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111 A CONTRIBUIÇÃO DE PAULO FREIRE NO PROCESSO ENSINO/APRENDIZAGEM Viviane Pereira da Silva Melo1 RESUMO Este trabalho tem como objetivo apresentar a contribuição do educador Paulo Freire no processo ensino/aprendizagem. Para tanto, fez-se um estudo teórico a partir das obras de Paulo Freire (1987,1991,1995,1996,2002) sobre o ato de ensinar e, consequentemente, de aprender. Foi desenvolvida umapesquisa bibliográfica que permitiu conhecer e entender as concepções freireanas referentes à prática pedagógica. Espera-se que esta pesquisa seja um instrumento relevante de interpretação da realidade social e histórica que permeia as relações humanas na compreensão de Freire. Palavras-chave: Educação. Ensinar. Aprender. Diálogo. Paulo Freire. ABSTRACT Thisworkaimsto present thecontribution of theeducator Paulo Freire in theteaching / learningprocess. For that, a theoreticalstudywas made basedontheworks of Paulo Freire (1987, 1991, 1995, 1996, 2002, 2002) onteaching and, consequently, learning. Wedeveloped a bibliographicalresearchthatallowedustoknow and understandtheFreireanconceptionsreferringtothepedagogicalpractice. It ishopedthatthisresearchis a relevantinstrument of interpretation of the social and historical reality thatpermeateshumanrelations in Freire'sunderstanding. 1INTRODUÇÃO Este artigo está integrado à linha de pesquisa Estado, Políticas e História da Educação do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás. A pesquisa visa conhecer e compreender a contribuição de Paulo Freire (1987,1991,1996,2002), na 1Professora Esp. do Instituto Aphonsiano de Ensino Superior. Mestranda em Educação pela UFG. 112 educação brasileira, tendo como referência outros estudiosos que discutem esta temática, os quaisse destacam:Gadotti (2007-2008), Saviani (2008), Barreto (1998), Saul (2012), Shor (1986). A investigação objetiva demonstrar a contribuição do educador Paulo Freire no processo ensino/aprendizagem, estabelecendo como eixos principais: a) pesquisar sobre a relação ensino/aprendizagem; b) conhecer a base do pensamento de Freire. Sendo assim, faz-se necessário explicitar os conceitos que orientam a nossa pesquisa e a estrutura do trabalho, que foi organizado em dois tópicos, propondo discutir assuntos relevantes à compreensão do tema em estudo. No primeiro tópico – Conhecendo a base do pensamento de Paulo Freire-apresentamosum histórico sobre o fundamento da concepção freireana; visando, assim, apontar que as ideias de Paulo Freire veem ao encontro da defesa da escola pública. No segundo tópico – Paulo Freire e o processo ensino/aprendizagem– discorremos sobre a contribuição do educador Freire sobre os saberes essenciais àprática educativaque oportunizem a autonomia dos educandos. 2 CONHECENDO A BASE DO PENSAMENTO DE PAULO FREIRE Atualmente, a educação brasileira enfrenta uma série de desafios, os quais apontam para a necessidade de uma escola que ofereça uma educação de qualidade social. Neste sentido, Barreto (1998) descreve que: Na visão de Paulo Freire, o conhecimento é produto das relações dos seres humanos entre si e com o mundo. Nestas relações, homens e mulheres são desafiados a encontrar soluções para situações para as quais é preciso dar respostas adequadas. Para isto, precisam reconhecer a situação, compreendê-la, imaginar formas alternativas de responder e selecionar a resposta mais adequada (BARRETO, 1998, p.56). 113 Mediante o exposto, percebemos que o conhecimento é construído por intermédio das relações entrehomem e mundo e estes devem se reconhecer para poderem ser sujeitos de sua própria história. Nesta perspectiva, a escola precisa desenvolver uma pedagogia que contemple um currículo significativo e contextualizado, para que o ensino e a aprendizagem de fato se efetivem pautados em uma proposta política pedagógica que esteja alicerçada, criticamente, na realidade social, política e histórica. Gadotti (2007, p. 50) apresenta Paulo Freire como “um defensor da escola pública que é a escola da maioria, das periferias, dos cidadãos que só podem contar com ela. A escola pública do futuro, numa visão cidadã freireana, tem por objetivo oferecer possibilidades concretas de libertação para todos”. Nesse entendimento, a escola é vista por Freire como um lugar especial, por ser um espaço de relações e representações sociais. Assim,ela assume seu papel como uma contribuição importante na transformação social. E, para que esta escola possa ser o local de múltiplas oportunidades de aprendizagem, vários elementos devem ser compreendidos dentro de sua totalidade, sejam os alunos, professores, equipe gestora e a comunidade escolar. Cada um deve se assumir enquanto sujeito neste processo de construção do conhecimento e formação da cidadania. O diálogo na relação educador/educando é um dos postulados de Freire necessários à educação. Reiterando as palavras do autor: Por isto, o diálogo é uma exigência existencial. E, se ele é o encontro em que se solidariza o refletir e o agir de seus sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e humanizado, não pode reduzir-se a um ato de depositar ideias de um sujeito no outro, nem tampouco tornar-se simples troca de ideias a serem consumidas pelos permutantes (FREIRE, 1987, p.45). Nessa perspectiva, o diálogo é a base da comunicação; portanto, nesta relação dialógica, o homem age como sujeito e se humaniza. Deste modo, o educador deve se posicionar, criticamente, frente à realidade durante o ato de ensinar. Barreto (1998, p. 68) esclarece que a “competência científica necessária,indispensável ao ato de ensinar, jamais é entendida pelo professor progressista como algo neutro. Temos de nos indagar a favor de quem e de que se acha nossa competência científica e técnica”. 114 Assim, ensinar, numa perspectiva dialética, não é uma simples transmissão ou repasse de conhecimento pelo professor ao estudante, mas sim, “Saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou construção” (FREIRE, 1996, p. 47). No que se refere à construção de conhecimento pelo professor e estudante, Freire (1987) elucida que há duas concepções de educação: a) a educação bancária e b) a educação problematizadora e libertadora. a) A educação bancária é a postura do educador como sujeito do processo ensino/aprendizagem em detrimento do saber do aluno; sendo que este é considerado um mero receptor de conteúdos e conhecimentos a serem depositados mecanicamente. b) A educação problematizadora e libertadora é aquela que rompe com os sistemas verticais característicos da educação bancária e fundamenta-se na perspectiva do diálogo. Deste modo, o educador não é mais apenas o que educa, mas sim o que quando educa é educado (FREIRE,1987). Na linha do pensamento freireano, o educador numa concepção bancária é visto como sujeito; logo, há a narração de que ele [...] conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo” os recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem docilmente “encher”, tanto melhores educandos serão (FREIRE, 1987,p.58). Nessa concepção de educação, o professor se torna um mero depositador, cabendo aos alunos guardar e arquivar os conhecimentos, se tornando alienados, o que inviabiliza o poder criador e a criticidade dos educandos, só tendo interesse aos opressores, para os quais a educação se torna um instrumento de dominação e alienação. A educação, para Freire (1987), deve promover a libertação numa concepção de problematização do homem em suas relações com o mundo, pois115 [...] a educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres “vazios” a quem o mundo “encha” de conteúdo; não pode basear-se numa consciência especializada, mecanicistamente compartimentada,mas nos homens como “corpos conscientes” e na consciência como consciência intencionada ao mundo (FREIRE, 1987,p. 67). Portanto, a educação para Freire (1987), deve ser problematizadora e responder a essência do ser da consciência, a sua intencionalidade. A educação libertadora, problematizadora, desconsidera o ato de depositar conhecimentos e valores aos educandos, ao contrário, a educação bancária nega a dialogicidade como essência da educação. Assim, “não podíamos compreender, numa sociedade dinamicamente em fase de transição, uma educação que levasse o homem as posições quietistas ao invés daquela que levasse à procura da verdade em comum, “ouvindo,perguntando,investigando”(FREIRE, 2002, p.98). Nesta direção, é possível perceber que Freire compreende“que ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo. Mediatizados pelos objetos cognoscíveis que, na prática “bancária”, são possuídos pelo educador que os descreve ou os deposita nos educandos passivos” (FREIRE, 1987, p. 69). Para o citado autor, a educação problematizadora requer um professor e estudantes como seres cognocentes, pois ambos constroem conhecimento durante o processo de ensino e buscam uma prática educativa democrática.Freire (1995,p. 79) argumenta que “o papel do educador progressista,é desafiar a curiosidade ingênua do educando para, com ele,partejar a criticidade”.Portanto, cabe ao educador desafiar o educando a discutir o conteúdo proposto no sentido social,ideológico e político. Barreto (1998) aponta que Paulo Freire foi o primeiro educador a defender que não existe educação que seja politicamente neutra, a educação numa sociedade de classes serve a diferentes interesses. Assim, constata-se a necessidade de o professor assumir a politicidade do ato educativo “ensinar do ponto de vista progressista, não pode reduzir-se a um puro ensinar aos alunos 116 a aprender através de uma operação em que o objeto do conhecimento fosse o ato mesmo de aprender” (BARRETO, 1998,p.69). Portanto, compete ao professor, desenvolver uma prática educativa pautada no diálogo, em que a construção do conhecimento deve se dar numa relação,em queo professor e o estudante reflitam sobre o objeto do conhecimento. Ao considerar o diálogo como forma de caráter democrático, Shor (1986, p. 66) ressalta que“[...] a abertura do educador dialógico a sua própria reaprendizagem recobre o uso do diálogo de caráter democrático”.Ademais, Shor (1986) reafirma que a educação dialógica enfatiza o desenvolvimento de relações democráticas na escola e, portanto, na sociedade. ParaFreire (1987) não há diálogo, se não houver um profundo amor ao mundo e aos homens. O autor considera que o amor é diálogo, e este deve ser revestido de humildade,pois deve abrir a contribuição ao outro. O diálogo deve ocorrer numa relação horizontal,em que sem diálogo não há educação. Esta busca por uma relação dialógica deve ser iniciada na busca do conteúdo programático. Logo, “é na realidade mediatizadora, na consciência que dela temos, educadores e povo,que iremos buscar o conteúdo programático da educação”(FREIRE, 1987,p.87). Desse modo, na busca do conteúdo programático o educador precisa promover o diálogo e este deve promover uma educação como prática de liberdade. Deve-se buscar, no universo temático do educando, os temas de seu interesse, a partir do seu contexto social, político e ideológico, orientar a sua visão de mundo e extrair os temas geradores, portanto “é importante reenfatizar que o “tema gerador” não se encontra nos homens isolados da realidade, nem tampouco na realidade separada dos homens. Só pode ser compreendido nas relações homens-mundo.” (FREIRE, 1987, p.56) 3PAULO FREIRE E O PROCESSO ENSINO/APRENDIZAGEM 117 Os estudos sobre Paulo Freire mostram que, na condição de educador,o autorbuscou construir uma prática educativaque pudesse desenvolver a autonomia de seus educandos inseridos na sociedade, na qual precisam compreendê-la e transformá-la. Assim, não se pode entender o pensamento pedagógico de Paulo Freire descolado de um projeto social e político. Por isso, não se pode "ser freireano" apenas cultivando suas ideias. Isso exige, sobretudo, comprometer-se com a construção de um "outro mundo possível". Sua "pedagogia sem fronteiras" é um convite para transformar o mundo (GADOTTI,2007, p.52). Considerando as ideais defendidas por Freire (1996), o papel do educador e da escola precisa contemplar diversos saberes necessários à prática educativa, com o intuito de contribuir para a construção da escola e do educando e, consequentemente, do ensino e da aprendizagem. Para Freire (1996), é importante valorizar os diferentes saberes, uma vez que eles [...] remetem a uma reflexão contínua no exercício docente, evitando assim uma postura mecanicista por parte do professor, ou seja, [...] que o ensino não resume em transferir conhecimentos, conteúdos nem formar, é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. (FREIRE,1996, p. 23) Nesse sentido, cabe ao professor, entender que ensinar não é somente um repasse de conhecimentos pré-estabelecidos convencionalmente, e sim assumir uma postura de mediação entre o sujeito e o objeto do conhecimento de forma dialógica. Portanto, compete ao professor,conforme Freire (1996), desenvolver em seus educandos a autonomia de ser e de saber, respeitando-o como sujeito social e histórico. Ainda, no entendimento deFreire (1996), “Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos”, em que os envolvidos no processo ensino aprendizagem respeitem os saberes socialmente construídos na prática comunitária, sempreobservando os conteúdos curriculares, para que o educador possapartir do contexto e das experiências dos próprios educandos. Neste sentido, Freire (1987) propõe a busca do conteúdo programático a partir das relações educador e educando, mediatizados nas relações homem-mundo. 118 Nesta perspectiva, a busca do conteúdo programático deve ocorrer por meio do diálogo, na investigação do universo temático doeducando, extraindo assim os temas geradores, pois esta investigação implica, necessariamente, numa metodologia que não pode contradizer a dialogicidade da educação libertadora. Daí que seja igualmente dialógica. Daí que, conscientizadora também, proporcione, ao mesmo tempo, a apreensão dos “temas geradores” e a tomada de consciência dos indivíduos em torno dos mesmos. (FREIRE, 1987, p.50) Assim, os temas geradores devem proporcionar uma riqueza de discussão, permitindo assim a análise da sua constituição histórica, seu significado e sua pluralidade e portanto contribuir para uma prática de educação libertadora.Neste sentido, é que a investigação do “tema gerador”, que se encontra contido no “universo temático mínimo” (os temas geradores em interação) se realizada por meio de uma metodologia conscientizadora, além de nos possibilitar sua apreensão, insere ou começa a inserir os homens numa forma crítica de pensarem seu mundo(FREIRE, 1987, p.55). Portanto, compete ao educador/investigador desenvolver a metodologia de Paulo Freire a buscados temas geradores e posteriormente as palavras geradoras considerando arealidade dos educandos como ponto de partida do processo educativo, ou seja, uma metodologia que superasse o modelo tradicional de educação, a qual apenas o educador detém o conhecimento. Assim, Paulo Freire defendia uma alfabetização em que o educador deixava de lado o saber pronto, para uma educaçãopautada numa relação dialógica, centrada no pensar. (Barreto,1998). Desse modo, para Barreto (1998) após o material pesquisado, ouseja, o levantamento dos temas geradores, a escolha das palavras geradoras deveriam refletir situações existenciais da realidade e da própria vida dos alfabetizandos e atender aos critérios, como a riqueza fonética, apresentar todas as dificuldades fonéticas e terem teor pragmático, permitindo sua contextualização social, política e cultural. Assim, por meio do debate, do 119 diálogo entre educador e educandos, as palavras geradoras eram apresentadas em fichas, sendo tematizadas e problematizadas, por meio de situações problemas, planejadas e conduzidas pelo educador numa relação dialógica e crítica. Outro aspecto descrito por Freire (1996),sobre o saber necessário à prática educativa, é a exigência de reflexão crítica sobre a prática, sendo que a prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer. O saber que a prática docente espontânea ou quase espontânea, “desarmada”, indiscutivelmente produz é um saber ingênuo, um saber de experiência feito, a que falta a rigorosidade metódica que caracteriza a curiosidade epistemológica do sujeito. Este não é o saber que a rigorosidade do pensar certo procura (FREIRE, 1996, p. 38). Portanto, no entendimento de Freire (1996), há uma necessidade de reflexão crítica sobre a prática educativa, e que esta precisa ser pautada na experiência dos educandos e dos professores, para que estesse assumamcomo seres históricos e sociais, que criticam, que opinam, haja vista que a educação nunca deve ser neutra e sim política; representando, assim, uma forma de transformação da realidade. Para o desenvolvimento desta prática docente crítica, o autor afirma que o professor deve estar em formação permanente, numaperspectiva crítica, pois“(...) o que forma se forma ereforma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado” (FREIRE, 1996, p.23). Em uma perspectiva crítica do ensino, Barreto (1998), elucida que: Ensinar, numa perspectiva progressista, não é a simples transmissão do conhecimento em torno do conteúdo, transmissão que se faz muito mais através da descrição do conceito do objeto a ser mecanicamente memorizada pelos alunos (BARRETO, 1998, p. 65). Para o autor, o educador deve assumir uma postura progressista, respeitando o saber do educando, sendo necessário que o educador observe a realidade que está inserido, incluindo, nos seus conteúdos programáticos,o seu contexto sociocultural e econômico numa perspectiva dialógica. 120 Freire (1992) relata a necessidade da prática educativa dialógica, tendo em vista que o diálogo entre professores ou professores e alunos ou alunas não os torna iguais, mas marca a posição democrática entre eles ou elas. Os professores não são iguais aos alunos por razões entre elas porque a diferença entre eles os faz ser como estão sendo. [...] O diálogo tem significação precisamente porque os sujeitos dialógicos não apenas conservam sua identidade, mas a defendem, não nivela e assim crescem um com o outro (FREIRE, 1992, pp.117-118). A relação dialógica, no entendimento de Freire (1996),não anula o ato de ensinar, e sim converge na ampliação de oportunidades de aprendizagens construídas, dialeticamente, na relação professor aluno e objeto de conhecimento, seja esta criança, jovem ou adulto. Nesta perspectiva dialógica, o ato de ensinar exige respeito à autonomia e dignidade do ser do educando; por isto, o professor precisa assumir uma postura democrática. Freire (1996, p. 70) preconiza queo papel do educador é fundamental para que o educando seja o autor do seu próprio conhecimento. Vejamos: Como professor, se minha opção é progressista e venho sendo coerente com ela, se não me posso permitir a ingenuidade de pensar-me igual ao educando, de desconhecer a especificidade da tarefa do professor, não posso, por outro lado, negar que o meu papel fundamental é contribuir positivamente para que o educando vá sendo o artífice de sua formação com a ajuda necessária do educador. Diante do exposto, o que se percebe é que a postura progressista do professor requer que ele incentive o educando para ser o sujeito do processo educativo, tornando-o crítico e autônomo. Portanto, o professor deve se posicionar na função de mediador do processo ensino/aprendizagem, contribuindo com a construção efetiva do conhecimento. Paulo Freire (1987) demonstra que o princípio fundamental da relação professor-aluno é o diálogo, por conseguinte a ausência deste critério leva a um autoritarismo; negando, assim, a aprendizagem da democracia e a transformação da sociedade. Esta relação deve partir do reconhecimento das condições sociais, culturais, econômicas dos alunos inseridos em suas comunidades. 121 O pensamento freireano buscou compreender o homem e suas relações. Deste modo, preocupou-se em discutir a educação brasileira desde a década de 1960, pensando meios de torná-la melhor numa perspectiva libertadora e progressista. Nas palavras de Saviani (2008), Paulo Freire foi, com certeza, um dos nossos maiores educadores, entre os poucos que lograram reconhecimento internacional. Sua figura carismática provocava adesões, por vezes de caráter pré-crítico, em contraste com o que postulava sua pedagogia. Após sua morte, ocorrida em 1997, a uma maior distância, sua obra deverá ser objeto de análises mais isentas, evidenciando-se mais claramente o seu significado no nosso contexto. Qualquer que seja, porém, a avaliação a que se chegue, é irrecusável o reconhecimento de sua coerência na luta pela educação dos deserdados e oprimidos que no início do século XX, no contexto da “globalização neoliberal”, compõem a massa crescente dos excluídos. Por isso, seu nome permanecerá de uma pedagogia progressista e de esquerda (SAVIANI, 2008, p. 336). Nesse sentido, Saviani (2008) apresenta o legado e a contribuição de Paulo Freire na condição de educador comprometido com os ideais de uma educação libertadora e transformadora. As contribuições de Paulo Freire preconizam saberes essenciais à prática educativa, os quais devem fazer parte do cotidiano das escolas brasileiras e incorporados pelos educadores. Nas palavras de Freire (1996), Uma das tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o professor ou a professora ensaia uma experiência profunda de assumir-se. Assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos [...] (FREIRE, 1996, p.41). Para Freire (1996), o professor/educador deve-se assumir-se como sersocial, histórico, crítico e pensante,capaz de transformar as relações escolares em espaços de pleno exercício e vivência da autonomia e da cidadania. Desta forma, não há prática docente sem discente, e esta relação deve ser uma forma de “intervenção que além do conhecimento dos conteúdos, 122 bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante quanto o seu desmascaramento” (FREIRE, 1996, p.98). Àluz dos pressupostos freireanos, não há dúvidas de que a educação precisa compreender a sociedade e suas formas de organização política e social, afim de entender o contexto das forças dominantes nela inserida e a consciência de classe.Assim,o professor não deve “reduzir sua prática docente ao puro ensino de conteúdos[...].Tão importante quanto o ensino de conteúdos é aminha consciência de classe. A coerência entre o que digo, o que escrevo e o que faço” (FREIRE, 1996, p.103). Isto é, no processo ensino/aprendizagem, é relevante que o professor não fique limitado somente ao ensino de conteúdos, mas sim de despertar no alunado aconsciência de classe, tão ressaltada pelos ideais freireanos. Saul (2012) faz uma releitura dos pressupostos de Freire, quando este assume a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo: Paulo Freire levou para a administração pública os pressupostos da educação popular. A opção política por uma educação crítica, comprometida com princípios de solidariedade e justiça social, a luta pela qualidade social da educação, a abertura da escola à comunidade, a construção do currículo, de forma participativa, autônoma e coletiva, o estímulo à gestão democrática da educação, o respeito ao saber do educandoe a indispensável e necessária formação dos educadores, foram marcos fundamentais que nortearam o seu quefazer na educação de São Paulo (SAUL, 2012, p.05). Freire (1991) descreve sobre o período que assumiu agestão municipalem São Paulo, evidenciando a preocupação de que“mudar a cara da escola implica também ouvir meninos e meninas,sociedades de bairro,pais, mães,diretoras de escolas, delegados de ensino, professores, supervisoras,comunidade científica [...].Não se muda a cara da escola por uma vontade do secretário” (FREIRE,1991, p.95). Com efeito, isso também implica que não se altera o ato de ensinar e de aprender pela simples vontade política, partindo de decisões da classe dominante; antes, porém, deve acatar e respeitar outras vozes: comunidade escolar (aluno, pais, professor, coordenador, gestor) e comunidade local. 123 Dentre tantas ações desenvolvidas por Freire (1991), é imprescindível observar as suas convicções e pressupostos referentesà educação, destacando o diálogo e a participação de todos os envolvidos no âmbito escolar e da administração, bem como a preocupação com a formação permanente do professor. Nas palavras de Gadotti (2007) É assim que entendo a preocupação de Paulo Freire em apontar os saberes necessários à prática educativa crítica. Ele é muito exigente em relação a esse profissional insubstituível. Em Pedagogia da autonomia ele sustenta que, para ser professor, é necessário: rigorosidade metódica, pesquisa, respeito aos saberes dos educandos, criticidade, ética e estética, corporificar as palavras pelo exemplo, assumir riscos, aceitar o novo, rejeitar qualquer forma de discriminação, reflexão crítica sobre prática(...) (GADOTTI, 2007,p.42). Para Gadotti (2007), corroborando com as ideias deFreire(1996), oprofessor tem um papel fundamental e relevante no processo ensino- aprendizagem, que ensinar não é meramente a transferência de conteúdos, e sim a criação de possibilidades de apreensão por parte dos educandos.Nesse contexto, o professor deve apoiar o educando para que ele mesmo supere suas dificuldades, na busca permanente pelo conhecimento, pautada nos saberes necessários a sua prática educativa, portanto, o poder da obra de Paulo Freire não está tanto na sua teoria do conhecimento, mas no fato de ter insistido na idéia de que é possível, urgente e necessário mudar a ordem das coisas.Ele não apenas convenceu muitas pessoas em muitas partes do mundo pelas suas teorias e práticas, mas, também, despertou neles a capacidade de sonhar um mundo “mais humano, menos feio e mais justo”. Ele foi uma espécie de guardião da utopia. Esse é o legado que ele nos deixou. Esse legado é, acima de tudo, um legado de esperança (GADOTTI,2007,p. 89). É possível perceber que os estudos de Freire representam ummarco importante na educação brasileira, principalmente no que se refere ao processo ensino/aprendizagem, cujo legado freireano contribuiu incessante por uma educação mais ética, dialógica, democrática e justa; ademais, educar com esses critérios, exige respeito, humildade, conhecimento e luta por parte do professor. 124 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS É de suma importância reconhecer o legado de Freire na educação brasileira ea suacontribuição no âmbito do processo ensino/aprendizagem e nas práticas escolares. Mediante o exposto, percebemos que o conhecimento é construído por intermédio das relações entrehomem e mundo, sujeitos de sua própriahistória. Desta forma, a escola precisa desenvolver uma pedagogia que contemple um currículo significativo e contextualizado, para que o ensino e a aprendizagem de fato se efetivem pautados em uma proposta político pedagógica que esteja alicerçada, criticamente, na realidade social, política e histórica, desenvolvendo uma educação libertadora e progressista como preconiza Freire. Os estudos realizados para a construção da pesquisa permitiuconstatarmos que o diálogo é a base da comunicação; portanto, nesta relação dialógica, o homem age como sujeito e se humaniza.Destamaneira, ensinar, numa perspectiva progressista, não seria uma simples transmissão ou repasse de conhecimento pelo professor ao aluno, mas sim, “saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou construção” (FREIRE, 1996, p. 47). Neste entendimento, compete ao educador, desenvolver uma prática educativa pautada no diálogo, em que a construção do conhecimento precisa se materializar numa relação harmoniosa entreprofessor/aluno, e estes, por sua vez, possam refletir sobre o objeto a ser ensinado e estudado, respectivamente. Assim, faz-se necessário que o professor assuma uma postura crítica, para que ele se posicione na função de mediador do processo ensino/aprendizagem, contribuindo com a ação, interação e construção efetiva do conhecimento nas práticas pedagógicas. REFERÊNCIAS BARRETO, Vera. Paulo Freire para educadores. São Paulo: Arte e Ciência, 1998. GADOTTI, Moacir. A escola e o professor: Paulo Freire e a paixão de ensinar.1ª ed. São Paulo: Publisher Brasil, 2007. Disponível em: 125 <http://www.acervo.paulofreire.org:8080/jspui/bitstream/7891/2773/1/FPF_PTP F_12026.pdf>. Acesso em:03 set. 2016. __________. Moacir. Reinventando Paulo Freire no século 21 / Carlos Alberto Torres... [et al.]; apresentação Jason Mafra. São Paulo: Editora e Livraria Instituto PauloFreire,2008(SérieUnifreire). Disponível em:<http://www.apu.com.br/assets/imagens/publicacoes/EdL_Reinventando_P aulo_Freire_no_Seculo_21_Varios_Autores.pdf>. Acessoem: 03 set. 2016. FREIRE, Paulo. A Educação na cidade. São Paulo: Cortez; 1991. _________. Pedagogia da autonomia: Saberes Necessários à Prática educativa. 30ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção Leitura) _________. Pedagogia do oprimido. 39ªed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. _________. À sombra desta mangueira. São Paulo: Olho d’Água.1995 _________. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra.2002. SAUL, Ana Maria. A Construção da escola pública, popular e democrática nagestão de Paulo Freire, no município de São Paulo. XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas – 2012.Disponível em:<http://www.infoteca.inf.br/endipe/smarty/templates/arquivos_template/uplo ad_arquivos/acervo/docs/0103s.pdf>. Acesso em: 03 set. 2016. SAVIANI, Demerval. História das ideias pedagógicas no Brasil.2ª ed., rev.eampl.- Campinas, SP: Autores Associados, 2008.-(Coleção memória da educação.) SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. Ira Shor, Paulo Freire; tradução de Adriana Lopez. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. http://www.acervo.paulofreire.org:8080/jspui/bitstream/7891/2773/1/FPF_PTPF_12026.pdf http://www.acervo.paulofreire.org:8080/jspui/bitstream/7891/2773/1/FPF_PTPF_12026.pdf http://www.apu.com.br/assets/imagens/publicacoes/EdL_Reinventando_Paulo_Freire_no_Seculo_21_Varios_Autores.pdf http://www.apu.com.br/assets/imagens/publicacoes/EdL_Reinventando_Paulo_Freire_no_Seculo_21_Varios_Autores.pdf http://www.infoteca.inf.br/endipe/smarty/templates/arquivos_template/upload_arquivos/acervo/docs/0103s.pdf http://www.infoteca.inf.br/endipe/smarty/templates/arquivos_template/upload_arquivos/acervo/docs/0103s.pdf
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