Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
DEFICIÊNCIA AUDITIVA E LIBRAS Autora: Ana Regina e Souza Campello Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Reitor: Prof. Ozinil Martins de Souza Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Profa. Hiandra B. Götzinger Montibeller Profa. Izilene Conceição Amaro Ewald Profa. Jociane Stolf Revisão de Conteúdo: Profa. Anelise Donaduzzi Revisão Gramatical: Profa. Marli Helena Faust Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci 616.8 C193d Campello, Ana Regina e Souza. Deficiência Auditiva e Libras / Ana Regina e Souza Campello. Centro Universitário Leonardo da Vinci – Indaial: Grupo UNIASSELVI, 2009.x ; 124 p.: il. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7830-782-0 1. Deficiência - Neurologia 2. Portadores de Necessidades Especiais I. Centro Universitário Leonardo da Vinci. II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título Reimpressão Junho/2012 Copyright © UNIASSELVI 2009 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (047) 3281-9000/3281-9090 Ana Regina e Souza Campello Sou a Professora Ana Regina e Souza Campello, responsável pela disciplina da Área da Surdez. Sou doutorada em Educação de Surdos – Processos Inclusivos e mestranda em Linguística da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Trabalhei como professora de EAD – Ensino a Distância de Letras Libras na UFSC. Publiquei vários artigos e livros: Existir para existir; Comunicação Total é uma forma de viver; Animais em Língua de Sinais Brasileira; Alimentos em Língua de Sinais Brasileira; Relacionamentos em Língua Brasileira de Sinais; Vestuário em Língua de Sinais Brasileira; Habitação em Língua de Sinais; Profissões em Língua de Sinais; Pedagogia Visual: Sinal na Educação dos Surdos; Língua de Sinais X Língua Oral: Comunicação no dia a dia; The origin of the deaf Community in Brazil; Comunicação no dia a dia; International Internship Program; Onde você quer chegar?; Inclusão X Exclusão Social: O que de fato pode acontecer na educação dos surdos brasileiros; Re-reflexão crítica: Seminário promovido por instituição oficial de educação em um estado da região sul brasileira no ano de 2004. Sumário APRESENTAÇÃO ......................................................................7 CAPÍTULO 1 um Breve HiStórico de educação de SurdoS ...............................9 CAPÍTULO 2 modeloS e técnicaS educacionaiS na educação de SurdoS.......... 25 CAPÍTULO 3 identidadeS, culturaS e línguaS de SinaiS doS SujeitoS SurdoS PóS-moderniSmo .......................................45 CAPÍTULO 4 a legiSlação na educação de SurdoS ........................................71 CAPÍTULO 5 a Política de incluSão educacional............................................83 CAPÍTULO 6 aceSSiBilidade educacional e Social.........................................103 7 APRESENTAÇÃO Esta disciplina trata da Surdez, em termos culturais e antropológicos, definindo-a como uma identidade cultural, partilhada, entre indivíduos Surdos ou com perda auditiva, pela “experiência visual”. Na videoaula é apresentada a língua de sinais brasileira, que é a língua natural da comunidade Surda, e no caderno de estudos, apresentarei conteúdos que possam servir de ajuda na compreensão, assim como dicas e atividades para reflexão durante o curso. Vamos citar exemplos mais comuns no dia a dia: você já encontrou ou já teve contato com pessoas Surdas em algum momento da sua vida? Já teve vontade de conversar com elas, mas não sabia como começar, por causa da sua língua de sinais brasileira? Perguntou-se se os Surdos são capazes de fazer alguma coisa como nós? Eles são “normais”? Por que eles são considerados “diferentes”? Essas são algumas das questões que vamos conhecer na área da Surdez. Para entender ou conhecer sobre a área da Surdez, apresentamos a disciplina dividida em seis capítulos, que depois poderão ser aproveitados para fazer seus futuros projetos profissionais. São eles: - Capítulo 1 – Trata da contextualização e traz um breve histórico de educação de Surdos no Instituto de Jovens Surdos de Paris até a educação de Surdos no Brasil. - Capítulo 2 – Apresenta os vários modelos e técnicas educacionais na educação de Surdos. - Capítulo 3 – Tem por objetivo conhecer as identidades, culturas e línguas de sinais dos sujeitos Surdos no pós-modernismo. - Capítulo 4 – Apresenta a legislação na educação de Surdos. - Capítulo 5 – Contextualiza a política de inclusão educacional e - Capítulo 6 – Apresenta as possibilidades de acessibilidade educacional e social dos Surdos. No caderno de estudo, você terá contato com as referências complementares que poderão servir de ajuda no transcorrer do curso, e também com as atividades propostas. A autora. CAPÍTULO 1 um Breve HiStórico de educação de SurdoS A partir da perspectiva do saber fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Apresentar os conhecimentos filosóficos, históricos, sociológicos e econômicos na Educação de Surdos. 3 Mostrar os diferentes conhecimentos da história na Educação de surdos no mundo e no Brasil. 11 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos Capítulo 1 contextualização Apresento a trajetória da comunidade Surda e sua educação como ponto de partida na construção da identidade cultural, sociológica e educacional dos sujeitos Surdos. A conquista do seu espaço como sujeito Surdo se deu graças à introdução do “alfabeto manual”, que possibilitou a sua inserção na sociedade. Com a inserção na sociedade, transformou o sujeito Surdo em sujeito crítico, criativo e inovador. Os sujeitos Surdos foram precursores de várias atividades, dentre elas, as Associações, movimentos sociais e da educação de Surdos até hoje. a trajetória doS SujeitoS SurdoS A trajetória social, política, linguística e de educação dos sujeitos Surdos inscreve-se junto com o longo do capítulo das exclusões. Os sujeitos Surdos como personagens são, ao mesmo tempo, excluídos e incluídos. Da inclusão, a comunidade não-surda escondia as deficiências e acabou criando guetos para os sujeitos Surdos. Da exclusão, a comunidade não-surda não os aceitava como membros da sociedade como um todo. Estes fatos são escritos e narrados por diversos autores, como Marcos, no seu Evangelho, quando Jesus Cristo fez os Surdos e Mudos falarem e ouvirem pelo milagre divino (SANCHÉZ, 1990). Nos seus livros, Platão e Aristóteles, ao tratarem do planejamento das cidades gregas, recomendavam que as pessoas nascidas “disformes” deveriam ser eliminadas. A eliminação se daria pela exposição ao sol, abandono ou, ainda, atiradas do alto da montanha chamada de Taygetos, na Grécia. Segundo a concepção de Aristóteles, é impossível educar as pessoas Surdas: “[...] mudos também são Surdos: eles podem ter vozes, mas não podem falar palavra alguma” (SANCHÉZ, 1990, p. 31). Nos séculos de pré-conceito errôneo, ignorância, desconfiança, piedade, mitos e desprezo, os sujeitos Surdos começaram a desmitificar tais preconceitos. A desmitificação começou a mostrar que os restos da audição, como um dos resquícios da presença e da integridade física, viabilizavam a capacidade de ouvir como os demais cidadãos. A partir de então, criaram-se vários métodos que, emsua maioria, foram pesquisados por padres, abades e frades e registrados pela igreja e monastérios como de sua autoria. Os livros das antiguidades e seus métodos para os sujeitos Surdos eram conservados nos repositórios da igreja. Mudos também são Surdos: eles podem ter vozes, mas não podem falar palavra alguma. 12 Deficiência Auditiva e Libras Pesquise na Biblioteca de sua região como os antigos romanos e gregos faziam com os Surdos. A metodologia na soletração de alfabeto manual foi positiva aos sujeitos surdos, porque os padres, frades ou monges, ao criarem uma forma de comunicação no sistema de silêncio, criaram o alfabeto manual, como relata Melchor Sánchez de Yebra (PLANN, 1997). Segundo ele, no seu livro “Simplification of the Letters of the Alphabet and Method of Teaching Deaf Mutes to Speak” (1620), a fonte original desse alfabeto é San Buanaventura (Frei Juan de Fidanza, 1221-1274). Este criou o alfabeto manual para comunicar-se com outros companheiros pelo voto de silêncio. O sistema passou a ser aproveitado para ensinar aos Surdos daquela época. Com essa ação, inicia-se uma nova fase de integração dos Surdos com o objetivo de eliminar a exclusão dos mesmos do meio social, dadas as circunstâncias que aconteceram na época, como herança e matrimônio entre os filhos Surdos dos condes, príncipes e até reis. A integração deles, por meio da intervenção dos padres, frades ou monges, de modo consciente ou inconsciente, está mais relacionada à solução, ou a salvar a “alma”, apiedar-se e re-colocar os Surdos na sociedade. Atividade de Estudos: 1) Escreva em cinco linhas o porquê do uso da letra “S” em maiúscula para definir o Sujeito Surdo. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ San Buanaventura (Frei Juan de Fidanza, 1221-1274) criou o alfabeto manual para comunicar-se com outros companheiros pelo voto de silêncio. 13 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos Capítulo 1 No início da Idade Moderna, vários monges, como Melchor Sánchez de Yebra (1526-1586) e Gerolamo Cardomo (1501-1576), instruíram os Surdos a lerem e escreverem; Beneditino Pedro Ponce de Léon (1510-1584) e Juan Pablo Bonet (1579-1633) publicaram alfabeto manual, livros e métodos que ensinavam aos Surdos a usar sinais e escrita, e alguns utilizavam a via da oralização. Com a efervescência política, econômica e cultural e a transição da Idade Média para a Idade Moderna, a época do Renascimento trouxe o esclarecimento, a música, a arte, a razão e as ciências empíricas, que, aos poucos, apagaram as ações negativas sobre os sujeitos Surdos. As pesquisas acerca da Surdez e sua metodologia eram veiculadas nas igrejas e abadias da Europa, especificamente, na França, na Abadia de Amiens. O primeiro professor Surdo de que se tem notícia foi Etienne de Fay, francês, nascido em 1669, arquiteto, bibliotecário, escultor, procurador e professor de instrução na cidade de Amiens, França, onde foi educado e onde morreu aos 70 anos. Ensinou uma turma de sete crianças Surdas usando a língua de sinais e a escrita (TRUFFAUT, 1993, apud LANE, 1999). Surdos-Mudos: É uma representação identitária, cultural e os sinais são convencionados pela comunidade Surda utilizada do século XVI até a presente data, apesar de a denominação “Mudo” ser retirada pelo Congresso de Milão em 1880. Condiz que Surdo- Mudo não é portador da “mudez” por problema patológico e também por não falar, não ter “voz”, e sim por usar a língua de sinais, que é a modalidade viso-gestual e não usa a “fala” ou a “oralização” para articular e sinalizar ao mesmo tempo. As letras “S” e “M”, maiúsculas, são utilizadas por uma questão de identidade. (CAMPELLO, 2008). Oralização: No dicionário HOUAISS, quer dizer prática ou método de ensino de linguagem oral orientada para crianças com perda auditiva. Ciências empíricas: São as ciências que se baseiam em demonstrações reais para comprovar alguma coisa. Por outras palavras, são as ciências que comprovam dados científicos através de demonstrações de acontecimentos que ocorrem naturalmente na natureza. Uma coisa empírica é algo que é aprendido ou adquirido através das experiências. Por exemplo, a biologia, a química, a física, a geologia e outras são exemplos de ciências empíricas. Por outro lado, você tem as ciências conceptuais, que se baseiam em demonstrações teóricas para comprovar dados científicos. Uma 14 Deficiência Auditiva e Libras coisa conceptual é algo que se baseia em conceitos e teorias. Por exemplo, a matemática e a filosofia são ciências conceptuais. inStituto nacional de jovenS SurdoS de PariS No século XVIII, já existiam comunidades Surdas espalhadas na capital e nas cidades vizinhas da França. O abade francês Charles Michel de l`Epée, nascido em Versailles, em 1712, tomou uma importante iniciativa, em termos pedagógicos, no que se refere à educação dos Surdos, começando tal instrução com duas mulheres Surdas, com vocação religiosa. Com a mendicância nos arredores de Paris, a revolução francesa e a opressão lingüística contra os Surdos não instruídos, o abade de l`Epée criou uma escola particular bancada com seus próprios recursos. Depois da sua morte, a Constituição Francesa criou a escola chamada de Institution Nationale des Sourds-Muets, em Paris, em 1760, atual Institut Nationale de Jeunes Sourds de Paris (INJS) com o objetivo de dar independência e reconhecimento aos Surdos como cidadãos pelas pessoas não surdas. Apesar de serem Surdos, estes, como cidadãos franceses, não eram desprezados, excluídos e tutelados. Na França, houve a padronização da língua de sinais, um dos princípios da política linguística, como formação de uma língua, como “sinais metódicos”, ou francês sinalizado (PADDEN, 1988, LANE, 1999). Pesquise, no site do Google, sobre a comunidade Surda do século XVIII, em inglês ou francês. Utilize a palavra “Deaf-Mutes” ou “Sourds-Muets”. Você encontrará coisas interessantes para conhecer! Os “sinais metódicos” eram forjados a partir de uma forma existente, como a Antiga Língua de Sinais Francesa – ALSF (WILCOX, 2005), que era aceita e não era estereotipada pela comunidade não-surda. Do mesmo modo, o poder político do império francês promoveu a criação de um instituto por meio da Constituição Francesa, escolhendo ou impondo a língua de uma minoria, como é o caso da 15 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos Capítulo 1 comunidade Surda, com o intuito de elevar os Surdos franceses da época como cidadãos e com os mesmos direitos civis dos não-surdos. Na determinação e implementação, Sicard, sucessor do abade de l`Epée e antigo diretor do INJS – Institut National de Jeunes Sourds, junto com os professores ouvinte, criou e usou os “sinais metódicos” em cima da Antiga Língua de Sinais Francesa (língua naturalda comunidade Surda da França) como uma forma de institucionalizar o ensino pedagógico dos Surdos porque sua inventiva pretendia não apenas (pretensamente) gramaticalizar os sinais, mas, ao escolher os elementos mais “adequados” para essa gramaticalização, oferecer ao surdo um instrumento acurado para uma análise linear das idéias aglomeradas em sua mente (SOUZA, 2003). Lane (1999) apresenta um ponto de vista positivo quanto à introdução de sinais metódicos às crianças Surdas francesas oriundas de lugares pobres, tanto de Paris como de outras cidades francesas, pois o autor considera que isso permitiu um ponto favorável: a socialização, por meio da língua de sinais francesa, entre os mesmos (no caso de escolas que serviram de internatos) e, ao mesmo tempo, os introduziu a um novo mundo, com novos conhecimentos e aquisição de novos significados ao aprender a ler e escrever. Com tais instruções, passaram a adquirir a sua primeira educação efetiva para torná-los cidadãos franceses na conturbada revolução francesa da época e no período da proibição de mendicância nas ruas de Paris. Esta época era denominada de “Século de Ouro”. Essa abordagem ou proposta pedagógica criada por l`Epée foi marcada pela característica populista/nacionalista e ainda tem ressonância na contemporaneidade. Nesse sentido, McLaren (2000, p. 25) diz que “No atual momento das práticas educacionais dominantes, a linguagem está sendo mobilizada dentro de uma ideologia populista autoritária, que a vincula à identidade nacional, à cultura e à formação”. Da mesma forma, o Institut Nationale de Jeunes Sourds de Paris (INJS) formou e enviou professores para várias cidades vizinhas, inclusive criando diversas escolas de Surdos, das quais citaremos pessoas famosas como: Monsieurs Allibert, Berthier (eleito deputado da Assembleia Francesa, ativista, idealizador do banquete em homenagem ao abade De l`Epée e agraciado com medalha de honra por parte do Rei Napoleão Bonaparte), Borie, Carette, Chambellan, Chomat, Clerc (fundador do Institution de Hartford, atualmente Gallaudet University junto com Thomas Gallaudet nos Estados Unidos), Delfariel, Dubois, Dusuzeac (bacharel em ciência matemática), Lenoir, Massieu (fundador do Institution de Lille), Orsoni, Pélissier (criador do dicionário de Língua de Sinais Francesa do Institution Nationalle des Sourds-Muets de Paris), Riviére, Tessières, Théobald e Tronc; Mademoiselles Alleton e Meunier (ACERVO do INES, 2007). 16 Deficiência Auditiva e Libras Para você conhecer melhor a história e características da Associação de Surdos, visite e pesquise as Associações de Surdos da sua cidade e enumere os fatos que revelam a atuação das Associações sobre a comunidade Surda. Politicamente, o mais importante de todos os fatos aconteceu no governo Napoleão Bonaparte, que conferiu ao Professor Ferdinard Berthier, Surdo-Mudo, eleito na Assembléia Constituinte, o título de Cavaleiro da Legião da Honra (RANGEL, 2004). Pela primeira vez, os direitos civis tiveram força, graças ao empenho e à façanha política do Professor Berthier, que representou 22.000 “irmãos silenciosos”. E também, juntamente com a comunidade Surda Francesa, organizava anualmente o “banquete” em memória ao abade De l`Epée. Para mostrar a importância do uso da Antiga Língua de Sinais Francesa – ASLF – na prática de instrução educacional e da sua preservação da língua de sinais francesa no Instituto, como método viável na educação de Surdos, o Professor Berthier, como professor, foi convidado a se retirar do Instituto pelo Conselho de Administração, por insubordinação, e deflagrou uma “Guerra dos Surdos” contra a introdução do ensino da fala e rebaixamento dos professores Surdos franceses como professores repetidores (LE POUVOUIR DES SIGNES, 1990). Isso mostra a nitidez da relação do poder, como diz Foucault (2007), que começa com a introdução de novos métodos de controle para não modificar algo que é de interesse dos detentores do poder. A “Guerra dos Surdos” e o movimento de introdução e de preservação da língua de sinais francesa impulsionaram uma nova prática, que é a organização de uma sociedade, como a Sociedade Universal de Surdos (RANGEL, 2004), em 1838, para delimitar o território do poder linguístico de língua de sinais. Contou com o apoio de vários autores importantes, como: Diderot, o filósofo e enciclopedista (1713-1784), que elaborou um livro chamado de “Carta sobre os Surdos-Mudos para uso dos que ouvem e falam”, contra o abade Charles Batteux, sobre a uniformidade da construção gramática da língua francesa e dos gestos dos Surdos, que são ricos gramaticalmente. Igualmente aconteceu com outro autor, Pierre Deslogues, Surdo (1747-1799) que escreveu o seu livro “Observações de um Surdo-Mudo” (WILCOX, 2005) defendendo que os sujeitos Surdos possuíam, de fato, uma antiga língua de sinais francesa e que se comunicavam em vários assuntos (política, trabalho, religião, família etc.). Dizia também que essa língua de sinais, ou seja, A “Guerra dos Surdos” e o movimento de introdução e de preservação da língua de sinais francesa impulsionaram uma nova prática, que é a organização de uma sociedade, como a Sociedade Universal de Surdos, em 1838, para delimitar o território do poder linguístico de língua de sinais. 17 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos Capítulo 1 “sinais metódicos” (mesclada com a língua francesa) não era popularmente aceita nas instituições educacionais por “resistência ideológica dos dominantes” (HALL, 2006, FOUCAULT, 2007). O Professor Pierre Pélissier publicou em 1856 o seu primeiro dicionário da língua de sinais francesa, chamado de “Iconographie des Signes”, com 40 folhas e 362 verbetes, juntamente com os desenhos, separados por categoria gramatical com os explicativos de como se sinalizam, no intuito de preservar a língua denominada antiga língua de sinais francesa. Sinais Metódicos eram corrupções gramaticais feitas deliberadamente por L’Epée a partir do latim e do francês (BERTHIER, 1984 apud SOUZA, 2003). congreSSo de milão em 1880 Com a influência européia e das pesquisas descobertas de que os Surdos podiam falar por meio de método oralista, sucedidos na Alemanha e na Inglaterra, no século XVIII, os profissionais resolveram organizar o Congresso de Veneza, em 1872, para definir que a modalidade falada, ou seja, da filosofia oralista é superior à modalidade gesto-visual, que é a língua de sinais. Seus argumentos baseavam-se na ideia de que o meio humano para a comunicação do pensamento é do uso da língua oral. Em 1880, um grupo de profissionais não-surdos tomou a decisão, sem a participação dos professores e profissionais Surdos, de excluir a língua de sinais no ensino de Surdos. O Congresso começou no dia 6 de setembro e foi até o dia 11 de setembro de 1880. Lá votaram oito resoluções, sendo que uma foi aprovada por unanimidade: a que preconizava que o governo deveria tomar as medidas para que todos os Surdos recebessem educação. Na prática o que aconteceu foi que os profissionais tomaram as resoluções como argumentos para convencer os governos de que a filosofia oralista era o caminho viável na educação de Surdos, sem que “ouvissem” as opiniões dos dirigentes Surdos daquela época. O Congresso de Milão é considerado para a comunidade Surda como o século do “holocausto”, pois proibia os professores Surdos de dar instrução nas escolas de Surdos, o uso da língua de sinais dentro das escolas deSurdos e determinava o fechamento dos institutos em regime de internato. Houve o declínio dos professores O Congresso de Milão é considerado para a comunidade Surda como o século do “holocausto”, pois proibia os professores Surdos de dar instrução nas escolas de Surdos, o uso da língua de sinais dentro das escolas de Surdos e determinava o fechamento dos institutos em regime de internato. 18 Deficiência Auditiva e Libras Surdos até a quase extinção dos mesmos, restando poucos professores Surdos do mundo. Contudo, a língua de sinais, como política de resistência, continuou agindo às escondidas e com isso, propulsionou o crescimento e a fundação de diversas Associações de Surdos do mundo. Pesquise na Internet os significados das palavras: Congresso de Milão (ou Milan 1880). Faça uma reflexão sobre o impacto que as oitos resoluções causaram à comunidade Surda. Registre suas ideias. educação de SurdoS no BraSil Os professores dessas escolas das cidades vizinhas da França saíram também para o mundo, como Eduard Huet, Surdo, conde, professor e primeiro diretor do Imperial Instituto de Surdos-Mudos, que, junto com o Imperador Dom Pedro II, instituiu, à maneira da política linguística e educacional da França, a introdução de novos sinais na terra brasileira, de acordo com o ambiente linguístico de língua de sinais brasileira, para atender crianças e jovens Surdos espalhados no antigo império brasileiro. Com a constituição do Imperial Instituto de Surdos-Mudos, em 1855, atualmente Instituto Nacional de Educação de Surdos, no Rio de Janeiro, houve a primeira experiência brasileira quanto à educação de surdos. Lá ensinavam várias disciplinas mesclando a língua de sinais francesa com a língua de sinais brasileira da comunidade Surda do Brasil. Veja o site do Instituto Nacional de Educação de Surdos – www. ines.org.br Com o sucesso e apresentação dos alunos Surdos ao Imperador Dom Pedro II, e da boa formação destes, os Surdos tornaram-se repetidores (atualmente designados como monitores do professor), professores, escultores, pintores e de outras profissões. O Surdo-Mudo, ex-aluno e repetidor Flausino José de Gama, 19 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos Capítulo 1 com o apoio do Diretor Tobias Leite e do amigo gráfico, Sr. Eduard Rensburg, aprendeu, no ofício, a copiar os desenhos por meio de litografia, elaborando o primeiro dicionário de língua de sinais, chamado de “Iconographia dos Signaes”, na versão brasileira, traduzindo as palavras dos 362 verbetes da língua de sinais francesa para a língua portuguesa, com os mesmos desenhos, categorias gramaticais e explicativos, em 1875 (ACERVO do INES, 2007). Para assegurar a língua de sinais brasileira e a formação profissionalizante de Surdos, foi criada uma Associação Protetora dos Surdos (BACELLAR, 1926) no Instituto Central do Povo, um departamento para Surdos com fins escolares e extra-escolares. Um pequeno grupo no Instituto Central do Povo, em 1913, criou a Associação Brasileira de Surdos, promovendo a conscientização da sociedade pelo direito do ensino de língua de sinais aos Surdos. Publicaram seus primeiros jornais em 1914 e só duraram dois anos. Com a decretação da proibição do Congresso de Milão pelo mundo, os Surdos do Imperial Instituto de Surdos, que eram internos, voltaram para as suas cidades de origem e criaram Associações de Surdos com o objetivo de preservar a língua de sinais brasileira. A criação da primeira Associação Brasileira de Surdos ocorreu em 1913, e nos 96 anos seguintes foram criadas cerca de 180 Associações de Surdos, segundo os dados do site da FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos, tanto na capital como no interior do Brasil. Para matar a curiosidade sobre a FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos, clique no site: www.feneis. org.br Realize uma pesquisa na internet sobre a criação de Associações de Surdos depois do Congresso de Milão. Apesar do sucesso da educação dos Surdos no Brasil, esta passou por três fases distintas: Introdução do Oralismo; Introdução de Comunicação Total; Introdução de Bilinguismo. a) Introdução do Oralismo A criação da primeira Associação Brasileira de Surdos ocorreu em 1913, e nos 96 anos seguintes foram criadas cerca de 180 Associações de Surdos. 20 Deficiência Auditiva e Libras Por problema pessoal, o diretor E. Huet, do Imperial Instituto de Surdos- Mudos, deixou o Instituto e o cargo de diretor, que foi ocupado por vários diretores. O Diretor Tobias Leite estabeleceu, a pedido do Império brasileiro, a obrigatoriedade da aprendizagem da linguagem articulada e da leitura dos lábios, de acordo com a promulgação das resoluções do Congresso de Milão, em 1897. Com a tendência mundial, depois do Congresso de Milão, o Instituto Nacional de Surdos (INES), em 1911, utilizou o oralismo puro como metodologia educacional em suas salas de aula. Mas o uso de língua de sinais permaneceu, apesar da proibição que foi feita oficialmente em 1957. b) Introdução de Comunicação Total Após sucessivos fracassos educacionais e exclusões dos Surdos da sala de aula, surgiu uma proposta educacional, na década de 70, proveniente de estudos americanos a respeito do desenvolvimento de crianças Surdas, filhas de pais ouvintes e de Surdos. Esses estudos mostraram diferenças lingüísticas, igualmente importantes, e para melhor, no desenvolvimento de linguagem, capacidade de raciocinar, de aprender e de conviver com outras crianças e com adultos, de poder lidar melhor com as dificuldades, e da capacidade de oralizar, com o uso da língua de sinais. O objetivo da filosofia de Comunicação Total é oferecer às crianças Surdas as oportunidades de ter acesso à língua e de adquirir conhecimento por meio da aquisição da linguagem. A Comunicação Total foi trazida pelas professoras do Instituto Nacional de Educação de Surdos que visitaram a Gallaudet University nos Estados Unidos. c) Introdução de Bilinguismo Na década de 80, os linguistas brasileiros começaram a discutir a viabilidade da introdução do bilinguismo no Brasil e da sua contribuição para a educação do Surdo. Essas discussões partiram da descoberta da pesquisa de língua de sinais americana, como status lingüístico, por Stokoe (1960, apud BRITO, 1995), e de Lucinda Ferreira Brito (1995) sobre a Língua de Sinais Brasileira – Libras. Segundo Vilela (2007), o Instituto Nacional de Educação de Surdos, em 1986, introduziu o projeto de pesquisa chamada de PAE (Projeto de Alternativas Educacionais), um trabalho de implementação da Comunicação Total em grupos de alunos ali matriculados. Esse projeto não foi adiante. No entanto, a língua de sinais brasileira é vista como sistema linguístico de natureza viso-gestual, com gramática própria utilizada pela comunidade Surda do Brasil. A língua de sinais brasileira é vista como sistema linguístico de natureza viso- gestual, com gramática própria utilizada pela comunidade Surda do Brasil. 21 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos Capítulo 1 Atividades de Estudos: Responda em algumas linhas estas questões: 1) Você conhece algumas escolas de Surdos? ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________ 2) Quais são as metodologias de ensino utilizadas dentro das escolas de Surdos visitadas ou conhecidas por você? ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ 3) Escreva o que entende das características da comunidade Surda. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ Com a promulgação da Lei 10.436, de 2002, o sistema educacional federal, estadual, municipal e do Distrito Federal passou a garantir, como parte integrante dos parâmetros Curriculares Nacionais, nos cursos de formação de educação especial, de Fonoaudiologia e de magistério, em seus níveis médio e superior, a inclusão o ensino das LIBRAS. O Surdo passou a ter, assim, garantia dos seus direitos à educação, assegurando uma formação que lhe dê condições de autonomia, em várias áreas do contexto brasileiro: no mercado de trabalho, previdência social, lazer, esportes, 22 Deficiência Auditiva e Libras educação, entre outros. A educação promoveu a inclusão social em todos os seus aspectos. E igualmente oportunizou a criação de Pós-graduação de Educação e Linguística da UFSC, formando doutores e mestres Surdos; a abertura de Curso de Letras – LIBRAS, modalidade a distância, por meio de decreto 5.626, de 2005, está proporcionando a formação adequada de professores de língua de sinais brasileira e de professores bilingues. Para conhecer os sites que envolvem a área da Surdez: Letras-Libras – www.libras.ufsc.br PROLIBRAS – www.prolibras.ufsc.br algumaS conSideraçõeS A trajetória histórica da educação dos sujeitos Surdos sempre andou junto com a evolução da língua de sinais e suas metodologias. Os sujeitos Surdos eram “descartados” pela sociedade pela sua inutilidade física. A desmitificação da inutilidade física começou com a viabilidade do uso de restos de audição. A metodologia para ensinar aos sujeitos Surdos, geralmente, filhos de reis e de condes, começou a impulsionar pesquisas dentro da igreja, dentre elas, o alfabeto manual, para que eles pudessem receber a educação refinada e de dotes. A partir de então, criou-se uma escola de Surdos, em Paris, uma das primeiras escolas do mundo a dar exemplos para outras cidades vizinhas da França. Antes da criação da escola, havia um professor Surdo-Mudo que ensinava as crianças Surdas a ler, escrever e sinalizar. Mais tarde, o abade de l`Epée criou uma escola chamada de Institution Nationale des Sourds-Muets, em Paris, em 1760, atual Institut Nationale de Jeunes Sourds de Paris (INJS), com o objetivo de dar independência e reconhecimento aos Surdos como cidadãos às outras pessoas não surdas. Mas, a metodologia “sinais metódicos”, criada pelo abade l`Epée, não era reconhecida pela comunidade Surda. A comunidade Surda lutava para adquirir o status linguístico com o mesmo padrão das línguas orais. Na mesma época, começou a introdução da metodologia oralista, com as resoluções do Congresso de Milão, em 1880. Houve movimentos de resistência que impulsionaram uma nova prática, que é a organização de uma Associação de Surdos. Publicaram vários dicionários de língua de sinais, promoveram a fundação de várias escolas de Surdos do mundo e no Brasil. O movimento educacional passou por três fases distintas: oralismo, comunicação total e bilinguismo. A inclusão da língua de sinais brasileira 23 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos Capítulo 1 nas escolas inclusivas e bilingues ficou mais forte com a Lei 10.436, de 2002, que reconheceu a língua de sinais brasileira da comunidade Surda e impulsionou os novos cursos de Letras-Libras, modalidade a distância e, em consequência, a formação de professores bilingues. referênciaS ACERVO DO INES. Iconographia dos Signaes por Flausino da Gama. Rio de Janeiro: Biblioteca do INES. 1875. Obras raras. BACELLAR, Arnaldo de Oliveira. A Surdo Mudez no Brasil. Tese. São Paulo: Matinelli, Maia & C. 1926. BRITO, Lucinda Ferreira. Por uma gramática de Línguas de Sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro: UFRJ, Departamento de Lingüística e Filosofia, 1995. CAMPELLO, A. R. S. Aspectos da visualidade na educação de Surdos. Tese de Doutorado. Florianópolis: UFSC. 2008. DIDEROT, Denis. Carta sobre os Surdos-Mudos: para uso dos que ouvem e falam. São Paulo: Nova Alexandria. 1993. FOUCAULT, M. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. 33 ed. Petrópolis: Editora Vozes. 2007. HALL, Stuart. Da Diáspora: identidades e mediações culturais. Minas Gerais: Editora UFMG, 2006. LANE, Harlan. The mask of benevolence: disabling the deaf community. San Diego: DawnSignPress. 1999. Paperback. McLAREN, Peter. Multiculturalismo Revolucionário. Pedagogia do dissenso para o novo milênio. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. PADDEN, Carol & HUMPHRIES, Tom. Deaf in America: voices from a culture. Massachusetts: Harvard University Press. 1988. PLANN, Susan. A Silent Minority: Deaf Education in Spain, 1550-1835. Berkeley: University of California Press, c1997 1997. disponível em: <http://ark.cdlib.org/ ark:/13030/ft338nb1x6/>. Acesso em: 15 mai. 2009. 24 Deficiência Auditiva e Libras LE POUVOIR DES SIGNES: Sourds et Citoyens. Paris: Institut National de Jeunes Sourds de Paris. 1990. RANGEL, Gisele Maciel Monteiro. História do povo surdo em Porto Alegre: imagens e sinais de uma trajetória cultura. Dissertação de Mestrado. Porto Alegre: UFRGS, 2004. SÁNCHEZ, Carlos M. La increible y triste historia de la sordera. Caracas: Ceprosord. 1990. TRUFFAUT, Bernard. Etienne de Fay and the History of the Deaf. In: Fischer, R & LANE, H. (eds.) Looking Back. Hamburg: Signum-Verl. 1993. VILELA, Genivalda Barbosa. Histórico da Educação do Surdo no Brasil. Acessado em 14 de maio de 2009. http://www.fonoaudiologos.net/2007022853/ autor-profissional/genivalda-barbosa-vilela/histico-da-educao-do-surdo-no-brasil. html WILCOX, Sherman & WILCOX, Phyllis Perrin. Aprender a Ver. Petrópolis: Ed. Arara Azul. 2005. . CAPÍTULO 2 modeloS e técnicaS educacionaiS na educação de SurdoS A partir da perspectiva do saber fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Obter conhecimento acerca das metodologias e técnicas implantadas na modernidade na educação de Surdos. 3 Repensar uma educação bilíngue na educação inclusiva para Surdos. 27 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 contextualização A educação e sua pedagogia não compreenderam ou desconheceram os métodos próprios para o ensino de sujeitos Surdos. Isso se deve ao fato de o espaço educacional estar permeado de ações de controle e poder e de visão fonocêntrica de supervalorização da língua oral e da cultura não-surda Como salienta Skliar (1998), a problemática da vida escolar e acadêmica foi baseada nos modelos ouvintes, ou “ouvintismo”, que culminam na “negação” e no “assujeitamento”, nas palavras de Foucault (1987, 2007), e do pós-colonialismo, termo usado por Bhabha (2005). A progressão histórica a partir do atopunitivo do Congresso de Milão, que culminou no fechamento dos internatos e dos institutos e na criação de programas de política educacional nas escolas de Surdos, modificou todo o panorama da educação e da pedagogia que concerne à área da surdez, ou seja, anulou a experiência visual. Historicamente, no movimento da filosofia oralista, foram implantadas várias metodologias sob a perspectiva clínica terapêutica. A educação, o currículo e a metodologia educacional para Surdos, por meio de experiência visual, foram postos de lado para se envolver nos treinamentos da oralização. O que era coletivo passou a ser individual. Os recursos da oralização até a Comunicação Total foram totalmente aceitos nas salas de aulas. Atualmente, a educação bilíngue está sendo implantada aos poucos e utilizada em poucos estados do Brasil. Vamos expor, cronologicamente, como essas práticas foram implantadas. modelo oraliSta e SuaS técnicaS A criação do primeiro Imperial Instituto de Surdos-Mudos, atual Instituto Nacional de Educação de Surdos, por decreto imperial, no Rio de Janeiro, foi reproduzida dos modelos europeus, como: asilo e sistema de internato com currículo adequado e adaptado de acordo com as suas características. Ao longo de muitos anos, muitas instituições particulares foram criadas em caráter de assistencialismo, pois o governo não atendia a demanda do número existente de pessoas portadoras de deficiência. A educação especial era voltada à prática de assistencialismo e sem currículo definido. Em 1957, o governo federal assumiu a educação especial, transformando-a em um órgão especial e, a partir de então, implantou uma Lei de Diretrizes e Bases 28 Deficiência Auditiva e Libras da Educação Nacional, em 1961, objetivando a educação dos “excepcionais” no sistema geral de ensino, tanto na esfera federal como em associações não governamentais. Em um dos artigos da lei, incluía a “integração” das pessoas portadoras de deficiência na comunidade, assegurando-lhes o direito de receber educação. Na década de 70, os estados do Brasil passaram a incluir os tratamentos especiais nas escolas. Para ter melhor controle governamental a respeito da educação especial, foi criado o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), vinculado ao Ministério de Educação e Cultura, em 1973. Com a promulgação da Constituição de 1988, foram inseridos vários capítulos, artigos, incisos sobre educação, habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência, graças aos movimentos políticos e sociais. (BRASIL.MEC, 2008). No ano de 1861, com a saída do primeiro diretor surdo, Eduard Huet, do Imperial Instituto de Surdos, esse Instituto passou por várias fases, com os regimentos alterados, revogando vários decretos, até a década de 50. A gestão do governo Getúlio Vargas impulsionou o Instituto Nacional de Surdos-Mudos a implantar o primeiro Curso Normal, em 1951, para a formação de professores para Surdos, com três anos de duração, por meio de orientação pedagógico- emendativa. Em 1957, o Instituto Nacional de Surdos-Mudos passou a denominar- se de Instituto Nacional de Educação de Surdos, pela Lei 3.198, de 6 de julho de 1957, segundo o relatório anexado à carta da Professora e ex-Diretora do INES, Ana Rimoli Dória: de que o surdo é mudo, via de regra, porque não tendo ouvido nunca a voz humana, não pode imitá-la falando; e por outro lado a certeza de que o surdo é passível de receber a mesma educação, embora por processos diferentes, dos que falem e ouçam (DÓRIA, 1956). Para ampliar a ação da educação e fornecimento de professores especializados para as classes, foram firmados convênios com os estados de Minas Gerais, Santa Catarina, Espírito Santo e São Paulo. Em cada ano se formavam vários professores e estes eram distribuídos para cada estado mediante convênio. Ao mesmo tempo, foi criado o primeiro livro técnico, chamado de “Introdução à Didática da Fala”, e entrou em funcionamento o Centro de Logopedia destinado à assistência das crianças surdas que possuíam problemas fonatórios. Problemas fonatórios – são as várias alterações fonatórias (som e letras) encontradas em pessoas Surdas: dificuldades para O surdo é mudo, via de regra, porque não tendo ouvido nunca a voz humana, não pode imitá-la falando; e por outro lado a certeza de que o surdo é passível de receber a mesma educação, embora por processos diferentes, dos que falem e ouçam. 29 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 controle da função respiratória, dificuldades para controle global do pitch e loudness e padrões prosódicos alterados. Seguindo a metodologia e a filosofia oralista, foi criado o Serviço de Estimulação Precoce para atendimento de bebês, em 1970; Cursos de Estudos Adicionais aos professores de diversos estados do Brasil para trabalhar na área da surdez, em 1980. Em 1993, pelo ato ministerial, o INES passou a ser um centro nacional de referência na área da surdez. Atualmente temos Curso de Especialização. Entre os anos de 1880 até 1990, o turno da escola especial era integral e de internato (para quem morava em lugares de grande distância). O sujeito Surdo estudava em um turno e no outro turno ficava para receber reforço escolar, atendimento em fonoaudiologia e outras atividades extracurriculares, como curso de bordado, de marcenaria, de cozinha, de pintura e outros ofícios, como aprendiz. Os exemplos explicitados pela autora Costa (1994) da prática educacional e da metodologia mais conhecida ainda são utilizados nas classes especiais, nas classes mistas ou nas classes de integração, em algumas escolas atuais. Os dados reconhecidos são as sinopses das diversas orientações e técnicas, conforme a proposta curricular para deficientes auditivos do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP). Essas são divididas em duas categorias (COSTA, 1994): método unissensoriais e método multissensorial. a) Método unissensoriais São os aspectos básicos do oralismo, como leitura dos lábios, fonoarticulação e treinamento auditivo, que utilizam apenas um canal ou uma informação sensorial. São eles: • Leitura Labial – é uma leitura que consiste em adquirir as habilidades para captar as palavras oralmente, por meio de decodificação dos movimentos labiais e das articulações do emissor. • Fonoarticulação – também pode ser chamada de mecânica da fala. Os Surdos são chamados, e apelidados também pela comunidade Surda, como “fala de papagaio”. Envolve a leitura labial, movimento, articulação da fala e, por sua vez, envolve o som e o ritmo. Treina-se bastante para articular todos os fonemas, com exercícios de respiração, inspiração, expiração, relaxação e movimentação de língua, mandíbula, palato, lábios e bochechas. Métodos unissensoriais são os aspectos básicos do oralismo, como leitura dos lábios, fonoarticulação, treinamento auditivo, método Tadoma e Pollack. 30 Deficiência Auditiva e Libras • Treinamento auditivo – Consiste em treinar a estimulação sonora com a exposição de ruídos e sons ambientais. Implica a exploração máxima dos resíduos auditivos para identificar, discriminar, associar, reproduzir e localizar os sons de duração, frequência, intensidade e ritmo diferentes e sons da fala. • Método Tadoma – consiste em usar as informações táteis (percepção de vibrações) para surdocegoe também, em alguns casos, para sujeitos surdos. • Método Pollack – objetiva aumentar o número de possibilidades na utilização do canal auditivo para que possa armazenar os estímulos sonoros com as informações adequadas. Preocupa-se em desenvolver a atenção perceptual sobre os estímulos visuais. b) Método multissensorial Utiliza-se para usar informações sensoriais com os dois órgãos dos sentidos (visuais/auditivas, visuais/táteis, auditivas/táteis) na educação dos Surdos. Utilizam-se várias alternativas, como pistas visual e tátil (via auditiva óssea), que são: • Método Sander – procede ao treinamento auditivo associando-o com as informações visuais. • Método Guberina – procede ao treinamento dos movimentos ginástico-rítmicos no ensino da articulação de fonemas, com o auxílio de fones de ouvido, amplificadores com filtros e vibradores (para exploração das vias auditivas aérea e óssea). • Método Verbatonal – favorece a entonação e a pausa na emissão das frases. • Método Perdoncini – dá ênfase à reeducação educativa. Trabalha-se com um analisador cinético composto de microfone unido a um analisador acústico. Quando o som é emitido de modo reduzido, acende-se uma lâmpada verde. Ao contrário, acende-se uma luz roxa. Tem a finalidade de os Surdos aprenderem a discriminar a acentuação das palavras. A metodologia oralista ainda é praticada, tendo em vista que algumas escolas particulares e públicas, em caráter assistencial, praticam a metodologia clínica terapêutica dentro dos turnos escolares e em grades extracurriculares. Isso envolve os profissionais da terapia da fala, como fonoaudiologia, no quadro profissional. Para sustentar essa metodologia, os profissionais recebem subsídio do SUS – Sistema Único de Saúde. O método multissensorial baseia-se em informações sensoriais com os dois órgãos dos sentidos (visuais/ auditivas, visuais/ táteis, auditivas/ táteis) na educação dos Surdos. 31 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 A técnica de leitura labial: ”ler” os lábios por meio de captação dos movimentos dos lábios dos locutores quando está falando com palavras simples, pequenas ou frases curtas, de modo mais simples, claramente e devagar. A pesquisa comprovou que a maioria de Surdos só consegue captar e ler 20% da mensagem através da leitura labial (MARTINS, 2004). A captação em sentido contínuo e sem interrupção impossibilita a captação e leitura de todas as informações. Geralmente os surdos “deduzem” ou “adivinham” as mensagens de leitura labial através do contexto já condicionado e conhecido. É importante salientar que, com a nomenclatura na área da Surdez elaborada por Sassaki (2009), além dessas particularidades dos sujeitos Surdos “também existem pessoas surdas ou com deficiência auditiva que são indiferentes quanto a serem consideradas surdas ou deficientes auditivas” e “a origem dessa diversidade de preferências está no grau da audição afetada”. Se você quiser conhecer mais sobre as nomenclaturas pelo Sassaki, acesse o site: http://sentidos.uol.com.br/canais/materia. asp?codpag=8322&canal=opiniao Excepcional: A palavra era utilizada para todas as pessoas portadoras de deficiência. Integração: Significa o estabelecimento de formas comuns de vida, de aprendizagem e de trabalho entre pessoas deficientes e não- deficientes. Integração significa ser participante, ser considerado, fazer parte de, ser levado a sério e ser encorajado. Orientação: Costa (1994) esclarece que a utilização da palavra Método deve ser entendida como orientação. FINEP: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. 32 Deficiência Auditiva e Libras modelo de comunicação total e SuaS técnicaS Comunicação Total é o título dado à filosofia da comunicação pelo norte- americano Roy Holcomb (1967, apud HAWKINS; BRAWNER, 1997) em substituição à palavra método (SCOUTEN, 1984, apud HAWKINS; BRAWNER, 1997). Nos anos de 1970 e em seus dez anos de observação e de prática, as escolas surdas norte-americanas e suas organizações viam a possibilidade de praticar a filosofia de comunicação dentro de programas educacionais como “uma comunicação simultânea que é a fórmula mais adequada para a comunicação utilizando como um dos ajustes educacionais para crianças Surdas” (KAPLAN, 1996, apud HAWKINS; BRAWNER, 1997). A Comunicação Total, na sua concepção, foi criada para atender todas as necessidades de comunicação dos sujeitos Surdos. Foi uma “transição” da educação oralista para a educação bilíngue. A Comunicação Total consiste na aplicação de todos os recursos e aspectos comunicativos, como no caso de falar e sinalizar ao mesmo tempo. De acordo com Denton (apud FREEMAN; CARBIN; BOESE, 1999, p. 171), a definição sobre a Comunicação Total: A Comunicação Total inclui todo o espectro dos modos linguísticos: gestos criados pelas crianças, língua de sinais, fala, leitura orofacial, alfabeto manual, leitura e escrita. A Comunicação Total incorpora o desenvolvimento de quaisquer restos de audição para a melhoria das habilidades de fala ou de leitura orofacial, através de uso constante, por um longo período de tempo, de aparelhos auditivos individuais e/ou sistemas de alta fidelidade para amplificação em grupo. Essa filosofia virou moda aqui no Brasil na década de 80 (CICCONE, 1999), quando foi trazida por alguns profissionais que foram visitar a Gallaudet University (Estados Unidos) e ficaram impressionados com a nova filosofia, passando a impulsionar a sua prática em todos os estados do Brasil. Há profissionais que favorecem, por comodismo, o uso de “português sinalizado”, que é uma mistura de duas línguas: a língua portuguesa e a língua de sinais. Essa prática é denominada de “bimodalismo” e objetiva o desencorajamento do uso inadequado da língua de sinais brasileira, por causa da gramática distinta da língua portuguesa. A Comunicação Total inclui todo o espectro dos modos linguísticos: gestos criados pelas crianças, língua de sinais, fala, leitura orofacial, alfabeto manual, leitura e escrita. 33 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 BilinguiSmo Com a introdução de Estudos Culturais, de Estudos Surdos e de Estudos Linguísticos e dos eventos realizados nos estados do Brasil, apresentou-se uma nova proposta educacional mais ou menos viável, pois a questão linguística ainda permeia a discussão: pouca pesquisa sobre a língua de sinais e poucos profissionais que envolvem a questão linguística. A educação bilíngue consiste em dar habilidade aos sujeitos de se comunicar em duas línguas, sendo que uma língua pode predominar sobre a outra. Atualmente, não temos uma verdadeira proposta bilíngue. Algumas escolas utilizam a proposta bilíngue mesclando-a com outros métodos, como a comunicação total e a utilização de Intérprete de Língua de Sinais Brasileira nas salas de aula. Mas ainda há fatores importantes que atrapalham o desenvolvimento cognitivo das crianças Surdas, pelos dois motivos: a língua de sinais é distinta da língua portuguesa e deve ser ensinada separadamente e nunca as duas juntas; e segundo, os Intérpretes de Língua de Sinais Brasileira são como uma “caixa preta” que só repassam as informações do emissor e do receptor de forma mecânica e não há afeto e contato linguístico entre aluno e intérprete de língua de sinais. Há provas científicas, porém poucas, de que a educação bilíngue proporciona mais habilidades parapercepções mentais, cognitivas e visuais e capacidade para analisar os conceitos de modo subjetivo e objetivo às informações recebidas. Com a introdução de novos espaços para pesquisadores Surdos, a proposta bilíngue vai caminhando aos poucos até chegar a uma resposta adequada para a educação e, em consequência, para o novo parâmetro da pedagogia dos Surdos. educação Bilíngue Para SurdoS Em diversos estudos, Skliar (1997), Moura, Lodi e Pereira (1993) e Quadros (1997), e muito outros, argumentavam que a educação bilíngue é necessária para que “a criança possa ter um desenvolvimento cognitivo-linguístico paralelo ao verificado na criança ouvinte” (MOURA, LODI, PEREIRA, 1993, p.1). Para que a criança possa ter um desenvolvimento cognitivo-linguístico, é necessário esquecer a estimagtização que gira em torno da criança Surda ou do indivíduo Surdo em referência à surdez que carrega. “Não é o grau de surdez que importa, mas sim - em termos cruciais - a idade ou estágio em que ocorre.” (SACKS, 2002, p. 21). A educação bilíngue consiste em dar habilidade aos sujeitos de se comunicar em duas línguas, sendo que uma língua pode predominar sobre a outra. 34 Deficiência Auditiva e Libras Para que a criança surda possa alcançar o rendimento linguístico e a competência comunicativa, faz-se necessária a implantação de uma proposta bilíngue, pois sendo filho de pais ouvintes (90% de Surdos convivem com a família não-surda), tem que viver, pelo resto da vida, a sua condição bilíngue. A proposta do bilinguismo surgiu nos fins da década de 70, quando os sociólogos, filósofos e políticos, através dos movimentos sociais dos Surdos, criaram a proposta bilíngue de educação de Surdos, em vários estados do Brasil e também internacionalmente. Isso mostra claramente que o sujeito Surdo vive duas condições: duas línguas (bilíngues, por o Brasil dominar a língua portuguesa, majoritária e oral) e duas culturas (bicultural, pelas duas culturas distintas: cultura não-surda e cultura Surda). Na abordagem educacional do bilinguismo, reconhece-se que as crianças Surdas são os sujeitos interlocutores naturais de uma língua e que podem se adaptar a outra língua sem prejudicar o desenvolvimento cognitivo-linguístico. Por isso, há um movimento social da comunidade Surda, que, ao lançar a manifestação, publicou um documento intitulado: “A educação que Nós os Surdos queremos”, em Porto Alegre, em 1999, reivindicando a língua de sinais brasileira como uma língua oficial (mais tarde oficializada, em 2002) é que esta língua seja ensinada desde os primeiros dias de vida da criança como primeira língua. A comunidade Surda reconhece que a língua oficial do Brasil é o português, no entanto, pede que para os Surdos seja reconhecido como ensino e aprendizagem de segunda língua. Igualmente defende que a língua de sinais brasileira deve ser adquirida, preferencialmente, pelos Surdos adultos e pelo convívio com outros Surdos da mesma comunidade. Para assegurar a efetiva comunicação das crianças Surdas, os pais devem aprender a primeira língua dos Surdos para que possam ser entrosados de maneira mais íntima e sem depender de outros fatores externos. A língua oral ou da escrita aprendida dentro de casa seria considerada como a segunda língua das crianças Surdas. A EDUCAÇÃO QUE NÓS SURDOS QUEREMOS DOCUMENTO ELABORADO PELA COMUNIDADE SURDA A PARTIR DO PRÉ-CONGRESSO AO V CONGRESSO LATINO- AMERICANO DE EDUCAÇÃO BILÍNGUE PARA SURDOS, REALIZADO EM PORTO ALEGRE/RS, NO SALÃO DE ATOS DA REITORIA DA UFRGS, NOS DIAS 20 A 24 DE ABRIL DE 1999 [...] A educação que Nós os Surdos queremos é que esta língua seja ensinada desde os primeiros dias de vida da criança como primeira língua. 35 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 AS CLASSES ESPECIAIS PARA SURDOS Se não houver escolas de surdos no local e for necessário programa de surdos a distância com classes especiais para surdos ou em municípios polo, a comunidade surda recomenda que: 35. Nas classes especiais, que os surdos não sejam tratados como deficientes, mas como pessoas com cultura, língua e comunidade diferente. 36. Seja incentivado, mostrado e estimulado o uso das línguas de sinais pelo surdo, indo ao encontro de seu direito de ser e de usar a comunicação visual para estruturar uma língua de sinais coerente. 37. A aquisição da identidade surda seja considerada de máxima importância, tendo em vista que a presença de professor surdo e o contato com a comunidade surda possibilitam ao surdo adquirir sua identidade. 38. Sejam introduzidas palestras sobre cultura surda nas escolas com classe especial para surdos. 39. Garanta-se atendimento adequado nas escolas onde há classe especial de surdos no sentido de acabar com sentimentos de menos- valia e que os surdos recebam ensino adequado. 40. Implantem-se sistemas de alarme luminoso, cabinas de telefone tdd ou fax em escolas com classe especial de surdos. 41. Promova-se a criação de um banco de dados sobre a situação dos direitos dos surdos, bem como sobre sua cultura e história, visando à promoção da identidade surda na escola com classe especial. 42. Apoie-se a definição de ações de valorização da comunidade e cultura surda na escola com classe especial. 43. Trabalhe-se com os surdos e suas famílias no sentido de que a família adquira a língua de sinais. 44. Seja implantado um Programa de Pais, garantindo o acesso à informação e assessoramento adequados. [...] 36 Deficiência Auditiva e Libras Fonte: Texto extraído e adaptado de: <http://groups. google.com/group/acessodigital/browse_thread/ thread/5d5d3d2e8936949a?pli=>. Acesso em: 03 mai. 2009. Caro(a) pós-graduando(a), Você pode acessar o documento completo “a educação que nós surdos queremos” no site: • http://groups.google.com/group/acessodigital/browse_thread/thread /5d5d3d2 e8936949a?pli= Em concordância com Kyle (1999, p. 16), que afirma: É relativamente óbvio que as crianças surdas deveriam ser bilíngues. Elas possuem uma língua natural visual e espacial que irão adquirir se forem agrupadas nas escolas. Elas vivem numa sociedade que é dominada pela língua falada e escrita. Para alcançar o potencial que é aparente em seu funcionamento cognitivo, precisam acessar a língua da maioria. A maioria dos grupos minoritários chegaram à mesma conclusão. Inicialmente, a educação bilíngue, em termos de práticas metodológicas, deve ser aplicada com a língua de sinais como língua dominante e, ao mesmo tempo, assimilando, aos poucos, o acesso à língua portuguesa, na modalidade escrita ou de escrita de língua de sinais, dependendo da maturação e do desenvolvimento cognitivo-linguístico de cada criança, em qualquer situação. O conceito do bilinguismo trabalha na introdução da aceitação da surdez como identidade natural e convencionada pela comunidade Surda e, assim sendo, poderá almejar, assim como as pessoas não-surdas, os diversos campos de atuação. O bilinguismo defende que os Surdos formem uma comunidade, com cultura e língua própria; e procura fazer entender que os Surdos têm as suas particularidades, a sua língua e a sua forma particular de se sentir e de pensar, não ligando aos aspectos negativos da patologia da surdez. Também reforça a introdução do bicultural para que os Surdos possam obter conhecimentos acerca da sua língua com o objetivo de desenvolver a identidade cultural e ajudar a afirmar os seus valores culturais.Isso reforçará o melhor entrosamento no seio multicultural que hoje se expande no mundo. 37 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 Atividades de Estudos: 1) Na sua cidade existem escolas bilíngues? ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ 2) Os professores ou escolas denominados de “bilíngues” usam a prática linguística distinta ou simultânea (uso da língua de sinais brasileira ou uso de português sinalizado)? ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ A experiência da escola bilíngue partiu, através da pesquisa, da Suécia, Noruega e Dinamarca (JOKINEN, 1999), que foram os países que implantaram a abordagem bilíngue na educação dos Surdos. E, mais tarde, essa abordagem foi implantada em outros países, como Estados Unidos, França e alguns estados do Brasil. 38 Deficiência Auditiva e Libras A questão primordial e crucial da educação bilíngue é a aquisição da língua natural e espontânea aplicada nas escolas. Sabemos que, para estudar, aprender a ler e reconhecer a língua portuguesa como segunda língua, é imprescindível que a escola prepare uma metodologia e material pedagógico adequado para o aprendizado da língua portuguesa como segunda língua dos Surdos. O uso das duas línguas (bilíngues/bicultural) proporcionará, na educação dos Surdos, o desenvolvimento das competências linguísticas, de uma forma prazerosa, objetiva e adequada às duas línguas e às duas comunidades em que os sujeitos Surdos estão inseridos. Jokinen (1999, p.116) afirma que: No seu aprendizado/ensino da primeira língua é importante que os estudantes aprendam a usar sua língua para expressar seus pensamentos e sentimentos em milhares de formas diferentes, em diferentes contextos. Eles talvez brinquem com os aspectos formais da língua e podem focalizar esses aspectos em contextos particulares significativos. A língua escrita é uma das modalidades que pode ser aprendida mais tarde, assim como ocorre com as crianças não-surdas. Pelo fato de os Surdos serem ágrafos e do acesso tardio à leitura e escrita de uma língua, a escrita é um dos pontos mais cruciais do desenvolvimento cognitivo-linguístico das crianças Surdas. Se as crianças Surdas forem expostas, em tenra idade, à língua escrita e visual, e com o conhecimento da estrutura gramatical e dos sinalários da língua de sinais (Escrita de Sinais), elas extrairão os significados do material escrito. A língua escrita, uma das modalidades da língua portuguesa, torna os sujeitos Surdos mais autônomos na coleta, leitura, procura e uso das informações gerais até as específicas, e essas informações permitem uma melhor integração na sua vida social, escolar, de trabalho e até acadêmica. Acesse o site sobre Escrita de Língua de Sinais (SignWriting), que contém coisas interessantes para conhecer!: http://www.signwriting.org/library/history/hist010.html Sem o uso adequado do sistema bilinguismo na vida social e escolar dos sujeitos Surdos, certamente advirão futuras consequências, tais como: - ausência de oportunidade de usar a variedade de linguagem; 39 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 - ausência do planejamento para a solução de problemas; - dependência da situação auditiva; - presença de agressividade, desvio comportamental e o sujeito Surdo será rotulado como anti-social. Estudos Culturais: são estudos sobre a diversidade dentro de cada cultura e sobre as diferentes culturas, sua multiplicidade e complexidade. São, também, estudos orientados pela hipótese de que entre as diferentes culturas existem relações de poder e dominação que devem ser questionadas. Estudos Surdos: sob o ponto de vista cultural, entendem a cultura surda como algo presente, compondo: língua, história cultural, pedagogia dos surdos, artes, literatura, etc. Compartilham a teoria cultural que enfatiza a cultura surda e seus discursos são contra a ideia do surdo como sujeito deficiente, estereotipado e como cultura subalterna. Estudos Linguísticos: é um grupo de estudo da aquisição de linguagem e de língua de sinais. Promove encontros, reuniões e seminários anuais, com a intenção de compartilhar informação científica e promover o progresso da pesquisa linguística de língua de sinais brasileira. Sinalários: é o conjunto de expressões que compõem o léxico da língua de sinais. É uma ferramenta para a escrita de língua de sinais (ELS). ProPoStaS educacionaiS na educação incluSiva A proposta bilíngue na educação inclusiva está sendo utilizada em poucas cidades do Brasil (LACERDA, 2000) por vários motivos: dificuldade de organizar grupos de Surdos e de não-surdos com domínio de língua de sinais brasileira; resistência de pessoas não-surdas em aceitar a língua de sinais como a primeira 40 Deficiência Auditiva e Libras língua dos surdos e, por último, a incompreensão da necessidade do uso de língua de sinais brasileira no trabalho com as pessoas Surdas. Apesar das dificuldades, a autora mostra que as experiências bilingues no atendimento educacional e inclusivo têm dado resultado satisfatório. Para concretizar a proposta bilíngue nas escolas inclusivas, deve-se possibilitar: a) a introdução da língua de sinais brasileira como primeira língua e o português (ou a língua majoritária) como a segunda língua; b) a introdução, o mais cedo possível, da língua de sinais brasileira, na educação nas séries infantis e séries iniciais do ensino fundamental (SOUZA, 1998); c) a exposição de LIBRAS garante aos Surdos o direito a uma língua de fato, e, em consequência, um funcionamento simbólico-cognitivo satisfatório e prazeroso; d) o asseguramento do acesso dos Surdos às duas línguas, no contexto escolar, ou seja, respeitar a autonomia da Língua de Sinais e da língua majoritária do país, no nosso caso, o Português (QUADROS, 1997); e) a proposta bicultural, já que a comunidade Surda, como a ouvinte, tem a sua cultura. É importante que a escola ofereça, à criança Surda, oportunidade de adquirir a sua primeira língua, da mesma maneira como essa oportunidade é oferecida à criança ouvinte. A cultura Surda deve ser inserida nos currículos escolares. A culturado surdo é designada por Moura (2000) como representação linguística principalmente pela sua língua que tem propiciado a união dos surdos e continua viva nas comunidades. A história dos surdos mostra a necessidade de permanecerem unidos, de construírem uma identidade própria, “um lugar de direitos coletivos para a determinação própria” (p. 66) de seu grupo. A cultura dos surdos, assim entendida, revela-se no comportamento, valores, atitudes, estilos cognitivos e práticas sociais. A nova modalidade e sua perspectiva Surda pressupõem o respeito e o reconhecimento de sua singularidade e especificidade humana, refletidos no direito de apropriação da Língua de Sinais da qual dependem os processos de identificação pessoal, social e cultural (SKLIAR, 1997). Considerando a característica de língua viva da LIBRAS, o instrutor surdo é o profissional mais habilitado a atualizar profissionais da escola em LIBRAS 41 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 e prepará-los para receber alunos surdos em suas salas de aula/escola, porque recebeu capacitação adequada para ensinar LIBRAS e pertence à comunidade que a utiliza (SOUZA; GÓES, 1999). Hoje, com o movimento de inclusão, é cada vez maior a necessidade de se criar um espaço, junto às escolas, para os seus profissionais se atualizarem em LIBRAS ou conhecerem a língua capaz de aproximá-los e de auxiliá-los a compreender os alunos surdos incluídos e instrumentalizá-los para ensinar. Além disso, considerando a nova política educacional, esse trabalho deve vir integrado com um atendimento de apoio à família, visando a garantir o desenvolvimento educacional adequado aos alunos surdos. Atividades de Estudos: Pesquise nas escolas: 1) As propostas bilíngues nas escolas inclusivas estão sendo adequadas para o atendimento escolar das crianças Surdas? ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ 2) Anote os pontos positivos e negativos da inclusão das crianças Surdas nas escolas inclusivas e discuta com seus colegas. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ 42 Deficiência Auditiva e Libras algumaS conSideraçõeS A educação dos surdos e suas diversas metodologias foram permeadas por ações de controle, poder e de visão fonocêntrica, de supervalorização da língua oral e da cultura não-surda. Houve várias transições: Oralismo, Comunicação Total até culminar na Educação Bilíngue como método viável na Educação de Surdos, graças ao empenho e criação de vários estudos, tais como: Culturais, Surdos e Linguísticos. referênciaS BHABHA, Homi K. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 2005. BRASIL. MEC. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Documento elaborado pelo Grupo de Trabalho nomeado pela Portaria nº 555/2007, prorrogada pela Portaria nº 948/2007. Brasília: MEC, 2008. CICCONE, Marta. Comunicação Total: Introdução, Estratégias a Pessoa Surda. Rio de Janeiro: Cultura Médica. 1999. COSTA, Maria da Piedade. O Deficiente Auditivo. São Carlos: UFSCAR. 1994. DÓRIA, Ana Rimoli. Relatório. 1956. FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. 33. ed. Petrópolis: Vozes, 2007. FREMAN, Roger D.; CARBIN, Clifton F.; BOESE, Robert J. Seu filho não escuta? Um guia para todos que lidam com crianças surdas. Brasília: MEC/ SEESP, 1999. HAWKINS, Larry; BRAWNER, Judy. Educating Children Who Are Deaf or Hard of Hearing: Total Communication, 1997. Disponível em: <http://ericae.net/edo/ ED414677.htm>. Acesso em: 10 mai. 2009. JOKINEN, Markku. Alguns pontos de vista sobre a educação dos surdos nos países nórdicos. In: SKLIAR, Carlos (org.). Atualidade da educação bilíngue para Surdos. vol. 1. Porto Alegre: Mediação, 1999. KYLE, Jim. O ambiente bilíngue: alguns comentários do desenvolvimento do 43 Modelos e Técnicas educacionais na educação de surdos Capítulo 2 bilingüismo para surdos. In: SKLIAR, Carlos (Org). Atualidade da educação bilíngue para surdos. vol. 1. Porto Alegre: Mediação, 1999. LACERDA, C. B. F.; GOÉS, M. C. R. (Orgs). Surdez: processos educativos e subjetividade. São Paulo: Lovise, 2000. MARTINS, André Luis Batista. Identidades Surdas no processo de identificação linguística: o entremeio de duas línguas. Dissertação de Mestrado. Uberlândia: UFU, 2004. MOURA, M. C.; LODI, A. C. B.; PEREIRA, M. C. C. (Orgs.). A linguagem de sinais na educação de criança surda. In: Língua de Sinais e educação do Surdo. São Paulo: Tec Ant., 1993, p. 1-4. MOURA, Maria Cecília. O Surdo: caminhos para uma nova identidade. Rio de Janeiro: Revinter, 2000. QUADROS, R. M. de. Educação de Surdos: a aquisição da linguagem. Porto Alegre. Artes Médicas, 1997. SACKS, Oliver. Vendo Vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. São Paulo: Companhia de Letras, 2002. SASSAKI, Romeu Kazumi. Nomenclatura na área da surdez. Disponível em: <http://sentidos.uol.com.br/canais/materia.asp?codpag=8325&codtipo=8&subcat =31&canal=visao>. Acesso em: 03 mar. 2009. SKLIAR, Carlos (org.). A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação, 1998. SOUZA, R. M. Que palavra que te falta? Linguística, educação e surdez. São Paulo: Martins Fontes, 1998. SOUZA, R. M.; GÓES, M. C. R. O ensino de surdos na escola inclusiva: considerações sobre o excludente contexto da inclusão. In: C. SKLIAR (Org.): Atualidades da educação bilíngue para surdos. v. 1, Porto Alegre: Mediação, 1999. CAPÍTULO 3 identidadeS, culturaS e línguaS de SinaiS doS SujeitoS SurdoS PóS-moderniSmo A partir da perspectiva do saber fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Analisar os conhecimentos linguísticos e culturais dos sujeitos Surdos. 3 Conhecer os fundamentos da língua de sinais e suas resistências no modernismo e a transformação do Sujeito Surdo no pós-modernismo. 47 IdentIdades, Culturas e línguas de sInaIs dos sujeItos surdos Pós-ModernIsMo Capítulo 3 contextualização O capítulo três apresentará várias unidades sobre o estudo da língua de sinais e suas implicações linguísticas: configurações de mãos, pontos de locações, movimentos, orientações e expressões faciais. Também estão inseridas as estruturas gramaticais, como: morfologia, sintaxe, semântica e pragmática (ordem básica e outras ordenações possíveis). Igualmente, este capítulo contextualizará os estudos da transformação do sujeito Surdo no pós-modernismo, o que implicará vários aspectos: identidade e cultura Surda. língua de SinaiS BraSileira e SuaS imPlicaçõeS linguíSticaS De acordo com Quadros
Compartilhar