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Capítulo 46 – Suicídio e autolesão não suicida Introdução A autolesão não suicida e o comportamento suicida representam importantes problemas de saúde publica O suicídio é a segunda causa de morte entre adolescentes de 15 a 24 anos Autolesão não suicida (ALN) É definida como lesões superfícies deliberadas de tecido corporal, não sancionadas social, como cortar, queimar ou raspar a própria pele sem intenção de suicidar-se Pesquisas mostram que os jovens que se identificam como minoria sexual apresentam maior risco de ALNS, pensamentos e comportamentos suicidas Bissexuais e transgêneros apresentam maior frequência de ALNS: 41,47 e 46,65% ao longo da vida; e 41,20 e 46,61% nos últimos 12 meses, respectivamente, quando comparados aos seus pares cis gays e lésbicas Na população LGBTQIA+ a prevalência de ALNS é maior entre os adolescentes e tende a diminuir na fase adulta e é mais prevalente no gênero feminino Comparando jovens LGBTQIA+ e cis heterossexuais que procuraram a emergência de psiquiatria, um estudo com duração de 12 meses verificou que os LGBTQIA+ apresentavam mais visitas prévias ao pronto-atendimento, internações psiquiátricas e ideação suicida A transição da ALNS para as tentativas de suicídio, embora mais frequente, ocorreu mais lentamente entre os LGBTQIA+, padrão de achados que pode indicar um maior uso da ALNS como uma estratégia para enfrentar sofrimento ou para gerenciar impulsos suicidas e por autopunição Suicídio Segunda maior causa de morte em pessoas de 15 a 29 anos em todo o mundo Nos países em desenvolvimento, adultos jovens e mulheres idosas apresentam taxas de suicídio superiores às registradas nos países desenvolvidos, enquanto mulheres de meia idade têm taxas mais elevadas em países desenvolvidos A prevalência de ideação suicida na população LGBTQIA+ está entre 22 a 67%, enquanto na população geral varia de 3,48 a 23,8% Análises de subgrupos demonstram que mulheres e homens cis bissexuais apresentam um risco mais elevado de suicídio quando comparados às demais populações cis Fatores de risco O modelo de estresse de minorias oferece conceitos para compreender as disparidades em saúde vivenciadas pela população LGBTQIA+ As minorias sexuais vivem estressores únicos e crônicos ao longo da vida, como vitimização e LGBTIfobia internalizada, que trazem efeitos deletérios para a saúde mental O estresse das minorias também se associa ao uso problemático de substâncias como mecanismo de coping para regular ou evitar afetos negativos ou estresse psíquico [Inserir quadro 1- Fatores de risco para ALNS em pessoas LGBTQIA+] Em relação ao suicídio, os fatores de risco incluem tentativas prévias, problemas de saúde mental, uso problemático de substâncias, desemprego, perda financeira, abuso ou trauma, dor crônica ou condições clínicas, como câncer, diabetes e HIV/Aids A ALNS e o suicídio compartilham fatores de risco: baixo nível socioeconômico; gênero feminino; depressão, ansiedade; uso de álcool; falta de suporte social e familiar; sofrer violência; fatores intrapessoais (como LGBTIfobia internalizada e disforia de gênero) e interpessoais (como rejeição, estigmatização, vitimização, intimidação e discriminação) Hipóteses para o maior risco de suicídio em homens trans em relação às mulheres, na adolescência: puberdade como desafio de lidar com o aparecimento das mamas e da menstruação, que podem provocar sofrimento pela redução da “passabilidade’’ A transição social, que equipara a expressão de gênero com o gênero identificado, melhora o bem-estar psíquico, enquanto o bloqueio puberal Fatores de proteção A conexão com indivíduos e/ou instituições importantes nos ambientes de convivência dos adolescentes pode amortecer o efeito do estresse de minoria Os fatores protetores podem variar para cada subgrupo LGBTQIA+, tendo todos em comum a boa relação com os adultos responsáveis, no caso dos adolescentes Empregabilidade, melhor nível socioeconômico e educacional, boas condições de saúde, espiritualidade e laços comunitários, acolhimento familiar, menor exposição a ambientes LGBTIfóbicos (em locais públicos ou no trabalho) são fatores de proteção em adultos e idosos O acesso dos pacientes facilitado aos serviços de saúde é um fator que reduz a vulnerabilidade, por meio da oferta de consultas de demanda espontânea, preservação do sigilo, respeito ao uso do nome social Atendimentos acolhedores que permitam a revelação de pensamentos suicidas ou ALNS sem julgamento pelo profissional de saúde favorecem o vínculo e a possibilidade de abordagem precoce Cuidado integral Muitas pessoas que tentam o suicídio procuraram antes os serviços de saúde o que pode ser uma janela para a detecção precoce A prevenção do suicídio e abordagem da ANLS para as pessoas LGBTQIA+ deve incluir estratégias de facilitação do acesso aos serviços de saúde, educação em saúde, redução de danos, combate e prevenção da LGBTIfobia e tratamento para o consumo de álcool e substâncias Ao elaborar um projeto de cuidado, um dos objetivos deve ser a elaboração de estratégias para que as pessoas sejam capazes de lidar com as desregulações emocionais de maneira mais saudável ao contexto Falar sobre ALNS pode ajudar o indivíduo a lidar melhor com situações adversas e também reduz o risco de suicídio No caso de pessoas LGBTQIA+ com ideação suicida, o profissional deve abrir o diálogo perguntando diretamente sobre pensamentos, planos, tentativas prévias e fatores de resiliência e vulnerabilidade Situações de risco aos LGBTQIA+ devem ser identificadas, pois podem ser gatilhos para comportamentos impulsivos O profissional deve estar atento a possibilidade de LGBTIfobia internalizada dos pacientes, pois a culpa e baixa autoestima favorecem o surgimento e a perpetuação de comportamentos de autoagressão Dúvidas sobre a identidade sexual devem ser acolhidas, respeitando o tempo da própria pessoa Em situações de alto risco para suicídio, o profissional deve explicar sobre a importância de ter alguém próximo e identificar quem seria a pessoa O sigilo da orientação sexual e identidade de gênero devem ser preservados e, em situações de risco grave, o que deve ser revelado é o comportamento em si, e não a orientação/identidade Em casos graves, o paciente deve ser internado, com todas as prerrogativas para acolhimento aos LGBTQIA+ dentro do hospital Pessoas LGBTQIA+ que sobreviveram à tentativa de suicídio podem sofrer um duplo ou triplo estigma dentro dos serviços de saúde: como LGBTQIA+, como pessoa que tentou suicídio, e como portador de sofrimento mental ou pelo abuso de substâncias Após o atendimento inicial, deve ser elaborado um plano continuado de cuidados, que pode incluir apoio psicoterápico, individual ou em grupo, medicações e mindfulness. Psicoterapia É um tipo de terapia cognitivo-comportamental e foi adaptada para ALNS, que dentro deste modelo é conceituada como uma solução disfuncional Essa terapia reduziu o número de episódios de ALNS e sintomas depressivos em uma amostra de adolescentes que estavam em tratamento ambulatorial Terapia em grupo Objetivos: treino de resolução de problemas e o desenvolvimento de estratégias para regulação das emoções, habilidades para tolerar situações de estresse e para comunicar e procurar ajuda Terapia familiar A família pode ser um fator de risco ou pode ser um fator de proteção, a partir do fortalecimento dos vínculos positivos e aumento da sensação de pertencimento A associação da terapia individual com terapia em grupo familiar é recomendada para abordagem da ALNS Objetivo: desenvolver técnicas e habilidades entre familiares e pacientes para melhorar a coesão e o acolhimento Tratamento farmacológico Os antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina, como a fluoxetina e sertralina mostraram ser eficazes na depressãono transtorno de personalidade borderline em pessoas com ALNS Os antidepressivos tricíclicos e a bupropiona devem ser evitados em pacientes com ALNS, pois aumentam a atividade dopaminérgica e estão associados ao aumento de comportamentos impulsivos Benzodiazepínicos devem ser evitados, pois diminuem o autocontrole Antes da prescrição de medicação, é fundamental a avaliação detalhada para identificar possíveis e frequentes transtornos psiquiátricos relacionados a ALNS e comportamentos suicidas Mindfulness É um recurso que ajuda a gerenciar a excitação fisiológica desconfortável que geralmente acompanha o trauma psicológico A prática mindfulness reduz os sintomas comumente relatados a estresse, depressão, ansiedade e desafios interpessoais CIASCA, Saulo Vito; HERCOWITZ, Andrea; JUNIOR, Ademir Lopes. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. 1. Ed. Sanada de Parnaíba [SP]: Manole, 2021
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