrente) e sintomas respiratórios (dispneia, tosse, sensação de sufocamento e até asfixia). A queixa de dor é incomum. Pode ocorrer hipotireoidismo, se o comprometimento da glândula for extenso. A maioria dos pacientes apresenta astenia e adinamia, mesmo sendo eutireóideos. Ocasionalmente pode haver hipoparatireoidismo associado, o qual pode, às vezes, preceder a TR. O exame físico revela massa cervical de consistência endurecida, descrita como lenhosa, normalmente indolor, de dimensões que podem variar de pequenas a muito grandes, em geral de comprometimento difuso, podendo ser unilateral. É aderente e invade estruturas circunjacentes, como músculos, vasos e nervos. A sua consistência tende a ser mais endurecida do que a dos carcinomas. Raramente ocorre linfadenomegalia e, quando há, está associada a grandes lesões. Uma vez diagnosticado o comprometimento tireoidiano, deve-se ficar atento a possíveis alterações em outros locais, principalmente à fibrose retroperitoneal. Doenças associadas Foram descritas associações da TR com fibrose de glândulas salivares, de glândulas lacrimais, fibrose mediastinal, retroperitoneal, colangite esclerosante e pseudotumor de órbita. Trata-se de uma mesma patologia com amplo espectro de manifestações. É raro ocorrer fibrose extracervical em mais de uma localização. Um terço dos pacientes com TR acompanhados a longo prazo desenvolvem alguma forma de fibrose extracervical; no entanto, menos de 1% dos pacientes com fibrose peritoneal apresenta TR associada. Diagnóstico laboratorial A PAAF, na maioria dos casos, não é elucidativa. Esse procedimento é de difícil execução, dada a rigidez do tecido. O diagnóstico deve ser confirmado por biopsia a céu aberto. O exame histológico é essencial, já que clinicamente a TR pode ser confundida com carcinoma. Devido à extensa fibrose ou à concomitância de TH, hipotireoidismo primário pode acometer 25 a 80% dos pacientes com TR. Títulos elevados de anticorpos antitireoidianos são encontrados em 67 a 90% dos casos. Entretanto, não está definido se esses anticorpos são uma causa ou consequência da destruição fibrótica da tireoide. O hemograma geralmente está normal ou revela leucocitose. A VHS mostra-se um pouco elevada. A RAIU/24 h em regra está normal. À cintilografia, podem-se evidenciar áreas frias, que correspondem à extensão da lesão. Tanto a US quanto a TC são úteis para delimitar o envolvimento tireoidiano. O exame histopatológico tem como característica uma fibrose intensa comprometendo a glândula total ou parcialmente e que se estende além da cápsula, podendo envolver nervos, vasos, tecido muscular, adiposo e até as paratireoides. Tratamento Nos casos em que há sintomas compressivos ou suspeita de malignidade, é indicado o tratamento cirúrgico. Alívio dos sintomas compressivos nos estágios iniciais da doença já foi relatado com os GC, tamoxifeno e metotrexato. Os hormônios tireoidianos também têm sido utilizados, porém essa indicação não está bem clara quando não há hipotireoidismo. Prognóstico O curso da TR é benigno, com progressão geralmente lenta, podendo estacionar ou mesmo involuir sem nenhuma terapêutica. Melhora dos sintomas compressivos não responsivos ao tratamento medicamentoso é obtida com a cirurgia.
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