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GESTÃO PÚBLICA 4.0 UNIDADE 1 ÍNDICE TÓPICOS PÁGINA 1. MUNDO 4.0 3 2. CIDADÃO 4.0 8 3. GOVERNO 4.0 14 3.1 Governo Digital 15 3.2 Governo Aberto 15 3.3 Governo como plataforma 16 4. PROFISSIONAL 4.0 19 BIBLIOGRAFIA 26 3 1. MUNDO 4.0 Nos anos 40 o mundo passava pela Revolução Industrial. Era um período de forte industrialização e os avanços tecnológicos e a capacidade produtiva moldavam a sociedade. As ferrovias cortavam regiões possibilitando o escoamento de bens produzidos, criando uma nova relação social, de trabalho e com meio. Nos anos 80, a montadora Toyota já era uma gigante do setor automotivo. Para garantir que seu processo de montagem e gestão de pessoas mantivesse a padronização e qualidade em qualquer lugar do mundo onde estivesse presente promoveu sua filosofia baseada em gestão de conhecimento, melhoria contínua e trabalho em equipe, aliados à cultura organizacional muito forte. Com filosofia de padronização, processos e treinamento de pessoal, extrapolou o seu segmento e influenciou executivos no mundo todo como exemplo de gestão e eficiência. Com o sistema Toyota de produção. Em 1990, o britânico Tim Berners-Lee, funcionário do CERN (Organização Europeia para a Investigação Nuclear), conseguia resolver um problema de compartilhamento de dados para cientistas ao redor do mundo. Assim surgia o primeiro browser chamado WorldWideWeb e o primeiro servidor HTTP permitindo interligar informação, não importando onde ela se encontre. Nos anos 2000, jovens inquietos da universidade de Harvard, nos Estados Unidos, pensavam em como fazer com que as pessoas pudessem se conectar pelo computador e criar seus perfis pessoais como uma rede social. Mark Zuckerberg resolveu criando um serviço gratuito de conexão na web para os alunos da instituição. O Facebook tornou-se uma poderosa plataforma de relacionamento para mais de dois bilhões de usuários. 4 A Nokia lançava o famoso celular formato “tijolão”, o Nokia 1001, que dava mobilidade para a rede telefônica. A BlackBerry criava um telefone inteligente, que possibilitava que as pessoas mandassem também mensagens de texto para seus contatos com segurança mudando a comunicação corporativa. Mais tarde, outro jovem colocava no mesmo dispositivo - o telefone, a música e o SMS e promovia a transformação do mercado de telecomunicações e de internet. Steve Jobs colocou a Apple como uma das marcas mais valiosas do mundo. Todos esses exemplos nos mostram como a incorporação de tecnologia nas diversas áreas produtivas afeta bem mais que os empregos, mas o comportamento da sociedade. A adoção de algumas tecnologias pela sociedade tem, por muitas vezes, acelerado processos e transformações em uma velocidade sem precedente. A televisão levou 22 anos para alcançar 50 milhões de usuários enquanto o computador pessoal apenas 14 anos. E o que dizer dos 7 anos da internet, ou do Facebook que em 4 anos conquistou os mesmos 50 milhões de usuários. E o icônico jogo Pokemon Go que atingiu essa meta em incríveis 19 dias. Muitas coisas aconteceram nas últimas décadas que nos espantam: O crescimento da Amazon como uma das marcas mais valiosas do mundo com seus espantosos centros de distribuição (CD´s). O da Califórnia é considerado um paraíso tecnológico de logística com mais de 300mil m² repleto de tecnologia proprietária Amazon, como os incríveis robôs Kiva que automatizam a movimentação de cargas dentro do armazém. Não precisamos sair do Brasil para buscar exemplos, o Mercado Livre - empresa Argentina de tecnologia que oferece soluções de comércio eletrônico – ultrapassou em 2020 a gigante Vale - mineradora multinacional brasileira e uma das maiores operadoras de logística do país - em valor de mercado consolidando uma tendência global em empresas de tecnologia. O fato é que estamos vivendo um período chamado de Quarta Revolução Industrial. No final do século XVIII, a Primeira Revolução Industrial introduziu motores a vapor como fonte de energia no processo de produção. Na sequência, a eletricidade possibilitou os primeiros sistemas de automação industriais e surgiu a Segunda Revolução Industrial, entre 1870 e 1945. As décadas seguintes – 50, 60 e 70 trouxeram a Era Computacional com a Revolução da Informação e seus sistemas digitais, a Terceira Revolução Industrial. A Quarta Revolução Industrial ou Revolução da Inteligência cunhou o termo Indústria 4.0. Neste processo, os dados passam a ser protagonistas e decisivos no gerenciamento dos mais diversos processos e sistemas. As fábricas inteligentes misturam sistemas humanos e computacionais (ciber-físicos), introduzem a Internet das Coisas (IoT) e a Computação em Nuvem (cloud computing). 5 Diferentes características da Indústria 4.0 começam a se mostrar vantajosas e aplicáveis em uma quantidade muito maior de negócios, transformando significativamente o mercado. Aos poucos, essas tecnologias começam a extrapolar os muros fabris e tomam várias outras áreas e então surge o Marketing 4.0; o RH 4.0; a Saúde 4.0; a educação 4.0 enfim; o Mundo 4.0. Importante aqui é entender os principais conceitos e usos dessas tecnologias para percebermos que elas fazem cada vez mais parte do nosso dia-a- dia. Imagine um mundo onde ao acordar, os seres humanos contatam máquinas antes de outros seres humanos. As pessoas são localizadas por robôs capazes de prever o tempo para o deslocamento até o trabalho, o clima e lhes dizer quais serão seus compromissos do dia. Esses equipamentos inteligentes são capazes de conectar com seus veículos orientando caminhos menos congestionados enquanto tocam suas músicas preferidas. Foi fácil de imaginar? Hoje estamos tão imersos em um mundo híbrido que nem percebemos como equipamentos não humanos (robôs) misturam-se na nossa rotina. Ao abrir o aplicativo bancário, ao tocar uma playlist musical favorita, ao utilizar um GPS, um aplicativo de mensagens, uma rede social estamos trocando informações com máquinas e gerando cada vez mais dados capazes de melhor sua capacidade de aprendizagem computacional o que gera mais e mais relevância para o que esses sistemas nos entregam. Esse é o conceito da Internet da Coisas (IoT ou Internet of Things) – interconexão de objetos à internet para que troquem informações. Cada vez vemos mais “coisas” conectadas, itens que usamos nos nosso dia-a-dia como relógios, geladeiras, carros, até itens que vestimos como óculos, roupas, calçados (os chamados wearables). Um relatório da Gartner estima que já são mais de 30 bilhões de dispositivos conectados pela Internet das Coisas e uma receita de U$ 309 bilhões em 2020. Ambientes onde se valoriza a inovação e investe-se nela têm se tornado cada vez mais relevante no cenário mundial. Em 1980, uma região da Califórnia começou a despontar como um berçário de grandes empresas, principalmente da área de tecnologia – o Vale do Silício é referência até hoje e onde estão instaladas as principais empresas do setor. De lá para cá, vemos este tipo de ambiente se desenvolver em várias partes do mundo. Tel Aviv, Barcelona, Portugal e Londres vêm repetindo o modelo que o Vale do Silício desenvolveu e incentivando a criação de uma grande quantidade de novas empresas, tecnologias e produtos, atraindo investimentos e alcançando mercados em todo mundo. Aí se desenvolvem os melhores ecossistemas de inovação com a presença, além das empresas, de universidades e do setor público como fortes apoiadores. 6 Esses ambientes vêm promovendo uma mudança cultural em que velocidade, escala e competitividade são características fundamentais. Neste contexto é imprescindível que o gestor público enxergue esta transformação e entenda os impactos que ela promove na educação, urbanização, legislação, ambiente e tecnologia. E o quão urgente são essas discussões para uma sociedadeem transformação. Por outro lado, cada vez mais se discute o Mundo 4.0 remodelado pela tecnologia e seus impactos na vida das pessoas. O conceito de Cidade Inteligente (Smart City) -originalmente baseado em infraestrutura com instalação de uma gama de dispositivos espalhados pela cidade conectados a uma sala central de controle – foi se alterando para um conceito mais humanista, com o cidadão no centro das decisões e a tecnologia como aliada para o desenvolvimento econômico, social e que gere eficiência nas operações urbanas. O Mundo 4.0 busca a resiliência, a sustentabilidade, a inclusão e a criatividade para alcançar seus objetivos. Objetivos esses que precisam ser compartilhados. A ONU (Organização das Nações Unidas) propôs os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODSs). Os ODSs são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. Como alcança-los em um mundo tão volátil? Esse é o principal ponto que se discute ao propor o tema Mundo 4.0. Aliar tecnologia à qualidade de vida. Inovação à sustentabilidade. Transformação digital à inclusão. No Brasil, nos últimos anos vemos o Governo Federal propondo legislações mais adequadas a esse novo cenário. Alguns exemplos importantes para acompanhar são a Lei Geral de Proteção de Dados (LGP) que discute além de direitos e deveres do cidadão e das empresas em usar dados pessoais em serviços digitais, ética e privacidade. Também as leis que pretendem melhorar os ambientes regulatórios para empresas e cidadãos como é o caso da Lei de Desburocratização, que diminui o excesso burocrático, e a Lei da Liberdade Econômica que busca facilitar o exercício de atividades econômicas, alterando a mentalidade de forte regulamentação estatal nos negócios privados. 7 Ou o Marco Legal das Startups e Empreendedorismo Inovador que está tramitando no Congresso Nacional baseado na desburocratização; facilitação de investimento e recursos financeiros para os investidores; proposta de compras públicas para soluções inovadoras e definição da formalidade jurídica quanto às relações trabalhistas em startups. Com isso o país tem oportunidade para criar um ambiente mais amigável para que essas empresas se desenvolvam. Ainda poderíamos citar a questão dos leilões do 5G; as mudanças regulatórias do Banco Central para favorecer as fintechs de crédito (empresas financeiras de base tecnológica) e os bancos digitais; a criação do PIX (o meio de pagamento instantâneo brasileiro criado pelo Banco Central); a regulamentação pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) de usinas híbridas para incentivar o processo de eficiência energética e novas energias; entre outros. Em todos esses casos, a discussão pública/ privada e a colaboração entre todos os atores é fundamental. Isso prova que o mundo 4.0 passa necessariamente pela colaboração, construção coletiva, inovação e, principalmente, pela visão holística da sociedade. 8 2. CIDADÃO 4.0 Em um dia chuvoso, dois jovens tentavam conseguir um taxi nas ruas de Paris. Depois de muito tempo e frustração conseguiram se deslocar ao local desejado, mas recebendo um atendimento muito ruim. Colocaram, então, em cheque a experiência do usuário naquela situação e criaram um serviço baseado em tecnologia que mudaria o mercado dos taxistas no mundo todo. Em 2010, o Uber era lançado em São Francisco como um dos pioneiros no conceito de e-hailing. Na década seguinte o Uber já chega a todos os continentes e é uma startup avaliada em mais de U$100 bilhões. Em praticamente todas as cidades onde entrou houve uma guerra regulatória e trabalhista com taxistas e governos, mas não com o cidadão. Inclusive foi o cidadão / consumidor que possibilitou a entrada, crescimento e disseminação do Uber no mundo. Seu modelo de negócio, guardadas todas as controvérsias, entrega uma experiência melhor ao usuário, ganho de tempo e economia (exatamente os problemas que seus fundadores queriam resolver) e com isso os usuários abriram mão do discurso legalista e autoritário do governo que regulava um setor. Foi a aceitação do consumidor que deu forças à empresa privada para mudar legislações, impor autorizações e romper um mercado convencional estabelecido. Podemos citar outras dezenas de exemplos de empresas que emplacaram produtos e serviços, que resolviam um problema tão importante para o consumidor, que desestruturaram mercados: a Apple ao lançar o Iphone para a comunicação interpessoal, o Spotfy para o mercado da música, o Airbnb para o mercado hoteleiro e o Waze que fez com que qualquer fabricante de equipamentos GPS se tornasse obsoleto, entre outros. O cidadão 4.0 baseia suas decisões na percepção de valor. Em um mundo cada vez mais tecnológico, globalizado e compartilhado o acesso a novos produtos e serviços tornam o consumidor mais exigente e menos fiel a marcas. Ele entende a potencialidade dos dados que gera ao usar aplicativos e serviços online e aceita disponibilizá-los desde que haja um ganho individual seja de tempo, de eficiência, de conveniência, mas também é cada vez mais importante que as marcas e os produtos produzam impactos coletivos positivos (ou mitiguem impactos negativos). Esse mercado compartilhado está longe de ser apenas ideológico. Segundo um estudo da PWC (Price Waterhouse Coopers) a projeção para 2025 é que o a economia compartilhada gere uma receita de até U$335 bilhões. E por que isso é importante para a gestão pública? 9 Porque há demanda por produtos e serviços públicos melhores, mais tecnológicos, compartilhados e com potencial de impacto também. À medida que o consumidor muda, o cidadão muda. E é muito difícil para o gestor público acompanhar essa mudança e ajustar a jornada do cidadão às suas necessidades em constante transformação. Aqui nasce o processo de inovação aberta. Quando falamos em Mundo 4.0 e Governo 4.0 chamamos a atenção sobre o fato de o governo do futuro ser centrado no cidadão, integrado, inteligente, confiável, transparente, aberto, proativo e eficiente. Um governo centrado no cidadão tem o diálogo e a colaboração como premissas, por outro lado, o cidadão (e as empresas) está cada vez mais disposto a colaborar com o setor público em busca da eficiência. A Inovação aberta, ou em inglês, open innovation, é usada por empresas que buscam melhorar o desenvolvimento de seus produtos ou serviços, aumentar a eficiência e reforçar o valor agregado. O termo foi difundido por Henry Chesbrough, diretor da Berkeley Center for Open Innovation, para defender que empresas e instituições usem ideias internas e externas, assim como caminhos internos e externos para o mercado. O processo de inovação aberta traz a oportunidade para o setor público de ampliar sua capacidade tecnológica e olhar os processos de produtos e serviços sob a ótica de quem utiliza – o cidadão. Processos de inovação aberta também são muito mais rápidos, o comum é que sejam usadas metodologias ágeis no processo. As metodologias ágeis, como o Design Sprint, propõe trabalhar em ciclos de tempo curtos com atenção permanente aos detalhes e, formar equipes motivadas, integradas e auto- organizadas. O Design Sprint é o método usado pelo Google para testar e aplicar novas ideias em apenas cinco dias. Em cada dia avança-se uma etapa: (1) mapear, (2) criar soluções, (3) selecionar as melhores soluções, (4) prototipar e (5) testar com o consumidor final. O resultado desse processo não é um produto ou serviço acabado, mas um aprendizado consistente sobre a percepção de pessoas que possuem visões diferentes com relação ao problema que se está tentando resolver. Por isso é tão importante que haja diversidade no processo – diferentes hierarquias, diferentesintenções, diferentes contextos. As diretrizes do design são utilizadas para a criação de uma experiência completa de consumo que afeta tanto produtos quanto serviços. O conceito de design de serviços está cada vez mais sendo usados na gestão pública afim de promover a melhor entrega de valor para o cidadão. 10 Os principais pontos abordados pelo design de Serviço são: - Estratégia para integração de canais (Omnichannel) que consiste em abrir, disponibilizar e adaptar os serviços a todos os canais seja físico ou digital. Facilitando o acesso do cidadão e também aumentando a eficiência na sua prestação. O ideal é que os canais estejam integrados o que significa que as informações ou serviços que o cidadão forneceu online estejam visíveis e acessíveis ao atendente/ servidor no momento do atendimento físico evitando assim retrabalho. - O atendimento é outro ponto essencial. É impossível pensar em uma estratégia de design de serviço sem ajustar a forma como esse atendimento é realizado. O treinamento do atendente é fundamental, mas muitos são os casos que a tecnologia apoia e melhora o processo do atendimento físico através de agendamento online, cadastramento online, histórico de processos, etc. Quanto mais produtos e serviços que entreguem conveniência, agilidade e acesso são incorporados no nosso dia-a-dia, maior a exigência no momento do consumo. Quando tínhamos apenas a opção de esperar até meia hora por um taxi, esse tempo era aceitável para o consumidor. A partir do momento em que o Uber entregou um serviço muito mais rápido, passar de cinco minutos à espera de um carro é desconfortável. O consumidor 4.0, aliás, é extremamente exigente com relação ao tempo. As emissoras de televisão sofrem pela “pressa” do expectador em trocar o programa no horário comercial. Na verdade o expectador nem assiste programa com horário marcado, faz uma busca por streaming e assiste a hora que quer. E quando se esperava o retorno de uma ligação ou o horário comercial para resolver um assunto? Hoje as mensagens instantâneas tornaram quase tudo uma questão de urgência. Quanto mais a tecnologia avança, mais a noção de tempo se modifica. Quando acessávamos a web como internet discada, se esperava vários minutos para carregar um site. Depois vieram as redes Banda Larga e a Internet Móvel que eleva a velocidade de conexão à medida que evolui. Para ter uma ideia, segundo um teste realizado pelo The Wall Street Journal, baixar uma playlist de 1 hora no Spotfy demorava cerca de 7 minutos com o 3G, 20 segundos com o 4G e, com o 5G, esse tempo será de 0,6 segundos. O Brasil está se preparando para o maior leilão de 5G do mundo. Essa tecnologia 5G é a quinta geração da rede de internet móvel. Sua velocidade chega e ser até 20 vezes maior do que o restante dos sinais. Esse mercado é dominado mundialmente pela chinesa Huawei, seguida pela Nokia e Ericsson. 11 Está achando a velocidade 5G incrível? Em novembro de 2020 a China enviou ao espaço um satélite de testes da internet 6G. A expectativa é que a conexão possa estar disponível em 2030 e que a internet 6G seja até 100 vezes mais veloz do que o 5G. A velocidade de conexão trará uma nova revolução na sociedade, abrirá era da hiperconexão através da Internet das Coisas (IoT). Máquinas conectadas irão compartilhar informações entre si, drones farão entregas, carros autônomos transitarão nas cidades e muitos dos nossos comportamentos digitais moldarão novos produtos e serviços. Toda essa disponibilidade de dados e conexão gera ao consumidor muitos ganhos, mas também muitas preocupações. Questões relacionadas à privacidade de dados, segurança digital e ética estão na pauta da maioria dos consumidores ao redor do mundo. Não é por acaso, que a maioria dos países discute legislações referentes à Proteção de Dados. A Lei Geral de Proteção de Dados (LPGD) brasileira aprovada em outubro de 2020 foi baseada no Regulamento Geral de Proteção de Dados na União Europeia (GDPR) - a principal referência mundial sobre legislação de proteção de dados que, inclusive, motivou muitos países a reformularem ou trabalharem em regras similares à promulgada em 2018. A regulamentação da LGPD trouxe imposições importantes para o setor privado e também ao público. Ela indica que é o cidadão que define a disponibilização de seus dados pessoais a terceiros. Ela define sem margem para discussão que é a pessoa a quem se referem os dados a sua proprietária, e não quem o manipula ou armazena. Parece óbvio, mas muitos eventos ao longo dos anos mostram o perigo da não regulamentação da privacidade de dados. Um fato marcante sobre violação de proteção de dados é o escândalo envolvendo o uso indevido de dados do Facebook pela empresa Cambridge Analytica, em 2018. O usuário da rede social teve seus dados utilizados sem permissão, foi alvo de fake news e manipulação política em todo o mundo. O caso levou o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, a depor diante de um comitê legislativo nos EUA. A empresa Cambridge Analytica declarou falência e, em 2019, se declarou culpada por descumprir uma ordem do regulador britânico encarregado da proteção de dados (ICO). O caso do Facebook e a Cambridge Analytica levantou a discussão sobre até que ponto estamos expostos, como usuários, à manipulação através do aprendizado que essas empresas têm sobre os nossos hábitos digitais. Ele impactou politicamente os EUA (e muitos outros países, inclusive o Brasil) e fez com que o consumidor ficasse mais atento sobre a importância da sua privacidade. 12 Quando o assunto é segurança digital podemos a preocupação é crescente pelo aumento em quantidade e diversidade dos ataques cibernéticos provocados por hackers. Em novembro de 2020, os servidores do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sofreram o que foi considerado um dos incidentes de segurança mais graves envolvendo o setor público no Brasil. Além de sequestro de dados, possível vazamento de dados e captura de informações pessoais, o ataque paralisou as atividades do tribunal alterando prazos de processos e cancelando audiências. Questões éticas também estão no centro das discussões tecnológicas. É claro que para falar em ética é preciso discutir valores morais, sociais e legais. Áreas sensíveis como os avanços da medicina genética, da inteligência artificial e o seu julgamento cognitivo, das soluções para cidades inteligentes com monitoramento em Tempo Real e a Ciência de Dados do cidadão. São assuntos muito discutidos, mas que dependem dos valores e do contexto onde estão inseridos. Por exemplo, falar sobre privacidade de dados em países com regimes autoritaristas é muito diferente do que em regimes democráticos. Em 2018, cidadãos chineses que tentaram comprar passagens de avião foram bloqueados por conta de suas pontuações no "crédito social”. Um sistema de Informação do Crédito Público Nacional que classifica as pessoas pelo bom desempenho. O governo afirmou que a ideia da plataforma de crédito social é “permitir que as pessoas confiáveis andem livremente por aí, enquanto os desacreditados terão dificuldade em dar um passo sequer”. Parece abuso para a cultura ocidental, mas vale lembrar que na China não há discussão sobre o quanto o governo pode ter acesso aos dados do cidadão, seja por dados, sensores e câmeras espalhadas pelas cidades. A sociedade atual parece mais disposta a mudanças e livre para experimentar algo novo, flexível e adaptável, como menciona Zygmunt Bauman em seu livro Modernidade Líquida. O autor ressalta que essa liberdade, em muitos casos, se contrapõe à confiança na rigidez das instituições e na solidificação das relações humanas. Para ele, relações de consumo também se tornam mais frágeis e superficiais, e as redes sociais potencializaram esse comportamento. Acaba sendo o paradoxo, os anos 2000, quando a internet começava a fazer partedo nosso cotidiano, os meios de comunicação eram dominados por grupos que criavam conteúdos enquanto nós éramos “audiência”. As redes sociais elevaram o consumidor para também produtor de conteúdo (“prossumidor”) aumentando substancialmente a quantidade de informação disponível a todos. Com uma conta em rede social, ou um blog, o consumidor se empoderou e sua opinião começou a ser levada em conta primeiramente pelo seu ciclo de relacionamento, depois pelas empresas. 13 As redes sociais tornaram-se uma arma na mão do consumidor para cobrar de empresas e marcas bons serviços, tomaram o lugar do Call Center telefônico e expuseram más condutas. Quem não se lembra das primeiras crises de marcas em redes sociais, como Arezzo e Brastemp? A Brastemp teve, em 2010, repercussão internacional quando um consumidor (Oswaldo Borelli) ficou 90 dias aguardando retorno do SAC da empresa para resolver o problema de uma geladeira comprada com defeito. Ele colocou seu refrigerador Brastemp na porta de casa e gravou um vídeo contando todo o caso. O vídeo ainda está disponível na internet e tem 1milhão de visualizações. Em 2011 a marca de roupas Arezzo também não deixou os consumidores satisfeitos. O lançamento de uma coleção chamada PeleMania trouxe à tona a discussão sobre causas ao lançar produtos feitos de pele de animais. Pior que a coleção foi a inabilidade da empresa em entender o ponto de vista de seus consumidores, o que gerou uma enorme crise de imagem e uma mudança radical no mercado da moda nos anos subsequentes. O que quero chamar a atenção aqui é sobre empoderamento, representatividade, mudanças de comportamento e evoluções tecnológicas. A tecnologia por si só não provoca a mudança no consumidor, mas potencializa. Não temos a resposta para a questão se a tecnologia muda comportamentos ou comportamentos mudam a tecnologia. Acredito as coisas aconteçam de forma simultânea. A partir do momento que novos produtos e serviços simplificam nossa vida, resolvem problemas da nossa rotina mais rapidamente criamos novas necessidades, e hábitos não retrocedem. A mudança de um setor pode alterar muitos outros, como o caso do Uber para a mobilidade em geral; do Iphone para a comunicação e tecnologia; e da Brastemp para o Atendimento ao Consumidor. 14 3. GOVERNO 4.0 A chegada da Quarta Revolução Industrial ou Revolução da Inteligência cunhou o termo Mundo 4.0 (proveniente da Indústria 4.0) relacionando sistemas humanos e computacionais (ciber-físicos), introduzindo a Internet das Coisas (IoT) e a Computação em Nuvem (cloud computing). Aos poucos, essas tecnologias alcançaram várias outras áreas e então surge o Marketing 4.0; o RH 4.0; a Saúde 4.0; a educação 4.0 e também o Governo 4.0. O dito popular: “muito ajuda quem não atrapalha” que constantemente é usado em referência aos governos não cabe nessa nova composição da sociedade pautada pela proatividade, colaboração, pela conexão e pela tecnologia. A relação entre governo e cidadão é conturbada na maioria dos países e, no Brasil, a sensação de ineficiência, morosidade e corrupção atrapalham ainda mais esse relacionamento. Por outro lado a transparência, a desburocratização e a participação popular na tomada de decisões estão cada vez mais na pauta do gestor e são exigências da sociedade. Uma publicação da Escola Nacional de Administração Pública (Enap - 2019) sobre Governos Locais aponta cinco temas relevantes na agenda dos governos com uma visão de inovação: 1. Performance Administrativa (aumento na capacidade profissional e reorganização administrativa); 2. Gestão fiscal qualificada (mais eficiente e transparente); 3. Provisão de serviços e ampliação na eficiência da entrega (integrando serviços de esferas diferentes); 4. Ampliação na capacidade de investimento local (arranjos que envolvam atores privados); 5. Participação da sociedade no planejamento e definição de políticas públicas. Tema também elencado no documento que contém as 6 (seis) dimensões do governo digital da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e do Governo Federal ao instituir a Estratégia de Governo Digital para o período de 2020 a 2022, no âmbito dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. 15 Os objetivos a serem alcançados, por meio da Estratégia de Governo Digital incluem oferecer serviços públicos digitais simples e intuitivos, consolidados em plataforma única e com avaliação de satisfação disponível; conceder acesso amplo à informação e aos dados abertos governamentais; promover a integração e a interoperabilidade das bases de dados governamentais; promover políticas públicas baseadas em dados e em serviços preditivos e personalizados; garantir a segurança das plataformas de governo digital; adotar tecnologia de processos e serviços governamentais em nuvem como parte da estrutura tecnológica dos serviços e setores da administração pública; otimizar as infraestruturas de tecnologia da informação e comunicação; formar equipes de governo com competências digitais, entre outros. Em resumo, o governo do futuro será centrado no cidadão, integrado, inteligente, confiável, transparente, aberto, proativo e eficiente. Os servidores públicos precisam estar alinhados e preparados para essa realidade. Neste contexto alguns conceitos precisam estar bem entendidos como governo digital, governo aberto e governo como plataforma. 3.1 GOVERNO DIGITAL Buscar outras formas de oferecer serviços para o cidadão, eliminar burocracia, gerir obras públicas ou promover ações específicas como a difícil tarefa de eliminar o papel dos órgãos públicos são alguns dos desafios que o Governo Digital se propõe a enfrentar. A transformação digital é uma aposta real para tornar a gestão púbica mais eficiente, o cidadão com uma experiência mais positiva na utilização de serviços além de reduzir custos. Segundo o estudo “Estratégia Brasileira para a Transformação Digital” (2018), o custo do atendimento online é menor se comparado ao custo do atendimento presencial em órgãos públicos. Enquanto o atendimento presencial tem um custo médio de R$ 43,68; o atendimento online pode chegar a R$ 1,20 por transação. 3.2 GOVERNO ABERTO Há diversos conceitos para explicar o Governo Aberto, um bastante direto e amplo é do Centro Latinoamericano de Administração e Desenvolvimento (CLAD) que explica Governo Aberto como “um conjunto de mecanismos e estratégias que contribuem com a governança pública e o bom governo”. 16 Neste sentido a governança está alinhada com o que se espera de um Governo transparente, íntegro e que presta contas. Sendo aberto por padrão, o governo se compromete de forma proativa a divulgar dados em formatos abertos e a tornar acessíveis seus processos apoiados por tecnologias digitais, a menos que haja uma justificativa legítima para não o fazer. Em 2016, o Governo Federal estabeleceu regras para a disponibilização de dados abertos obrigando a criação de um Plano de Dados Abertos no âmbito de cada órgão da administração federal. O maior desafio na aplicação eficiente da Política é que os dados disponibilizados sejam estruturados e legíveis por máquina, que possuam identificadores universais e, dessa forma, possuam contexto a fim de desfazer ambiguidades de sentido chegando a níveis cada vez mais refinados de dados abertos. 3.3 GOVERNO COMO PLATAFORMA A digitalização e a abertura de dados foram passos importantes no processo que torna viável a mudança do conceito de um Governo provedor de serviços para um Governo que utiliza tecnologias digitais e dados para permitir a colaboração e cocriação com a sociedade. Essa forma de enxergar o governo disponibilizando a infraestrutura para uma grande plataforma onde pessoas, empresas e instituições incorporemfuncionalidades das mais diversas áreas é oriunda da inciativa privada, em especial, de empresas de base tecnológica. A Apple, por exemplo, entregou uma plataforma aberta à colaboração ao criar a Apple Store. O que seria do iPhone se não fossem os bilhões de aplicativos disponibilizados por bilhões de empresas com as mais diversas funcionalidades? Dessa forma há espaço para criatividade e visão dos usuários sobre os produtos e serviços que sejam mais relevantes. A construção é coletiva também. Ao mesmo tempo em que a tecnologia traz inúmeros benefícios aos governos e, consequentemente, ao cidadão; existem pontos de atenção no processo de transformação digital do governo. Um fator preocupante é a vulnerabilidade na segurança de dados. Outro ponto é o quanto a tecnologia pode aumentar os gaps econômicos e sociais aumentando a desigualdade na sociedade. A Pesquisa TIC Governo Eletrônico 2019 aponta que enquanto mais de 85% das prefeituras de cidades com mais de 50 mil habitantes possuem infraestrutura de conexão via fibra ótica, municípios com até 10 mil habitantes em especial do centro – oeste e norte não chegam a 50% com essa infraestrutura instalada. 17 Essa preocupação não é de hoje, o relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) intitulado Política Pública de Inclusão Digital de 2015 já chamava atenção para a importância de programas que visam fornecer conexões à internet para telecentros, escolas, órgãos públicos localizados em regiões remotas e de fronteira e para projetos de Inclusão Digital. Quando o assunto é cybersegurança a preocupação é crescente pelo aumento em quantidade e diversidade dos ataques cibernéticos provocados por hackers. Hackers são pessoas com conhecimento necessário para criar e modificar softwares e hardwares. Em novembro de 2020, os servidores do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sofreram o que foi considerado um dos incidentes de segurança mais graves envolvendo o setor público no Brasil. Além de sequestro de dados, possível vazamento de dados e captura de informações pessoais, o ataque paralisou as atividades do tribunal alterando prazos de processos e cancelando audiências. Ainda temos muito a avançar como municípios, estados e país. Em plena Era da Inteligência Artificial e Internet das Coisas, apenas 27% das prefeituras possuem Centros de Operação para monitoramento de áreas como segurança e defesa civil. Um planejamento integrado entre diversos setores é peça fundamental para o sucesso na transformação digital, no entanto há diferença de percepção sobre o que é inovação e quais os principais problemas a se resolver. Os setores público e privado divergem sobre foco da inovação: o primeiro procura eficiência enquanto o outro espera atendimento ao cliente. Para a liderança pública (prefeitos, secretários, cargos de gestão) a inovação está relacionada à busca de soluções que visam gerar ganhos de eficiência na implementação de políticas públicas e capital político. Já para os servidores públicos de áreas técnicas - inovar é implementar soluções para o seu dia-a-dia. A inovação do ponto de vista do empresário está ligada à solução tecnológica e, finalmente, os cidadãos querem melhores serviços com melhor qualidade. Equalizar esses interesses ajudará na busca de soluções para todos. Algumas dificuldades são recorrentes no setor público como a insegurança jurídica e burocracia. Falta de recursos, advocacy e de diálogo entre os diferentes atores também são barreiras para a inovação. Todo esse cenário traz ameaças, mas também grandes oportunidades para mudanças. A ONU (Organização das Nações Unidas) elabora um levantamento dos melhores governos digitais do mundo. Em 2020 os primeiros colocados são Dinamarca, Coréia do Sul, Estônia, Finlândia e Austrália. O Brasil ocupa a 54ª posição no ranking. 18 A Dinamarca atingiu a primeira posição em apenas quatro anos graças a uma lei que exige que todos os cidadãos acessem serviços públicos online. Sua estratégia progressiva de prioridade nos serviços digitais (“digital-first”) chegou ao ponto que obriga legalmente os cidadãos a acessarem serviços públicos online. Os envolvidos no processo de digitalização da Dinamarca indicam a cooperação entre os atores locais e nacional e a coordenação como pontos cruciais para o sucesso. O acesso a serviços de forma unificada e intuitiva facilita a vida do cidadão e estimula o uso de plataformas digitais. Este assunto está longe de se esgotar nessas poucas páginas, importante continuar discutindo e, acima de tudo, testando novos arranjos para evolução digital dos governos. A legislação certamente é uma grande barreira para a inovação no setor público, mas estamos presenciando muitos avanços no Governo Federal propondo legislações mais adequadas a esse novo cenário. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGP), as leis que pretendem melhorar os ambientes regulatórios para empresas e cidadãos como é o caso da Lei de Desburocratização e a Lei da Liberdade Econômica ou o Marco Legal das Startups e Empreendedorismo Inovador; são bons exemplos. Estar ciente das mudanças tecnologias, sociais e econômicas é sem dúvida uma obrigação do Estado. Assim como é o papel do gestor público acompanhar as transformações das relações e das necessidades do cidadão e da cidadã para entregar sempre um bom serviço. O serviço público requer empatia, ética e eficiência na relação com a população. 19 4. PROFISSIONAL 4.0 Um dos relatórios mais importantes e influentes do mundo, o Tech Trends Report aponta anualmente os vinte principais tópicos que serão as tendências à frente. Em sua décima-terceira edição, já se tornou uma referência para antecipar as ciências emergentes e tendências tecnológicas que influenciarão negócios, governos, educação, mídia, e sociedade. O relatório de 2020 destacou cinco áreas com avanços significativos: Inteligência Artificial Inteligência artificial detectando e agindo sobre nossas emoções e comportamentos. Cada vez mais temos contato com uma internet de comportamentos que extrai, refina e produz nossa biometria comportamental para uso na personalização de nossos dispositivos e redes. E quando falamos de dispositivos, não estamos considerando apenas smartphones, mas infinitas possibilidades como carros, eletrodomésticos, equipamentos e até vestuário. Transporte Autônomo Incluindo o sistema de transporte público. Funcionalidade de computação espacial em escala urbana que atua como um sistema operacional municipal gigante, ajudando os cidadãos com suas atividades cotidianas. Transações de dados em tempo real e um mundo hiperconectado. 20 Edição Genética Medicamentos sintéticos, micróbios e alimentos se propõem a resolver muitos de nossos problemas, mas ainda exigem discussões éticas na sociedade. A biologia sintética envolve a criação de um organismo que ainda não existe na natureza, e algum dia ajudará a reparar genes defeituosos, a livrar o planeta de toxinas, destruir células cancerígenas e ajudar a produzir proteínas em massa para nosso consumo. Farmácias computacionais irão empregar especialmente farmacêuticos treinados com formação em bioinformática, medicina e farmacologia. Blockchain A tecnologia Blockchain está sendo considerada uma das maiores revoluções das próximas décadas. Ela propõe uma cadeia com transações seguras, transparentes, privadas e autorreguladas. Primeiramente utilizada para transações financeiras, hoje expandiu sua aplicação para muitas outras áreas. Exemplos como o blockchain aplicado às notícias que propõe um esforço para impedir a desinformação e fake news. Ou nos testes para as eleições do futuro para reduzir ou até eliminar o risco de fraudes em eleições online. Realidade Mista É a tecnologia que reúne tanto a realidade virtual quanto a realidade aumentada além de vídeos360º e holografia. Essas tecnologias podem ser usadas para criar renderizações digitais interativas e compartilhadas com aplicações em imóveis, arquitetura e design. Para testar e simular produtos na indústria, no entretenimento, na medicina enfim, cada vez mais encontramos segmentos para utilizá-la. Além dessas ainda vemos a ampliação de usos das impressoras 3D com aplicação de novos materiais que hoje já são empregados na indústria aeroespacial e indústrias automotivas; no design e arquitetura com impressão em camadas curvas e na medicina, em centros cirúrgicos, para imprimir rapidamente válvulas de reposição e juntas usando sua própria biomatéria como modelos. Em breve teremos a fabricação aditiva de cinco eixos - impressão 5D incluindo capacidade de calor e luz. Também vemos o avanço de computadores que fazem uso da mecânica quântica. Computadores quânticos utilizam algoritmos especiais capazes de fazer novas coisas, tornando-os mais poderosos do que qualquer coisa construída até hoje. 21 Em 2018, pesquisadores do Google fizeram história ao realizar em 200 segundos um cálculo que o computador tradicional mais rápido da atualidade teria levado 10.000 anos para ser processado. Não podemos pensar no futuro de uma determinada tecnologia sem considerar simultaneamente como ela se relaciona com todas as áreas. É fundamental pensar de forma ampla, não apenas sobre uma tendência emergente, mas sobre como essa tendência se relaciona com um ecossistema complexo como um bairro, uma cidade, um país. Durante a Segunda e Terceira Revoluções Industriais, empresas e empregos sofreram profundas mudanças. As manufaturas e o trabalho artesanal deram lugar a processos automatizados de alta produção. Mudanças econômicas e sociais consolidaram o sistema capitalista. O ambiente urbano também sofreu alterações e, a segunda fase da revolução industrial trouxe tecnologias aplicadas à indústria, à comunicação e ao transporte “encurtando” distâncias e alterando a noção de “tempo”. Muitos empregos foram criados por causa da industrialização e dos processos tecnológicos. Mas também muitos empregos deixaram de existir e o desemprego aumentou significativamente. A chamada Grande Depressão (1870 a 1900 e, depois, 1929) trouxe como consequência a falência de milhares de pequenas e médias empresas e, consequentemente, a criação de grandes grupos e monopólios. Se fizermos uma analogia com os anos 2000 e o avanço da Quarta Revolução Industrial (a Revolução da Inteligência), a indústria, a comunicação e o transporte estão novamente em plena transformação. Novas tecnologias criam a necessidade do desenvolvimento de novas habilidades e postos de trabalho, ao mesmo tempo em que tornam muitos processos industriais e comerciais obsoletos. Hoje o Brasil tem 13,8 milhões de desempregados. Por causa da pandemia do novo Coronavírus, somente em 2020, foram fechados 4,3 milhões de postos de trabalho. No mesmo período as vagas do setor de tecnologia (que incluem serviços de TI, desenvolvimento de software e telecomunicações) aumentaram em 14 mil postos de trabalho. A expectativa é de que o setor precise, em média, de 70 mil profissionais qualificados a cada ano, até 2024, mas faltam profissionais para ocupar as vagas abertas. Você pode estar pensando que tudo isso está muito longe da sua realidade diária, mas não está. Em 2006, marcas como Coca-Cola, General Eletric (GE), Toyota e WallMart participavam do topo do ranking das marcas globais mais valiosas do mundo. No segmento de tecnologia apenas a Microsoft e a IBM estavam ranqueadas. De lá para cá Apple, Google e Amazon cresceram em todos os mercados e desbancaram gigantes consolidadas há décadas a ponto de, em 2019, a Amazon conquistar a liderança absoluta no segmento de varejo frente ao WallMart. As cinco marcas mais valiosas do mundo, em 2019, eram empresas de tecnologia. 22 Todo esse cenário mostra como a tecnologia tem transformado a sociedade e como o profissional 4.0 precisa estar inserido neste contexto seja qual for seu segmento. Cada vez mais, empresas buscam por talentos que percebam a transformação para a nova economia, mas também que sejam capazes de se adaptar a um mundo em transformação. As distâncias foram definitivamente encurtadas a uma velocidade difícil de acompanhar. Até as escolas e universidades sofrem com o processo de formação desse profissional. Um estudo realizado pela Universidade de Oxford dá conta que 47% dos empregos atuais correm o risco de desaparecer nos próximos 20 anos. Fica o desafio, como formar profissionais em cursos tradicionais oferecidos hoje? Atualmente, os profissionais precisam tanto desenvolver suas habilidades sociais e comportamentais (softskills) quanto suas habilidades técnicas (hardskills). Um relatório do Fórum Econômico Mundial indica que 35% das habilidades que hoje são consideradas essenciais vão mudar nos próximos cinco anos. O estudo identifica os sete (7) principais grupos profissionais com perspectivas emergentes no futuro do trabalho: Dados e Inteligência Artificial, Economia do Cuidado; Economia verde; Engenharia e Nuvem; Informática; Pessoas e Cultura e Desenvolvimento de produtos. Além desses, continuam promissores: Vendas, Marketing e Conteúdo. Somados, esses grupos têm potencial de gerar mais de seis milhões de empregos em todo mundo até 2022. Mesmo com tanta tecnologia envolvida, na disputa entre humano X máquina, o Fórum Econômico Mundial ainda aposta suas fichas nas habilidades humanas do profissional 4.0. Ao listar as dez (10) habilidades desejadas pelo mercado de trabalho, fica claro o valor (e o poder) das habilidades sociais e comportamentais: 1. Resolução de problemas complexos; 2. Pensamento crítico; 3. Criatividade; 4. Gestão de pessoas; 5. Coordenação; 6. Inteligência Emocional; 7. Capacidade de julgamento e de tomada de decisões; 8. Orientação para servir; 9. Negociação; 23 10. Flexibilidade cognitiva. Em outras palavras, a transição para o novo mundo do trabalho será centrada tanto em humanos quanto em tecnologia. No setor privado a concorrência, o risco de uma grande disrupção no mercado, de um emergente de tecnologia mudar o comportamento do consumidor, traz ao profissional a preocupação com a formação continuada e a necessidade de evoluir tecnologicamente. Muitas vezes desenvolver novas habilidades é uma questão de sobrevivência no mercado de trabalho. Sabemos que a estabilidade do setor público, muitas vezes, é causa de estagnação e uma barreira para mudanças. Por outro lado, um dos principais conceitos do Governo 4.0 é que ele seja centrado no cidadão. Neste caso, é uma questão de tempo que a exigência do cidadão e a pressão tecnológica do mercado forcem também o profissional do setor público à mudança e à adequação. Para trazer a mesma transformação que o setor privado vem experimentando para o setor público não há outro caminho senão a capacitação dos profissionais. Não necessariamente uma capacitação técnica/ tecnológica, mas uma atualização sobre tendências desse novo mercado. Uma das exigências para o profissional do futuro é que ele esteja em constante aprendizado. O termo (em inglês) muito utilizado para definir este conceito é Lifelong Learning. Neste sentido, quebra-se a lógica do ensino convencional escolar/ universitário para o ensino continuado. Cada vez mais vemos profissionais alternando várias profissões ao longo da vida, e também funcionários sêniors iniciando novas jornadas profissionais. Cabe aqui uma visão sobre trabalho transformador, propósito e impacto. A expectativa de vida vem aumentando na população do mundo inteiro. A ONU indica que uma em cada seis pessoas no mundo terá mais de 65 anos até 2050. Na América Latina, a projeção é que em 30 anos, a população acima de 65 anos dobre. Quer dizer que cada vez mais a população estende seu período produtivo,ao mesmo tempo em que mais anos vividos com qualidade de vida demandam por produtos e serviços que supram novas necessidades. Neste cenário não podemos deixar de falar sobre diversidade e inclusão – principalmente inclusão digital. A pesquisa Desafios da Inovação na Gestão Municipal, realizada pelo Instituto Arapyaú e pelo Plano CDE, entrevistou especialistas e gestores do setor público para mapear os principais obstáculos à inovação em governo. A partir dos desafios identificados, foi possível traçar seis (6) competências que o gestor público deve desenvolver para definir uma atuação das prefeituras/ governos em favor da inovação. 24 São elas: Storytelling (contar histórias) - explicar a mudança de uma forma simples para que crie suporte do interlocutor para o receptor da informação; Foco nos cidadãos - os serviços públicos devem se concentrar na solução das necessidades dos cidadãos; Curiosidade - buscar e tentar novas ideias ou formas de trabalhar; Interação - desenvolver políticas, produtos e serviços de forma incremental e experimental; Alfabetização de dados - garantir que as decisões sejam orientadas por dados e que esses não sejam utilizados apenas no final dos processos; Insurgência - desafiar o status quo e trabalhar com parceiros incomuns. Perceba que as tendências estão alinhadas ao que se espera de um governo inovador e também ao que o consumidor tem demandado das empresas. Alguns caminhos passam por competências digitais, por pensar em automação de processos para melhorar a eficiência de produtos e serviços. Mas também passam por melhorar a comunicação tanto em novos canais como redes sociais, portais e mobile (comunicação digital), quanto na forma da comunicação mais simples, direta e acessível. Vale ressaltar aqui que o mercado de trabalho está cada vez mais global. O home-office, trabalho remoto e nomadismo digital são realidades aceleradas pela pandemia de 2020. Vários países já emitem vistos para profissionais que trabalhem remoto, quer dizer, os talentos podem estar em qualquer lugar trabalhando para qualquer empresa. Um último ponto que gostaria de abordar no tema profissional 4.0 é a coexistência de gerações com experiências diferentes em relação à tecnologia. Falamos sobre como o mundo está caminhando para a conexão extrema entre pessoas, entre “coisas”, entre lugares. Essa hiperconexão afeta de forma diferente as gerações, que se encontram no mesmo espaço-tempo no mercado de trabalho (e na vida). A classificação usada mundialmente para posicionar indivíduos na linha do tempo da história digital são quatro (4) Gerações. A Geração X, Y (Millennials), Z e Baby Boomers. Os Baby Boomers (nascidos entre 1945 e 1964) tendem a valorizar o patrimônio e uma carreira profissional estável. Eles geralmente permanecem no mesmo emprego por décadas até a aposentadoria. Para a Geração X (nascidos entre 1965 a 1984) o tempo de experiência é mais valorizado do que a criatividade e a inovação. Indivíduos da Geração X ficam desconfortáveis em correr risco. 25 A Geração Y (1985 e 1999) tem menos receio de largar um emprego em busca de satisfação e realização profissional e pessoal. Para a geração Y, o trabalho em equipe é mais importante do que a hierarquia e estão em uma busca constante por inovação. Enfim, a Geração Z são os conhecidos como nativos digitais. Estão entrando agora no mercado de trabalho, mas já demonstram suas habilidades multitarefas, são independentes e exigentes com o que consomem. São os mais preparados para os cargos que ainda nem foram criados. Esse choque de gerações, comportamentos e habilidades digitais pode provocar ruídos profissionais, mas também é uma grande oportunidade para criar um ambiente onde um se aproveita das habilidades diferentes e complementares do outro. Essa é a essência da inovação: do choque de ideias surge o novo. 26 BIBLIOGRAFIA Álvaro Campos. Mercado Livre ultrapassa a Vale e se torna empresa mais valiosa da América Latina. Valor Econômico — São Paulo em 07/08/2020. https://valor.globo.com/financas/noticia/2020/08/07/mercado-livre-ultrapassa-a-vale-e-se-torna- empresa-mais-valiosa-da-america-latina.ghtml TOTVS. Os principais números da Indústria 4.0. 2018. https://www.totvs.com/wp- content/uploads/2018/10/Os-principais-n%C3%BAmeros-da-ind%C3%BAstria-4.0-no-Brasil_500kb.jpg GARTNER. The Evolution of IoT and Its Impact on Adopters and Technology Providers: A Trend Insight Report. 2018. Nações Unidas. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. https://brasil.un.org/pt-br/sdgs
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