Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 Luana Mascarenhas Couto 18.2- EBMSP Doença Inflamatória Pélvica (DIP) Introdução A Doença inflamatória pélvica (DIP) é a infecção aguda do trato genital superior, ou seja, aquela acima do orifício interno do colo. Amarelo- Orifício interno/ Azul- Orifício externo/ Entre eles- canal endocervical. A DIP decorre da ascensão de microrganismos do trato genital inferior, de forma espontânea ou devido à manipulação, tais como: - Colocação de DIU; - Curetagem; - Biopsia de endométrio. Epidemiologia: Representa uma doença que atinge principalmente idade de 15-25 anos, tendo uma prevalência subestimada, uma vez que a maioria dos quadros clínicos são oligossintomáticos. Além disso, cerca de 85% dos casos estão associados a IST’s. Fisiopatologia Antes de tudo, precisamos entender que o canal endocervical é uma barreia que protege o trato genital superior, e que normalmente é estéril aos microrganismos do ecossistema vaginal. Contudo, quando os microrganismos passam pelo colo e chegam à cavidade uterina, podendo ir até as tubas e peritônio, causando um processo inflamatório, o qual pode gerar até abscessos tubo-ovarianos. Em geral, são bactérias sexualmente transmissíveis as causadoras, principalmente: Clamydia trachomatis e Neisseria gonorrhoeae. Contudo, pode ser causada por outras, como: Gardenerella vaginallis (causadora da vaginose bacteriana), Micoplasma, Ureaplasma, E. coli, etc. Logo, podemos perceber que há um comprometimento do endométrio, tubas uterinas, anexos e/ou estruturas contíguas, apresentando quadros de endometrite, salpingite, ooforite (inflamação dos ovários) e formação de pus na trompa, a chamada piosalpite. Pode ainda haver peritonite por estruturas contíguas, comprometendo da capsula de Glisson, causando um quadro de perihepatite. Etiologia 85% dos casos estão associados aos patógenos transmitidos sexualmente, como já ditos anteriormente. Dessa forma, a Clamídia e o Gonococo são os principais causadores. Já cerca de 15% dos casos estão associados a transmissão não sexual, sendo os patógenos mais associados os entéricos: E. coli, S. agalactiae, etc. Contudo, importante salientar que independentemente do patógeno inicial, a DIP é clinicamente considerada uma infecção polimicrobiana mista. Fatores de risco Os principais fatores de risco são: - Idade entre 15-25 anos, uma vez que pacientes jovens possuem mais riscos para ectopia, ou seja, exteriorização do tecido colunar em região do ectocérvice e os patógenos causadores possuem tropismo por esse epitélio. Além disso, as jovens não possuem uma resposta imune tão eficaz quando comparadas a pacientes mais velhas; - Baixo nível socioeconômico; - Múltiplos parceiros; - Parceiros com IST; - Passado de DIP; - Uso de DIU: Principalmente as 3 semanas após a inserção pelo mecanismo de colocação e possível ascensão dos patógenos; - Duchas vaginais; - Uso de anticoncepcional: há uma redução do uso de camisinhas e também há um espessamento do muco pelos hormônios; - Nulíparas; - Não uso de preservativo; - Tabagismo: promove um prejuízo na motilidade ciliar das tubas uterinas; - Vulvovaginites e cervicites concomitantes. Quadro Clínico A infecção resultante pode ser subclínica ou manifestar-se. Contudo, ainda não se sabe o motivo pelo qual bactérias do trato inferior causam DIP em algumas mulheres e em outras não, mas se desconfia que possa ser por variações genéticas na resposta imune, níveis de estrogênio que afetam a viscosidade do muco genital e até mesmo pela carga bacteriana dos patógenos. Sinais e sintomas: - Dor abdominal inferior; - Dor à mobilização do colo; - Dor à palpação dos anexos; - Corrimento vaginal purulento; - Dispareunia: principalmente de profundidade; - Febre: em menos de 1/3 dos casos; 2 Luana Mascarenhas Couto 18.2- EBMSP - Náuseas, vômitos e inapetência; - Irritação peritoneal. Exame físico: Ao exame especular vamos visualizar: - Colo friável; - Eritema cervical; - Spotting ou sangramento de escape: pelo comprometimento dos órgãos genitais superiores; - Presença de secreção endocervical. Diagnóstico O diagnóstico é dado da seguinte maneira: - Presença de 3 critérios maiores + critério menor OU - Presença de 1 critério elaborado. Os critérios maiores, menores e elaborados são: - Maiores ou mínimos: Dor em hipogástrio; Dor à mobilização do colo uterino; Dor à palpação de anexos. - Menores ou adicionais: Temperatura axilar > 37,5 º C ou oral > 38,3ºC; Fluxo vaginal/endocervical anormal: mucopurulento; >5 Leucócitos por campo de imersão em material de Endocérvice; Massa pélvica; Leucocitose em sangue periférico; Proteína C reativa e/ou VHS elevados; Comprovação laboratorial de infecção cervical. - Elaborados ou definitivos: Evidência histopatológica de endometrite; Abscesso tubo-ovariano ou em fundo de saco de Douglas em estudo de imagem; Laparoscopia com evidencia de DIP. Exames complementares: - Hemograma, VHS, Proteína C reativa; - Cultura de material da Endocérvice; - Detecção de Clamídia e gonococo por biologia molecular; - Hemocultura; - Exame qualitativo de urina e urocultura; - Pesquisa de N. gonorrohoeae e C.trachomatis no material do Endocérvice, da uretra, da laparoscopia ou de punção do fundo de saco de Douglas; - Teste de gravidez; - USG: inicialmente e de preferencia transvaginal; - TC pélvica. Diagnósticos diferenciais: - Gravidez ectópica: presença de atraso menstrual e teste positivo para gravidez; - Ruptura ou torção ovariana: ocorre uma dor de início súbito e extremamente intensa; - Endometriose; - Cistite: há aumento da frequência urinaria e disúria; - Apendicite: dor em fosse ilíaca direita e vômitos; - Diverticulite; - Síndrome do intestino irritável: dor abdominal generalizada e mudança dos hábitos intestinais; - Dor funcional: há uma dor crônica ou constante, sem causa identificável. Classificação A Classificação da DIP é essencial para se saber como será realizado o tratamento. Estágio Classificação de MONIF Estágio 1 (Leve) Endometrite e salpingite aguda sem peritonite - Conduta: nível ambulatorial Estágio 2 (Moderado sem abscesso) Salpingite aguda com peritonite - Conduta: nível hospitalar Estágio 3 (Moderado com abscesso) Salpingite aguda com oclusão tubária ou comprometimento tubo-ovariano (abscesso) - Conduta: nível hospitalar Estágio 4 (Grave) Abscesso tubo-ovariano roto com secreção purulenta na cavidade (há queda do estado geral, refratariedade ao tratamento clinico, febre persistente, comprovação USG e/ou abscesso acima de 10 cm); - Conduta: nível hospitalar e cirúrgico (Envolve a remoção cirúrgica do abscesso, preservando os ovários sempre que possível). Tratamento Tratamento ambulatorial: Indicado em casos de: - Quadro clínico leve/moderado; - Ausência de pelviperitonite. Sendo importante garantir retorno para reavaliar em 72 horas. O tratamento é feito da seguinte maneira: 3 Luana Mascarenhas Couto 18.2- EBMSP - 1ª opção: Ceftriaxone 500 mg, IM em dose única + Doxiciclina 100 mg, 1 comprimido, VO, 2x/dia por 14 dias + Metronidazol 250 mg, 2 comprimidos, VO, 2x/dia por 14 dias; - 2ª opção: Cefotaxina 500 mg, IM, dose única + Doxiciclina 100 mg, 1 comprimido, VO, 2x/dia por 14 dias + Metronidazol 250 mg, 2 comprimidos, VO, 2x/dia por 14 dias. Tratamento hospitalar: Pode ser clínico ou cirúrgico. - Clínico: possui as seguintes indicações: Dificuldade para excluir emergência cirúrgica; Presença de gestação; Presença de abscesso pélvico ou tubo-ovariano; Refratariedade ao tratamento; Ausência de resposta clínica após 72 horas do tratamento com ATB oral; Intolerância ao tratamento oral; Estado grave: presença de febre alta, náuseas e vômitos; Seguimentonão garantido; Dificuldade para exclusão de emergência cirúrgica, por exemplo: gravidez ectópica, apendicite, etc. 1ª opção 2ª opção 3ª opção Ceftriaxone 1 g, IV, 1x/dia por 14 dias + Doxicilina 100 mg, 1 comprimido, VO, 2x/dia por 14 dias + Metronidazol 400 mg, IV, de 12/12 horas Clindamicina 900 mg, IV, 3x/dia, por 14 dias + Gentamicina (IV ou IM), 3-5 mg/kg, 1x/dia, por 14 dias Ampiclina/Subactam 3g, IV, 6/6 horas por 14 dias + Doxicilina 100 mg, 1 comprimido, VO 2x/dia por 14 dias. OBS: A Doxicilina venosa pode causar flebite e é contraindicada na gravidez. O uso parenteral deverá ser suspenso 24 horas após a cessação dos sintomas e a continuação por VO deve se estender por 14 dias. OBS1: É importante orientar o paciente quanto ao não uso de bebidas alcoólicas durante e após 24 horas do uso do metronizadol para evitar o efeito dissulfuram símile ou antabuse (presença de desconforto abdominal, rubor, vômitos e cefaleia). Este representa uma interação medicamentosa. - Cirúrgico: possui as seguintes indicações: Presença de abscesso não responsivo ao tratamento ou roto ou acima de 10 cm. Seguimento: Posteriormente o tratamento é preciso: - Reavaliar em 1 semana após a alta hospitalar; - Solicitar abstinência sexual até a cura clinica e tratamento do parceiro; - Tratar parceiros dos últimos 2 meses para gonococo e C; trachomatis; Se possuir peso < 150 kg: Ceftriaxone 500 mg, IM, em dose única + Azitromicina, 1 g, dose única ou Doxicilina 100 mg, VO 2x/dia por 7 dias para tratamento de clamídia em indivíduos com infecção pelo gonococo; Se possuir peso > 150 kg: Ceftriaxone, 1 g, IM, em dose única + Azitromicina, 1 g, dose única ou Doxicilina 100 mg, VO 2x/dia por 7 dias para tratamento de clamídia em indivíduos com infecção pelo gonococo. - Fazer testes para gonococo e C trachomatis após 3 meses ou na primeira oportunidade em até 1 ano. Condições especiais DIP X DIU: Não há necessidade de remoção do DIU, pois a manipulação da sua retirada pode fazer com que se introduzam mais bactérias e piore ainda mais a inflamação, contudo, em casos de indicação realizar colocação após 2 doses do esquema terapêutico de ATB. DIP X imunossupressão: O tratamento é similar às pacientes com imunidade normal, contudo há maior chance de abscesso tubo-ovariano. Complicações As principais complicações são: - Infertilidade; - Dor pélvica crônica; - Gestação ectópica; - Abscesso tubo-ovariano: suspeitaremos quando não existir uma resposta ao tratamento. Seu diagnostico é feito pela USG transvaginal e a paciente cursa com dor abdominal recente, corrimento purulento, sangramento genital irregular, sinais de peritonismo, tumor pélvico e febre. O tratamento é feito com ATB. Indicações cirúrgicas: Abdome agudo: rotura; Massa persistente ou que aumenta após ATB adequada; Falha ao tratamento clínico. - Hidrossalpingite: coleção líquida na tuba uterina; - Torção anexial; - Síndrome de Fitz-Hugh-Curtis ou Síndrome corda de violinha: há presença de aderências entre a capsula de Glisson e a parede abdominal, que gera dor crônica em hipocôndrio direito, febre e calafrios.
Compartilhar