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A síndrome de Sjögren (SS) é uma doença inflamatória crônica imunomediada, de evolução lenta e progressiva, caracterizada por infiltrado linfoplasmocitário focal nas glândulas exócrinas e em outros tecidos epiteliais, causando secura das mucosas e grande diversidade de manifestações clínicas sistêmicas. Acomete principalmente mulheres, em uma proporção de 13:1. A manifestação é geralmente entre a 4ª e a 5ª década de vida. A SS ocorre isoladamente ou em associação a outras doenças autoimunes. As comorbidades mais frequentemente associadas são: fibromialgia (20 a 50%), HAS (28 a 40%), DM (10 a 27%) e dislipidemia (11 a 22%). A etiologia da SS não está completamente definida. Há suscetibilidade, pois se observa que indivíduos da mesma família têm maior frequência de SS e de outras doenças autoimunes. Sabe-se que certos vírus podem desencadear SS em indivíduos geneticamente predispostos, como: EpsteinBarr, Coxsackie, citomegalovírus, HTLV1, o herpesvírus humano tipo 6 e tipo 8. O baixo nível de citólise sugere infecção viral não citolítica persistente da célula epitelial. A persistência de material genético viral dentro das células epiteliais altera suas propriedades biológicas, dando início a uma resposta imune aberrante. O modelo etiopatogênico atualmente aceito está baseado no desenvolvimento de epitelite autoimune caracterizada pela infiltração linfocítica das glândulas exócrinas. Fatores hormonais e ambientais resultam na perda do equilíbrio da resposta autoimune. As células epiteliais são ativadas e passam a recrutar, ativar e promover diferenciação das células imunes, que passam a produzir citocinas que retroativam as células epiteliais, alimentando um ciclo vicioso de ativação. O infiltrado linfocitário das glândulas exócrinas na SS é composto por linfócito T, linfócito B, células dendríticas e, ocasionalmente, por agregados linfoides do tipo centro germinativo-like (CG). A apoptose de células epiteliais glandulares libera vesículas contendo autoantígenos Ro52, Ro60 e La, que são os alvos da resposta imune adaptativa na SS. Essas vesículas podem ser capturadas pelas células apresentadoras de antígenos, em especial as células dendríticas. As células dendríticas, presentes no infiltrado linfocitário, ativadas pelos autoantígenos ou partículas virais, iniciam a produção de interferon. Participam também da ativação de linfócitos T que proliferam e liberam outras citocinas pro- inflamatórias, fomentando o sistema imune adaptativo. Há 2 subgrupos de pacientes com manifestações clínicas, padrões histológicos, perfil de citocinas e prognósticos diferentes: Elevados níveis de sintomas (secura, fadiga e dor) e grande impacto sobre a qualidade de vida Manifestações mais graves, acometendo órgãos-alvo, maior morbidade e mortalidade e com alto risco de desenvolvimento de linfoma. Cerca de 70% dos pacientes estão no polo benigno, O aparecimento de manifestações sistêmicas é cumulativo. A presença de dor crônica não inflamatória é marcador benigno, pois é fator de proteção para o aparecimento de manifestações sistêmicas. O acometimento glandular leva a manifestações clínicas de secura oral (xerostomia), ocular (xeroftalmia), cutânea (xerodermia), de vias aéreas (xerotraqueia) e vaginal. A saliva protege os dentes e as partes moles da gengiva, auxilia na mastigação, na deglutição e na fala. Oferece proteção mecânica e imunológica. Na hipossalivação, ocorre alteração da microbiota oral, propiciando o aparecimento de cárie e de candidíase. Pacientes podem se queixar de sensação de secura oral, aparecimento ou rápida progressão de cáries, disfagia, sensação de queimação em mucosa oral e halitose. A mucosa pode apresentar-se mais fina, avermelhada, dolorosa e hipersensível a alimentos picantes e ácidos. Etiopatogênese: Fisiopatologia: Manifestações clínicas: A lágrima tem função: Metabólica: nutrir e levar O2 para a conjuntiva e para a córnea avascular Óptica: forma uma superfície transparente e lisa que auxilia na refração da luz Protetora: elimina partículas que podem causar irritação ou inflamação Antimicrobiana, cicatrizante e lubrificante. A integridade da função lacrimal depende das glândulas lacrimais, das pálpebras e da superfície ocular. O filme lacrimal é um gel contendo mucina hidratada recoberta por fina camada de lipídios que dá estabilidade ao filme e evita a evaporação da camada aquosa A lágrima no olho seco por deficiência de produção, como acontece na SS, é hiperosmolar e, por isso, estimula a cascata da inflamação na superfície ocular. Pacientes com xeroftalmia podem apresentar prurido, hiperemia, irritação, sensação de corpo estranho, sensação de secura, lacrimejamento (reflexo, em fase mais inicial), borramento visual e diminuição da acuidade. A irritação crônica e a destruição do epitélio conjuntival bulbar e corneano caracterizam a ceratoconjuntivite seca. A secura pode ocorrer em outros sistemas ou órgãos, como respiratório, geniturinário e na pele. A hipofunção de glândulas mucosas do trato respiratório superior e inferior ocasiona secura nasal, orofaríngea e traqueal, com tosse seca persistente. A secura genital é representada pela vaginite seca, com irritação, prurido e dor durante relação sexual (dispareunia). A diminuição das secreções das glândulas exócrinas da pele causa secura e, consequentemente, prurido cutâneo. A SS, no momento do diagnóstico, pode se apresentar como doença sistêmica na maioria dos casos (50% em apenas um e 7% em múltiplos sistemas). A doença articular é comum na SS e é tipicamente uma poliartrite ou poliartralgia inflamatória, podendo ser simétrica ou assimétrica. A artropatia é caracteristicamente não deformante, e o aparecimento de erosões sugere diagnóstico diferencial ou associação com artrite reumatoide. As manifestações cutâneas mais relacionadas à SS são púrpura, eritema nodoso, eritema polimorfo e lesões de fotossensibilidade do tipo lúpus cutâneo subagudo. O acometimento respiratório inclui doença pulmonar intersticial (DPI), linfoma não Hodgkin, acometimento pleural e de pequenas vias aéreas . O padrão histológico mais frequente de DPI é a pneumonia intersticial não específica (PINE), que ocorre em cerca de 66% dos pacientes. A presença de cisto pulmonar está mais associada com anticorpo positivo e linfoma. As manifestações renais associadas à SS são a nefrite tubulointersticial (NI) e a glomerulonefrite (GN). Ocorrem em cerca de um terço dos casos, sendo clinicamente relevante em 5% e, quando presentes, estão associadas com maior mortalidade. A doença neurológica é frequente na SS e pode afetar tanto o sistema nervoso central quanto o periférico. Predomina o padrão axonal sensorial, mas pode ocorrer o padrão axonal sensoriomotor, a polineuropatia inflamatória desmielinizante crônica (PIDC) e a gangliopatia com ataxia. As lesões neurológicas estão associadas a alterações na microvasculatura endoneural com ou sem vasculite crioglobulinêmica. Também pode surgir acometimento de par craniano, sendo os mais comuns o trigêmeo e o óptico. Pode ocorrer perda auditiva neurossensorial Cerca de 30% dos pacientes apresentam pericardite e lesão valvar, geralmente de apresentação silenciosa. Miocardite e arritmias podem acontecer como apresentação inicial e em contexto de atividade em outros sistemas. Qualquer segmento do trato gastrintestinal pode ser afetado na SS. A frequência de dismotilidade esofágica é alta. Podem-se observar disfagia, hepatite, pancreatite e síndrome de má absorção decorrente de infiltrado linfocítico do jejuno. Existem vários autoanticorpos associados à SS, mas são considerados típicos o antiSSA/Ro e o anti- SSB/La. Células produzindo anticorposanti-SSA/Ro e anti- SSB/La foram encontradas na saliva dos pacientes e têm forte correlação com os níveis sorológicos. Os autoanticorpos podem preceder a doença por anos. Auto-anticorpos: A presença de anticorpos antiSSA/Ro e antiSSB/La coincide com uma alta frequência de manifestações extraglandulares. Nos pacientes com SS, o anticorpo antiSSA/Ro é detectado com mais frequência em soros de pacientes que manifestam a doença em idade mais precoce, com envolvimento da parótida ou de glândulas salivares maiores e intensa infiltração linfocitária das glândulas salivares menores. Esses anticorpos podem ser rastreados pelo FAN, e o padrão mais comum é o nuclear pontilhado fino pela presença de antiSSA/Ro e antiSSB/La. Alguns autoanticorpos órgão-específicos, embora não sejam os mais frequentes, podem ocorrer nas formas primárias e associadas da doença. A análise histopatológica das glândulas salivares menores submucosas do lábio inferior é uma importante ferramenta de diagnóstico da SS São de fácil acesso e exibem o mesmo processo patológico das glândulas maiores. A sialoadenite linfocítica focal com escore focal ≥ 1 é o padrão histológico típico da SS. Caracterizada por um ou mais focos contendo densos agregados de 50 ou mais linfócitos, localizados geralmente nas regiões periductal ou perivascular, adjacentes a ácinos mucosos preservados, a cada 4mm² de tecido glandular. Ocorre destruição progressiva das células epiteliais pelo infiltrado linfocitário, dilatação e distorção dos ductos, resultando na substituição do tecido glandular por células mononucleares e cronicamente com atrofia acinar e substituição adiposa dos ácinos. Anticorpos antiSSB/La e antiSSA/Ro são encontrados no citoplasma de plasmócitos das glândulas salivares labiais dos pacientes com SS. Os novos critérios de classificação têm sensibilidade e especificidade > 95% e preconizam investigar SS em todos os pacientes com síndrome seca e/ou manifestações sistêmicas compatíveis. A busca ativa pode ser feita por meio de perguntas estruturadas validadas, como: Você tem apresentado sensação diária e persistente de olho seco há mais de 3 meses? Você tem apresentado sensação de areia ou corpo estranho nos olhos? Você necessita usar colírio substituto de lágrima mais que 3 vezes/dia? Você tem apresentado sensação diária de boca seca há mais de 3 meses? Você tem apresentado aumento decorrente ou persistente de glândulas salivares após a idade adulta? Você necessita beber líquidos para ajudar a deglutir alimentos mais secos? Considerando a elevada frequência de síndrome seca na população em geral, há que se rastrear SS naqueles que apresentarem disfunção lacrimal ou salivar confirmada por testes objetivos, incluindo pelo menos fluxo salivar não estimulado, teste de Schirmer I e teste de coloração de superfície ocular (fluoresceína + lisamina verde). Análise histopatológica: Diagnóstico: 1. O Teste de Schirmer é um teste feito para avaliar se o olho produz uma quantidade suficiente de lágrima para manter-se lubrificado. Consiste na colocação de uma tira de papel filtro sob ambas as pálpebras inferiores. O paciente permanece com os olhos suavemente fechados e, após 5 minutos, as tiras de papel filtro são retiradas. A quantificação da produção de lágrima é feita pela medida do papel filtro que ficou úmida. Os resultados são lidos da seguinte forma: > 10mm = NORMAL Entre 5-10mm = OLHO SECO MODERADO < 5mm = OLHO SECO SEVERO 2. O exame do Tempo de Ruptura do Filme Lacrimal avalia a estabilidade do filme lacrimal Após a instilação do corante de fluoresceína, o filme lacrimal é avaliado com um feixe de luz difusa da lâmpada de fenda, com o filtro azul-cobalto. Após o piscar, enquanto a lágrima está estabilizada, toda a superfície ocular aparece com a imagem uniforme. Após um intervalo de tempo, linhas ou pontos escuros surgem no filme lacrimal fluorescente, indicando áreas secas da evaporação da lágrima, marcando o tempo de ruptura do filme lacrimal. O normal é acima de 10 segundos, ou seja, se a primeira linha ou ponto escuro aparecer antes deste período, é diagnosticada a instabilidade do filme lacrimal. A SS pode ser dividida em primária, quando o acometimento é isolado, ou secundária, quando em associação com outras condições como AR ou LES. Os critérios classificatórios levam em conta: Sintomas oculares Olho seco > 3 meses, sensação de corpo estranho, necessidade de lubrificação. Sintomas orais Boca seca > 3 meses, aumento de glândulas salivares, necessidade de ingestão de líquido para concluir alimentação. Exames objetivos oculares Teste de Schirmer (+) Exames objetivos das glândulas salivares Fluxo salivar não estimado <1,5ml em 15 minutos; cintilografia de glândulas salivares com atraso na captação, diminuição da concentração e/ou atraso na excreção do traçador. Histopatologia Sialoadenite linfocítica focal em glândula salivar menor. Auto anticorpos Anti-Ro e/ou Anti-La Pacientes com SS têm risco aumentado para neoplasias, incluindo hematológicas, de tireoide, mama, pulmão, estômago, ovário e cavidade oral. A neoplasia mais frequente é a hematológica, do tipo linfoma de célula B. Pacientes com SS têm maior frequência de HAS, DM, dislipidemia, aterosclerose subclínica e maior risco para eventos cardiovasculares. O tratamento deve considerar fatores associados que possam agravar a secura, como comorbidades e uso de medicamentos. Orientar atividade física para melhora da dor, fadiga e qualidade de vida. Controlar fatores de risco cardiovasculares. Orientar vacinação. Fornecer orientações gerais para o controle dos sintomas de secura que possam auxiliar na hidratação da mucosa e boa higienização oral. Embora promovam alívio temporário dos sintomas, substitutos (saliva e lágrima artificiais) e agonistas muscarínicos (pilocarpina, cevimelina) são importantes para controlar a síndrome seca. O tratamento sintomático do olho seco inclui colírios lubrificantes, oclusão do ponto lacrimal, suplementação oral com ômega 3 e uso de medicamentos imunomoduladores tópicos, como ciclosporina ou tacrolimo. Medicações imunomoduladoras são usadas empiricamente nas manifestações sistêmicas. Por uma extrapolação das evidências em AR e LES, recomenda-se o uso de hidroxicloroquina e metotrexato para o controle das manifestações articulares. O tratamento da doença pulmonar intersticial requer fármacos imunossupressores como azatioprina, micofenolato e ciclofosfamida, a depender da gravidade. Pacientes com doença glomerular, doença pulmonar grave, acometimento de sistema nervoso central e mononeurite múltipla têm indicação de pulsoterapia com ciclofosfamida, associada ou não a metilprednisolona. Pacientes com polineuropatia sensitiva ou neuropatia atáxica têm indicação de imunoglobulina Monitoramento da doença: Prognóstico: Tratamento:
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