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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS - UFAL FACULDADE DE SERVIÇO SOCIAL - FSSO A QUESTÃO DA MORADIA: ELEMENTOS PARA REFLEXÃO Milton Filho Rodrigues da Silva Maceió – AL 2012 MILTON FILHO RODRIGUES DA SILVA A QUESTÃO DA MORADIA: ELEMENTOS PARA REFLEXÃO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social pela Faculdade de Serviço Social – FSSO. Orientador: Prof. Dr. José Nascimento de França Maceió– AL 2012 A QUESTÃO DA MORADIA: ELEMENTOS PARA REFLEXÃO MILTON FILHO RODRIGUES DA SILVA Este Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) foi julgado adequado para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social e aprovado em sua forma final junto à Faculdade de Serviço Social - FSSO. Aprovado em:__________ Apresentado a Banca Examinadora, integrada pelos Professores: _____________________________________ Prof. Dr. Jose Nascimento de França Orientador _____________________________________ Profª. Msc. Janne Alves Rocha _____________________________________ Profª. Msc. Elaine Nunes Silva Fernandes Dedico este trabalho a minha querida mãe Maria Lenice e o meu pai Milton Alves; aos meus irmãos, Lenilta, Vilma e Robson; e a minha noiva Maria do Carmo. Agradecimentos Em primeiro lugar, agradeço a minha família pelo apoio que me deu durante todos os anos em que estive na universidade. Embora a universidade seja pública, os custos com transporte, alimentação, material didático e etc., ainda são muito altos o que põe uma dificuldade a mais para todos os estudantes que nela ingressam, principalmente para os que saem dos guetos e, infelizmente, não escapei a esta regra. Aproveito a ocasião para agradecer também a todos os operários, que embora talvez não saibam, todo trabalho expropriado deles serviu para custear todos os anos que estive nesta universidade. Agradeço ainda a todos os professores, pois mesmo enfrentando todas as dificuldades e as deficiências nas estruturas de ensino oferecido pelas universidades públicas, não deixaram de socializar seu conhecimento. Em especial, agradeço a Profª. Msc. Janne Alves Rocha e ao prof. Dr. José Nascimento de França por todo apoio que me deram em todos esses anos e pelas portas que me abriram, oportunizando-me explorar novos campos de conhecimento. Sou grato também ao Movimento Estudantil Correnteza e ao Partido Comunista Revolucionário (PCR), pois foram eles que me deram a oportunidade de ampliar meus conhecimentos a respeito da realidade social. Não só isso, também possibilitaram o meu direto envolvimento na árdua luta pela transformação social e a construção de uma sociedade livre e igualitária, uma sociedade socialista. [...] a sociedade capitalista não nos oferecesse senão uma democracia mutilada, miserável, falsificada, uma democracia só para os ricos, para a minoria. A ditadura do proletariado, período de transição para o comunismo, instituirá pela primeira vez uma democracia para o povo, para a maioria, esmagando ao mesmo tempo, impiedosamente, a atividade da minoria, dos exploradores. Só o comunismo está em condições de realizar uma democracia realmente perfeita, e quanto mais perfeita for, mais depressa se tornará supérflua e por si mesmo se eliminará. V.I. Lênin, 1917. Resumo O déficit habitacional no Brasil constitui um dos principais problemas que afetam a classe operária, embora não seja exclusividade dela, pois a pequena burguesia, os camponeses e o lumpemproletariado também sofrem com o problema. Levando em consideração a relevância dessa questão, no presente trabalho, elaboramos uma interpretação desse problema na perspectiva do pensamento marxista. Assim, fizemos uma introdução, situando o problema da moradia como uma das expressões da questão social que afetam a classe operária, que nos países submetidos ao imperialismo, como o Brasil, torna-se mais agudizada. No primeiro capítulo, traçamos algumas considerações a respeito do imperialismo, tendo por base Lênin (1917). No segundo capítulo, elaboramos uma rápida abordagem do processo de reestruturação do capital, a partir da década de 1970, no mundo e, a partir da década de 1990 do século XX, no Brasil. Já no terceiro capítulo, buscamos fazer uma interpretação do trabalho publicado por Engels (1887) sobre a questão da habitação e, por fim, fizemos nossas considerações finais, buscando elementos que possam interpretar e contribuir para mudar a questão da habitação popular em países submetidos ao imperialismo americano. Não obstante ser este trabalho uma primeira aproximação, damos por concluída a tarefa de elucidação do objeto de estudo da nossa pesquisa: os elementos básicos de Engels na sua obra “Contribuição ao Problema da Habitação” para o entendimento e a intervenção da classe trabalhadora na questão habitacional nas sociedades submetidas ao imperialismo americano, sobretudo no Brasil. Palavras-chave: Sociedade Capitalista, Imperialismo, Reestruturação Produtiva, Habitação. SUMARIO Introdução .................................................................................................................................8 1. Reflexões sobre a Sociedade Capitalista Contemporânea ...........................................14 1.1 Ligeiras considerações acerca do Imperialismo e das últimas transformações do Capital................................................................................................................................. 14 1.2 O pensamento de Lênin sobre Imperialismo..............................................................21 2. Algumas questões a respeito da reestruturação do capital e os impactos no mundo do Trabalho.............................................................................................................................35 2.1 Breves considerações sobre o pensamento neoliberal e seus impactos na sociedade contemporânea...................................................................................................47 2.2 Alguns elementos sobre o processo de reestruturação produtiva no Brasil e os impactos para a classe operária.........................................................................................61 3. A questão da habitação no pensamento de Engels .......................................................81 Considerações finais .............................................................................................................100 Referências ............................................................................................................................104 8 Introdução De acordo com estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgados no ano passado, o déficit habitacional no Brasil é de 7,9 milhões de moradias, o que corresponde a 14,9% do total de domicílios; mais de 90% deste total estão entre os trabalhadores que ganham até três salários mínimos. A falta de acesso à moradia é maior nas zonas urbanas, sobretudo nas regiões metropolitanas, mas não é exclusividade das zonas urbanas, 1,5 milhões estão nas zonas rurais do total de 7,9 milhões. De acordo com a Revista Brasileira da Habitação (2011 e 2012), entre as regiões, os problemas são mais graves no sudeste e no nordeste; nestes o déficit habitacional atinge 36,40% e 34,30% respectivamente, sendo que os menores déficits estão na região sul com 12,00%, na região norte com 10,30% e na região centro-oeste com 7,00%. Entendemos o problema da moradia como uma das várias expressões da Questão Social, e como tal, é de fundamental importância que seja compreendida como resultado da contradição entre Capital e Trabalho. Isto porque sua origem está na relação de exploração e extração da mais-valia da classe operária pela classe capitalista. A Questão Social pode ser conceituada como um “conjunto de problemas políticos, sociais e econômicos que o surgimento da classe operária impôs no mundo no curso da constituição da sociedade capitalista. Assim, a Questão Social está vinculada ao conflito capital e trabalho” (Cerqueira Filhoapud GONÇALVES, 1982, p. 82). 9 De acordo com Mota (2000) [...] a questão social pode ser considerada com expressão politizada da desigualdade social, inerente à constituição da sociedade burguesa. Sua emergência e visibilidade estão organicamente vinculadas à constituição da classe trabalhadora na medida em que, como sujeito sócio-político coletivo, ela publiciza a pobreza, expondo a contradição central entre capital/Trabalho, presente no antagonismo das condições em que ambas as classes se inserem no processo de produção e usufruto da riqueza socialmente produzida. Assim, podemos dizer que a Questão Social está diretamente ligada à desigualdade social e a pobreza gerada pelo modo de produção capitalista. A desigualdade não é um fenômeno novo e exclusivo da sociedade capitalista. Em modo de produção pré-capitalista, a pobreza e as desigualdades sociais eram iminentemente ligadas à escassez, consoante ao baixo de grau de desenvolvimento das forças produtivas e das relações associadas àquelas. Já no capitalismo adquirem uma nova lógica e dinâmica, estando associadas à produção de riquezas [...]. Mas em ambos os casos, a pobreza e as desigualdades sociais podem ser relacionadas com a divisão de classes e a existência da propriedade privada (Castelo, 2010, p. 87). De acordo com Marx (1848, p. 7) “a história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes”. Assim no escravismo tínhamos o homem livre e o escravo, no feudalismo, os senhores e os servos, em outras palavras, opressoras e oprimidas. A sociedade capitalista está divida entre duas classes fundamentais, por um lado a classe operária que possui como único meio de vida a força de trabalho, por outro lado, a classe burguesa que detém em suas mãos a propriedade de todos os meios de produção. Ao processo que dá origem ao capitalista e ao trabalhador assalariado, Marx (1987) chama de acumulação primitiva. A expropriação de trabalhadores camponeses, pequenos proprietários e artesãos, transformam estes em trabalhadores livres “[...] em dois sentidos, primeiro porque não são mais parte direta dos meios de produção como o escravo e servo, e porque não são donos dos meios de produção, como o camponês autônomo, estando assim 10 livres e desembaraçados” (Marx, 1987 p. 830). Estas foram as condições básicas para o desenvolvimento das forças produtivas. Desta forma, O capitalismo pressupõe a dissociação entre os trabalhadores e a propriedade dos meios pelos quais realizam o trabalho. Quando a produção capitalista se torna independente, não se limita a manter essa dissociação, mas a reproduz em escala cada vez maior. O processo que cria o sistema capitalista consiste apenas no processo que retira do trabalhador a propriedade de seus meios de trabalho, um processo que transforma em capital os meios sociais de subsistência e os de produção e convertem em assalariados os produtores diretos (Marx, 1987 p. 830). Estando livres e desapropriados de seus bens, os trabalhadores possuem como única mercadoria a força de trabalho que vendem ao capitalista em troca de um salário. O capitalista, por sua vez, compra a força de trabalho do operário e o faz trabalhar pelo tempo maior que o necessário para sua sobrevivência, produzindo um trabalho excedente, que constitui a mais-valia. É importante destacar que a transformação da propriedade privada baseada no esforço individual e independência das condições de trabalho em propriedade capitalista fundamentada na exploração de trabalho alheio, possibilitam a destruição das velhas formas de produção e relações sociais próprias do feudalismo. À medida que o capitalismo caminha com seus próprios meios, transforma os meios de produção, antes explorados individualmente, em meios de produção explorados coletivamente e, portanto, a expropriação assume uma nova forma. Já não se expropria trabalhadores independentes, o capitalista explora agora um número cada vez maior de operários (Marx, 1987, p. 881). Ainda conforme Marx (1867), a expropriação estende a eliminação de um capitalista pelo outro, de um lado, reduzindo o número de capitalista e de outro lado, aumentando a acumulação de capital nas mãos de um número cada vez mais reduzido de capitalistas. “Ao lado da diminuição constante do número de magnatas do capital, que usurpam e monopolizam 11 todas as vantagens desse processo de transformação, aumentam em massa a miséria, a opressão, a escravidão, a degenerescência e a exploração” (Marx, 1867, p. 20). Na mesma medida, cresce a indignação da classe operária que, aumentando rapidamente, graças ao próprio modo de produção, unifica-se e se organiza no sentido de por fim a exploração do capital. “O capital, porém, não se limita a reproduzir-se, mas aumenta e cresce incessantemente com que aumenta e cresce também o seu poder sobre a classe dos operários privados de toda propriedade” (Engels, 1868, p. 30). O resultado deste crescimento é o aumento da classe operária na mesma proporção. O desenvolvimento científico e tecnológico possibilita um aperfeiçoamento dos meios de produção e, por consequência, aumenta a capacidade de produção. Em virtude disso, o capital tende a precisar cada vez menos de um número de operários para produzir a mesma quantidade de antes, aumentando o número de trabalhadores excedentes. Eles passam a constituir o exército industrial de reserva, que nas épocas más ou médias recebem por seu trabalho menos do que vale e trabalha só durante certo tempo ou vive à custa da beneficência pública, mas que é indispensável para a classe capitalista nas épocas de grande atividade [...] e que de qualquer maneira serve para vencer a resistência dos operários que trabalha normalmente e manter baixos os seus salários (Engels, 1868, p. 30). O crescimento constante do exército industrial de reserva aumenta, na mesma proporção do grau de miséria, elevando ao máximo o nível de desigualdade social. Nessas condições, temos o surgimento da Questão social, a qual se expressa pelo deficiente acesso a bens de consumo coletivos e individuais como alimentação, moradia, saneamento básico, entre outros. 12 O capital possui tendência para acumulação, que reside na concentração e monopolização de capital nas mãos de poucos capitalistas. Na mesma proporção em que aumenta a concentração de capital, aumentam os lucros do capital, e na proporção inversa, reduzem-se os salários da classe operária, por consequência, afeta a sua qualidade de vida, aumentando a sua miséria. Foi a concentração de capital e os monopólios que conduziram ao imperialismo; sob este, a desigualdade social e o pauperismo alcança o mais alto nível de miséria, elevando a qualidade de vida da classe operária ao limite do insuportável. Voltando à questão da habitação ou problema de falta de moradia, dissemos anteriormente que esta é um das várias expressões da Questão Social que se constitui num grave problema que afeta as classes subalternas e a classe média em menor grau. Por um lado, temos uma política de Estado que não atende às necessidades básicas das camadas subalternas e por outro, o setor da construção civil e imobiliário que vê na demanda por habitação uma fonte de lucro. Além disso, a indústria da construção civil prefere construir habitações voltadas para as camadas médias, o que aumenta a especulação do setor imobiliário, elevando os preços dos imóveis, tornando-os ainda mais inacessíveis às classes subalternas. Estes são alguns dos fatores que contribui para o aumento do déficit habitacional. Segundo Rolnik e Nakano (2009) o déficit de 7,9 milhões contrasta com o número de habitações vazias (casas e apartamentos), que chega a 6,7 milhões no Brasil. A resistência das classes subalternas a essa problemática se expressa a partir da quantidade de movimentos sociais que atua em defesa da moradia. Por um lado, o número ocupações em diversas partes do Brasil tem aumentado, ainda que timidamente, por outro lado, na mesma proporção, aumentaa repressão do Estado. 13 Em virtude do problema exposto acima, acreditamos que seja importante trazer alguns elementos para reflexão. Diante disso, faremos, aqui, uma leitura da questão a partir do pensamento de Engels sobre a questão da habitação. Para o Serviço Social, refletir sobre o problema da habitação é uma questão fundamental, tendo em vista que a política de habitação é um espaço de atuação profissional. E em respeito ao código de ética do assistente social, que estabelece como princípios a defesa da cidadania, como tarefa primordial de toda sociedade, visando garantir os direitos civis sociais e políticos para as classes trabalhadoras; como também o posicionamento em favor da equidade e justiça social, assegurando a universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, relacionamos nosso trabalho com o Serviço Social em dois pontos: 1) a defesa do código de ética do assistente social; e o apoio ao projeto político popular da sociedade brasileira; 2) interrelação do problema da habitação popular com a questão social e as políticas públicas habitacionais. Feitas estas breves considerações a respeito da questão da habitação, far-se-á uma reflexão a respeito das novas transformações do capitalismo na sociedade contemporânea e o imperialismo. 14 1. Reflexões sobre a Sociedade Capitalista Contemporânea 1.1 Ligeiras considerações acerca do Imperialismo e das últimas transformações do Capital Nas últimas três décadas do século XX, houve um esforço muito grande no campo do pensamento marxista para entender o capitalismo na atualidade, mas precisamente a partir do final da década de 1960 e início da década 1970. Nesse período, o capitalismo vivenciou mais um entre tantos períodos de recessão econômica que teve seu ápice com a crise do petróleo de 1973. Em consequência, o imperialismo vê-se obrigado a buscar novas estratégias para garantir o aumento dos seus lucros e para expandir a acumulação do capital. Sobre essa questão, abordaremos mais adiante, por hora em poucas linhas, apresentaremos alguns autores que se dedicaram ao estudo das transformações nos últimos anos. Quantos aos teóricos que abordam o assunto, partiremos das discussões abordadas em um artigo publicado por Moraes (2007) a respeito do debate marxista sobre transformações do Capitalismo nas últimas décadas. Para Moraes, um autor só pode ser considerado marxista quando adota os seguintes princípios: 1) o entendimento da luta de classes como motor da história, que supõe rejeitar a conciliação de classe; 2) reconhecer o Estado como representante dos interesses da classe dominante, o que significa que não se deve alimentar as falsas ilusões do papel benéfico deste para a classe trabalhadora; 3) e por fim, a defesa da revolução socialista como único meio para a emancipação da classe trabalhadora. 15 Acreditamos que estes princípios são fundamentais para a defesa do marxismo, porém classificar como marxista por apenas estes três princípios constitui erro. Acrescentaria que além destes, é de suma importância entender que a classe operária cumpre um papel de destaque como agente transformador da sociedade e que compete a esta o papel decisivo na revolução. Também é necessário defender o partido comunista, como a principal organização da classe operária na luta pela emancipação humana, além disso, a ditadura do proletariado. Acreditamos que a negação da ditadura do proletariado, constitui a negação da revolução socialista. Defender a luta de classes e negar a ditadura do proletariado é um completo absurdo. Marx (1852) e Lênin (1917) foram enfáticos em defender esta questão, então, não há como abandoná-la. Em carta escrita por Marx a Weidemeyer em 1852, Marx afirmou “que a luta de classe conduz necessariamente para a ditadura do proletariado e que essa própria ditadura é apenas a transição para a supressão de todas as classes e para a formação de uma sociedade sem classes” (Marx, 1852, marxists.org). Lênin referenciando a essa questão afirma: Quem só reconhece a luta de classes não é ainda marxista e pode muito bem não sair dos quadros do pensamento burguês e da política burguesa. Limitar o marxismo à luta de classes é truncá-lo, reduzi-lo ao que é aceitável para a burguesia. Só é marxista aquele que estende o reconhecimento da luta de classes ao reconhecimento da ditadura do proletariado (Lênin, 1917, p. 5). Retomando Moraes (2007), acreditamos que dentre os autores selecionados por ele, alguns não merecem receber a classificação de marxista, talvez coubesse melhor o termo neomarxista, por não levar em consideração princípios importantes do marxismo. O neomarxismo é uma corrente de pensamento do final do século XX. Caracteriza-se pelo abandono de categorias de análise importantes do pensamento de Marx, algumas vezes é chamado de marxismo ocidental. 16 Segundo Picolotto, Com a crise da abordagem marxista (principalmente da corrente ortodoxa), surgiram concepções heterodoxas do marxismo, com variados graus de abandono dos pressupostos originários e interpretações que propõe novos referenciais para entender os novos fenômenos políticos e sociais. Muitos autores continuaram referenciando-se em elementos teóricos-chaves do marxismo, passando a ser chamados de neomarxistas (2007, p. 160). Assim tais teóricos, refutam algumas categorias do marxismo preservando outras. Concluída esta discussão, embora de maneira provisória, sobre os elementos fundamentais para classificar um autor como marxista, mesmo entendendo que se faz necessário para evitar os desvios da teoria revolucionária, passaremos adiante. Acreditamos que estes tenham contribuído para uma leitura da realidade em alguns aspectos, mesmo que em certos casos seja apenas descritivo. Para isso, retomaremos mais uma vez Moraes (2007 p.1) conforme segue: Esta fase do Capitalismo, [...] é entendida de diversas maneiras: mundialização do capital e poder das finanças (Chesnais, 1997, 2003, 2005), neoliberalismo (Petras 1997, Anderson, 1995), imperialismo sobre o domínio dos EUA (Mészaros, 2003), fase B do ciclo de Kondratiev (Wallerstein, 2003), império (Negri e Hardt, 2001) ou acumulação flexível (Harvey 1992). Poderíamos ainda elencar outras denominações para o mesmo fenômeno. Segue o autor, dizendo que mesmo dentro de uma perspectiva da totalidade, cada autor privilegia alguns aspectos: como o político (Petras e Anderson), o econômico (Chesnais e Wallerstein), o político e o econômico (Mészaros), o filosófico (Negri e Hardt), as novas configurações da extração da mais-valia (Harvey) (ibidem). Harvey (1992), em sua obra “Condição Pós-moderna”, utiliza o termo acumulação flexível, porém em obra mais recente, “O Novo Imperialismo” (2004), utiliza o termo Imperialismo Capitalista ou novo Imperialismo como sugere o título do livro. 17 Os autores mencionados acima por Moraes são sem dúvida muito utilizados no meio acadêmico e têm influenciado muito na literatura acerca do entendimento da nova conjuntura. O motivo de trazemos tal discussão é que alguns serão utilizados em nosso trabalho, isto porque seria quase impossível falar da fase atual do capitalismo sem fazer nenhuma referência ou utilizar de algumas considerações feitas por escritores como Chesnais, Anderson, Harvey, Mészaros, entre outros. Em nosso trabalho, utilizaremos o termo imperialismo por entender que as transformações ocorridas nos últimos anos não podem ser entendidas se não levarmos em consideração as consequências que o imperialismo impõe a sociedade como todo. A respeito do termo imperialismo, há muitas divergências quanto a seu uso. Entre os escritores que utilizam o termo, naturalmente há muita divergência; acreditamos que são decorrentes das várias correntes de pensamento no campo do marxismo. Não temos a pretensão de discutir a questão neste momento. Interessa-nos, neste instante, apenas colocar que não é absurdo falar de imperialismo para entender a nova realidade da acumulação do capital,pelo contrário, é cada vez mais importante que façamos isso, pois as sucessivas crises no interior do capitalismo tem obrigado não só os marxistas, como também os ideólogos da classe dominante a se voltarem a esta questão. Em Harvey (2005) e Mészaros (2006), encontramos a argumentação de que o fim da segunda guerra mundial demarca para o imperialismo o início de uma nova fase de acumulação do capital, bem como a hegemonia dos Estados Unidos da América (USA) no controle da economia mundial e a busca deste imperialismo em estabelecer um governo mundial. 18 A hegemonia que antes da segunda guerra mundial pertencia ao imperialismo inglês passa para as mãos do imperialismo dos Estados Unidos da América. É que a segunda guerra mundial deixa as principais potências mundiais arrasadas político e economicamente. Os Estados Unidos da América, embora tenham participado da guerra, escapam ilesos e, não só, tiveram um amplo desenvolvimento da economia e da indústria. Nem mesmo a União Soviética que, a partir da segunda guerra, assumiu a hegemonia do leste europeu, foi capaz de suplantar o poder dos Estados Unidos da América. No decorrer da guerra, a União Soviética sofreu muitas perdas, tanto no nível de industrialização quanto na perda de territórios e nas condições de vida do povo russo arrasados pela guerra, uma vez que esteve mais diretamente envolvida na mesma. É importante colocar que a União Soviética foi o país que mais teve perdas: 45,5% de seu território foi ocupado pelos nazistas, muitas das suas indústrias foram destruídas, outras remanejadas para outros locais; Os combates destruíram cerca de 60% de suas terras agrícolas; cidades inteiras foram destruídas, deixando um número elevado de sem teto e sem alimentação. Estima-se que houve uma perda de 70% de sua riqueza nacional e nenhum outro país perdeu tantas vidas como a União Soviética, isto sem falar da perda de valores culturais perdidos pelas pilhagens.1 É importante destacar que apesar de todas as perdas, foi a união soviética, sobre o comando de Stalin, quem derrotou os nazistas e não os Estados Unidos da América como sugere a literatura burguesa. A vitória do exército vermelho na Batalha de Stalingrado foi fundamental para por fim a Segunda Guerra Mundial. Já a participação dos Estados Unidos 1 Disponível em: http://mulheres-russo.russian-women.net/mulheres-russo/Perdas-da-URSS-na-Segunda- Guerra-Mundial.shtm acesso em: 06 de maio de 2012. 19 foi de menosprezo, atrasando suas tropas nas batalhas, pondo em dificuldade e reduzindo a força do exército vermelho. Retomando a discussão sobre o imperialismo, encontramos em Mészaros (2006) a divisão deste em três fases históricas: 1. o primeiro imperialismo moderno construtor de impérios, criados pela expansão de alguns países europeus em algumas partes facilmente penetráveis do mundo; 2. imperialismo “redistributivista” antagonicamente contestado pelas principais em favor de suas empresas quase-monopolistas, chamando por Lênin de “estágio supremo do capitalismo”, que envolvia um pequeno numero de contendores, e alguns sobreviventes do passado, agarrados aos resto do antiga riqueza que chegou ao fim logo após a segunda guerra mundial; e 3. Imperialismo global hegemônico, em que os estados unidos são a força dominante, [...] com a falsa política de igualdade democrática, que se tornou prenunciada com eclosão da crise estrutural do sistema do capital [...] que trouxe a o imperativo de construir uma estrutura de comando abrangente do capital sob um “governo mundial” presidido pelo país globalmente dominante (Mészaros, 2006, p. 72). No decorrer de seu trabalho, o autor aborda várias características e contradições do imperialismo atual sob o domínio dos Estados Unidos da América e traça algumas linhas sobre a possibilidade de um movimento socialista comprometido com a classe operária. Por fim, conclui que “a terceira fase, potencialmente a mais mortal, do imperialismo hegemônico global que corresponde à profunda crise estrutural do sistema do capital no plano militar e político, não nos deixa espaço para tranquilidade ou certeza” (Mészaros, 2006, p. 109). Continua afirmando que caso não haja uma reação positiva do movimento socialista a tempo de enfrentar os desafios impostos, este século deverá ser o da barbárie. Em nossa opinião, há um certo pessimismo no autor. Enquanto houver a contradição entre Capital e Trabalho, haverá dificuldades para a organização da classe operária. Porém as condições já estiveram piores, e ainda assim houve revolução, ou eram melhores as condições na Rússia no período de 1900 a 1917? Ou ainda as condições de Cuba e da China nos períodos anteriores à revolução? 20 Harvey (2006), no início do primeiro capítulo do livro, diz “meu objetivo é examinar a atual condição do capitalismo global e o papel que um ‘novo’ imperialismo poderia estar desempenhando em seu âmbito. Faço da perspectiva da longa durée2 e pelas lentes daquilo que chamo de materialismo histórico-geográfico” (Harvey, 2006, p. 11). O autor fala em materialismo histórico-geográfico para análise da fase do capitalismo atual, mas adiante vai elencar outras categorias que segundo ele são fundamentais neste processo. Como ordenação espaço-temporal, acumulação por espoliação, sendo esta o cerne das práticas imperialistas na atualidade. Quanto à terminologia do uso do termo imperialismo, faz a seguinte consideração: “[...] defino aqui a variedade especial dele chamada de ‘imperialismo capitalista’ como uma fusão contraditória entre ‘a política do estado e do império’[...] e ‘o processo de acumulação no espaço e no tempo’” (Harvey, 2006, p. 31). Na visão desse autor “O que distingue o imperialismo capitalista de outras concepções de império é que nele predomina a lógica capitalista, embora [...] haja momento que a lógica territorial venha para primeiro plano” (Harvey, 2006 p. 36). Sobre a lógica territorial, o autor diz: “a prática imperialista, do ponto de vista da lógica capitalista, refere-se tipicamente a exploração das condições desiguais sob as quais ocorre a acumulação do capital, aproveitando igualmente do que chamo de as ‘assimetrias’ inevitáveis das relações espaciais de troca” (Harvey, 2006 p. 35). Segundo Harvey (2006), o Estado é a entidade política capacitada para orquestrar este processo. O autor argumenta que para entender a lógica capitalista do imperialismo, deve-se ter como pano de fundo a lógica 2 Duração em português. 21 das ordenações espaços-temporais, pois esta se encontra relacionada diretamente com o capital excedente e em menor grau com o trabalho excedente. A argumentação do autor, na nossa visão, precisa de um estudo mais aprofundado, o que naturalmente não temos condições de fazer agora. No entanto, as categorias trazidas pelo autor para explicar a realidade, antes complicam ao invés de esclarecer. Feita esta breve consideração a respeito do imperialismo em Harvey (2004) e Mészaros (2006), concluímos que embora eles tenham contribuído para o entendimento do imperialismo na atualidade, entendemos que ambos deixam a desejar no que diz respeito à construção do projeto revolucionário da classe operária; de um lado pelo pessimismo de Mészaros quanto ao futuro movimento socialista e de outro lado pela falta de clareza na abordagem de Harvey. A seguir, faremos um resumo das argumentações de Lênin (1917) a respeito do imperialismo. Acreditamos que a partir dele, temos melhores condições para entender a realidade atual, embora o trabalho do autor tenha sido escrito em 1916 sob as condições limitadas pela ditadura czarista na Rússia entre 1546 e 1917. Os principais traços do imperialismo, em nossa visão, continuam a fazer parte de nosso cotidiano. 1.2 O pensamento de Lênin sobre Imperialismo Vladimir Ilitch Lênin foi o primeiro teórico, depois de Marx, a observar com exatidão que o capitalismo, nas últimas décadas do século XIX, passava por profundas transformações 22 que deram origem a uma nova fasedo capitalismo, a fase imperialista do capital. Conforme Lênin (1917), o imperialismo é a fase superior do desenvolvimento capitalista, na qual a dominação dos monopólios e do capital financeiro se corporifica e a exportação de capitais ganha papel fundamental, começando com a divisão do mundo pelos trustes e cartéis internacionais e termina com a partilha de todo globo terrestre entre os países economicamente mais importantes. As definições do que venha a ser imperialismo não abarca por completo seu significado, nem todos os aspectos, porém uma definição deve abranger cinco aspectos fundamentais: [...] 1) a concentração da produção e do capital levada a um grau tão elevado de desenvolvimento que criou os monopólios, os quais desempenham um papel decisivo na vida econômica; 2) a fusão do capital bancário com o capital industrial e a criação, baseada nesse “capital financeiro” da oligarquia financeira; 3) a exportação de capitais, diferentemente da exportação de mercadorias, adquire uma importância particularmente grande; 4) a formação de associações internacionais monopolistas de capitalistas, que partilham o mundo entre si; 5) e o termo da partilha territorial do mundo entre as potências capitalistas mais importantes (Lênin, 1917, p. 218). A respeito do imperialismo, é importante destacar alguns traços: o domínio do capital financeiro sobre o capital industrial; as tendências para as anexações, que inevitavelmente conduz para uma nova partilha, aumentando a rivalidade entre as potências, além das aspirações das potências em se tornarem hegemônicas. Segundo Lênin (1917), as concentrações de capital nas mãos de poucos capitalistas, geradas pela livre concorrência, conduziram à formação dos monopólios. Na década de 1870, o capitalismo vivenciava um período de depressão internacional que desemboca no craque de 1873, é a partir dai que fica demarcado o início da formação de cartéis. A década anterior foi marcada, segundo Lênin, como a fase pré-histórica da formação dos cartéis. As três últimas décadas do final do século XIX foi o período em que se deu o processo de formação dos 23 cartéis, porém este “ainda não eram sólidos, representava apenas um fenômeno passageiro” (Lênin, 1917, p. 8). Nesse período, o capital teve um período de ascensão, mas nos últimos anos do século XIX, entra em recessão e no início do século XX, vivencia mais uma crise que vai de 1900 a 1903. Essa crise propicia aos cartéis virem a ser umas das bases de toda vida econômica. Nas palavras de Lênin “o capitalismo transforma-se em imperialismo” (ibidem). Ao longo do processo de formação dos cartéis, verifica-se que à medida que estes se solidificavam, a concentração de capital nas mãos de poucos era cada vez maior. Consequentemente, as empresas de pequeno porte desapareciam ou eram incorporadas pelas empresas maiores. As grandes empresas, organizadas em cartéis, passaram a controlar mais ramos da produção ou um ramo inteiro, impedindo que empresas menores pudessem competir com elas. De acordo com Lênin (1917), houve um completo esmagamento destas. As formas utilizadas pelos cartéis vão desde a restrição de créditos, privação de créditos e mão-de-obra a boicotes etc. Dessa forma, os monopólios vão se tornando a base de toda a economia. Os monopólios proporcionaram um grande progresso no que diz respeito à socialização da produção, como também nos inventos e nas técnicas de produção social. Disto Lênin (1917, p. 131) conclui que: O capitalismo, chegado à sua fase imperialista, conduz à socialização integral da produção nos seus mais variados aspectos; arrasta, por assim dizer, os capitalistas, independentemente de sua vontade e sem que disso tenham consciência, para um novo regime social, de transição entre a absoluta liberdade de concorrência e a socialização completa. Porém diz o autor “A produção torna-se social, mas a apropriação continua a ser privada” (ibidem), embora os monopólios conduzam para um grande progresso no que diz respeito à produção social. A apropriação fica restrita aos grupos monopolistas, enquanto a 24 grande maioria da população, sob o domínio do monopólio, tem suas condições de vida cada vez mais difíceis, vulneráveis e insuportáveis. Outro ponto que merece destaque, diz respeito às crises. Para Lênin (1917), ao contrário do que pensavam alguns dos teóricos do seu tempo, que acreditavam na supressão das crises pela atividade monopolista, os monopólios tendem a agravar o caos próprio de todo sistema de produção capitalista. Para o autor, “Acentua-se ainda mais a desproporção entre o desenvolvimento da agricultura e o da indústria, desproporção que é característica do capitalismo em geral” (1917, p.135). A situação vantajosa que a indústria organizada em cartéis tem em determinados ramos da indústria, influencia diretamente nas indústrias que ainda não se encontram organizadas, aumentando a desproporção entre as indústrias organizadas e não-organizadas em cartéis, impossibilitando a indústria não-organizada a entrar na competição em um determinado ramo da produção, ficando submissas às indústrias cartelizadas. Diante disso, a supressão de crise pelos monopólios fica descartada, pois este tem como característica acentuá-las. “E, por seu turno, as crises (as crises de toda a espécie, sobretudo as crises econômicas, mas não só estas) aumentam em fortes proporções a tendência para a concentração e para o monopólio” (Lênin, 1917, p. 136). Ainda no que diz respeito ao desenvolvimento dos monopólios, Lênin (1917) destaca o papel dos bancos. Segundo o autor, os bancos têm uma importância fundamental no modo de produção capitalista imperialista. Por meio do capital bancário (capital-dinheiro), os capitalistas podem dar vida ao capital inativo, transformando-o em capital ativo. A primeira atividade que os bancos desempenhavam no capitalismo era de meros intermediários nos pagamentos; essa era a atividade essencial dos bancos. 25 Com o desenvolvimento dos monopólios, há um aumento considerável das transações bancárias em número cada vez mais reduzido de instituições bancárias. Estes, por sua vez, através dos trustes e cartéis, concentraram em suas mãos um volume muito alto de capital- dinheiro. Por meio da concentração de capital, os grandes bancos estendem seus domínios sobre bancos menores; primeiro em um determinado país, depois em nível internacional. E à medida que os bancos se tornam cada vez mais indispensáveis para as atividades dos capitalistas industriais, torna-os cada vez mais submissos em relação aos bancos. É nesta relação das indústrias com os bancos que reside o papel dos bancos no imperialismo. A fusão do capital industrial com o capital bancário, e a sujeição do primeiro pelo último, é um traço característico do imperialismo. Em resumo, os processos de concentração gigantesca, tanto dos bancos quanto das indústrias, consolidaram a indústria como um monopólio dos grandes bancos. Do ponto de vista de Lênin (1917), outro traço característico e, talvez o mais importante, seja a respeito do capital financeiro e da oligarquia financeira. O aparecimento do capital financeiro está diretamente ligado com a concentração da produção e junção do capital industrial com o capital bancário. A concentração do capital financeiro nas mãos de um punhado de capitalistas que vivem da especulação e dos rendimentos dos juros dos bancos dá origem a uma oligarquia financeira. O capital financeiro, concentrado em muito poucas mãos e exercendo um monopólio efetivo, obtém um lucro enorme, que aumenta sem cessar com a constituição de sociedades, emissão de valores, empréstimos do Estado, etc., consolidando a dominação da oligarquia financeira e impondo a toda à sociedade um tributo em proveito dos monopolistas. (Lênin, 1917, p. 169). Os lucros da oligarquia financeira são demasiadamente grandes nos períodos de ascensão das indústrias e mesmo em épocas de crises, o setor financeiro continua a lucrar. Enquanto as empresas de pequeno portegeralmente entram em dificuldades, os grupos 26 monopolistas adquirem estas a preços baixos, visando lucros futuros e concentrando ainda mais a produção. Esse processo ocorre em diversas áreas da economia mundial. Outra forma das oligarquias financeiras obterem lucros é através da especulação. Tomemos como exemplo a aquisição de terrenos nas cidades que se desenvolve rapidamente. Nestas, os terrenos aumentam seus preços à medida que a cidade cresce e ganha obras de infraestrutura. Os investimentos em obras de infraestrutura não tem relação com o bem estar da população, mas com o lucro. Os grupos monopolistas de vários setores ligados ao capital financeiro investem em determinadas áreas da cidade, visando à valorização dos terrenos adquiridos por eles mesmos. Desta forma, segundo Lênin (1917, p. 173), O monopólio dos bancos funde-se neste caso com o monopólio da renda da terra e com o monopólio das vias de comunicação, pois o aumento dos preços dos terrenos, a possibilidade de vendê-los vantajosamente por parcelas, etc., depende principalmente das boas vias de comunicação com a parte central da cidade, as quais se encontram nas mãos de grandes companhias, ligadas a esses mesmos bancos mediante o sistema de participação e de distribuição dos cargos diretivos. Não é só das atividades legais que o capital financeiro tira vantagens é também por meio da corrupção. Conforme Lênin (1917, p. 175), “O monopólio, logo que tenha se constituído e controlado milhares de milhões, penetra de maneira absolutamente inevitável em todos os aspectos da vida social, independentemente do regime político e de qualquer outra ‘particularidade’”. Não é de se assustar o envolvimento, por parte de funcionários do Estado ligados ao capital financeiro e em operações fraudulentas, nem tão pouco, o fato de homens ligados a capital financeiro obterem cargos no Estado. Evidente que os apologistas burgueses fazem vista grossa para este fato e se limitam tão somente a apontar as falhas do ponto de vista da moral. Mas o fato é que, para o capital financeiro, não existe limite que possa impedi- lo de obterem seus lucros; se precisar usa a força, a coerção e a corrupção. 27 O capitalismo, segundo Lênin (op.cit.), faz por natureza a separação da propriedade do capital da sua aplicação à produção. Neste sentido, separa capital-dinheiro de capital industrial, homens que vivem do dinheiro (os rentiers) dos empresários e todos que vivem da gestão do capital. Dessa forma, conclui que o imperialismo ou domínio do capital financeiro, é a fase superior do capitalismo, e nesta as separações tomam proporções gigantes. “O predomínio do capital financeiro sobre todas as demais formas do capital implica o predomínio do rentista e da oligarquia financeira, a situação destacada de uns quantos Estados de ‘poder’ financeiro em relação a todos os restantes” (Lênin, 1917, p.177). No período em que prevaleceu o capitalismo concorrencial, uma característica marcante deste era a exportação de mercadoria para obter lucros. A fase do capitalismo monopolista é distinta deste, pois ao invés de exportar mercadoria, exporta capital. A exportação de capital cumpre um papel importante na criação de uma rede de países dependentes do capital de exportação, mais precisamente do capital financeiro. O desenvolvimento desigual entre as empresas de um modo geral, como também do crescimento econômico dos países capitalistas é algo inevitável, pois é próprio do capitalismo monopolista. O resultado é o crescimento desigual e um nível elevado de concentração de capital excedente nas mãos das oligarquias financeiras. De acordo com Lênin (1917, p.181), “No limiar do século XX assistimos à formação de monopólios de outro gênero: primeiro, uniões monopolistas de capitalistas em todos os países de capitalismo desenvolvido; segundo, situação monopolista de uns poucos países riquíssimos, nos quais a acumulação do capital tinha alcançado proporções gigantescas”. Em consequência, há nos países avançados um enorme excedente de capital. Embora este processo tenha aumentado consideravelmente o volume de capital excedente, a realidade 28 é que a massas da população se viram arrasadas pelo agravamento da miséria. O que importa para os capitalistas não é o bem-estar das massas, mas o lucro, ou seja, os investimentos lucrativos. Enquanto o capitalismo for capitalismo, o excedente de capital não é consagrado à elevação do nível de vida das massas do país, pois significaria a diminuição dos lucros dos capitalistas, mas ao aumento desses lucros através da exportação de capitais para o estrangeiro, para os países atrasados (Lênin, 1917, p. 181). Pois nos países colonizados, em geral os preços dos meios de produção, mão-de-obra e matérias-primas são mais baixos, o que possibilita ao capitalista obter lucros maiores. A exportação de capital para os países atrasados possibilita a eles que alcancem certo grau de desenvolvimento, porém as vantagens maiores são dos países exportadores de capital, que ao exportarem seu capital, impõem condições vantajosas para si, pois além de estabelecerem nas cláusulas, os juros, incluem ainda condições como exemplo, a exportação de matéria-prima para o país credor e a importação de mercadorias deste. É desta forma que o capital financeiro cria sua rede internacional, estendendo-a por diversos países e submetendo os países atrasados ao domínio dos monopólios. Outro ponto característico do imperialismo na concepção de Lênin (op.cit.), diz respeito à partilha do mundo entre os países exportadores. Evidentemente, a partilha do mundo, segundo o autor, inicia-se primeiro a partir dos interesses do capital financeiro e termina na partilha territorial entre as potências imperialistas. Num primeiro momento, as associações monopolistas - organizadas em truts, cartéis e sindicatos - dominam quase que completamente a economia de um país. Porém os interesses do capital não se limitam ao domínio do mercado interno, então este se lança ao mercado externo. É inevitável que o mercado interno se entrelace com o mercado externo, uma vez que o mercado mundial já foi concretizado há muito tempo. E à medida que estas associações se 29 lançam no mercado externo e firmam acordos de interesse universais, dão origem aos cartéis internacionais. Os cartéis internacionais estendem seus domínios pelas colônias, a partir de criações sucursais e acordos comerciais entre empresas pequenas, com a finalidade de eliminar a concorrência e dividindo o mundo conforme seus interesses. Em algumas casos, entrelaçam- se com os interesses do Estado, formando um monopólio universal. Vale salientar que a partilha do mundo entre as associações é algo fechado. Novas partilhas são sempre possíveis, dependendo da correlação de forças, das guerras imperialistas, das crises etc.; disto se conclui que os monopólios não eliminam por completo a concorrência, ao invés disso, lança-se na ofensiva, minando as condições dos monopólios concorrentes, com o objetivo de assumir uma posição de hegemonia frente aos outros. Os interesses dos cartéis internacionais não se relacionam com os interesses das massas, pois a luta deles é unicamente pelos próprios interesses, ou seja, dos lucros. Conforme Lênin (1917, pg. 199), A época do capitalismo contemporâneo mostra-nos que se estão a estabelecer determinadas relações entre os grupos capitalistas com base na partilha econômica do mundo, e que, ao mesmo tempo, em ligação com isto, se estão a estabelecer entre os grupos políticos, entre os Estados, determinadas relações com base na partilha territorial do mundo, na luta pelas colônias, na “luta pelo território econômico”. A respeito da partilha do mundo pelas potências imperialistas, Lênin (op.cit.) fala que a corrida pelas aquisições das colônias se dá posterior à fase pré-monopolista (período máximo da livre concorrência entre 1860 e 1870). A passagem do velho capitalismo para a fase do capitalismo monopolista encontra-se relacionada com oaumento do luta pela partilha do mundo. No final do século XIX e início do século XX, a partilha territorial do mundo já se encontrava concluída. Mesmo já estando terminada a partilha do mundo, novas partilhas são possíveis de acontecer, pois há interesses distintos entre as potências imperialistas, como também entre as colônias. É própria do imperialismo, a tendência para anexação de colônias, 30 movidas não só pelas riquezas e matéria-prima existentes, mas também pelas possíveis fontes de matéria-prima e riquezas. Para Lênin (1917, p. 208), O que distingue o imperialismo da fase dos monopólios, dos imperialismos anteriores, como império romano, império grego etc, é a “dominação exercida pelas associações monopolistas dos grandes patrões” (ibidem). Através da qual “O capital financeiro é uma força tão considerável, pode dizer-se tão decisiva, em todas as relações econômicas e internacionais, que é capaz de subordinar, e subordina realmente, mesmo os Estados que gozam da independência política mais completa” (ibidem). E é assim, a partir da exportação de capital, que os grupos de associações monopolistas dividem o mundo entre as potências imperialistas, conforme os interesses do capital financeiro e da oligarquia financeira. Em resumo, Lênin diz que o imperialismo surgiu do desenvolvimento do capitalismo. Mas o capitalismo só se transformou em imperialismo capitalista quando chegou a um determinado grau, muito elevado, do seu desenvolvimento, quando algumas das características fundamentais do capitalismo começaram a transformar-se na sua antítese, quando ganharam corpo e se manifestaram em toda a linha os traços da época de transição do capitalismo para uma estrutura econômica e social mais elevada (1917, p. 216). A substituição da livre concorrência pelos monopólios é uma característica fundamental. A eliminação da pequena produção pela grande produção potencializa a concentração da produção e de capital e dão origem aos grandes monopólios. O aparecimento dos trustes, cartéis e sindicatos e a fusão destes com os bancos, torna-se a base da economia mundial. “Ao mesmo tempo, os monopólios, que derivam da livre concorrência, não a eliminam, mas existem acima e ao lado dela, engendrando assim contradições, fricções e conflitos particularmente agudos e intensos” (Lênin, 1917, p. 217). Continua o autor “O monopólio é a transição do capitalismo para um regime superior” (ibidem). 31 O imperialismo, segundo Lênin (1917), possui um aspecto importante que merece destaque, é a tendência deste para o parasitismo e decomposição do capitalismo. De acordo com autor, os monopólios, base de toda economia do imperialista, “gera inevitavelmente uma tendência para a estagnação e para a decomposição” (Lênin, 1917, p. 231). Ao fixarem os preços monopolistas, interrompe, mesmo que seja temporariamente, as condições que possibilita o progresso técnico e científico, atrasando o desenvolvimento e aplicação de novos inventos. Em sua obra, Lênin (1917) coloca algumas questões do operariado frente ao imperialismo. Conforme Lênin (1917), os sinais de progresso do início do século XX, a defesa fervorosa por diversos meios e o embelezamento da ideologia do imperialismo, amplamente difundida, penetraram no seio da classe operária, levando alguns para a defesa do imperialismo. Ao analisar as posições reformistas nos seio da classe operária, Lênin faz críticas a Kautsky (Teórico da segunda internacional comunista, um dos principais revisionistas do marxismo) em sua análise do imperialismo. Pois este, ao invés de mostrar as contradições do imperialismo, prefere ocultá-las, colocando-se ao lado dos publicitas burgueses. Estes visavam ocultar as contradições de imperialismo, tentado fazer acreditar que era possível reformar as bases do imperialismo, tornando-o mais aceitável e induzindo que este poderia trazer a paz mundial. Desprovidos de qualquer base teórica, fazia vista grossa para as contradições presentes no seio da política imperialista, tais como: a questão nacional, a posição da política pequeno-burguesa frente à opressão do imperialismo etc. Não via que sob o domínio do imperialismo, ao invés delas se tornarem mais suaves, pelo contrário, tornavam- se cada vez mais agudas e acentuadas. 32 Assim como os diversos teóricos burgueses citados por Lênin, Kautsky não avança em relação a estes, ao defender que o capitalismo se desenvolveria mais rápido se não estivesse limitado pelos monopólios. Neste sentido, dá um passo atrás em relação ao marxismo; Defender a livre concorrência é defender a volta ao capitalismo concorrencial. Kautsky não percebeu que a livre concorrência possibilitou um rápido desenvolvimento do comércio, este por sua vez, aumenta rapidamente a concentração da produção e do capital, gerando os monopólios. Outra defesa de Kautsky criticada por Lênin é relativa à fase ultraimperialista. Para ele, a formação dos trustes internacionais conduziria para a formação de uma única concentração. Em virtude desta, eliminar-se-iam naturalmente as contradições produzidas pelos monopólios e, consequentemente, alcançaríamos a paz mundial. Lênin fala que esta posição só seria possível de um ponto de vista abstrato. Do ponto de vista real, era um completo absurdo, pois o imperialismo conduz sempre para a partilha, mas não a faz por igual, pois é próprio deste o desenvolvimento desigual em todos os patamares, entre os trustes, as empresas, os ramos industriais e os países. Além do mais, possui contradições fundamentais ignoradas por Kautsky, como a oposição entre monopólio e livre concorrência, entre os cartéis e indústrias não cartelizadas e etc. que inviabiliza a paz e a liberdade. As alianças “interimperialistas” ou, ultraimperialistas, no mundo real capitalista, e não na vulgar fantasia filistina dos padres ingleses ou do “marxista” alemão Kautsky – seja qual for a sua forma: uma coligação imperialista contra outra coligação imperialista, ou uma aliança geral de todas as potências imperialistas -, só podem ser, inevitavelmente, “tréguas” entre guerras (Lênin, 1917, p. 258). Segue o autor, afirmando que “As alianças pacíficas preparam as guerras e por sua vez surgem das guerras, conciliando-se mutuamente, gerando uma sucessão de formas de luta pacífica e não pacífica sobre uma mesma base de vínculos imperialistas e de relações recíprocas entre a economia e a política mundiais” (ibidem). Esta posição de Kautsky é 33 oportunista, visa acalmar os ânimos da classe operária e conciliar com o imperialismo. O embelezamento da ideologia imperialista visa atenuar as contradições do imperialismo, trazendo a falsas perspectivas de liberdade. Conforme Lênin (1917, p. 260), O imperialismo é a época do capital financeiro e dos monopólios, que trazem consigo, em toda a parte, a tendência para a dominação, e não para a liberdade. A reação em toda a linha seja qual for o regime político; a exacerbação extrema das contradições também nesta esfera: tal é o resultado desta tendência. Intensifica-se também particularmente a opressão naciona1 e a tendência para as anexações, isto é, para a violação da independência nacional (pois a anexação não é senão a violação do direito das nações à autodeterminação). É importante destacar que as anexações não são apenas de regiões agrárias; países pouco industrializados também podem ser anexados. Do ponto de vista do autor, o imperialismo tende a intensificar a opressão nacional. A exportação de capital para essas regiões aflora a contradição deste ainda mais, ao mesmo tempo em que desperta a resistências dos povos, elevando o nível de consciência nacional e que em algum momento pode se fundir com a resistência e a luta da classe operária. Lênin afirma que o imperialismo possui tendência para levar parte da classe operária para o seu lado. Os lucros obtidos pelos capitalistas dos mais diferentes ramos da indústria, de um entre vários países, “[...] oferece-lhes a possibilidade econômica de subornarem certos setoresoperários e, temporariamente, uma minoria bastante considerável destes últimos, atraindo-os para o ‘lado’ da burguesia desse ramo ou dessa nação, contra todos os outros” (Lênin, 1917, p. 267). O antagonismo criado entre as potências imperialistas pela divisão do mundo acentua ainda mais a tendência de cooptação do operário para o lado da burguesia. É precisamente neste ponto que se encontra a relação entre imperialismo e oportunismo. Diante disto, é necessário entender que “a luta contra o imperialismo é uma frase oca e falsa se não for 34 indissoluvelmente ligada à luta contra o oportunismo” (Lênin, 1917, p. 268), existente no seio da classe operária. Concluímos este capítulo, fazendo algumas considerações a respeito do imperialismo. A política do imperialismo tem desencadeado inúmeras guerras pelo mundo. As crises de todas as ordens cada vez mais têm ocorrido em ciclos menores, têm sido cada vez mais agudas; as desigualdades econômicas entre os países só tem aumentado; Os problemas sociais são cada vez mais graves e não são mais particularidades dos países subdesenvolvidos, atingem também aos trabalhadores dos países desenvolvidos, ainda que em menor grau. O desemprego, a falta de moradia, de saneamento, o aumento da violência, a desnutrição e a subalimentação fazem parte da realidade das principais potências imperialistas, porém nos países submetidos aos países imperialistas é ainda mais crítica a situação. As políticas sociais, cada vez mais escassas, não são capazes nem mesmo de atenuarem os problemas sociais, nem tão pouco reduzir o nível de miséria no mundo. No próximo ponto, abordaremos algumas considerações a respeito das últimas transformações no mundo do trabalho, bem como os impactos da política neoliberal no conjunto da classe trabalhadora e da sociedade em geral. 35 2. Algumas questões a respeito da reestruturação do capital e os impactos no mundo do Trabalho A reestruturação produtiva do capital pode ser entendida como a tentativa do imperialismo em superar a recessão econômica da década de 70 do século passado e a crise de 1973. Em virtude desta, ocorre no contexto econômico, político e social, mudanças profundas que afetaram a classe operária e os trabalhadores em geral, causando grandes impactos na sociedade como um todo, em escala mundial. A partir dos meados da década de 60, o modelo Keynesiano/Fordismo, dá seus primeiros sinais de crise. De um ponto de vista mais atento, percebemos que as crises não são propriamente uma novidade no modo de produção capitalista. Pois desde o início têm ocorrido incontáveis períodos de recessão econômica que terminaram com uma crise em escala mundial. As crises são próprias da estrutura do sistema capitalista, que convive com tempos de ascensão e depressão e inevitavelmente em um setor ou outro a crise se expressa. De maneira geral, as crises são causadas pela superprodução de bens de consumo e a queda das taxas de lucro. Percebemos ainda que as práticas imperialistas têm produzido crises cada vez mais agudas e ao mesmo tempo seu ciclo tem sido mais curto. Em um rápido olhar para o histórico das crises, identificamos alguns pontos que, no nosso entendimento, foram importantes pra a redefinição do capital. A começar pela recessão econômica na década de 1970 do século XIX, que culminou no craque de 1873, marco da passagem do capitalismo concorrencial para o capitalismo monopolista. Nessa fase, o processo de formação do monopólio dá ao capital uma 36 sobrevida, no entanto, já no final do século, novamente desemboca em outro período de recessão. No decorrer do século XX, tivemos várias crises, destaque para a de 1903 e do craque de 1929, ambas também antecedidas por um período de recessão econômica. Ironicamente, 100 anos depois do início da fase do capitalismo monopolista, mais uma vez, o capitalismo entra em um período de recessão econômica entre os meados da década de 1960 e 1970, em seguida a crise petróleo 1973, que dá origem a profundas transformações no imperialismo. Sobre a égide neoliberal, as crises se tornaram ainda mais frequentes, destaque para a crise mexicana (1994), a asiática (1997), da Rússia (1998), da argentina (2001) e a americana (2008) e atualmente na Grécia; esta última, ainda em ciclo, tem afetado até as principais potências imperialistas. A recessão econômica da década de 70 apresenta seus primeiros sinais a partir de três pontos básicos: os baixos níveis de produção do setor industrial, o acúmulo de mercadorias no estoque e queda na taxa de lucro das grandes corporações; a crise do petróleo de 1973; e o grande excedente de capital acumulado nas principais potências imperialistas da Europa e também nos Estados Unidos da América. Nesse contexto, o modelo de produção baseado no Fordismo3 já não responde mais a demanda do mercado, pois este se baseava na produção em massa e era um sistema que apresentava uma rigidez não compatível com a nova realidade da organização industrial no bojo da crise. Umas das características deste modelo era a produção ao redor de uma linha de 3 Modelo de produção que nasceu na indústria de automóvel da Ford nos USA, com base no método taylorista, para a produção em massa. 37 montagem que priorizava a separação entre elaboração e a execução, em outras palavras, separa a dimensão intelectual do trabalho manual do operário. A crise instaurada no seio do capitalismo coloca a necessidade da introdução de um modelo de produção que facilitasse a distribuição de mercadoria e, ao mesmo tempo, retomasse as taxas de lucro, aumentando a acumulação de Capital. A saída vista pelo imperialismo para a retomada do crescimento econômico e aumento das taxas de exploração da mais-valia, foi a introdução do modelo de produção baseado na flexibilidade do trabalho e da produção. O modelo de produção japonês chamado “Toyotismo” 4 foi o que melhor se adequou a esta realidade da crise. Nesse modelo, a produção de bens de consumo é feita de acordo com as necessidades e as demandas do mercado consumidor, evitando o acúmulo de mercadorias nos depósitos e facilitando a sua circulação. As novas formas de organização do trabalho baseadas na Flexibilização5 do trabalho e da produção, começaram a aparecer em diversas partes do mundo. Surgiu primeiro no Japão, entre as décadas de 1950 e 1970, e se expandiu pelo mundo a partir da década de 1970. O nascimento deste se dá em razão do imperialismo japonês pretender tornar a indústria japonesa competitiva frente à indústria norte-americana, tendo em vista que o Fordismo não foi um modelo aplicável à realidade do Japão, pois o modelo fordista exigia uma forma de organização que ocupava muito espaço, além do mais, a produção em massa exigia o acúmulo de mercadoria em estoque, o que inviabilizava o emprego do modelo fordista na realidade japonesa. 4 Modelo de produção que nasceu nas indústrias automobilísticas da Toyota, por isso ficou conhecido Toyotismo. 5 Ver Harvey em condição pós-moderna e outros vários artigos. 38 As principais características do Toyotismo são: A produção voltada para atender demanda do consumidor, enquanto no Fordismo era conduzido pela oferta; o estoque mínimo da produção, evitando a estocagem típica do Fordismo; o Just-in-time6, para reduzir o desperdício de tempo; o método Kanban7 para gerenciar o controle de estoque; A flexibilização do trabalho e do trabalhador; a introdução do trabalho em equipe, como forma de garantir a produção sem perdas; e a horizontalização, que delega a produção de elementos básicos às empresas terceirizadas. É importante destacar que a flexibilização do trabalho implica diretamente na perda de direitos trabalhistas conquistados com muitas lutas pela a classe operária. A violação aos direitos do trabalhador se dá a partir das reformas trabalhistas implementadas pelos governos nos diversos países sobre a orientação do organismo de representação do imperialismo como a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Fundo Monetário Internacional(FMI) e o Banco Mundial. O objetivo é adequar o trabalhador (em outras palavras sujeitar o trabalhador) às novas formas de gestão das relações de trabalho no âmbito das empresas, para aumentar os lucros por meio da extração da mais-valia relativa como também a mais-valia absoluta. Sobre a falácia da gestão participativa, e da ideologia do trabalhador participante nas decisões da empresa, o trabalhador vai sendo incluído nos círculos (os chamados de CCQ) e cada vez mais se sentindo parte da empresa. Em decorrência das reformas nas leis trabalhistas e no modelo de gestão das empresas, o trabalhador é conduzido a se sujeitar e aceitar as condições de trabalho impostas pelas 6 O just-in-time é um princípio de gestão de stocks que se caracteriza pela manutenção de stock apenas em quantidade suficiente para manter o processo produtivo no momento. 7 Kanban é uma expressão japonesa que designa um método de fabricação em série aplicado aos processos de aprovisionamentos, produção e distribuição, seguindo os princípios do Just-in-Time. 39 empresas, quase sem questionamento. Os impactos para a classe operária e trabalhadores em geral são sentidas pelas intensas jornadas de trabalho, as horas extras e a criação dos bancos de horas; pelas demissões e os contratos de trabalho sem assinatura; além do exercício de diversas funções na empresa, polivalência e flexibilidade do trabalhador passaram a ser palavras de ordem na hora da contratação. Há um aumento da precarização do trabalho, além do agravamento das condições de vida da classe operária. Uma das características que merece destaque é o aumento da contratação da mão-de- obra feminina, de deficientes físicos e visuais, bem como as brechas abertas para o contrato de trabalho de menores aprendizes. Sobre o discurso da inclusão, esconde o verdadeiro motivo da contração deste; o verdadeiro motivo é a redução nos gastos com a mão-de-obra e aumento das taxas de lucro. É inquestionável que este tenha condições de trabalhar e que o trabalho seja tão bem-feito como o trabalho masculino. Contudo, não podemos esconder que o valor do salário pago as mulheres ainda são menores em relação aos dos homens, por isso se dá preferência à contração da mão-de-obra feminina. Nem tão pouco, podemos esconder que a utilização da força de trabalho do deficiente nas empresas, tem como pano fundo receber os benefícios oferecidos pelo Estado e em contrapartida passar para sociedade uma boa imagem da empresa; a imagem da empresa cidadã preocupada com os problemas sociais. A respeito da utilização da mão-de-obra no modelo de produção (flexível), percebemos que as empresas contratam a mão-de-obra de acordo com as necessidades especificas daquele momento nas empresas. Diferentemente do período fordista em que se contratava o trabalhador, garantindo a ele certa estabilidade no emprego. No modelo Toyotista, a instabilidade no emprego é uma marca registrada, se a empresa precisa, por dois meses, contratará o trabalhador por este período e demite ao término do contrato; sendo que o 40 contrato pode ser prolongado ou até mesmo readmitido em outro momento. Em resumo, podemos dizer que as consequências para a classe trabalhadora com a adesão deste modelo de produção é o aumento sem precedentes das taxas de desemprego, do subemprego, de empregos temporários no setor de serviços e o crescimento do trabalho informal, como também o barateamento da mão-de-obra em todo mundo. De acordo com Santos (2000), do ponto de vista daqueles a quem interessa a retomada do crescimento econômico, ou seja, do imperialismo, e a saída da recessão da década de 1970 se dá em três frentes principais: a primeira “é o aumento sem precedentes da área de aplicação de capitais especulativos, ou seja, sem o envolvimento direto na produção, cujo rendimento é garantido pela liquidez e mobilidade em tempo real” (Santos, 2000, p. 27). Vale destacar que, nesse período, houve um aumento considerável do número de bancos em escala mundial, além do crescimento de outros setores como, por exemplo, os fundos de pensões, companhias de seguros e etc. Todos estes setores estão ligados ao setor do capital financeiro que graças ao avanço dos meios de comunicação, o advento das novas tecnologias e surgimento da informática, ganha uma capacidade de mobilidade nunca antes vista, podendo entrar e sair de um país quando achar oportuno. É claro que esta conta com a intervenção direta do Estado burguês, sem ele não existiria tanta facilidade; a mobilidade do capital exige uma série de mudanças no plano político. Em virtude disso, o Estado burguês implementou mudanças consideráveis, garantindo a desregulamentação das economias nacionais, possibilitando ao capital financeiro uma maior liberdade de trânsito em nível mundial. O imperialismo busca a todo custo a acumulação de capital, que para se reproduzir, precisa da presença do Estado; que se utiliza da coerção a 41 partir das instituições de organização do capital (FMI, OMC, BIRD e etc.), para pressionar os países subdesenvolvidos (colonizados) a fazerem mudanças políticas, adequando-se aos interesses das potências imperialistas. Em alguns casos, até mesmo a intervenção militar pode ser usada. Assim, penetrar em todos os países do mundo independente do regime político, da cultura, da religião e etc. O segundo ponto levantado é a reestruturação industrial. Apoiado em Harvey (1996), pontua que em decorrência do “aumento da concorrência combinando processos flexíveis com processos do fordismo” (Santos, 2000, p. 28). Conforme a autora, São visíveis as transformações no sentido de descentralização, desverticalização, terceirização, automação, enfim, de uma nova organização do trabalho que empreende esforços com o objetivo de potencializar a extração da mais-valia relativa, sem prejuízo da extração da mais-valia absoluta, ou seja, ao mesmo tempo em que se investe pesado nas inovações tecnológicas e organizacionais, joga-se com a ideia do fim da centralidade do trabalho e consenso de classes (ibidem). Ressalta, ainda, que também repõe antigas formas de exploração escondidas, sob o ideário de uma sociedade de produtores independentes de mercadorias. “Uma sociedade sem vendedores de força de trabalho posto que o contrato de compra e venda da força de trabalho está metamorfoseado num contrato de fornecimento de mercadorias” (Teixeira apud Santos, 2000, p. 28). Neste processo, é de vital importância para a reestruturação produtiva o desmantelamento da organização sindical. De acordo com Santos, Essa estratégia e levada a cabo com ajuda da “ideologia da qualidade”, mas também da histórica repressão ao movimento sindical combativo, do aumento estrondoso do desemprego e pela a fuga das indústrias dos locais em que há um maior grau de maturidade na luta de classes, realizando uma verdadeira “onda migratória” a procura de novos mercados de trabalho (2000, p. 28). A criação do centro de controle de qualidade (CCQ) nas fábricas e dos diversos programas baseados no controle de qualidade tem como objetivo anular a contradição entre o capital e o trabalho, desmobilizar as organizações dos trabalhadores. Para isso, introduz 42 mudanças na forma de gestão e organização do trabalho. Por um lado, a antiga figura do chefe desaparece com a introdução do trabalho em equipe. Neste, todos agora são responsáveis pelo controle da produção (controle da produção, aqui não quer dizer socialização dos lucros produzidos), fica a cargo de cada funcionário a vigilância sobre o outro. Para o bom funcionamento, cabe a ele desenvolver seu trabalho sem tirar os olhos dos outros, se em algum momento acontecer uma queda de produção em algum setor, este assume garantindo o bom funcionamento da produção. O tratamento ao trabalhador é diferenciado (no plano ideológico, pois na realidade ainda são explorados) passaram a ser associados, colaboradores, etc., isto visa esconder o antagonismo de classe que existe entre os empregados e proprietários, entre oTrabalho e o Capital. Ao mesmo tempo em que busca organizar o trabalho em equipe, estimula a competição entre os trabalhadores. A competição entre eles possibilita o cumprimento de metas das empresas. Por outro lado, cumpre um papel de desestímulo para as associações entre si, sem perdas para a produção socializada no âmbito da empresa. O terceiro ponto explorado por Santos (2000, p. 29) é a “criação de condições políticas de que o mercado não dispõe para implementação da flexibilidade”. Neste ponto, são abordadas as transformações que ocorrem na esfera da ação estatal em nível de regulação da economia. “As exigências dos ajustes neoliberais são peças importantes no jogo que, além de intervir na reprodução dos pressupostos históricos de dominação, aumenta substancialmente a liberdade do capital: liberdade de movimento para o capital financeiro, para a desregulamentação das economias e dos direitos dos trabalhadores, entre outras” (ibidem). 43 Segue a autora, “a crise fiscal do Estado redireciona as funções do mesmo para que ele possa continuar funcional às necessidades da nova fase de ‘acumulação flexível’” (ibidem) em outras palavras, a necessidade do imperialismo. Diante disto, o Estado assume o seu papel na defesa dos interesses do capital. As idéias neoliberais ganham relevância, e sua intervenção é de um Estado mínimo para os trabalhadores e máximo para o capital, reduzindo gastos com políticas sociais, cortando gastos com funcionalismo público, flexibilizando as leis trabalhistas e etc. Estas condições descritas acima, de acordo com Santos (2000), do ponto de vista da classe trabalhadora, impõem um grau de dificuldade maior no que diz respeito ao enfrentamento do capital por novas conquistas no campo dos direitos sociais e trabalhistas. Santos (2000) apoiada em Antunes (1997) aponta que a classe operária se torna cada vez mais heterogênea, fragmentada e complexificada. Diante disto, os efeitos da crise atingem a subjetividade do mundo trabalho e a consciência de classe da “classe-que-vive-do-trabalho”, fazendo sentir nas organizações dos trabalhadores a exemplo dos sindicatos e do partido político. No caso dos sindicatos, destacamos que o período em que vigorou o Estado de bem- estar social, deixou se levar pela ideologia do imperialismo da conciliação de classe. À medida que os sindicatos conciliam com os patrões, deixam de lutar pelo alargamento dos direitos trabalhistas, inserem-se cada vez mais no âmbito das empresas e se afastam de suas bases, a classe operária. A crise instalada no modelo de Estado Keynesiano obriga o imperialismo a aumentar a repressão aos sindicatos ainda combativos. Estes, em virtude da repressão e constantes ataques aos direitos trabalhistas, aos poucos aderem à luta mais 44 particularizada e setorial, ou seja, passam a direcionar a luta por problemas mais específicos e imediatos, como garantia de direitos já conquistados, manutenção dos postos de trabalho, aumento de salário e gradativamente se afastam das lutas mais gerais, a exemplo da luta anticapitalista e anti-imperialista. Os partidos políticos já não são capazes de dialogar com as massas em virtude do revisionismo dentro do partido de todo o mundo, sofrem modificações que afetam diretamente a sua estrutura. Em decorrência das descrenças causadas pela ideologia imperialista a respeito do fim das utopias, pela crise instalada nas ciências sociais e etc., são orientados pelo revisionismo e espontaneismo, perdendo a influência sobre a classe operária. O resultado é a adoção de um projeto social bem distinto dos princípios básicos do partido comunista. Em nossa opinião, um partido que pretende estar a serviço da classe operária deve ter como princípios básicos: a autonomia frente às ideologias e os interesses do imperialismo, ou seja, ter sua própria ideologia; deve entender que a sociedade é dividida em duas classes fundamentais: a burguesia e a operária, em outras palavras, de exploradores e explorados. Esta possui um antagonismo que não pode ser suprimida senão pela abolição do sistema capitalista. Ser um partido de classe operária, significa defender os interesses dos operários e trabalhadores em geral, rejeitando toda e qualquer forma de conciliação entre as classes; é preciso ser um partido com vida interna democrática e uma direção centralizada, permitindo o exercício e participação de todos os membros nas tomadas de decisões e nas divisões de tarefas, bem como a participação efetiva nas eleições da direção central e de todas as organizações. 45 Ser simultaneamente internacionalista e defensor dos interesses nacionais, pois é importante que seja solidário com os trabalhadores de outros países, sem virar as costas para as contradições internas especificas de cada nacionalidade; defender uma sociedade sem exploradores e nem explorados, ou seja, uma sociedade socialista e que tem como único meio para sua realização: a revolução violenta da classe operária. E por fim, ser portador de uma teoria revolucionária. Em nossa opinião, essa teoria é o marxismo-leninismo, pois só através dela, torna-se possível explicar as contradições do capital e do imperialismo e indicar o caminho para transformar a realidade. Entendemos que não haja um método pronto e acabado, uma vez que a realidade de cada país possui suas particularidades e suas contradições internas. Todavia, esses princípios são indispensáveis a qualquer partido que pretende ser um partido revolucionário. No que diz respeito a crise do movimento sindical nos países que vivenciaram o Welfare State, no qual a crise já se havia instalado desde o inicio da década de 1960. É de fundamental importância que lembremos que os sindicatos sempre tiveram como motivação principal a luta econômica, a adesão à luta mais ampla depende de outros vetores para que se desenvolva, a exemplo da direção de um partido de classe verdadeiramente operário nos termos colocados acima. Como vimos anteriormente na abordagem de Lênin (1917), o Imperialismo tem condições de proporcionar certa melhora de vida para um número reduzido da classe operária, puxando-os para a defesa dos interesses do Capital e da conciliação de classe. Acreditamos que o período do Welfare State tenha proporcionado certa melhoria de vida para a classe operária, uma vez que concede alguns direitos trabalhistas e o acesso a alguns serviços sociais, ao mesmo tempo se elevaram os números de postos de empregos, reivindicações 46 antigas da classe operária no mundo. Embora não representou o fim da espoliação da classe operária, pelo contrário, intensificou, pois manteve as bases da exploração e a extração da mais-valia. Esta condição proporcionada pelo imperialismo contribui significativamente para a redução e a abrangência da luta dos sindicatos, e abre espaço para o sindicalismo de empresa em oposição ao sindicalismo combativo. A crise no sindicalismo atinge a classe operária, contribuindo para abertura de espaço para novos sujeitos sociais, assim nascem os novos movimentos sociais. Estes são assim chamados por diversos estudiosos do assunto pela diferença destes em relação aos movimentos tradicionais, particularmente o movimento operário. É num cenário de crise econômica, política, social e ideológica que surgem e desenvolvem os chamados novos movimentos sociais, apresentando-se no cenário mundial como alternativa para a luta contra o capital. Embora os movimentos sociais tenham sido e ainda são significativos no plano da luta social por melhores condições de vida e na conquista de direitos sociais e políticos, é importante frisar que desde sua gênese, eles têm mostrado seus limites no que diz respeito às transformações radicais nas estruturas do sistema capitalista e na luta anti-imperialista, pois a abrangência dos seus objetivos são limitados, segmentados e imediatistas, que expressaram e se expressam sobretudo nas temáticas relativas ao gênero, etnia, raça, meio ambiente e etc. A reestruturação produtiva do
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