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Sucedâneos Recursais Conforme já discutido anteriormente, o conceito de recurso foi construído como sendo “o remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo, a reforma, invalidação, esclarecimento ou integração de decisão a que se impugna”. Neste diapasão, temos que o recurso possui cinco características essenciais: a) Voluntariedade: o recurso provém diretamente da vontade das partes, desde que haja interesse jurídico em recorrer; b) Expressa previsão legal: o rol de recursos previstos é taxativo, e encontra-se disposto no art. 994 do CPC, e na legislação especial; c) Desenvolvimento no próprio processo em que foi proferida a decisão impugnada: o recurso não configura um processo novo, mas tão somente prolonga o estado de litispendência; d) Manejável pelas partes, pelo Ministério Público ou terceiro juridicamente interessado; e) Com o objeto de reformar, anular, esclarecer ou integrar uma decisão judicial. Ocorre que, dentro da sistemática processual civil atual (e mantido pela vindoura), há outros meios além dos recursos para impugnar decisões judiciais que forem desfavoráveis. Estes meios são chamados de “Sucedâneos Recursais”, e diferem dos recursos por lhe faltarem alguns dos requisitos já elencados como indispensáveis para a condição e recurso. Assim sendo, pode-se dizer que possuem uma característica residual aos recursos (aquilo que não for recurso, mas tiver como intenção a modificação, invalidação ou esclarecimento de decisão judicial será considerado um sucedâneo). Dessa forma, podemos conceituar os sucedâneos como sendo “os meios de impugnação de decisões judiciais, os quais, pela falta de algum requisito essencial, não podem ser considerado recursos, mas que todavia possuem a mesma finalidade: buscar o aclaramento, integração, reforma ou invalidação da decisão combatida” Os sucedâneos podem ocorrer dentro do mesmo processo em que foi proferida a decisão combatida (sucedâneos internos), ou em ações próprias (sucedâneos externos, também chamados de ações autônomas de impugnação). Passaremos agora a analisar os sucedâneos mais comuns presentes no ordenamento. 1 – Sucedâneos internos 1.1) Pedido de reconsideração Tal sucedâneo foi trazido pela praxe forense. Não possui previsão legal, motivo pelo qual não pode ser chamado de recurso. É o resultado de construção doutrinária e jurisprudencial. O Pedido de Reconsideração é um meio usado pelas partes para interpelar o juízo, informando uma possível nulidade ou problema em alguma decisão, e requerendo que esta seja revista. Não possui rigor formal, sendo uma simples petição pedindo ao juiz para rever um ato. O fundamento para tal pedido é o fato de que o juiz pode, em qualquer tempo, rever qualquer ato já praticado, com o fim de corrigir erro ou nulidade existente no processo. O pedido de reconsideração tem como característica a informalidade, e não suspende o prazo para a interposição de qualquer recurso ou qualquer ato processual. Assim sendo, uma vez manejado e não provido, pode ocorrer a preclusão de algum ato a ser praticado, motivo pelo qual seu uso pode ser desaconselhado em algumas situações. 1.2) Reexame necessário O reexame necessário, também chamado de “remessa necessária”, está previsto no art. 496 e seguintes do CPC. Este sucedâneo é aplicado nas causas em que é parte as entidades da administração direta, autarquias e fundações públicas, e em que estes entes são sucumbentes em primeira instância. Assim é a redação legal: Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público; II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal. § 1o Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á. § 2o Em qualquer dos casos referidos no § 1o, o tribunal julgará a remessa necessária. O instituto do reexame necessário visa trazer mais força às sentenças proferidas em desfavor da Fazenda Pública, tendo em vista que, em teoria, nas ações em que estes entes são partes estão sendo discutidos direitos indisponíveis, e que irão afetar a coletividade. Assim sendo, temos o procedimento da remessa necessária: uma vez proferida a sentença desfavorável contra o ente público, e não proposto nenhum recurso, o juízo a quo irá, de ofício, remeter os autos ao tribunal, para que este profira nova decisão em sede de reexame. Assim sendo, tal sucedâneo não pode ser chamado recurso, pois lhe falta o requisito da voluntariedade. É importante ressaltar, também, que o reexame necessário não impede a existência de recursos voluntários de ambas as partes. Neste caso, o juízo ad quem irá apreciar novamente a demanda, tanto em sede de reexame necessário, quanto no caso dos recursos voluntários. Todavia, o reexame necessário não ocorrerá nos casos previstos no art. 496, §§3º e 4º do CPC: § 3o Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a: I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público; II - 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados; III - 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público. § 4o Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em: I - súmula de tribunal superior; II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; IV - entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa. Por fim, temos que a doutrina trata o reexame necessário como condição impeditiva do trânsito em julgado. Assim sendo, nas ações sujeitas ao reexame necessário (aquelas que não se enquadrem nas hipóteses do 496, §§3º e 4º do CPC), a decisão somente transitará em julgado (e, consequentemente produzirá efeitos) quando passar por este instituto. 2) Sucedâneos Externos 2.1) Mandado de Segurança O mandado de segurança é uma garantia constitucional insculpida no art. 5º, LXIX da CRFB/88. Segundo tal dispositivo, “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”. O mandado de segurança é uma ação constitucional, que foi disciplinada através da lei 12.016/09. Trata-se de ação mandamental, que tem como escopo a concessão de uma ordem para desfazer algum ato cometido por autoridade pública. Neste diapasão, temos que as decisões judiciais podem, perfeitamente, ser objeto de ação de mandado de segurança, desde que estejam eivadas de ilegalidade ou abuso de poder. uma vez que são atos cometidos por um agente investido de uma função pública. As únicas vedações expressasquanto ao uso do mandado de segurança como sucedâneos recursais estão previstas no art. 5º da referida lei: Art. 5o Não se concederá mandado de segurança quando se tratar: I - de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução; II - de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo; III - de decisão judicial transitada em julgado. No caso do mandado de segurança, o pedido formulado visa concessão de ordem para anular o ato considerado ilegal ou abusivo. Assim, o pólo passivo da ação é formado pela autoridade coatora, ou seja, o juiz ou tribunal que proferiu a decisão. Perceba que, neste caso, a nova ação sequer guarda identidade de partes com a ação onde a decisão combatida foi proferida; a parte “recorrida” na ação principal somente pode ingressar no mandado de segurança como terceiro interessado, mas não figura no pólo passivo. Necessário ressaltar, também, que não há dilação probatória no mandado de segurança. A ação deve ser proposta já com a prova da ilegalidade ou abuso de poder co metido pela autoridade pública. Por fim, temos a competência para o julgamento do Mandado de segurança. Neste caso, a competência deverá ser firmada com base na autoridade que proferiu a sentença. Senão vejamos: - Se for ato de ministro do STF, será julgado no próprio STF. - Se for contra ato do conselho nacional de justiça (CNJ), quem julga também é o STF. - Contra ato de ministro do STJ, quem é competente para julgar será o próprio STJ (súm. 330, STF). - Se for ato de desembargador de TJ ou de TRF e também contra atos de juízes de direito e juízes federais, o MS será julgado no tribunal ao qual a autoridade tiver vinculada. - Contra ato de juiz de juizado especial, o MS será julgado, como regra, no próprio colégio ou turma recursal. 2.2) Ação Rescisória A ação rescisória é considerada pela doutrina a ação autônoma de impugnação por excelência, eis que esta ação tem por objeto a desconstituição da coisa julgada, com a conseqüente anulação da decisão proferida. A priori, é necessário ressaltar que a coisa julgada é considerada direito fundamental pela CRFB/88. Preceitua o art. 5º, XXXVI, que “ a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Assim sendo, temos que somente em certos casos excepcionais pode a coisa julgada ser desfeita. A ação rescisória possui prazo decadencial de dois anos para ser intentada, prazo esse contado à partir do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo (art. 975,CPC). Conforme explicitado anteriormente, o rol de matérias possíveis de serem alegadas na ação rescisória é taxativo, e previsto no art. 966 do CPC: Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz; II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente; III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei; IV - ofender a coisa julgada; V - violar manifestamente norma jurídica; VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória; VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável; VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos. A ação rescisória, uma vez intentada, não impede o cumprimento da sentença da ação rescindenda, salvo se houver concessão e antecipação de tutela. Temos também, como condição especial para a interposição de ação rescisória, o depósito prévio de 5% (cinco por cento) do valor da causa, sendo que, caso a ação seja julgada inadmissível ou improcedente por unanimidade, este valor será convertido em multa. A ação rescisória poderá ser parcial, ou seja, visar a impugnação de apenas um capítulo da sentença. 2.3) Embargos de Terceiro Trata-se de sucedâneo recursal aplicável na fase de execução. Temos sua definição dada por Alexandre Freitas Câmara: Como ação autônoma, também, constituem-se os embargos de terceiro, entendidos estes como “a demanda, que dá origem a processo de conhecimento de procedimento especial, através da qual se busca excluir bens do demandante da apreensão judicial determinada em processo de que ele não é sujeito.” 1 Os embargos de terceiro são a ação manejável quando alguém se vê ameaçado de sofrer penhora ou ato constritivo de seu patrimônio em um processo de execução do qual não é parte. Estão previstos no art. 674 e seguintes do CPC. Podem ser opostos a qualquer tempo antes do trânsito em julgado da sentença e, no cumprimento da sentença, até cinco dias após a adjudicação. São distribuídos por dependência ao processo de execução e são autuados em apartado, devendo ser instruído com prova de sua posse ou domínio sobre o bem. 2.4) Reclamação A reclamação tem natureza jurídica de ação de competência originária de tribunal. Cabe especialmente para preservação da autoridade ou da competência de um tribunal. É disciplinada nos arts. 988 a 993 do CPC e, no caso de reclamação para o STF, na lei 11.417/06. Vejamos a redação do art. 988 do CPC, que prevê os casos onde é possível o ajuizamento de reclamação: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I - preservar a competência do tribunal; II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III - garantir a observância de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; 1 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 4a ed. Rio de Janeiro : Lumen Juris, v. 3, 2002, p. 431 IV - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de precedente proferido em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência. A respeito da reclamação, as palavras de Marcus Vinícius Rios Gonçalves: Cabe contra a decisão judicial ou ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente (art. 7º, da Lei n. 11.417/2006). A reclamação não impede o prejudicado de valer-se dos recursos previstos na legislação processual, mas tem sobre eles a grande vantagem de ser dirigida diretamente ao STF que, se a acolher, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinado que outra seja proferida, com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso (art. 7º, § 2º). Mesmo que a decisão seja de primeira instância, a reclamação será diretamente dirigida ao STF, uma vez que a sua natureza não é de recurso. A reclamação é o mecanismo adequado para tornar eficazes as súmulas vinculantes. O art. 7º, § 1º, da Lei estabelece que contra a omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido depois de esgotadas as vias administrativas. 2 Assim sendo, temos que a ação é dirigida diretamente ao ST, ou ao tribunal que editou a súmula, instruindo a ação com a prova que a decisão contrariou súmula ou enunciado, e requerendo seu cumprimento. O tribunal, entendendo como procedente o pedido, irá determinar a imediata cessação da decisão, anulando-a. 2 GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios.Direito processual civil esquematizado / Marcus Vinicius Rios Gonçalves. – São Paulo : Saraiva, 2011. P 51
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