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Materiais Amorfos

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Resumo—Os materiais amorfos possuem propriedades 
únicas. Feitos a partir da rápida solidificação de ligas metálicas 
apresentam fácil magnetização devida ao fato de seus átomos se 
encontrarem arranjados de maneira aleatória, facilitando a 
orientação dos domínios magnéticos. Transformadores usando 
núcleo de metais amorfos exibem perdas que são 60% a 70% 
menores que os transformadores convencionais. Este artigo visa 
uma discussão sucinta a respeito das aplicações destes materiais. 
 
I. INTRODUÇÃO 
NICIALMENTE, os metais amorfos eram formados pela 
deposição de vapor de metal a temperaturas criogênicas. 
As primeiras ligas eram finos filmes de materiais tais como 
bismuto e germânio, e não possuíam aplicação prática por 
serem muito instáveis à temperatura ambiente e terem que ser 
mantidas a temperaturas próximas do zero absoluto para 
manterem suas características amorfas. A primeira evolução 
foi obtida quando se passou a fabricar os metais amorfos 
através do resfriamento rápido de metais no estado líquido, 
necessitando para tanto taxas de variação de temperatura na 
ordem de 106 K/s. Como matéria prima, eram usadas 
misturas de metais tais como prata e cobre, prata e germânio, 
ouro e silício, e paladium e silício. 
O próximo estágio do desenvolvimento dos metais amorfos 
foi atribuir propriedades ferromagnéticas às ligas através da 
tentativa de varias combinações de materiais. Ironicamente, 
uma combinação com características magnéticas satisfatória 
foi obtida por acidente ao se combinar aço, fósforo e carbono. 
Mas, a dificuldade de se fabricar este tipo de material na 
forma de tiras levou à adição de materiais como o alumínio, 
silício, etc. 
Uma fórmula geral do tipo MaYbZc foi definida para ligas 
amorfas termicamente estáveis sendo M um ou mais dos 
metais do conjunto formado por aço, níquel, cobalto e cromo; 
Y representa elementos do grupo formado por fósforo, boro e 
carbono; Z representa alumínio, silício, antimônio, germânio 
e berílio; e a, b e c na faixa de 60 a 90, 10 a 30 e 0.1 a 15 
respectivamente sendo que a+b+c = 100. A combinação 
utilizada em transformadores é do tipo aço – boro – silício. O 
 
Artigo feito em 19 de junho de 2000. Este trabalho foi desenvolvido para 
a disciplina “Teoria dos Materiais” ministrada por Jaime Arturo Ramirez, 
para o curso de graduação em engenharia elétrica no 1º semetre de 2000. 
G. A. Vieira ( e-mail: avieira.bhz@zaz.com.br). 
M. F. Pinto (e-mail: maxwell@campus.cce.ufmg.br). 
M. J. Teixeira, Jr. (e-mail: marciojr@campus.cce.ufmg.br). 
B. L. Fraga (e-mail: brunol@campus.cce.ufmg.br). 
F. S. Silveira (e-mail: sernizon@campus.cce.ufmg.br). 
R. W. Oliveira (e-mail: rildo@campus.cce.ufmg.br). 
 
desenvolvimento cronológico das ligas amorfas [3] é 
resumidamente o seguinte: Fe80B20 (1976), Fe82B12Si6 (1978), 
Fe81.5B13Si3.5C2 (1979), Fe78B13Si9 (1980), sendo esta última 
a utilizada atualmente em todos os projetos de sistemas de 
energia elétrica. 
II. LIGAS AMORFAS 
A. Caracterização 
Tendo em vista a caracterização das ligas metálicas 
amorfas, abaixo são apresentadas suas propriedades físicas 
mais relevantes. 
1) Espessura das Lâminas 
Os metais amorfos admitem uma espessura nominal das 
lâminas do núcleo da ordem de magnitude de 
aproximadamente 10 vezes menor que os materiais 
comerciais, como o ferro-silício. Esta é uma das razões pelas 
quais eles apresentam baixos valores de perdas no núcleo. 
Entretanto, um maior número de laminações implica em 
aumento dos custos de produção. Cortar estes materiais 
requer técnica avançada e perícia, visto tratar-se de um 
material com alto grau de dureza. 
2) Dureza 
 Os metais amorfos são extremamente duros, da ordem de 4 
vezes maior que os aços usados como materiais elétricos 
convencionais. Esta característica além de dificultar sua 
laminação também a torna variável, uma vez que não é 
possível garantir a mesma espessura durante todo o corte da 
lâmina. As ferramentas de corte não possuem grau de 
exatidão estável, desregulando-se durante o processo. 
3) Fator de Empilhamento 
A combinação das características de alta dureza, lâminas 
de espessura muito baixa e variável, com superfície rugosa, 
contribuem para um fator de empilhamento baixo, da ordem 
de 80%, comparado com 95% dos aços usados como 
materiais elétricos convencionais. Consequentemente, a área 
de seção reta do núcleo destes transformadores é cerca de 
18% maior que dos transformadores com núcleo de ferro-
silício. 
4) Efeito de Recozimento 
Aços elétricos convencionais, por serem magneticamente 
orientados, têm stress elástico bem menor que metais 
amorfos. Estes por não serem, a priori, magneticamente 
orientados e terem elevado stress elástico introduzido durante 
o processo de fabricação devem ser imperativamente 
recozidos. 
O recozimento na presença de um campo magnético 
longitudinal melhora significantemente suas propriedades 
magnéticas, tais como indução de saturação, força coerciva, 
perdas ativas e potência de excitação, promovendo a 
relaxação estrutural do material. 
Materiais Amorfos 
Gustavo A. Vieira, Maxwell F. Pinto, Márcio J. Teixeira, Jr., Bruno L. Fraga, Fábio S. Silveira, e 
Rildo W. Oliveira 
I
 2
O alto stress interno das ligas amorfas é resultado da 
solidificação rápida, não permitindo a formação de cristais no 
material e deixando-o instável. A relaxação estrutural obtida 
pelo tratamento térmico e magnético realizado durante o 
recozimento em temperaturas abaixo da cristalização, leva o 
material a um estado semi-estável. Entretanto, ele reduz a 
ductibilidade do material, deixando-o mais rígido e 
quebradiço. 
5) Indução de Saturação 
Os materiais amorfos têm em geral uma composição de 
80% de ferro e 20% de boro. Esta composição leva estes 
materiais a terem uma indução de saturação 20% menor 
quando comparado aos materiais de ferro puro para mesma 
temperatura. De fato, tanto o aumento da temperatura, quanto 
o aumento de Boro + Silício na liga amorfa, diminuem sua 
indução de saturação crescentemente. 
6) Magnetostricção 
A alteração das dimensões físicas de um material 
magnético quando magnetizado causa ruído e/ou perdas no 
núcleo. Ligas amorfas baseadas em ferro exibem uma 
magnetostricção linear de saturação comparáveis às do ferro-
silício de grão orientado, assim como os níveis de ruído de 
ambas as ligas são praticamente os mesmos. 
7) Massa e Volume 
Em decorrência do aumento na área de seção reta, 
conseqüência do maior fator de empilhamento, o volume dos 
transformadores com núcleo de material amorfo é maior que 
os de ferro-silício em mais de 15% 
Em função da menor indução de saturação dos materiais 
amorfos, novamente é necessário aumento da área de seção 
reta do núcleo para que se tenha o mesmo valor de fluxo 
magnético, o que implica em maior quantidade de material 
necessário para sua construção. A conseqüência direta disso é 
o aumento da massa do núcleo do transformador (em média 
15%). 
B. Processo de Produção 
1) Congelamento a milhões de graus por secundo [4] 
Amostras de materiais amorfos (ou “vidros metálicos” 
como também são chamados) podem ser obtidas colocando-
se ligas propícias em contato com um substrato metálico de 
alta condutividade térmica. 
A alta taxa de resfriamento necessária (105 a 106 K/s) é 
conseguida quando o material é dilatado até 
aproximadamente 50 metros de espessura. Ligas muito 
reativas, como Be-Ti, precisam ser processadas em vácuo. 
Porém as ligas FeNiCo-BsiC, que são as de principal 
interesse comercial, podem ser processadas no ar. Se isto não 
ocorresse, a fabricação de ligas amorfas em grande escala 
seria impraticável. 
As primeiras técnicas para se produzir estas ligas eram 
bem simples como utilizar uma única gota para produzir 
superfícies irregulares ou utilizar uma pistola de gás para 
impulsionar a altas velocidades uma gota derretida num 
substrato resfriado. 
Depois de muitos anos de pesquisa nesta área, tornou-sepossível produzir fitas de comprimento significativo. Com a 
técnica utilizada hoje, em teoria, pode-se produzir fitas de 
largura ilimitada. Fitas de 50mm de largura são produzidas 
rotineiramente. 
2) Tratamento magnetotérmico [6] 
Tem sido demonstrado experimentalmente que durante o 
processo de produção das ligas amorfas para fins magnéticos, 
são introduzidas tensões mecânicas internas que tendem a 
mudar suas propriedades em relação ao seu estado bruto de 
têmpera. Estas alterações são indesejáveis, pois 
comprometem alguns parâmetros importantes no que tange 
sua eficiência ao longo de um ciclo de operação, tais como a 
indução de saturação, a força coerciva, as perdas ativas e a 
potência de excitação. Portanto estas tensões necessitam ser 
aliviadas para que as características magnéticas favoráveis do 
material sejam recuperadas ou até melhoradas, como aumento 
da indução de saturação e a redução da coercividade, que tem 
sido obtido por meio de tratamento térmico sob a ação de um 
campo magnético, também conhecido como tratamento 
magnetotérmico [5]. 
III. APLICAÇÕES 
A. Transformadores de Distribuição 
Uma das principais aplicações das ligas metálicas amorfas é 
no núcleo de transformadores de distribuição. 
Nas últimas décadas, o valor relativo de energia elétrica 
aumentou dramaticamente. Por isso, o uso racional de energia 
tornou-se estratégia básica para conter os gastos. As perdas 
associadas com distribuição são de particular interesse para as 
concessionárias e o uso de núcleos de metais amorfos nos 
transformadores de distribuição é uma das alternativas 
encontradas para a melhoria de eficiência. 
Estes transformadores podem assumir diversas 
configurações, a saber: 
1. Cruciforme 
2. Toroidal 
3. Núcleo com entreferro distribuído 
4. Núcleo de chapas enlaçadas juntas 
 
B. Comparação entre transformadores de núcleo amorfo e 
núcleo de aço-silício 
Conforme pode ser observado na tabela abaixo, os 
transformadores com núcleo de material amorfo apresentam 
sensíveis vantagens em relação aos de aço-silício, 
principalmente no que tange as perdas a vazio. Além disso, 
observa-se também significativas reduções na corrente de 
excitação e no ruído audível. Entretanto ele é mais pesado, 
mais volumoso e mais caro. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 3
TABELA I 
COMPARAÇÃO ENTRE TRANSFORMADORES DE NÚCLEO AMORFO E NÚCLEO DE AÇO-SILÍCIO [1] 
 
Amorfo Aço-Silício 
Tipo KVA Perdas 
a vazio 
(W) 
Perdas 
c/ carga 
(W) 
% I 
exc. 
% Z Massa 
(lb) 
 Perdas 
a vazio 
(W) 
Perdas 
c/ carga 
(W) 
% I 
exc. 
% Z Massa 
(lb) 
10 12 102 0.31 1.6 318 29 111 0.60 1.8 300 
15 16 141 0.27 1.6 422 41 143 0.70 1.9 321 
25 18 330 0.15 1.9 441 57 314 0.36 2.25 406 
50 29 455 0.13 2.7 719 87 462 0.23 3.2 709 
75 37 715 0.09 3.3 944 122 715 0.38 3.0 821 
 
 
1 φ 
100 49 944 0.09 3.0 1131 162 933 0.21 2.6 961 
 
75 51 925 0.14 4.0 2030 142 956 0.31 4.1 2000 
150 90 1397 0.10 3.9 2870 216 1429 0.24 3.5 2900 
300 165 1847 0.10 3.9 4360 412 2428 0.14 5.1 3600 
500 230 3282 0.09 4.8 6090 610 3589 0.18 4.6 4900 
 
 
3 φ 
750 327 4468 0.07 5.75 6600 713 5206 0.15 5.75 6800 
 
 
 
Conforme se observa na curva típica de magnetização 
abaixo, os materiais amorfos apresentam ciclo de histerese 
extremamente estreito além de apresentar baixa força 
coerciva. Como a área interna da curva B-H representa as 
perdas devidas à magnetização do núcleo, é visível a 
vantagem dos materiais amorfos a respeito das perdas a 
vazio e das baixas correntes de magnetização. 
 
 
Fig 1. Curva de magnetização do MetGlas 2605CO (baseado em ferro) da 
Allied Co. 
Aplicações: Sensores de campo, blindagem, núcleo de alta frequência. 
Benefícios: Média indução de saturação, baixa magnetostricção, alta 
resistência a corrosão. 
 
A tabela abaixo contém os dados fornecidos pelo 
fabricante do material cuja curva foi mostrada acima. Eles 
facilitam a compreensão das características de um 
transformador construído com este material. 
 
TABELA II 
PROPRIEDADES GERAIS E CARACTERÍSTICAS DO METGLAS 2605CO 
Eletromagnéticas 
 
Indução de saturação (T) 1.80 
Máxima permeabilidade DC (µ) 
Recozido (alta frequência) 400000 
Não recozido 120000 
 
Magnetostricção de saturação (ppm) 35 
Resistividade elétrica (µΩ/cm) 123 
Temperatura Curie (ºC) 415 
 
Físicas 
 
Densidade (g/cm3) 7.56 
Força de tensão (Mpa) 1000 a 1700 
Módulo Elástico (GPa) 100 a 110 
Fator de laminação (%) >75 
Expansão térmica (ppm/ºC) 8.6 
Temperatura de cristalização (ºC) 430 
Temperatura de serviço contínuo (ºC) 125 
 
Complementando os dados anteriores seguem abaixo as 
curvas típicas de permeabilidade de impedância e de 
perdas a vazio no núcleo (Fig. 2 e Fig. 3). 
 
C. Experiências de Campo 
Demonstrou-se experimentalmente serem os 
transformadores com núcleo de metal amorfo tão duráveis 
e confiáveis quanto os com núcleo de ferro-silício. 
As perdas no núcleo por histese magnética e corrente de 
Focault são entre 50% e 60% menores, chegando em 
transformadores de distribuição de baixa potência a 87%. 
As perdas por efeito Joule nos enrolamentos são 
menores em até 21%. As perdas totais chegam a 60% 
menos. 
A corrente de excitação é sensivelmente menor em 
 4
relação aos transformadores com núcleo de ferro-silício. O 
custo dos transformadores com núcleo de metal amorfo é 
maior entre 25% e 50%. Estima-se que seu investimento 
seja pago em torno de 2 a 3 anos devido seu menor 
consumo de potência 
 
 
Fig. 2. Curva típica de permeabilidade de impedância do MetGlas 
2605CO (baseado em ferro) 
 
Fig. 3. Curva típica de perdas a vazio (MetGlas 2605CO -baseado em 
ferro). 
 
D. Outras aplicações 
Apesar da principal aplicação das ligas metálicas 
amorfas ser a construção de núcleos de transformadores de 
distribuição, outras aplicações são viáveis. Algumas delas 
são listadas abaixo. 
• Transformadores de alta frequência 
• Estator de motores ac e rotor de motores dc 
• Sensores piezomagnéticos para carros, máquinas 
industriais e sonares 
• Fitas magnéticas para dispositivos antifurto utilizadas 
em estabelecimentos comerciais. 
IV. EXPECTATIVAS FUTURAS 
Os estados magnético das ligas amorfas ainda não são 
totalmente compreendidos. Enquanto as ligas amorfas 
baseadas em ferro são satisfatoriamente usadas em 
transformadores de distribuição, melhoramentos no 
desempenho deste tipo de material podem ser esperados 
quando for obtido um melhor conhecimento da estrutura 
atômica e suas propriedades. 
Evoluções no processo de produção são almejadas a fim 
de se obter melhorias na espessura das lâminas, assim 
como na qualidade da superfície, tornando-a menos 
rugosa, o que diminuiria as perdas por histerese. 
 
V. CONCLUSÃO 
Sendo assim, as pesquisas nesta área continuam 
avançando em busca da melhor utilização deste tipo de 
material, tendo em vista otimizar a relação custo–
eficiência e possibilitar, no futuro, a utilização em grande 
escala de metais amorfos em todas suas possíveis 
aplicações. 
VI. REFERÊNCIAS 
 
[1] NG, H. W., Hasegawa, R., Lee, A. C. E Lowdermilk, L. A. 
Amorphous alloy core distribution transformer. Proceedings of the 
IEEE, Vol. 79, No.11, p. 1608-1623, 1991. 
[2] Boyd, E. L. e Borst, J. D. Design concepts for an amorphous metal 
distribution transformer. IEEE Transactions on Power Apparatus 
and Systems, Vol. PAS-103, No. 11, p. 3365-3372, 1984. 
[3] G. E. Fish, Soft magnetic materials. Proceedings of the IEEE, Vol. 
78, No. 6, p.972-974, 1990. 
[4] Raskin, D. e Davis, L. A. Metallic glasses: a megnetic alternative. 
IEEE Spectrum, vol.18, No.11, p.28-33, nov. 1981. 
[5] Luciano, B. A. e Kiminami, C. S., Algumas considerações sobre a 
realização de transformadores com núcleos de ligas amorfas, 
Campina Grande, Universidade Federal da Paraíba, p.383-391, 
1995. 
[6] Grahan Jr., C. D. e Egami, T., Magnetic properties of amorphous 
materials. Metals Technology, p. 244-247, jun. 1980.

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